domingo, 30 de dezembro de 2018

PREGANDO AOS DOUTORES DA LEI, JESUS INICIA SEU APOSTOLADO COM AS ELITES


 

A narração do episódio em que Jesus foi encontrado pregando entre os doutores da lei, contando apenas com 12 anos de idade, demonstra a preferência que Deus dá às elites para fazer um eficiente apostolado de conquista dos corações.
          Como eram, ou deveriam ser, os ensinamentos dos rabinos?    “Sua função, - comenta Thomas Walsh - sob a direção dos Sumos Sacerdotes, na teocracia judaica, era explicar e conservar vivo e puro o conhecimento e amor do Deus único e verdadeiro. E para tornar melhor este serviço inestimável a Israel e ao mundo, os rabinos haviam estabelecido por toda a Palestina, quer nas sinagogas, quer, se fosse preciso, ao ar livre, notável sistema de livres escolas públicas, onde todas as crianças de seis ou mais anos eram obrigadas a estudar. Era ilegal, de fato, para uma família viver onde não houvesse escola. Ensinavam os rabinos que tal lugar merecia ser destruído ou excomungado...”  (O Apóstolo São Pedro” – Ed. Melhoramentos - pág. 19)

          Pelo que diz William Thomas Walsh, seria natural que o próprio Nosso Senhor tivesse freqüentado tais escolas, pois, apesar de ser Deus, Ele quis se sujeitar às leis da natureza humana em tudo. Segundo São Lucas, “o Menino crescia e se fortificava cheio de sabedoria, e a graça de Deus era com ele” (Lc 2, 40). Podemos até imaginar que tenha sido apresentado como Menino prodígio aos doutores de Jerusalém por seu mestre de Nazaré, ocasionando o fato extraordinário de ser encontrado pregando entre os doutores da lei. Ou então o que diz a vidente Beata Anna Catharina Emmerich em suas visões:

          “Nosso Senhor se havia dirigido, com alguns rapazes, a duas escolas da cidade; no primeiro dia, a uma; no segundo, a outra. No terceiro dia, fora de manhã a uma terceira escola, e de tarde ao Templo, onde o acharam os pais. Jesus pôs os doutores e rabinos de todas as escolas em tal estado de admiração e embaraço, pelas suas perguntas e respostas, que resolveram humilhar o Menino, por intermédio dos rabinos mais doutos, na tarde do terceiro dia, em auditório público, interrogando-o sobre diversas matérias. Vi Jesus sentado numa cadeira  grande, rodeado de numerosos judeus velhos, vestidos como sacerdotes. Escutavam atentamente e pareciam estarem furiosos. Como o Senhor houvesse alegado, nas escolas, muitos exemplos da natureza, das artes e ciências, para demonstrar as suas respostas, reuniram-se conhecedores de todas essas matérias”. ( Vida, Paixão e Glorificação do Cordeiro de Deus” – Anna Catharina Emmerich – Editora MIR – pág. 57). 
           Ao final, narra a Beata, os doutores e sacerdotes ficaram furiosos porque não conseguiam rebater os argumentos do Menino Jesus.
É claro que naquela pregação Nosso Senhor não se apresentara como o Messias, pois não havia chegado ainda a hora de sua atuação pública: Ele apenas indicava para aqueles doutores, dentre os quais provavelmente encontrava-se Hilel, Shammai ou até mesmo os seus futuros verdugos Anás e Caifás, qual a verdadeira interpretação da Lei e provavelmente quais as principais características do Messias, diferente daquilo que eles criam. Causou entre os doutores uma sensação de maravilhamento, mas ainda não de fascínio, pois São Lucas diz que “todos os que ouviam, estavam maravilhados de sua sabedoria e das suas respostas”, mas não consta que tenha conseguido algum discípulo entre eles.

          Enquanto os sacerdotes tinham funções rituais, os escribas se ocupavam com o estudo das escrituras e da parte doutrinária. No tempo de Nosso Senhor havia duas escolas de escribas, a do liberal Hillel e a de um radical chamado Shammai, ambos oriundos da Babilônia. São Nicodemos e Gamaliel eram também escribas, mas certamente de pouca importância entre eles, pelo contrário teriam sido assassinados por discordarem da corrente babilônica..

