sábado, 30 de setembro de 2023

SALMOS DE DAVI: POESIAS, CÂNTICOS, HINOS, ORAÇÕES, PROFECIAS, LOUVORES A DEUS




                                                                         (Rei Davi)

A Igreja deu continuidade a uma tradição milenar de entoar cânticos ao som de músicas em sua liturgia. No Catecismo da Igreja isso é lembrado: “A tradição musical da Igreja universal constitui um tesouro de valor inestimável que se destaca entre as demais expressões de arte, principalmente porque o canto sacro, ligado às palavras, é parte necessária ou  integrante da liturgia solene”[1] A composição e o canto dos salmos inspirados, com frequência acompanhados por instrumentos musicais, já aparecem intimamente ligados às celebrações litúrgicas da antiga aliança. A Igreja continua e desenvolve esta tradição: “Recitai “uns com os outros salmos, hinos e cânticos espirituais, cantando e louvando ao Senhor em vosso coração” (Ef 5, 19). “Quem canta reza duas vezes”

O canto e a música desempenham sua função de sinais de maneira tanto mais significativa por “estarem intimamente ligados à ação litúrgica”, segundo três critérios principais: a beleza expressiva da oração, a participação unânime da assembleia nos momentos previstos e o caráter solene da celebração. Participam assim da finalidade das palavras e das ações litúrgicas: a glória de Deus e a santificação dos fieis” [2]

Tudo indica que foi Davi o responsável por introduzir nas celebrações litúrgicas o canto sacro através de seus Salmos, que o povo eleito usou durante séculos e cuja tradição passou para a Igreja no advento do Cristianismo. Aquele santo rei reuniu suas qualidades de regente musical com a de regente da monarquia, ou até mesmo das almas, pois suas músicas e salmos eram inspirados pelo próprio Deus para o bem da almas e da regência das mesmas já nesta terra.

Tais cantos sagrados são chamados de Salmos nas traduções das Sagradas Escrituras tanto gregas quanto latinas, sendo também chamados simplesmente de hinos nas versões hebraicas. Sendo que conforme a tradição hebraica eles são denominados por analogia de Saltérios, nome também utilizado na tradição católica durante muitos anos.

Segundo estudiosos, a atual coleção de Salmos ou Saltérios foi se formando aos poucos, e de início era a coleção de hinos para o culto divino restaurado após o cativeiro da Babilônia. No entanto, é certo que já existiam desde os tempos do rei Davi (cerca de 1000 a;C.), e foram por ele criados, até depois de Neemias (cerca de 400 a.C.). Conforme vimos acima, a opinião de Santo Agostinho é de que todos eles são de autoria de Davi. É muito grande a variedade de temas abordados nestes cânticos e servem como orações para todas as circunstâncias da vida humana. Trata-se de uma antologia poética cristã de grande alcance em nossa vida religiosa

 

A Regência conforme os Salmos:

 Sobre o poder da realeza

 Salmo 2: (confronto entre as duas regências)

 Por que se embraveceram as nações, e os povos meditaram coisas vãs?

Os reis da terra sublevaram-se, e os príncipes coligaram-se contra o Senhor e contra o seu Cristo.

Rompamos os seus laços, e sacudamos de nós o seu jugo.

Aquele que habita no céu zombará deles, e o Senhor os escarnecerá.

Ele lhes falará na sua ira, e os encherá de terror no seu furor.

Eu, porém, fui por ele constituído rei sobre Sião, seu monte santo, para pregar a sua lei. O Senhor disse-me: Tu és meu filho, hoje eu te gerei.

Pede-me, e eu te darei as nações em tua herança, e estenderei o teu domínio até as extremidades da terra.

Governá-las-ás com uma vara de ferro, e quebrá-las-ás como vaso de oleiro.

E agora, ó reis, entendei: instruí-vos vós que julgais a terra.

Servi ao Senhor com temor, e alegrai-vos nele com tremor.

Abraçai a boa doutrina para que o Senhor não se ire, e não pereçais fora do caminho da justiça.

Quando daqui a pouco se incendiar a sua ira, felizes todos os que confiam nele.

 

Salmo 71: (O reino do Messias)

 Salmo sobre Salomão. Ó Deus, dá a tua equidade ao rei, e  a tua justiça, ao filho do rei; para que ele julgue o teu povo com justiça, e os teus pobres com equidade.

Recebam os montes paz para o povo, e os outeiros justiça.

Julgará os pobres do povo, e salvará os filhos dos pobres, e humilhará o caluniador.

E durará tanto como o sol e a lua, de geração em geração.

Descerá como a chuva sobre o velo[3], e como o orvalho que goteja sobre a terra.

Nos seus dias aparecerá a justiça e a abundância da paz, até que a lua deixe de existir.

E dominará de mar a mar, e desde o rio (Eufrates) até às extremidades da terra.

Diante dele se prostrarão os etíopes, e os seus inimigos beijarão a terra.

Os reis de Tarsis e as ilhas lhe oferecerão dons; os reis da Arábia e de Sabá lhe trarão presentes; e adorá-lo-ão todos os reis da terra; todas as nações o servirão; porque livrará o pobre do poderoso, e o indigente que não tem quem lhe valha.

Usará de clemência com o pobre e o desvalido, e salvará as almas dos pobres.

Resgatará as suas almas das usuras e da iniquidade, e o seu nome será em honra na sua presença.

Viverá e lhe apresentarão o ouro da Arábia; e o adorarão sempre, todo o dia e o bendirão.

Haverá mantimentos na terra, no cume dos montes, exaltar-se-á sobre o Líbano seu fruto, e florescerão os da cidade, como a erva dos campos.

Seja seu nome bendito pelos séculos; o seu nome existe antes do sol.

Serão benditas nele todas as tribos da terra;  todas as nações o glorificarão.

Bendito seja o Senhor Deus de Israel; é só ele que faz maravilhas.

Bendito seja o nome da sua majestade para sempre; e encher-se-á da sua majestade toda a terra. Assim seja, assim seja.

 

Salmo 92: (a glória do reino messiânico)

 O Senhor reinou, e vestiu-se de magnificência, vestiu-se o Senhor de fortaleza, e cingiu-se dela.

Porque firmou a redondeza da terra, que não será abalada.

Desde então, ó Senhor, firme é teu trono, tu és desde a eternidade. Os rios, Senhor, levantaram a sua voz. Levantaram as torrentes o seu fragor, com o estrondo das muitas águas.

Maravilhosas são as elevações do mar, mas admirável é o Senhor nas alturas. Os teus testemunhos, Senhor, são digníssimos de fé. A santidade convém à tua casa, Senhor, em toda a duração dos dias.

 

 

Salmo 98 (Louvor a Deus, rei supremo)

 O Senhor já reina, irritem-se os povos; reina o que está sentado sobre querubins, agite-se a terra.

O Senhor é grande em Sião, e elevado acima de todos os povos.

Dêem glória ao seu grande nome, porque é terrível e santo; e a honra do rei está em amar a justiça. Tu estabeleceste leis retíssimas; tu exerceste o julgamento e a justiça em Jacó.

Exaltai o Senhor nosso Deus, e adorai o escabelo de seus pés, porque ele é santo.

Moisés e Aarão estavam entre os seus sacerdotes, e Samuel entre aqueles que invocam o seu nome. Invocavam o Senhor, e ele os atendia; falava-lhes na coluna de nuvem.

Guardavam os seus mandamentos, e o preceito que lhes tinha dado.

Senhor, nosso Deus, tu os ouvias, ó Deus, tu lhes fosse propício, até em punir todas as suas faltas.

Exaltai o Senhor nosso Deus, e adorai-o sobre o seu santo monte, porque o Senhor nosso Deus é santo.

 

 Salmo 100 (qualidades da boa regência)

 Eu cantarei a misericórdia e a justiça. Senhor, eu te entoarei salmos, e procurarei conhecer o caminho da perfeição. Quando virás a mim?  Eu caminhava na inocência do meu coração, no meio da minha casa.

