sábado, 4 de outubro de 2008

Sínodo dos bispos será sobre a Palavra de Deus

Terá início neste domingo, dia 5, a XII Asembléia Geral Ordinária do Sínodo, que terá como tema “A Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja”. Pela primeira vez um sínodo não será realizado dento dos muros do Vaticano, mas na Basílica de São Paulo Extramuros. O motivo da escolha é por causa das comemorações do “Ano Paulino” pela Igreja. Tomarão parte da Assembléia 253 padres sinodais representantes de 113 conferências episcopais, de 13 igrejas orientais católicas, de 25 dicastérios da Cúria Romana e da União dos Superiores Gerais. Farão parte também do evento 41 especialistas de 21 países e mais 37 auditores de 26 nações. Estarão presentes também 25 mulheres, 6 especialistas e 19 auditoras. É comum se ouvir nos dias de hoje a expressão “Palavra de Deus”. Tanto os protestantes quanto os progessistas católicos usaram e usam desta expressão com um único sentido: a palavra de Deus é a Bíblia. Ora, a Bíblia em si, enquanto livro, enquanto papel, nada seria se não houvesse uma interpretação correta de seu conteúdo, isto é, uma doutrina. Perguntado certa vez sobre o que queria dizer a expressão “Palavra de Deus”, o modelo dos sacerdotes, São João Maria Vianey, disse: “a palavra de Deus é a doutrina católica”, isto é, o Catecismo, as homilias, as exegeses bíblicas, o conjunto dos ensinamentos da Igreja. Estão reunidos agora em Roma os bispos para tratar exatamente deste tema. E o site da Rádio Vaticano, dando uma prévia do que vai ser debatido pelos bispos sinodais, publicou o texto abaixo:
"Que o Sínodo dos Bispos ajude os pastores e os teólogos, os catequistas e os animadores comprometidos no serviço da Palavra de Deus a transmitir com coragem as verdades da fé, em comunhão com toda a Igreja" , é a intenção que o Papa propõe ao Apostolado da Oração para o mês de Outubro
(1/10/2008) Durante este mês , tem lugar a XII Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, convocada para debater «A Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja». É um tema pleno de actualidade, porque as investigações históricas, literárias e teológicas dos últimos decénios em torno da Bíblica têm sido fonte de grandes avanços no conhecimento mais aprofundado dos textos bíblicos – e de teorias polémicas na interpretação dos mesmos, não raro ignorando a autoridade do magistério eclesial e lançando a confusão entre os crentes. O Sínodo, porém, mais do que atender a tais polémicas, tem como objectivo ajudar as comunidades cristãs e cada cristão a tomarem consciência da necessidade de amar e conhecer esta Palavra, por meio da qual Deus se revela na sua intimidade e conduz a humanidade nos caminhos da salvação. Na Intenção que propõe ao Apostolado da Oração está patente a preocupação do Santo Padre quanto ao modo como os diversos membros da Igreja empenhados no serviço da Palavra de Deus (pastores, teólogos, catequistas, animadores...) assumem este serviço. Trata-se de uma preocupação compreensível, pois nem sempre tal serviço é assumido em Igreja e na Igreja. Assim tem acontecido, sobretudo por parte de estudiosos da Bíblia que, na sua investigação, se afastam do serviço à comunidade crente, na tentativa, bem intencionada, certamente, de tornar a Palavra de Deus mais aceitável ao espírito do tempo. Na maior parte dos casos, o resultado final é precisamente o contrário: uma erudição que abafa a originalidade da Palavra e acaba por torná-la simples palavra humana, historicamente datada e sem relevância para o contexto actual; noutros casos, a Palavra de Deus acaba a justificar opções ideológicas prévias, pouco ou nada respeitadoras da sua novidade. A atitude eclesial que o Sínodo dos Bispos pretende suscitar passa pelo serviço da Palavra de Deus, em Igreja. Todos podem e devem prestar este serviço: os estudiosos através da investigação cuidadosa e rigorosa, para ajudarem todo o povo de Deus a progredir no conhecimento da sua Palavra; os pastores da Igreja, anunciando a Palavra com vigor, explicando-a aos fiéis e convidando-os a caminhar na fidelidade aos seus ensinamentos; os catequistas, animando na descoberta das infindáveis riquezas da Palavra e testemunhando o seu poder para a transformação da vida pessoal e colectiva... e todos, em comunidade ou individualmente, dando testemunho diante do mundo de amor à Palavra de Deus, de alegria na sua escuta e, sobretudo, de adesão à mesma – que é adesão a Jesus Cristo – deixando-se converter e conduzir por ela".