          Os judeus atuais (conforme Frank Moore Cross ) admiram Hillel (que veio também da Babilônia no tempo de Herodes, “o grande”) como a “mais criativa inteligência de seu tempo”. “Foi um gigante que deixou marcas indiscutíveis no farisaísmo e por muitas gerações seus descendentes diretos foram os principais líderes da comunidade judaica normativa”.

          Segundo alguns autores, São Gamaliel era neto de Hilel e teria sido mestre de São Paulo, sendo considerado um dos 7 grandes rabinos de Israel. Conforme uma tradição tornou-se cristão, juntamente com outros judeus, e defendeu os primeiros apóstolos perante o Sinédrio (At 5,34 e 6,7).

Hilel fez escola. Um seu discípulo, Gamaliel II, presidiu uma reunião de escribas, já na diáspora, no ano 90 de nossa Era, ocasião em que foi ressuscitada a instituição do Sinédrio, evidentemente que inteiramente adaptado ao novo judaísmo. Logo depois surgiu o judaísmo moderno, que se originou no judaísmo rabínico, o sistema religioso dos rabinos do Mishná (compilado por volta do século II) e do Talmude (compilado entre os séculos V e VI).


sábado, 29 de dezembro de 2018

CORAÇÃO DE MARIA, NOSSA ESPERANÇA!





(Comentários do Dr. Plínio Corrêa de Oliveira sobre a Santíssima Virgem Maria)