Eu não punha diante dos meus olhos coisa injusta; aborrecia os que cometiam prevaricações.

Não se unia a coração depravado; o mau afastava-se de mim, e eu não o conhecia.

Ao que secretamente dizia mal do seu próximo, eu o perseguia. Com homem de olhos soberbos e de coração insaciável, com esse não comia.

Meus olhos só buscavam na terra os fiéis, para que  se sentassem comigo; o que andava por um caminho inocente, esse me servia.

Não habitará na minha casa o que procede com soberba; o que diz coisas iníquas não pôde tornar-se agradável aos meus olhos.

Pela manhã exterminava todos os pecadores da terra, a fim de suprimir da cidade do Senhor todos os que cometem a iniquidade.

  

[1] Sacrossanctum concilium, 112

[2] Catecismo da Igreja Católica, tópicos 1156 e 1157

[3] O velo é o couro com a lã cardada do animal; aqui diz-se que a chuva cai sobre ele porque era costume colocar-se o couro (aqui chamado de velo) por cima da colheita para protegê-la da chuva.


quarta-feira, 27 de setembro de 2023

FALSO ESPÍRITO DE CONCILIAÇÃO

 





 

(Comemorando-se hoje a festa de São Vicente de Paulo, relembramos neste artigo de Dr. Plínio, escrito em 1944, o verdadeiro espírito de caridade dos Santos, preocupados antes de tudo em combater o erro).

 

“Numa época em que a política da mão estendida, condenada pelo Santo Padre Pio XI, de novo tenta lançar uma ponte entre os católicos e os socialistas, é muito oportuno lembrar o que sobre a união dos católicos disse o santo por excelência da Caridade e do amor ao próximo, São Vicente de Paulo, cuja festa litúrgica foi celebrada a 19 deste mês .

As considerações que abaixo transcrevemos são sobretudo preciosas porque se referem à união de católicos com “cristãos” jansenistas, numa época em que os erros dos discípulos do Bispo de Ypres ainda não haviam sido condenados pela Santa Sé. As cartas de São Vicente de Paulo que hoje transcrevemos, tratam justamente da adoção de medidas tendentes a provocar um pronunciamento do Papa sobre os pontos de doutrina que dividiam os católicos franceses.

Segundo o Patrono das conferências vicentinas, fora da verdade nenhuma união é desejável. E apesar da mensagem “cristã” mais ou menos “fraca” dos jansenistas, era irredutível partidário de uma ruptura completa com eles.

Vejamos o que sobre este assunto se acha no livro do Padre Charles Maignen, “Nouveau Catholicisme et Nouveau Clergé”.

 “É um alivio para o espírito e o coração, quando colocamos de lado as tristezas e vergonhas do presente e nos transportamos para as grandes épocas da história, na companhia dos santos.

Não há leitura mais apropriada, neste sentido, que a dos capítulos da Vida de São Vicente de Paulo, em que o Padre Maynard, seu historiador, narra as lutas do santo contra o jansenismo.

Essas páginas parecem escritas para a hora presente.

Os processos dos jansenistas, seu modo de fazer polêmica e de desenvolver os interesses do partido não são apenas semelhantes, são idênticos à maneira de agir dos americanistas e católicos liberais de nosso tempo.

Não pretendemos redizer como São Vicente de Paulo que perseguiu a seita e atravessou seus projetos, denunciando-os à rainha, denunciando-os à Igreja e escrevendo a todos os Bispos de França para levá-los a pedir ao Papa a condenação das cinco proposições extraídas do livro “Augustinus”. Nós nos limitaremos a reproduzir alguns trechos de suas cartas, em que o zelo do santo aparece bem afastado dessa falsa virtude que protege o erro sob pretexto de caridade.

Eis em que termos Vicente de Paulo termina uma carta ao Bispo de Louçon, de 23 de abril de 1651, a respeito dos jansenistas:

“É grandemente de se desejar que tantas almas sejam alertadas... e que se impeça em boa hora que outras entrem em uma facção tão perigosa. – O exemplo de um chamado Labadie é uma prova da malignidade dessa doutrina. É um padre apóstata que passava por grande pregador, o qual, depois de haver feito grandes danos na Picardia e depois na Gasconha, fez-se huguenote em Montauban; e, por um livro que escreveu de sua pretensa conversão, declara que tendo sido jansenista, achou que a doutrina que ali se adota é a mesma crença que ele abraçou. E, com efeito, Monsenhor, os ministros se vangloriam em seus sermões, falando a essa gente, que a maioria dos católicos se acha de seu lado, e que em breve terão o resto.”

Vê-se que São Vicente de Paulo não desdenhava o testemunho dos padres apóstatas de seu tempo. Logo depois dessas palavras, o santo acrescentava: “Assim sendo, que não se deve fazer para extinguir esse fogo que dá vantagem aos inimigos jurados de nossa Religião? Quem não se lançará sobre esse pequeno monstro que começa a devastar a Igreja, e que afinal a desolará, se não for estrangulado ao nascer? Que não desejariam ter feito tantos bravos e santos Bispos destes dias, se fossem do tempo de Calvino? Vê-se agora a falta dos daquele tempo, que não se opuseram fortemente a uma doutrina que devia causar tantas guerras e divisões.” E São Vicente de Paulo insistia com o Bispo de Luçon para que “requeresse que Nosso Santo Padre” falasse enfim “para reprimir essas opiniões novas que simbolizam tanto com os erros de Calvino. Estará nisso a glória de Deus, concluiu ele, o repouso da Igreja e, ouso dizê-lo, também do Estado.”

Mas onde a clarividência e a energia de Vicente de Paulo aparecem com mais brilho, é na admirável carta aos Bispos de Alet e de Pamiers, que estranhas razões de prudência e de contemporização haviam levado a permanecer neutros no conflito.

São Vicente de Paulo refuta, uma após outra, todas as razões que eles haviam alegado em favor de sua abstenção. Essas razões são de todos os tempos e os argumentos que São Vicente de Paulo lhes opõe não são menos probantes em nossos dias do que no século dezessete:

“Monsenhores,

Recebi, com o respeito que devo à vossa virtude e à vossa dignidade, a carta que me haveis feito a honra de escrever no fim do mês de maio, para responder as minhas a respeito das questões presentes, na qual vejo muitos pensamentos dignos da posição que ocupais na Igreja e que parecem vos fazer inclinar ao partido do silêncio nas contendas do momento atual. Não deixarei, entretanto, de tomar a liberdade de vos apresentar algumas razões, que talvez vos poderão levar a outros sentimentos, e que vos suplico, Monsenhores, prosternado em espírito a vossos pés, vos digneis de boamente ouvir.

É, primeiramente, sobre o que testemunhais recear que o julgamento que se deseja de Sua Santidade não seja recebido com a submissão e a obediência que todos os cristãos devem à voz do Soberano Pastor e que o Espírito de Deus não encontre bastante docilidade nos corações para neles operar uma verdadeira união, eu vos diria de bom grado que, quando as heresias de Lutero e de Calvino, por exemplo, começaram a aparecer, se se tivesse esperado para condená-las até que seus sectários parecessem dispostos a se submeter e a se unir, essas heresias estariam ainda no número das coisas indiferentes, que podem ser seguidas ou deixadas, e elas teriam infectado mais pessoas que o fizeram. Se, portanto, essas opiniões, das quais vemos os efeitos perniciosos nas consciências, são dessa natureza, em vão esperaremos que aqueles que as semeiam entrem em acordo com os defensores da doutrina da Igreja, porque é isto que não devemos esperar, e o que jamais acontecerá; e diferir a obtenção da condenação da Santa Sé, é dar-lhes tempo de espalhar seu veneno, e é também privar a várias pessoas de condição e de grande piedade, o mérito da obediência que protestaram render aos decretos do Santo Padre, logo que os conheçam; tais pessoas não desejam senão saber a verdade, e, enquanto esperam o efeito desse desejo, elas permanecem sempre de boa fé nesse partido, que fazem aumentar e fortificar por esse meio; a ele aderindo pela aparência do bem e pela reforma que pregam e que é a pele de ovelha com que os verdadeiros lobos sempre se cobrem para enganar e seduzir as almas.