Vejamos resumidamente o que seria o Dom da Palavra para que depois possamos analisar mais sobre a Palavra de Deus:

1. O que é o Dom da Palavra

O Evangelho de São João se inicia assim: “No princípio existia o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus”. A Segunda Pessoa da Santíssima Trindade é chamada, pois, de Verbo. Ora, o termo “verbo” vem do latim, e significa nada mais nada menos do que “palavra”. Significa, neste enunciado, que Deus não é somente a palavra, mas que ela desde o início estava nEle, pois foi por intermédio dela que Deus fez tudo. Sim, pois foi pela palavra que Deus iniciou o mundo, dizendo “Fiat” antes mesmo de traçar com sua mão o gesto criador. E depois, palavra por palavra, Deus foi criando o Universo: “E Deus disse: exista a luz. E a luz existiu” (Gen 1, 4). Depois Deus foi dizendo: faça-se o firmamento, faça-se a terra, faça-se a água façam-se os animais, os frutos, as árvores, etc., e tudo foi se fazendo sob o efeito de sua simples palavra.
Somente quando Deus foi criar o homem o fez com simples gestos, sem dizer palavras: “Façamos o homem à nossa imagem e semelhança”. O termo utilizado no plural “façamos o homem” indica que a ação criadora envolveu todas as três pessoas da Santíssima Trindade e não somente o Padre Eterno, pois a imagem e semelhança de Deus no homem consiste em refletir nele as três pessoas da Santíssima Trindade.. Porém logo em seguida Deus usa da palavra, agora porém com a intenção de ditar os primeiros mandamentos aos homens: “Crescei e multiplicai-vos e enchei a terra...”. Era o momento em que transmitia o dom da palavra aos homens. A partir dai a comunicação de Deus com os homens foi sempre por intermédio da palavra, um dom que Ele deu aos homens para se comunicarem entre si. Foi também usando deste dom que a serpente enganou Eva, entabulando com ela o primeiro diálogo.
Ora, todo ser criado por Deus tem por natureza o instinto de sociabilidade, pelo qual ele tem necessidade de se comunicar com os demais seres. Para comunicar-se com Deus, temos o dom que se chama “verbo” interior, através de nossos pensamentos mais íntimos e recônditos. No entanto, necessitamos dos sentidos, usando da palavra para nos comunicar entre nós, assim como receber de Deus suas comunicações. No entanto, a Palavra de Deus é para nós muito mais que a satisfação de um instinto de sociabilidade, pois ela é que nos dá a vida, nós não convivemos com Deus mas participamos de sua própria vida divina através de Sua graça.

2. Dom Natural concedido a todo homem

Por natureza todo homem já nasce com o dom da palavra, mesmo aqueles que nascem mudos, pois estes sempre encontram um meio de se comunicar com os outros homens, fazendo de seus gestos, palavras. No entanto, alguns recebem este dom de um modo especial, pois têm nele muita facilidade de se expressar. Dentre estes podem se destacar exímios oradores que fizeram do uso da palavra uma verdadeira arte. Arte que se expandiu não só pela oratória, mas pela declamação poética, pelo teatro e pela música. E a humanidade está cheia de exemplos de tais homens, desde os filósofos gregos da Antiguidade clássica até os oradores latinos e os artistas de teatro medievais.