“Coração de Maria, minha Esperança!” era o lema do célebre João Sobieski, rei da Polônia, que nos transes difíceis de sua vida e do seu reinado, ia haurir no Coração Imaculado de Maria alento e valor para as dificuldades. Com este grito de guerra, “Cor Mariae, spes mea”, a vibrar-lhe na alma e a inebriar lhe o coração, se lançou ele afoito contra os turcos em 1683, e pouco depois libertava heroicamente a cidade de Viena do apertado cerco muçulmano.
“Coração de Maria, nossa Esperança!” é o grito de guerra com que dum recanto ao outro da terra temos que convocar todas as almas de boa vontade para, numa cruzada invencível, sob a égide da Rainha dos Céus, marcharmos à rude tarefa de libertar enfim a pobre humanidade dos terríveis cercos de ferro com que a perversidade e a insânia tentam aniquilá-la. É pelo Coração de Maria que faremos triunfar o Coração de Jesus!
Há quarenta anos apontava Leão XIII para o Coração Santíssimo de Jesus como o grande sinal no firmamento a prometer-nos vitória: In hoc signo vinces! (com este sinal vencerás) E com ele nos mandava armar, como outrora os soldados de Constantino, com o sinal da Cruz. E muitos dos cristãos obedeceram e o mundo foi consagrado oficialmente pelo Papa ao Sagrado Coração do Salvador.
Por isso podia na sua primeira encíclica escrever Pio XII: “Da difusão e aprofundamento do culto ao divino Coração do Redentor, que encontrou o seu coroamento, não só na consagração da humanidade, ao declinar do último século, mas também na instituição da festa da Realeza de Cristo pelo nosso imediato Predecessor, de feliz memória, resultaram indizíveis bens para inúmeras almas; foi um caudal impetuoso que alegra a cidade de Deus: fluminis impetus laetificat civitatem Dei” (Salm. XLV, 5).
Mas havemos de reconhecer que os triunfos do Coração de Jesus ainda não correspondem plenamente nesta época às sorridentes esperanças de Leão XIII ao consagrar-lhe o universo. “Que época mais do que a nossa – diz ainda Pio XII – foi atormentada de vazio espiritual e profunda indigência interior a despeito de todos os progressos técnicos e puramente civis?... Pode conceber-se dever maior e mais urgente do que evangelizar as insondáveis riquezas de Cristo (Ef. III, 8) aos homens do nosso tempo? E pode haver coisa mais nobre do que desfraldar o estandarte do Rei – Vexilia Regis – diante dos que tem seguido e seguem ainda bandeiras falazes, e procurar reconduzir para o pendão vitorioso da Cruz os que o abandonaram?”
Ora, se urge anunciar essas riquezas insondáveis de Cristo aos homens, o caminho mais rápido e obrigatório é Maria – per Maria ad Jesum. Tem sido sempre assim desde o começo da Igreja. É por Maria que nos vem Jesus.
E o impulso cristão – que irrompe afinal das almas sob a ação do Espírito Santo, como num das suas encíclicas sobre o Rosário o notou Leão XIII – o impulso cristão vai mais longe afirmando cada vez mais clara e afoitamente, sobretudo de há um século a esta parte, que é pelo Coração de Maria que nos há de vir o Coração de Jesus; é pelo reinado do Coração da Mãe que há de vir o reinado do Coração do Filho.
Para o fazer reinar é mister amá-Lo – é o seu triunfo nos corações e nas vontades. Para o amar é urgente primeiro conhece-Lo – é o seu reinado nas inteligências.
Contribuam estas linhas para levar às almas essa luz e esse calor.
Bastante temos já escrito no Mensageiro de Maria e alguma coisa tem lido os nossos leitores sobre Nossa Senhora.
Talvez, porém, não nos situássemos nunca no verdadeiro ponto de vista e na verdadeira luz em que melhor se nos revela toda a excelência, poder e bondade de Maria.
Omnis gloria Filiae Regis ab intus (Salm. 44, 15): toda a glória da Filha do Rei está no seu interior. Assim como não se conhece deveras a Cristo enquanto não se conhece Seu Coração – o Coração de Jesus é o melhor ponto de vista do Salvador, é a chave do enigma de todas as Suas misericórdias, o abismo inesgotável de todas as suas invenções de amor... – assim também Maria Santíssima só será conhecida e amada e reinará plenamente nas almas, quando intimamente for conhecido o Seu Coração Imaculado. É também ele o melhor ponto de vista de Maria. À luz do Seu Coração ilumina-se das mais suaves e deslumbrantes tonalidades a sua virgindade sem par, a sua inexcedível dignidade de Mãe de Deus, de Esposa do Espírito Santo e de Filha Predileta do Altíssimo, a Sua terníssima solicitude de Mãe dos homens e de Rainha dos Céus e da Terra.