Em segundo lugar, o que vós dizeis, Monsenhores, que o calor dos dois partidos em sustentar sua opinião deixa pouca esperança de uma perfeita união, à qual entretanto se deve visar, me obriga a vos ponderar que não há união a fazer na diversidade e contrariedade de sentimentos em matéria de Fé e de Religião, a não ser apelando para um terceiro que não pode ser senão o Papa, na falta dos Concílios e que aquele que não deseja unir-se nessa matéria, não é capaz de nenhuma união, a qual fora disto não é mesmo desejável: porque as leis não se devem jamais reconciliar com os crimes, não mais que a mentira concorda com a verdade.

Em terceiro lugar, essa uniformidade que desejais entre os Prelados seria bem de se desejar, desde que sem prejuízo para a Fé, porque não deve haver união no mal e no erro; mas quando essa união deve ser feita, a parte menor deve procurar a maior, e o membro deve se unir à cabeça, que é o que se propõe, e havendo ao menos, das seis partes, cinco que ofereceram de se ater ao que disser o Papa na falta de um concílio, que não pode reunir-se por causa das guerras; e quando, depois disso permanecer a divisão e se achardes melhor o cisma, deve-se imputa-lo àqueles que não desejam juiz, nem se render à pluralidade dos Bispos, aos quais. não acatam, do mesmo modo que não o fazem ao Papa.

E daí se forma uma quarta razão, que serve de resposta ao que vos ocorreu de me dizer, Monsenhores, que um e outro partido acreditam que a razão e a verdade se acham de seu lado, o que concedo. Mas vós bem sabeis que todos os hereges têm dito o mesmo, e que isto não os garantiu contra a condenação e os anátemas com que têm sido fulminados pelos Papas e pelos concílios; não se achou que a união com eles fosse um meio de sanar o mal, pelo contrário, foi-lhes aplicado o ferro e o fogo e algumas vezes demasiadamente tarde, como pode acontecer agora. É verdade que um partido acusa o outro, mas com esta diferença, que um pede juízes, e que o outro não os deseja, o que é mau sinal. Ele não deseja remédio, digo eu, da parte do Papa, porque sabe que é possível; e faz gesto de pedir Concílio porque o crê impossível, no estado presente das coisas; e se pensasse que ele fosse possível, rejeitá-lo-ia do mesmo modo que rejeita o outro. E não será, segundo creio, motivo para o riso dos libertinos e hereges, nem escândalo para os bons, ver os Bispos divididos, porque além de ser muito pequeno o número dos que não desejam subscrever as cartas escritas ao Papa sobre este assunto, não é coisa extraordinária, nos antigos Concílios, que todos não tenham o mesmo sentimento; e é o que mostra também a necessidade que o Papa conheça o assunto; pois que, como Vigário de Jesus Cristo, é o Chefe de toda a Igreja, e por conseguinte o superior dos Bispos.

Em quinto lugar, não vemos porque a guerra, por estar espalhada quase por toda a Cristandade, há de impedir que o Papa julgue com todas as condições e formalidades necessárias e prescritas pelo Concílio de Trento, a escolha das quais este deixou nas mãos de Sua Santidade, a quem vários santos e antigos Prelados tem ordinariamente consultado e reclamado nas dúvidas sobre a Fé, mesmo quando reunidos, como se vê nos Santos Padres e nos anais eclesiásticos. Ora, se se prevê que haverá quem não dê aquiescência ao seu julgamento, será este um meio de discernir os verdadeiros filhos da Igreja dos rebeldes.

Quanto ao remédio que propondes, Monsenhores, de proibir a um e outro partido de dogmatizar, eu vos suplico muito humildemente que reconsidereis que isto já foi experimentado inutilmente, e serviu apenas para dar força ao erro, porque vendo que era tratado na mesma base que que a verdade, o erro se aproveitou desse  ensejo para se consolidar; e não se deve tardar demasiadamente em extirpa-lo, visto que essa doutrina não se aplica somente em teoria, mas que consistindo também na pratica, as consciências não mais podem suportar a perturbação e a inquietação que nascem dessa dúvida, a qual se forma no coração de cada um, a saber se Jesus Cristo morreu por ele ou não, e outras semelhantes. Há pessoas que, ouvindo outros dizerem, a moribundos, para consolá-los, que tivessem confiança na bondade de Nosso Senhor, que morreu por eles, disseram aos doentes que não se fiassem nisso, porque Nosso Senhor não havia morrido por todos.

 “Permiti também, Monsenhores, acrescentar a estas considerações que esses que fazem profissão da novidade, vendo que se temem suas ameaças, as aumentam, e se preparam para uma forte rebelião; servem-se de vosso silêncio como um poderoso argumento em seu favor, e mesmo se ufanam, por um impresso que publicam, que sois de sua opinião; e, pelo contrário, os que se conservam na simplicidade da antiga crença, se debilitam e se desencorajam, vendo que não se acham universalmente sustentados. E não ficareis um dia bem contristados, Monsenhores, se vosso nome, ainda que contra vossas intenções, que são muito santas, tivesse servido para confirmar a uns em sua obstinação, e para abalar a crença de outros?

“Quanto a confiar o assunto a um concílio ecumênico, qual o meio de convoca-lo durante estas guerras? Passaram-se quase quarenta anos desde que Lutero e Calvino começaram a perturbar a Igreja e a convocação do Concílio de Trento. Segundo este, não há mais pronto remédio que o de recorrer ao Papa, ao qual o próprio Concílio de Trento nos encaminha em sua última sessão, no último capítulo, do qual vos envio um excerto.

“Portanto, Monsenhores, não se deve temer que o Papa não seja obedecido como é bem justo quando se tiver pronunciado; porque além do que essa razão de temer a desobediência é comum em todas as heresias, as quais por conseguinte dever-se-ia deixar existir impunemente, nós temos um exemplo muito recente na falsa doutrina dos dois pretensos chefes da igreja saída da mesma botica, a qual, tendo sido condenada pelo Papa seu julgamento foi obedecido, e não mais se fala dessa nova opinião. Certamente, Monsenhores, todas essas razões e várias outras que vós sabeis melhor que eu, que desejaria aprender de vós, que respeito, como meus pais e como doutores da Igreja, fizeram que restam presentemente poucos prelados em França que não tenham assinado a carta que vos foi apresentada.”

 

 

(Plínio Corrêa de Oliveira – “Legionário”, 30 de julho de 1944, pág. 5)


terça-feira, 26 de setembro de 2023

POR QUE A ALEMANHA NAZISTA NÃO INVADIU O VATICANO

 





Em alguns episódios a Igreja mostrou seu o poder através do Papado. Átila invadiu Roma, mas parou perante a presença do Papa, São Leão. Henrique IV, rei da Alemanha, desafiou o Papa Gregório VII, mas após ser excomungado perdeu o trono. No século XX  tivemos o episódio que abaixo mostramos, quando Hitler pretendeu invadir o Vaticano, mas desistiu. Ele havia invadido a Itália após a morte de Mussolini, mas não teve coragem de invadir o Vaticano. Vejam o relato:

O jornalista Mario del Ballo afirma que Adolf Hitler, no verão de 1942, em plena II Guerra Mundial, projetou «raptar» o Papa Pio XII. Mario del Ballo apresenta esta tese na obra de investigação «Quando Hitler quis raptar o Papa. Os segredos revelados do Arquivo Secreto do Vaticano», publicada pelas Edições Paulinas.