3. Dom sobrenatural, concedido aos filhos de Deus

Este dom sempre foi concedido de modo especial àqueles que são ou foram fiéis a Deus. Desta forma, destacaram-se os profetas do Antigo Testamento que receberam de Deus este dom em grau elevado. Um que recebeu o dom de modo incompleto foi Moisés, pois era gago e alegou isto para não se comunicar com o faraó. No entanto, Deus concedeu a seu irmão, Aarão, o dom da palavra para comunicar-se com o rei, deixando a Moisés apenas o encargo de decidir o que fazer. Porém, quando dirigia o povo pelo deserto Moisés foi aos poucos adquirindo aquele dom, a ponto de haver feito vários discursos inflamados para animar o povo à perseverança na Lei de Deus.
As Sagradas Escrituras contam como o Profeta Isaías recebeu milagrosamente este dom, juntamente com o do Entendimento e da Sabedoria. Isaías lamentava-se, após a visão angélica que tivera, de que tinha os lábios impuros e indignos de entender e transmitir aquela mensagem celeste. Foi aí que um dos Anjos foi até ele: “Voou para mim um dos serafins, o qual trazia na mão uma brasa viva, que tinha tomado do altar com uma tenaz. Tocou a minha boca e disse: Eis que esta brasa tocou os teus lábios. Será tirada a tua iniqüidade e expiado o teu pecado” (Is 6, 6-7). Por que o anjo tirou a brasa “com uma tenaz”, em vez de pegá-la com a mão? Tratando-se de um anjo, não haveria perigo de se queimar. Ocorre que, para serem visíveis aos homens, os anjos em geral aparecem aos profetas sob formas humanas, usando assim de certos recursos naturais para se manifestar, ao mesmo tempo que se mostram sujeitos às leis da natureza (alguns até aceitam alimentos). De outro lado, o anjo quis dar a entender que aquela brasa era tão sagrada que o próprio anjo não poderia tocá-la, já que era destinada a ser posta nos lábios do profeta.
Diz-se que aquele Anjo apareceu a Isaías para iniciá-lo nos mistérios divinos. Logo, se conclui que o referido Anjo deveria necessariamente de ser um dos mais próximos de Deus. Mas não. O Profeta conheceu os poderes deificantes dos serafins, mas quem lhe apareceu foi um Anjo da última hierarquia, encarregados estes de estarem próximos dos homens e os instruírem devidamente. O Anjo lhe ensinou, dentro do possível, toda a ciência sagrada que tinha. O Profeta atribuiu aos serafins, próximos a Deus, a propriedade de purificar pelo fogo. Daí se pode dizer que foi um Serafim quem purificou o Profeta, mas através da intermediação de um Anjo da menor hierarquia, investido daqueles poderes enquanto Anjo, e, além de tudo, se utilizando de uma “brasa”. Esta “brasa” indica também que o anjo portava um dom que não lhe era próprio, o havia recebido de outro anjo de hierarquia maior, não podia sequer tocar nele com as “mãos”, sendo que para isso trazia uma tenaz.
Samuel foi o último dos Juízes de Israel, tendo sido o Profeta que intercedeu entre Deus e os israelitas para que fosse instituída a monarquia entre eles. Estava ele no Templo, dormindo ao lado do sacerdote Heli, e ouviu o Anjo falar, mas não o viu, conforme se lê na Sagrada Escritura: “e a palavra do Senhor era preciosa naqueles dias: e não havia visão manifesta”. Por que? Porque o importante era a palavra, eram as ordens a serem cumpridas:
“Ora aconteceu certo dia que Heli estava deitado no seu aposento. Os seus olhos tinham-se escurecido e não podia ver. Antes que fosse apagada a lâmpada de Deus, Samuel dormia no templo do Senhor, onde estava a arca de Deus. O Senhor chamou Samuel, o qual, respondendo, disse: Eis-me aqui. Correu a Heli e disse: Eis-me aqui, pois tu chamaste-me. Ele respondeu: não te chamei; volta e dorme. Ele retirou-se e dormiu.
“O Senhor voltou novamente a chamar Samuel. Samuel levantando-se foi a Heli e disse: Eis-me aqui, pois me chamaste. Heli respondeu: Não te chamei, meu filho, volta, e dorme. Ora Samuel ainda não conhecia o Senhor, e não lhe tinha ainda revelada a palavra do Senhor.
“O Senhor voltou novamente a chamar Samuel pela terceira vez. Ele, levantando-se, foi a Heli e disse: Eis-me aqui, pois me chamaste. Compreendeu então Heli que o Senhor chamava o menino e disse a Samuel: Vai e dorme. E, se te chamarem outra vez, dirás: Fala, Senhor, porque o teu servo ouve. Samuel, pois, retirou-se e dormiu no seu aposento. “O Senhor veio, parou e chamou duas vezes, como tinha feito: Samuel, Samuel! E Samuel respondeu-lhe: Fala, Senhor, porque o teu servo ouve. O Senhor disse a Samuel: Eis que vou fazer uma coisa em Israel, a qual, todo o que a ouvir ficar-lhe-ão retinindo ambos os ouvidos. Naquele dia suscitarei contra Heli todas as coisas que disse sobre a sua casa; começarei e cumprirei. Porque eu predisse-lhe que exerceria o meu juízo contra a sua casa para sempre, por causa da iniqüidade, porque ele sabia que seus filhos procediam indignamente e não os corrigiu. Por isso jurei à casa de Heli que a iniqüidade da sua casa jamais se expiaria com vítimas nem com ofertas” (I Reis 3, 3-14).
Orígenes diz que a palavra de Deus, ou a pregação, não basta por si mesma para tocar o coração do homem. Baseou-se no que diz São Paulo: “a minha conversação e a minha pregação não consistiram em palavras persuasivas da humana sabedoria, mas na manifestação do espírito e da virtude (de Deus), para que a vossa fé se não baseie sobre a sabedoria humana, mas sobre o poder de Deus” (I Cor 2, 4-5), e no Salmo de Davi: “O Senhor dará a nova, e grande é o número dos mensageiros”, isto é, o Evangelho é dado por Deus para que seus mensageiros (pregadores) o espalhem nos corações humanos.
A palavra é, pois, um dom pelo qual o homem se comunica, com todo o seu ser, com os demais homens. Pois existem outras formas de se comunicar, como por gestos ou por sinais, mas que o da palavra é superior a todos os outros, por ser mais eficiente e por transmitir sabedoria e entendimento. Não há necessidade de usar o mesmo para se comunicar com Deus, mas Ele prefere comunicar-se com os homens pela palavra, seja por intermédio dos anjos, seja mesmo por sonhos, mas sempre usando da palavra. É preciso que se leve em conta que a “Palavra de Deus” não é manifiesta, necessariamente, pela voz, como veremos adiante.