O seu Coração é o ímã misterioso que nos arrebata os corações, o que levou São Bernardo a denominá-la a arrebatadora dos corações: raptrix cordium. Mas se é pelo Coração que Ela nos conquista a nós, é também ele a arma com que conquistamos a Ela: tocar-lhe no Coração é vencê-la. E – mistério profundo! – não é outro o cetro com que Maria impera junto do Altíssimo. Mostrar ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo o seu Coração de Filha, Esposa e Mãe é conquistar a Deus; é inclinar a seu favor toda a Santíssima Trindade.
Daqui vem que tudo o que se afirma de Maria Santíssima na sua missão e misericórdia a respeito dos indivíduos, da humanidade e da Igreja em especial, se haja de afirmar com mais forte razão do seu Coração Imaculado.
Portanto não conhece Maria quem não conhece o seu Coração; mas quem conhecer a esse Coração possui o melhor conhecimento de Maria.
Não ama a Maria quem não ama o seu Coração; mas amar o Coração de Maria é amá-lo pelo melhor modo como Ela deseja ser amada. É no seu Coração que está a razão de todas as suas bondades para com os homens; é essa a força que nos atrai, quando a Ela acudimos e o bálsamo que nos conforta quando A imploramos, na certeza de sermos socorridos.
É porque no peito de Maria palpitava um Coração tão semelhante ao Seu, que o Coração de Jesus à hora da morte no Calvário no-La deu por Mãe: ecce mater tua e a Ela nos entregou por filhos: ecce filius tuus.
Se de São Paulo se afirmou que tinha um coração parecido ao de Cristo: cor Pauli, Cor Christi, muito mais e melhor que ninguém tem direito a este encômio supremo Maria Santíssima: Cor Mariae, Cor Jesu.
É porque em seu peito continua lá no Céu a pulsar o mesmo Coração dulcíssimo e amantíssimo que a Santa Igreja, nas horas aflitivas, nos manda acudir a Maria, seguros de obtermos sempre pronto socorro.
“Quem considerar atentamente os anais da Igreja Católica – escrevia o saudoso Pontífice Pio XI – verá facilmente unido a todos os fastos do nome cristão, o valioso patrocínio da Virgem Mãe de Deus. E na verdade, quando os erros, grassando por toda a parte, procuravam dilacerar a túnica inconsútil da Igreja e subverter o mundo católico, Àquela que “sozinha destruiu todas as heresias do mundo inteiro” (do Breviário Romano) acudiram nossos pais e se dirigiram com o coração cheio de confiança; e a vitória por Ela obtida trouxe-lhes tempos mais felizes”.
Quando a impiedade muçulmana, confiada em potentes armadas e grandes exércitos, ameaçava arruinar e escravizar os povos da Europa, foi implorada instantissimamente, por conselho do Sumo Pontífice, a proteção da Mãe Celeste; deste modo foram destruídos os inimigos e submergidas as suas naus (referência à batalha de Lepanto, em outubro de 1571, n.d.c.).
E tanto nas calamidades públicas, como nas necessidades particulares, tem acudido à Maria, suplicantes, os fiéis de todos os tempos, para que Ela venha benignissimamente em seu socorro, obtendo-lhes o alívio e remédio dos males do corpo e da alma. E jamais seu poderosíssimo socorro foi esperado em vão por aqueles que o imploram em prece confiante e piedosa.
Com toda a razão, portanto, nas horas difíceis em que hoje vivemos, todas as nossas esperanças de salvação, de triunfos e de paz estão postas nesta Arca de salvação: no Coração de Maria.
“A mim, o mínimo dos santos, foi-me dada esta graça de evangelizar às gentes as investigáveis riquezas de Cristo”, dizia São Paulo.
Uma das mais insondáveis riquezas que nos legou Cristo foi o Coração de Sua Mãe. E se a nós nos fora dado carisma parecido ao do Apóstolo de evangelizarmos aos nossos leitores toda a profundeza, longitude e latitude, todos os abismos preciosos de amor encerrados no Coração de Maria!
Um erudito e piedoso autor dizia, ao escrever sobre o Coração da Mãe de Deus, que ambicionava para si poder, como outrora São João Evangelista na última Ceia sobre o peito do Senhor reclinar-se também sobre o peito de Maria, para depois de escutar as palpitações de seu Coração, conseguir mais facilmente dizer desses segredos de amor.
As nossas ambições vão mais longe neste instante: quiséramos não somente reclinar a cabeça sobre o Coração Imaculado de nossa Mãe do Céu, mas poder estabelecer lá dentro a nossa morada para que, iluminados nessa luz, virginizados nessa pureza e inflamados nas chamas dessa caridade, tudo o que disséssemos fossem palavras de luz e fogo a brotar da abundância desse Coração inefável.
Que Ela nos acolha nesse recôndito de amor, nos faça aí como que desaparecer n’Ela, para que afinal seja Maria quem diz de Si mesma, pelo débil instrumento que todo se lhe consagra, as maravilhas do seu Coração.