«De facto, ao que parece, Adolf Hitler tinha projetado invadir o pequeno Estado [do Vaticano] e até prender e deportar o pontífice [Pio XII]», afirma Ballo. Todavia, como afirma o autor, o projeto foi suspenso «quando já faltava muito pouco para o executar».

A ideia de Hitler era «uma conjura antipapal, um plano como o que tinha acontecido há mais de um século, com Napoleão contra Pio V e Pio VI», escreve o autor.

Adolf Hitler dirigia os destinos de uma Alemanha em expansão bélica, que já ocupara a Áustria, a Checoslováquia e outros países como a França, a Bélgica e a Holanda. O motivo da «irritação» do líder nazi com o pontífice terá sido a publicação da encíclica «Mit brennender Sorge» («Com profunda preocupação»), na qual se denuncia «a repressão da liberdade religiosa, [e] o culto idolátrico da raça». «Dissemos vigorosamente que nós, os católicos, não podemos banir os sábios ensinamentos do Antigo Testamento», afirmou Pio XII, citado por Ballo. «"Espiritualmente, somos todos semitas", dirá o Papa alguns meses depois», remata o autor.

«Mit brennender Sorge» foi publicada em março de 1937, e é uma das raras encíclicas publicadas em alemão, tendo sido impressa secretamente na Alemanha e lida em todos os templos católicos, o que motivou perseguições a vários religiosos e seguidores da Igreja de Roma. «Tenho de agir pela paz, mesmo correndo um risco como este [a conjura contra Hitler] para eliminar a loucura nazi», escreveu Pio XII, citado por Ballo. O Papa reagiu também de forma «fria» e com relutância à capitulação dos bispos austríacos, que três dias depois da entrada pacífica de Hitler na Áustria, assinaram uma declaração de apoio ao que se apresentou como «a integração austríaca no Reich germânico».

O cardeal-arcebispo de Viena, Teodoro Innitzer, líder da Igreja austríaca, acrescentou à sua assinatura uma saudação nazi, tendo sido de imediato chamado ao Vaticano, e motivou uma forte repreensão e repulsa de Pio XII que o acusou de «ingénuo», e questionou se nunca lera «uma página» da obra «Mein Kampf», na qual Hitler expõe a sua doutrina nacional-socialista.
Antes de cingir a tiara papal, tinha sido núncio apostólico em Munique e em Berlim, precisamente no período da I Grande Guerra (1914-1918), altura em que Adolfo Hitler, austríaco, recusado pelo Exército do seu país, se alistou no alemão e ganhou fama de «invulnerável», depois de se ter esquivado a vários ataques do inimigo, tendo até sido condecorado com a Cruz de Ferro.
Com a subida a chancelar do ex-soldado do 16.º Regimento de Infantaria da reserva do reino da Baviera (Alemanha), «o Papa cria que Hitler estava possesso pelo demónio; por isso fazia exorcismos à distância na sua capela, como contavam o sobrinho Carlo Pacelli e outras testemunhas; um episódio foi verificado pelo jesuíta Peter Gumpel, relator da causa de beatificação» de Pio XII.

(Fonte: https://tvi.iol.pt/noticias/internacional/vaticano/hitler-tinha-plano-para-sequestrar-o-papa-pio-xii )

 

Ainda sobre a atuação de Pio XII contra o Nazismo, ver as postagens:

- PIO XII SALVOU 11.000 JUDEUS

https://quodlibeta.blogspot.com/2011/08/pio-xii-salvou-11000-judeus-romanos.html

PIO XII TERIA EXORCIZADO HITLER

https://quodlibeta.blogspot.com/2009/08/pio-xii-teria-exorcizado-hitler.html

 

 


sábado, 23 de setembro de 2023

O BRASIL SURGIU SOB O SIGNO DE NOSSA SENHORA DA ESPERANÇA

 


 


 

 NOSSA SENHORA DA ESPERANÇA - Origem da devoção

A devoção à Nossa Senhora da Esperança surgiu na Europa em plena Idade Média. O mais antigo santuário que se tem notícia é o da cidade de Mezières, na França, construído no ano 930. Aos poucos a devoção foi se espalhando pela Europa, chegando a Portugal por ocasião da época dos Descobrimentos.

Era venerada em Belmonte, origem da família Cabral. Segundo o cronista Frei Antonio Brandão, a linhagem dos Cabrais veio da Grécia, passando por Castela e de lá para Portugal em priscas eras. Na região de Belmonte, o nome dessa ilustre família está ligada estreitamente à devoção à Nossa Senhora da Esperança. Deve-se a uma senhora da família, provavelmente irmã de Gil Álvares Cabral, a construção da igreja dedicada a São Tiago, em Belmonte, no altar da qual se venerava Nossa Senhora da Esperança. Sua festa é celebrada no terceiro domingo de setembro.

Peregrinações e devoção no Brasil

A imagem de Cabral permanece em Belmonte, mas já esteve algumas vezes no Brasil em peregrinação. Sua primeira visita ao Brasil foi em 1955 por ocasião do Congresso Eucarístico Internacional do Rio de Janeiro. No sesquicentenário de nossa independência, em 1972, o governo português ofereceu ao Brasil uma cópia da imagem, recebida em Salvador pelo Cardeal Primaz e entronizada na paróquia do STIEP (bairro de Salvador), onde é venerada.

No entanto, foi em 1996 que a imagem original fez a maior peregrinação pelo Brasil. Em 22 de maio daquele ano a imagem foi recebida pelas autoridades no Rio de Janeiro e de lá percorreu em peregrinação todas as capitais brasileiras. Em toda capital era recebida por prefeitos, governadores, autoridades religiosas e o povo em geral, demonstrando grande apreço de nossa gente por essa devoção. No dia 8 de dezembro, dia da Imaculada Conceição, a imagem se despedia no Rio de Janeiro. Após ser colocada num barco onde se realizou um exorcismo por um sacerdote, a imagem desceu à terra num andor e foi recebida festivamente por cadetes do exército que a conduziram entre bandeiras dos estados brasileiros, de Portugal e de outros países, em meio à exuberante beleza natural da Baía de Guanabara. Abrindo a procissão foi rezado um terço pela multidão aglomerada para seguir a procissão. Logo após, a imagem ficou exposta na Câmara Municipal para veneração pública até o dia 11 de dezembro.

A devoção de Pedro Álvares Cabral

Quando Pedro Álvares Cabral partiu em 1500 da praia do Restelo com destino à Terra de Santa Cruz, trazia na nau capitânea uma imagem de Nossa Senhora da Esperança, que seria a protetora de sua esquadra durante a viagem. Era uma pequena imagem representando a Virgem Maria de pé, com o Menino Jesus sentado em seu braço esquerdo e segurando, carinhosamente, com a mão direita, o pezinho d’Ele. O Divino Infante alimenta uma pomba (símbolo do Espírito Santo) com alguns grãos, pousada sobre o braço direito de Sua Mãe.

O fidalgo de Belmonte, tornado então Capitão-Mor de uma esquadra que se dirigia às Índias em missão oficial do Rei de Portugal, Dom Manuel “O Venturoso”, deveria enfrentar “mares tormentosos” ao contornar o famoso “Cabo da Boa Esperança”, anteriormente chamado “das Tormentas”. Segundo alguns, desviou demais o rumo de sua viagem e sua esquadra veio avistar o Monte Pascoal no dia 22 de abril daquele ano. Alguns dias depois, a 26 de abril, num Domingo de Páscoa, o capitão tomava posse da nova terra desembarcando em Porto Seguro.

Os cronistas não o dizem, mas é claro que Pedro Álvares Cabral levou para terra a piedosa imagem de Nossa Senhora da Esperança. Assim, no Altar onde Frei Henrique de Coimbra celebrou a primeira missa em solo brasileiro, havia não só a Santa Cruz, que deu nome à nova terra, mas também a imagem de Nossa Senhora da Esperança. A Virgem da Esperança, que amansou o “cabo das tormentas” e lhe trocou até o nome, vinha agora com seu terno olhar amansar e abençoar a selvagem terra recém-descoberta.