4. O que é a Palavra de Deus

a) É a Doutrina.
b) Necessita que haja predisposição de ouvi-la
São Paulo condena acerbamente os hebreus porque não ouviram as palavras divinas e, por isso, perderam o direito do “descanso”: Para penetrar no significado de “descanso”, precisamos fazer as seguintes indagações: o que é o verdadeiro descanso? Em que lugar se descansa? O lugar melhor para o descanso são as moradas, ou as interiores ou as celestes; e o verdadeiro descanso é a paz de espírito. Disse o Apóstolo:
“Temamos, pois que, desprezando a promessa (de Deus) de entrar no seu descanso, haja algum dentre vós que dele seja excluído. Da mesma forma que eles (israelitas), também nós recebemos a boa nova; porém a palavra que eles ouviram, não lhes aproveitou, por não ser acompanhada da fé por parte daqueles que a tinham ouvido. Porém, nós, que cremos, entraremos no descanso (do céu), segundo disse: “Como jurei na minha ira, não entrarão no meu descanso”; e com certeza, concluídas as suas obras depois da criação do mundo. Com efeito, em certo lugar falou assim do sétimo dia: “E Deus descansou no sétimo dia de todas as suas obras”. E outra vez: “Não entrarão no meu descanso”. Como, pois, resta que alguns entrem nele, e que aqueles, a quem primeiro foi anunciada a boa nova, não entraram por causa de sua incredulidade, fixa de novo certo dia falando de Hoje, dizendo por meio de Davi, tanto tempo depois, como acima foi dito: “Hoje, se ouvirdes a sua voz, não queirais endurecer os vossos corações”. De fato, se Josué lhes tivesse dado o descanso, (Deus) não falaria, depois disso, de outro dia. Resta portanto um sabatismo para o povo de Deus. Realmente aquele que entrou no seu descanso, também descansou das suas obras, como Deus das suas” (Heb 4, 1-10).
São Paulo refere-se ao Salmo 94-8 e 11, quando disse “Hoje, dizendo por meio da Davi”, que reza assim: “Se hoje ouvirdes a sua voz, não queirais endurecer os vossos corações”; e “Não conheceram os meios caminhos; pelo que jurei na minha ira: Não entrarão no meu descanso”.
A Palavra de Deus é viva
Continua São Paulo:
“Apressemo-nos, pois, a entrar naquele descanso, para que ninguém caia em tal exemplo de incredulidade. Porque a palavra de Deus é viva, eficaz e mais penetrante do que toda a espada de dois gumes; chega até à separação da alma e do espírito, das junturas e das medulas, e discerne os pensamentos e intenções do coração. Não há nenhuma criatura invisível na sua presença mas todas as coisas estão a nu e a descoberto, aos olhos daquele de quem falamos” (Heb 4, 11-13)
Entrar no descanso de Deus, enquanto estamos vivos, significa simplesmente penetrar nas moradas interiores. Para tanto, basta ouvir a Palavra de Deus, que, no caso, pode ser manifestada de várias formas, sendo a mais importante aquela que ressoa no interior de nossos corações. É tão forte esta palavra que São Paulo diz que é mais cortante do que uma espada de dois gumes, chegando até àquele lugar da “separação da alma e do espírito”, quer dizer, a região interior do homem que une corpo e alma, aquilo que os teólogos chamam “luz primordial”, “luz do entendimento” , “sacrário da alma”, “templo de Deus”, etc., etc.