Alguns dias depois seguiu Cabral a rota da Índia, agora com 11 navios, onde foi enfrentar, além do Cabo da Boa Esperança, bárbaros reis mouros na esperança de lá também propagar a Fé Católica. Em junho do ano seguinte começaram a chegar as seis embarcações que restaram das 13 que partiram: dentre elas se destacava a nau capitânea, relicário ambulante que continha intacta, soberana e vencedora a Virgem da Boa Esperança.

Foi, pois, sob o olhar materno de Nossa Senhora da Boa Esperança que nasceu o Brasil. 

NOSSA SENHORA, ESPERANÇA DOS CULPADOS

Nossa Senhora, Esperança dos culpados: acho que seria uma invocação análoga à “Refugium peccatorum” da Ladainha Lauretana e que tem muito significado. Porque, de fato, para ter esperança em Nossa Senhora não precisa que a pessoa tenha feito alguma coisa de bom.

É um erro raciocinar da seguinte maneira: “eu tinha uma tal culpa, mas em mim havia tal coisa boa e tomando em consideração tal outra coisa boa, Nossa Senhora teve pena de mim e me atendeu”. Porque não é isso bem exatamente o que acontece.

Nossa Senhora é o refúgio dos culpados, a esperança dos culpados, de todos os culpados, por pior que seja, por mais miserável, ainda que nele nada haja que preste, Ela é a esperança dos culpados.

A principal razão pela qual Nossa Senhora nos socorre não é por causa de algo de bom que haja em nós, mas devido ao bem que há n’Ela. É por causa disso que a Mãe de Deus tem pena de nós e atende nossos pedidos. Porque Ela é boa e não porque encontrou em nós um conjunto de coisas boas, maiores ou menores.

Então, se antes de fazermos nossas orações, nos lembrássemos disso, encontraríamos muito mais alento ao rezar. Exatamente o que desanima muito quando se vai rezar é a idéia de que nossas orações não valem nada. A pessoa pensa: “afinal de contas, se eu deito um olhar para dentro de mim e vejo quem sou, eu desanimo completamente. Não adianta eu rezar...” Não é verdade! Se sou culpado, então o lugar próprio para mim é (colocar-me aos pés de) Nossa Senhora, Esperança dos culpados.

(Plinio Corrêa de Oliveira - Santo do Dia, 11 de setembro de 1969)

 

 NOSSA SENHORA DA ESPERANÇA DE PONTMAIN

 Nos tempos modernos a devoção à Nossa Senhora da Esperança foi revivida em Saint Brieuc, na Bretanha, espalhando-se excepcionalmente depois das aparições ocorridas em Pontmain, nos dias terríveis da invasão prussiana, quando o frio, a fome a guerra se uniram de uma vez para castigar o povo francês.

Paris estava sitiada e as tropas já batiam em retirada. Em 17 de janeiro de 1871, o bispo de Saint Brieuc, desesperado, fez um voto solene a Nossa Senhora da Esperança para que salvasse sua pátria. Mais ou menos na mesma hora, em Pontmain, próximo às linhas inimigas, o Sr. Barbedette, concluído seu trabalho no campo juntamente com seus dois filhos, saiu um pouco para espairecer e ver como estava o tempo lá fora. Surpreso, avistou sobre uma casa próxima, a poucos metros de distância, uma jovem senhora resplandecente de luz e de incomparável beleza. Trajava um vestido azul salpicado de brilhantes estrelas, usando sandálias azuis com fivelas douradas. Sobre a cabeça ostentava um véu preto, e por cima uma coroa de ouro mais alta na frente e diminuindo para trás. Um dos filhos, de nome Eugênio, contemplava extasiado a aparição, quando viu uma vizinha sair de sua casa. Chamou-a e mostrou a aparição, mas a mulher não a via. O irmão mais novo, porém, de nome José, também passou a ver tudo e exclamando: “Como é linda! Como é linda!”

A visão continuava, mas para os três somente. Não só a vizinha, mas a própria mãe das crianças, e até mesmo o vigário e uma professora chamados ao local, nada viam. Mas todos pressentiam a presença do sobrenatural e logo compareceu ao logo uma multidão de curiosos e devotos. Aos poucos a visão foi se transformando aos olhos das crianças. Surgiu em volta da Senhora uma fita azul com quatro velas, duas na altura dos ombros e duas dos joelhos. Em seguida outra fita comprida desenrolou-se sob os pés da Virgem e uma pena invisível escreveu os seguintes dizeres: “Mas, rezai, meus filhos, Deus vos atenderá dentro em breve. Meu filho se deixa enternecer”. Viram depois nas mãos de Maria Santíssima um crucifixo vermelho e uma estrela, que dando voltas em torno d’Ela acendeu as quatro velas, parando sobre sua cabeça. Finalmente, por voltas das 8h e 45m da noite um véu preto subiu pouco a pouco e escondeu a aparição.

Dez dias depois foi assinado a armistício e terminava a guerra. O bispo de Laval, após apurados exames, publicou a 2 de fevereiro do ano seguinte uma carta pastoral em que reconhecida como verdadeira a aparição e autorizava o culto à Virgem Maria sob a invocação de Nossa Senhora da Esperança de Pontmain. Festa litúrgica: 17 de janeiro

Nossa Senhora da Esperança da América

François Le Pelch, da Virgínia, EUA, foi a Lourdes e, no retorno, obteve a graça de ver a cura de seu pai que era tuberculoso. O próprio Le Pelcho havia obtido anteriormente uma cura milagrosa. "Eu não conseguia parar de chorar como andava a treinar para a pequena cidade de Lourdes, a alegria e a paz encheu meu ser." Em agradecimento, resolveu esculpir uma imagem de Nossa Senhora. Estava ele prestes a concluir sua escultura e não sabia que nome dar à Imagem. Rezando à Virgem Maria com tal fim, sua esposa teve a impressão de ouvir o nome de Nossa Senhora da Esperança da América. Ela tinha visto num livro a foto da imagem de Nossa Senhora de Pontmain, semelhante á escultura de 52 cm que ele estava a concluir. A 08 de dezembro de 1996, a imagem foi abençoada pelo Papa João Paulo II. Outras 100 imagens fizeram peregrinações pela França.

No Líbano, na localidade de Bechouat, há uma imagem de Nossa Senhora da Esperança que é cópia da de Pontmain. Estão ocorrendo milagres na localidade, não somente com católicos mas até com muçulmanos. Um deles ocorreu com Tony Sukkar, 37 anos, oriundo de Nova York. Sukkar estava paralítico e, em visita aBechouat, ficou completamente curado ao rezar perante a imagem de Nossa Senhora da Esperança que lá se venera. Um outro milagre foi constatado com uma criança de dez anos, Mohammed Al-Alwwad Naef Al-Hawadi, jordaniana de pais muçulmanos.

 

Orações a Nossa Senhora da Esperança

 

Ó Maria, minha Mãe, eu me ajoelho diante de você com o coração pesado.

O peso de meus pecados me oprime.

O conhecimento da minha fraqueza me desanima.

Estou atormentado por medos e tentações de toda espécie.

Mas eu sou tão apegado às coisas deste mundo que, ao invés de saudade para o Céu

Estou cheio de pavor com a idéia de morte.

Ó Mãe de misericórdia, tem piedade de mim na minha aflição.

Está todo-poderoso com seu Divino Filho.

Ele pode recusar qualquer pedido de seu Imaculado Coração.

Mostre-se uma verdadeira mãe para mim, sendo meu advogado perante o seu trono.

O Refúgio dos pecadores e esperança dos desesperançados, a quem devo recorrer se não você?

Alcançai-me, então, ó Mãe da Esperança, a graça da verdadeira tristeza para os meus pecados, o dom da renúncia perfeita para o Santo de Deus, dai-me a coragem de assumir minha cruz e seguir Jesus.

Ao Sagrado Coração de Jesus a graça especial que eu peço nesta novena.

(Faça o seu pedido.)

Mas acima de tudo orar I,

O querida Mãe, que através da sua poderosa intercessão mais meu coração pode ser preenchido com a Santa Esperança, para que, em hora mais escura da vida eu nunca pode deixar de confiar em Deus meu Salvador; mas andando no caminho de Seus mandamentos que eu possa merecer estar unidos com Ele, e com você nas alegrias eternas do céu. Amen.

 

Ó Maria, minha mãe, ajoelho-me diante de Vós, com o coração pesaroso. O fardo de meus pecados me oprime. O conhecimento da minha fraqueza me desencoraja. Sou perturbado por temores e tentações de toda espécie. Mas sou tão apegado às coisas deste mundo, que ao invés de ansiar pelo céu, fico cheio de angústia ao pensar na morte. Ó Mãe de misericórdia, tem piedade de mim em meu sofrimento! Sois todo-poderosa junto ao vosso Divino Filho. Não há pedido de vosso Imaculado Coração que Ele possa recusar. Mostra-vos Mãe verdadeira para comigo, intercedendo por mim diante de seu trono. Ó Refúgio dos pecadores, e Esperança dos desesperados a quem volver-me-ei senão a Vós? Obtende, pois para mim, Ó Mãe da Esperança, a graça de um verdadeiro arrependimento de meus pecados, o dom da perfeita resignação à Santa Vontade de Deus e a coragem para tomar minha cruz e seguir Jesus. Mas acima de tudo Vos peço, ó queridíssima Mãe; que por vossa poderosíssima intercessão, meu coração seja cheio de Santa esperança para que na hora mais negra da vida, eu nunca deixe de confiar em Deus, meu Salvador; mas andando no caminho de Seus mandamentos, possa merecer ser unido com Ele e convosco, nas eternas alegrias do Céu.

V. Maria, Nossa Esperança, tenha piedade de nó

R. Esperança dos desesperados, Rogai por nós.

 

 

 


quarta-feira, 20 de setembro de 2023

A BUSCA DA FELICIDADE, UM BEM SOCIAL?

 



O desejo ou a busca da felicidade é uma espécie de instinto colocado na alma do homem ao ser criado, a fim de que, através dele, aspire a felicidade eterna, a beatitude celeste, segundo declarou Santa Catarina de Gênova em seu tratado sobre o purgatório:
“Quando Deus cria uma alma, da parte de Deus ela sai pura, simples, isenta de toda mancha de pecado e dotada de um instinto que a impele para Deus, como seu centro e beatitude.  Mas o pecado original debilita muito este instinto, e ainda mais o pecado atual. Esse instinto é dependente do da sociabilidade, pois ninguém pode ser feliz sozinho.

 

Filosofias sobre a felicidade

Todo espírito pagão (ou o chamado “espírito do mundo”) está mais ou menos alicerçado em alguns princípios filosóficos, os quais podem ser resumidos nas escolas de pensamento da Grécia antiga ou da era moderna. O tema central de tais filosofias é sempre a felicidade terrena do homem. Eis os principais:

Estoicismo -  Escola filosófica criada por Zenão de Cítio (320 a 240 a.C.). Ensinava em Atenas no pórtico Pecila (“stoá poldle”, ou pórtico pintado, em grego), de onde originou o nome “estoicismo”. Por esta filosofia o homem deve buscar a felicidade terrena suprema (chamada “ataraxia”) no viver em harmonia com a natureza. O universo está impregnado de Deus e forma com ele um único ser (panteísmo).  A “virtude”  leva o homem a participar da vida divina, que segue uma inexorável evolução. Conforme esta marcha e o acontecer necessário das coisas, o homem deve aceitar, sem resistência, tudo o que vier a lhe ocorrer na vida. O lema é “seguir a natureza”. O verdadeiro “sábio” da filosofia estóica deve atingir a impassibilidade absoluta, suportando, impávido, toda adversidade. A paz, a completa beatitude, está na indiferença absoluta por todos os prazeres e por todas as dores. A moral estóica é o sistema ético principal do paganismo. Uma de suas doutrinas é a fraternidade universal. Atualmente, o budismo e a ioga seguem tais doutrinas de vida.

Epicurismo – Epicuro foi outro filósofo grego que viveu em Atenas por volta do ano 270 a. C. O epicurismo recusa qualquer crença ou preocupação no sobrenatural, elegendo como bem supremo o prazer, mas não como usufruto das sensações e sim na quietude (apatia) da mente. Santo Agostinho assim exprobra esta filosofia: “Epicuro teria recebido a palma se eu não acreditasse que, depois da morte, a alma vive e leva os méritos consigo, o que Epicuro negava. E me indagava: se fôssemos imortais e vivêssemos num perpétuo prazer do corpo, sem temor de perdê-lo, por que não seríamos felizes? Que coisa mais seria preciso procurar? Eu não estava percebendo que nisso consistia a minha miséria.  Imerso no vício e cego como estava, não conseguia pensar no esplendor da luz e da beleza, desejáveis por si mesmas, invisíveis aos olhos do corpo e só percebidas no íntimo da alma” [1] 

Hedonismo – Do grego “hedoné”, prazer, tem o prazer como móvel fundamental das ações humanas. O mais antigo e extremado hedonismo vem da escola Cirenaica, cujo chefe Aristipo ensinava ser o prazer sensível imediato a única norma de conduta para o homem.  Há um hedonismo moderno, defendido por David Hulme e John Stuart Mil, pelo qual está em primeiro lugar o prazer coletivo. O chamado “utilitarismo” é um ramo do hedonismo moderno, porque contempla uma ética coletiva e não individual, cujo lema é “mais felicidade para um maior número de pessoas”.  David Hulme foi um filósofo do século XVIII e sua principal obra foi um livro do qual quase ninguém tomou conhecimento em sua época, a não ser seus adeptos, “A Treatise of human nature”  (Tratado da natureza humana). Em 1861 escreveu “Utilitarism”, em que defende o princípio de que um ato é bom ou mau na medida em que favorece ou impede a felicidade.

Tribalismo indígena – Não é um sistema filosófico estruturado como escola, mas um modo de viver que envolve os costumes, hábitos e convivência comunitária própria dos índios.  Tal paganismo foi praticado por outros povos, mas em graus diversos. Trata-se da vivência do mais completo estoicismo, com mistos de epicurismo e hedonismo. Seus conceitos são definidos pela observação dos cronistas e antropólogos sobre a vida indígena dentro da tribo, embora os seus membros não necessariamente os conheçam como tais. Manifesta-se através de um pronunciado atavismo, apatia mental, desfrute dos mais baixos gozos sensitivos, encontrando muitas vezes como forma requintada de prazer a explosão de orgulho e o espírito de vingança.

O tribalismo moderno foi acrescido também do hedonismo ou utilitarismo, tal qual já descrevemos, na forma de espírito comunitário, onde todos devem desfrutar da felicidade coletiva e não individual. É esta a mentalidade própria também dos neo-missionários adeptos de tal tribalismo, a corrente estruturalista infiltrada na Igreja.

Vemos aí a união de dois paganismos: o da vida moderna, praticado pelo homem atual, principalmente nas grandes cidades, e o das tribos indígenas ainda remanescentes. Que diferença há entre a vida comunitária da tribo nômade e selvática e a da tribo urbana moderna? Ambos procuram os mais baixos gozos sensitivos, a “felicidade”  coletiva.  A diferença é que na vida urbana esta “felicidade” é buscada pelos instrumentos de satisfação oferecidos pelo progresso tecnológico, enquanto que na tribo selvática os instrumentos de tal satisfação são os que se acham esparsos na natureza rude e inculta.

Não é à toa que já começam a se denominar de “tribos” certos grupos de jovens que tumultuam a vida de certas cidades ou bairros mais populosos. Alguns até acrescentam ao de tribo o nome “urbano”, são as já famosas “tribos urbanas”. Possuem algumas características tribais, como enfeites, tatuagens, rituais estranhos, esoterismos, nudismo, etc.