5 No que consiste “ouvir a palavra de Deus”:

a) não se trata somente de prestar atenção à pregação;
b) trata-se de “abrir” a alma, deixar-se aquecer pelo entusiasmo do amor a Deus, para que a alma seja iluminada.
c) Por aí se começa o dom do entendimento, conforme ensina São Boaventura;
d) E se alcança a Sabedoria.

6. Meios com que a “Palavra de Deus” ilumina a alma:

a) oral, por sermões e práticas espirituais, como retiros e recolhimentos;
b) leituras e meditações;
c) o “verbo interior” e as revelações divinas

7. E se chega ao verdadeiro amor a Deus, conforme o explica São Tomás:

“O amor que causa no homem a vida espiritual e a iluminação do coração, que produz a perfeita paz e o conduz à felicidade da vida eterna é inteiramente dom de Deus.
“Não fomos nós que amamos a Deus, mas Ele que nos amou primeiro”, diz o Apóstolo João, porque não por causa de nós o amarmos primeiro que Ele nos amou, mas o próprio fato de o amarmos é causado em nós pelo seu amor.
“E é somente segundo a diferença deste amor que será a diferença da bem-aventurança celeste; muitos houve que fizeram maiores jejuns do que os apóstolos, mas estes na eterna glória superarão a todos os outros por causa da excelência de seu amor.
“Já que, portanto, é o amor algo tão importante, devemos trabalhar diligentemente para adquiri-lo e retê-lo. Embora ninguém possa por si mesmo possuir o amor, pois é dom inteiramente proveniente de Deus, deve-se considerar, todavia, que para possuí-lo requer-se disposição de nossa parte. Por isso devemos saber que duas coisas são necessárias para adquirir a caridade.
“A primeira é a escuta diligente da palavra de Deus, o que é suficientemente manifesto pelo que ocorre entre nós. Ouvindo, de fato, coisas boas de alguém, somos acesos em seu amor. Assim também, ouvindo as palavras de Deus, somos acesos em seu amor:
- A tua palavra é um fogo ardente, e o teu servo a amou (Sl 118, 140;
- A palavra de Deus o inflamou (sl 104);
“Por esta causa aqueles dois discípulos, ardendo do amor divino, diziam: “Porventura não ardia em nós o nosso coração, enquanto nos falava pelo caminho e nos explicava as Escrituras” (Lc 24, 32).
“De onde também, no décimo de Atos, se lê que “Pregando Pedro, o Espírito Santo caiu nos ouvintes da palavra divina! E o mesmo freqüentemente acontece nas pregações, isto é, que os que se aproximam com o coração duro, por causa da palavra da pregação,são acesos ao amor divino.
“A segunda é a contínua consideração dos bens recebidos:
- Aqueceu-se o meu coração dentro de mim (Sl 38, 4);
“Se, portanto, queres conseguir o amor divino, meditarás os bens recebidos de Deus. Demasiadamente duro seria, na verdade, quem considerando os benefícios divinos que alcançou, os perigos dos quais escapou, e a bem-aventurança que lhe é prometida por Deus, que não se acendesse ao amor divino.
De onde, diz Santo Agostinho:
“Dura é a alma do homem que, posto que não queira impedir o amor, não queira pelo menos retribuir”.
“E, de modo geral, assim como os pensamentos maus destroem a caridade, assim os bons a adquirem, a alimentam e a conservam, de onde que nos é ordenado:
-Retirai os vossos maus pensamentos dos meus olhos! (Is 1, 16), e também:
- Os pensamentos perversos separam de Deis! (Sab 1, 3).” [1]
[1] opúsculo “Sobre o Preceito do Amor” – de São Tomás de Aquino.

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