 

O epicurismo indígena

Os humanistas da Renascença ressuscitaram dos escombros da História os pensamentos de vários filósofos da Grécia antiga, que a Idade Média já tinha suplantado pelas escolas católicas, principalmente pela Escolástica e o Tomismo. Voltou-se a falar de Platão, Sócrates, Diógenes, Aristóteles, Ovídio, etc. Até mesmo o obscuro Epicuro foi retirado das cinzas e da poeira do século III a.C. para atingir a culminância de certo intelectualismo ávido por “renascer” a filosofia pagã.  Por que? É que tais filósofos eram úteis para despertar as paixões humanas, principalmente o orgulho e a sensualidade, molas propulsoras do processo revolucionário. O epicurismo era uma dessas filosofias.

A vida do índio começou a ser vista, no Século dos Descobrimentos, como o modelo ideal do gozo de prazeres na terra. Enquanto que a vida do homem civilizado era apresentada como cheia de estorvos, ser índio era tido como exemplo de felicidade, tranquilidade, despreocupação, uma verdadeira vida idílica e pacífica. De outro lado, ser civilizado era tormentoso, havia a Igreja com seus princípios morais, seus dogmas, suas leis; alguns Estados ainda faziam cumprir certas leis que coibiam os desvios morais, e isto fazia com que a vida do homem civilizado se tornasse inquieta e cheia de ansiedades. Desta forma, o melhor era procurar copiar, ou pelo menos invejar o Índio em sua vida paradisíaca.

O epicurismo indígena não é igual ao do homem civilizado, pois enquanto este procura gozar os prazeres utilizando-se do progresso, aquele desfruta dos mesmos prazeres em sua forma mais rude e selvagem.  Na barbárie exige-se apenas que o gozo seja desfrutado “ao natural”: ouve-se música e nele se deleita por “enlevos” ou “êxtases” causados com auxílio de drogas alucinógenas e batidas cadenciadas de paus e instrumentos rudimentares; alimenta-se apenas para empanturrar a barriga, sem a mínima preocupação com condimentos, sabores, qualidade dos alimentos, etc.

 

A felicidade através dos prazeres  

O homem foi criado por Deus com alguns instintos muito fortes, dentre os quais destacam-se: o da preservação (luta pela sobrevivência), o da sociabilidade (de onde vem o desejo de constituir família e viver em sociedade), o desejo de felicidade (que o leva a procura de prazeres, mas principalmente a busca da beatitude, a felicidade eterna) e, em último lugar, o da propagação da espécie, que é o instinto sexual. Muitos psicólogos, filósofos, e pensadores do mundo moderno afirmam (baseados nas falsas elucubrações freudianas) que o instinto mais forte do homem é o sexual, e que o mesmo o leva à procura da felicidade. Pelo contrário, a felicidade não depende do instinto sexual, mas sim da sociabilidade e do cumprimento do fim último do homem. Os moralistas católicos, pelo contrário, afirmam que aqueles que procuram a felicidade na satisfação do instinto sexual se frustram e não são felizes.  Após o gozo ficam frustrados, infelizes. Já aqueles que procuram, antes de tudo, a felicidade social, com base na ética, na moral, na lei, principalmente na Lei de Deus, sofrem, de início,  para consegui-lo, mas sentem-se recompensados e felizes com os resultados auferidos.  De outro modo, a felicidade não é completa neste mundo.

 

Onde está a verdadeira felicidade?

O tema da felicidade nos dias de hoje parece preocupar não tanto os homens de filosofia, mas certos institutos ou escolas de estudos sociais ou de psicologia. Nesta perspectiva moderna, que povo seria o mais feliz da terra? Segundo uma pesquisa (e como se fazem pesquisas hoje em dia!) feita pelo Instituto de Investigação Social da Universidade de Michigan, EUA, a Dinamarca seria o país mais feliz da terra, enquanto o mais infeliz seria o Zimbabue. Será que se esqueceram de investigar o nosso querido Brasil na pesquisa? De um total de 98 países estudados, chegaram a uma conclusão de que pelo menos 44 (quase a metade), registraram aumento da felicidade no período de 1981 a 2007. E o que teria causado um aumento tão substancial da felicidade no mundo? Ora, não poderia ser outra coisa: a democracia, a igualdade social e a paz (quer dizer, a paz dos pampas...). Como é que aquele instituto chegou a uma conclusão tão exata sobre a felicidade dos povos, algo difícil de se constatar até mesmo a nível individual? Através de uma simples pergunta, feita desta forma: "Considerando tudo em geral, você diria que é muito feliz, bastante feliz, não muito feliz ou nada feliz em absoluto?". Esta mesma pergunta poderia obter a mesma resposta num determinado indivíduo de um país e sob regime democrático e outro de um país de regime ditatorial; onde houvesse igualdade social ou não a existisse; ou houvesse certa paz ou onde houvesse guerras constantes. Por que? Porque sendo algo subjetivo, o fato de ser feliz não dependeria nem do regime político, nem da condição social ou de certa tranquilidade da ordem social. Dependeria da filosofia de vida da pessoa que respondeu ao questionário (de uma única pergunta, por sinal). Assim, os dinamarqueses foram mais espertos em responder a pergunta do que os zimbabuanos. Ou então, sendo eles mais cultos e ricos, a felicidade para eles consistiria em gozar os prazeres da vida, caindo-lhes bem a propósito a pergunta. Se para os zimbabuanos a felicidade consiste também em gozar os prazeres da vida, eles realmente não são os mais infelizes do mundo...

 

A Civilização Cristã trouxe certa felicidade aos povos?

Segundo um grande doutor em Teologia, Mons. Henri Delassus, os frutos da boa regência, na Civilização Cristã, se fizeram sentir, inclusive, trazendo uma certa felicidade terrena aos povos:

“Do século I ao século XIII, os povos tornaram-se cada vez mais atentos a essa pregação, e o número dos que dela fizeram luz e regra de vida foi cada vez maior. Sem dúvida, havia fraquezas, fraquezas das nações e fraquezas das almas.

“Mas a nova concepção de vida permanecia lei para todos, lei que os desvios não faziam perder de vista e à qual todos sabiam, todos sentiam que era preciso retornar uma vez que se tivessem afastado. Nosso Senhor Jesus Cristo, com Seu Novo Testamento, era o doutor escutado, o guia seguido, o rei obedecido.[2] Sua realeza era a tal ponto reconhecida pelos príncipes e pelos povos, que eles a proclamavam em suas moedas. Em todas estava gravada a cruz, o signo augusto da ideia que o cristianismo tinha introduzido no mundo, que era o princípio da nova civilização, da civilização cristã, que devia regê-lo, o espírito de sacrifício oposto à ideia pagã, ao espírito de gozo que tinha construído a civilização antiga, a civilização pagã.

“À medida que o espírito cristão penetrava as almas e os povos, almas e povos cresciam na luz e no bem, se elevavam pelo só fato de verem a felicidade no alto e de a carregarem consigo. Os corações tornavam-se mais puros, os espíritos mais inteligentes. Os inteligentes e os puros introduziam na sociedade uma ordem mais harmoniosa, aquela que Bossuet nos descreveu no sermão sobre a eminente dignidade dos pobres. A ordem mais perfeita tornava a paz mais geral e mais profunda; a paz e a ordem engendravam a prosperidade, e todas essas coisas davam ensejo às artes e às ciências, esses reflexos da luz e da beleza dos céus. De sorte que, como escreveu Montesquieu, “A religião cristã, que parece não ter outro objetivo além da felicidade da outra vida, ainda constrói nossa felicidade nesta”.[3] É, ademais, o que São Paulo tinha anunciado, quando disse: “Pietas ad omniautilis  est, promissiones habens vitae quae nunc est et futurae” (A piedade é útil para tudo, possuindo as promessas da vida presente e aquelas da vida futura)(I Tim 4, 8), Não havia o próprio Nosso Senhor Jesus Cristo dito: “Procurai primeiro o reino de Deus e sua justiça, que o resto vos será dado por acréscimo?” (Mt 6, 33) Não há aí uma promessa de ordem sobrenatural, mas o anúncio das consequências que deviam sair logicamente da nova orientação dada ao gênero humano”[4]

 

A felicidade social segundo Santo Agostinho

Em sua famosa obra “Cidade de Deus”, Santo Agostinho comenta bastante sobre a “felicidade social”, um tema muito debatido entre os romanos da época. O argumento principal da “Cidade de Deus” é que a civilização cristão poderá trazer a verdadeira felicidade entre os povos, pois somente assim serão cumpridos socialmente os mandamentos divinos.[5]

No relato de Santo Agostinho há muita semelhança do que se gozava no império romano com os dias atuais. Vejamos algumas semelhanças: “que não se lhes mande dureza, nem se lhes proíba coisa torpe; que os reis não atentem a se são bons e virtuosos seus vassalos, mas se obedecem suas ordens”;

Não há um só país do mundo de hoje em que os governantes se preocupem que seus cidadãos sejam bons ou ruins, mas apenas que cumpram suas ordens, suas leis. Por isso, ninguém suporta que o governo crie leis que lhes exijam sacrifícios, como às vezes ocorre com os protestos contra as duras leis de contenção de despesas dos governos em crise: “que o povo aplauda , não aos que o persuadam o que lhe importa, mas aos que lhe proporcionam gostos e deleites”;

A tendência de todo governante do mundo moderno é alcançar os melhores níveis possíveis de popularidade e, para tanto, existem diversos institutos de pesquisas que medem constantemente o grau de aceitação de seu governo entre o povo. Mas, para conseguir esta sonhada popularidade nenhum deles se arrisca a editar leis que causem sofrimento á população, mesmo que possa ser benéfica ao bem comum. Como diz-se por aí: pão e circo alegra o povo. Basta dizer que é próprio das constituições de quase todos os países atuais falar quase somente dos “direitos” de seus concidadãos, mas nem sempre dão ênfase aos “deveres”, que deveriam ser correlatos e até mais importantes do que os direitos: “que também haja abundância de mulheres públicas, para todos os que quiserem participar delas, ou particularmente para os que não possam tê-las em sua casa”;

Nem é necessário se deter muito para se constatar a avassaladora onda de promiscuidade sexual que toma conta do mundo moderno: tudo é permitido nessa matéria, sendo a perversão sexual o crime mais aviltante e cometido com a conivência da lei, do Estado e de toda a sociedade. Santo Agostinho falou de um mal de seu tempo, a prostituição pública, mas, hoje, há pior, que é a prostituição de crianças: “que se edifiquem grandes, magníficas e suntuosas casas onde se façam saraus e festejos, e onde, segundo o parecer de cada um, de dia e de noite, jogue, beba, se divirta, gaste e triunfe; que continuem sem interrupção os bailes, fervam o teatro com os aplausos e vozes de alegria; que se comovam com a apresentação de atos desonestos e todo gênero de deleites tão abomináveis e torpes, e que seja tido por inimigo público o que não gostar desta felicidade”;

Parece que o texto acima foi feito por autoridade religiosa de nosso tempo, censurando, por exemplo, as milhares de casas de espetáculos espalhadas pelo mundo com o único fim de gozos e festas. E, em grande parte, compostas de espetáculos torpes, onde campeia a promiscuidade sexual e moral. Sem falar dos estádios e de outros lugares públicos dedicados exclusivamente às diversões, cujos gastos não são vistos por ninguém como supérfluos; ao contrário de alguns templos religiosos, a maioria em ruínas e ao abandono: “que qualquer um que tentar alterá-la ou tirá-la possam todos, livremente, expulsá-lo para onde não o ouçam, o desterrem para onde não seja visto e o tirem do meio dos viventes; que sejam tidos por verdadeiros deuses aqueles que promoveram esta felicidade e, alcançada, souberam criar meios para conservá-la; que os reverenciem e honrem do modo que lhes seja mais agradável; que peçam os jogos e festas que sejam de sua vontade e possam alcançar de seus adoradores, contanto que procurem com todo seu esforço, que esta felicidade momentânea esteja segura das invasões do inimigo, dos funestos efeitos do contágio e de qualquer outra calamidade”;

É assim o mundo moderno: as personalidades mais honradas e festejadas são aquelas que trouxeram algo de proveito para o gozo da vida, para os deleites e sensações agradáveis. Todo e qualquer técnico, mesmo sem qualificação moral nenhuma, mas que produziu algum invento que tornou a vida mais gozosa, mais prazerosa e fácil, torna-se um cara endeusado e badalado pela poderosa mídia. Em geral são mostrados como modelos de perfeição, como exemplos de homens inteligentes, espertos e audazes, embora seus inventos nada tenham feito senão tornar a vida gostosa e mais fácil.

 

Sardanápalo, modelo da “felicidade” pagã deste mundo

No final, Santo Agostinho coloca como exemplo disso tudo a vida de um personagem da Antiguidade, Sardanápalo, o qual suicidou-se com toda sua família e pediu que junto de seus corpos fossem enterrados todos os objetos com que gozavam os prazeres da vida, não permitindo que outros também os desfrutassem..

O relato do fim de vida deste triste imperador da antiguidade pagã (ocorrida cerca de 612-609 a.C.) não é muito diferente de outros reis e patriarcas que viviam segundo os princípios idolátricos e filosóficos daqueles tempos. Vejam como a Wikipédia narra tal vida: “Sardanápalo ultrapassou todos os seu antecessores em ociosidade e luxúria, sendo essa toda a sua vida. Vestia roupa feminina e usava maquilagem. Tinha muitas concubinas, não só mulheres mas também homens. Escreveu o próprio epitáfio, onde dizia que o prazer físico é o único propósito na vida. Uma aliança de medos, persas e babilônios desafiou os assírios. Sardanápalo envolveu-se pessoalmente nos combates e repeliu várias vezes os rebeldes, mas não conseguiu derrotá-los. Pensando que o tinha conseguido voltou ao seu estilo de vida decadente, ordenando sacrifícios e celebrações. Entretanto os rebeldes receberam reforços e suas tropas foram surpreendidas quando festejavam e foram derrotadas. Voltou ele, então, para Nínive, ao mesmo tempo que colocou no comando do seu exército o seu cunhado, rapidamente derrotado e morto. Após ter posto a sua família em segurança, preparou-se para resistir em Nínive. Conseguiu aguentar um longo cerco, mas chuvas intensas provocaram cheias no Tigre, que levaram à queda de uma das muralhas de defesa. Para evitar cair nas mãos dos seus inimigos, Sardanápalo mandou erigir uma enorme pira funerária para si próprio, onde empilhou "todo o seu ouro, prata e trajes reais", após o que encerrou todos os seus eunucos e concubinas dentro da pira, à qual lançou fogo e onde morreu com eles.

Mas, pensando bem, será que a sociedade moderna desfruta realmente desta felicidade que alardeiam aos quatro ventos? Ou será que revivem em suas vidas a de novos Sardanápalos, prontos a suicidar-se a qualquer momento como ocorre com muitos? Lembremo-nos de que o demônio nunca dá o que promete e que os gozos desta vida servem apenas para levar as almas para o inferno, onde não há alegrias nem prazeres mas somente sofrimentos..


[1] “Confissões”, Ed. Paulinas, pág. 155.

[2] Era, pois, o Regente de toda a sociedade.

[3]Apud “Esprit des Lois”, livro XXIV, cap. III

[4]“La Conjuration Antichretienne”, Mons. Henri Delassus, Desclée De Brouwer et Cie, Tomo I, págs. 14/16

[5] Cidade de Deus – Capítulo XX do livro Primeiro.