 Que seja aí também que os nossos leitores coloquem a sua mansão, para nessa escola e a essa luz melhor compreenderem a obra prima do Senhor.
(Legionário, 28 de março de 1943, N. 555)




terça-feira, 18 de dezembro de 2018

UM MILAGRE DO MENINO JESUS NA POLÔNIA COMUNISTA




No Natal de 1956, na Hungria, professora ateia desafia alunas cristãs
O maravilhoso milagre que vamos narrar ocorreu a muitos anos, por ocasião do Natal de 1956, na Hungria já subjugada pela Rússia comunista. O prodígio, inteiramente verídico e largamente conhecido, chegou ao Ocidente através do relato do Pe. Norberto que exercia o sacerdócio numa paróquia de Budapeste, antes de escapar para o Ocidente, fugindo da perseguição que os marxistas moviam aos católicos em seu país.
Na escola dessa paróquia, ensinava a professora Gertrudes, ateia militante. Todas as suas lições giravam em torno da impiedade e da negação de Deus. Tudo lhe servia para denegrir e ridicularizar a Igreja Católica. O seu programa de ensino era simples: arrancar a Fé da alma das crianças e formar legiões de pequeninos “sem Deus”.
Suas alunas mesmo intimidadas, não se deixavam convencer com as troças da mestra. Coisa curiosa: Gertrudes parecia adivinhar quais as que comungavam e era as que mais perseguia.
Um dia, uma menina de dez anos, chamada Ângela, procurou o Pe. Norberto e pediu-lhe licença para comungar diariamente. Muito inteligente, muito bem dotada, era a melhor aluna da classe e da escola. O sacerdote mostrou os riscos a que se expunha, mas ela insistiu: “Senhor padre, a mestra não conseguirá apanhar-me em falta, asseguro-lhe, e trabalharei melhor. Não me recuse o que lhe peço. Nos dias em que comungo sinto-me mais forte. O senhor padre disse-me que devo dar bons exemplos. Para os dar preciso sentir-me forte.” O padre acedeu.
Desde esse dia, Ângela viveu um verdadeiro inferno. Apesar de saber sempre as lições, a mestra implicava continuamente com ela. A criança resistia, mas ficava nitidamente abatida. A partir de novembro, as aulas passaram a ser autênticos duelos entre a professora e a pequena discípula. Aparentemente, a mestra triunfava e dizia sempre a última palavra. Todavia, a sua irritação era tão grande que até o silêncio de Ângela a punha fora de si.
Aterradas, as outras crianças pediam socorro ao padre Norberto, que nada podia fazer. “Graças a Deus – lembrava ele – Ângela continuava firme na sua Fé e a nós restava rezar com absoluta confiança na misericórdia divina”.
Pouco antes do dia de Natal, a 17 de dezembro, a professora inventou um estratagema cruel que devia, na sua opinião, dar um golpe mortal naquilo que ela designava por “superstições ancestrais” das alunas. E preparou a cena com sádico entusiasmo. Naturalmente, a pobre Ângela foi a vítima …
Com voz doce, a professora fez um longo interrogatório para que ela e a classe se certificassem de que pessoas vivas atendem quando são chamadas. As mortas, ou as que só existem nas histórias, não podem obviamente aparecer.
Mandou então Ângela sair da sala de aula e ficar do lado de fora. Ato contínuo, fez as alunas chamarem-na em coro. Ângela entrou muito intrigada, pressentindo uma cilada. “Afinal – sentenciou a mestra – estamos todos de acordo. Quando chamamos aqueles que vivem, que existem, eles vêm. Quando chamamos os que não existem, eles não podem vir … Ângela, que está aqui, viva, em carne e osso, ouviu-nos chamando-a e veio. Suponhamos que chamássemos o Menino Jesus. Parece que há entre vós quem acredite n’Ele…” – acrescentou maliciosamente. Houve um instante de silêncio, de medo, talvez, mas as meninas, embora timidamente responderam: “Acreditamos”.
“E tu Ângela, também crês que o Menino Jesus te ouve quando o chamas?” – perguntou-lhe a perversa Gertrudes. Apesar de ver ali a cilada que havia pressentido, a criança respondeu com ardente fervor: “Sim, creio que Ele me ouve!”
“Muito bem”, replicou a mestra. “Façamos a experiência: as meninas viram que Ângela, quando a chamávamos, veio imediatamente. Se o Menino Jesus existe, Ele vos ouvirá chamando-O. Gritem todas ao mesmo tempo e com força: Vem Menino Jesus! Vá! Um, dois, três! Chamem!”
Intimidadas, as crianças permaneceram caladas. Os argumentos da mestra tinham-nas impressionado. Gertrudes soltou uma gargalhada prolongada, diabólica …
De repente, deu-se o imprevisto. Levantando-se, no meio da classe, cheia de esperança e confiança, Ângela olhou em volta para todas as suas colegas e gritou: “Ouçam-me, vamos chamá-Lo! Gritemos todas: vem, Menino Jesus!”
Num instante, todas se puseram de pé e fizeram ouvir suas vozes num uníssono vibrante. A professora não esperava esta súbita reação. Um impulso sobrenatural se manifestava naquela que se revelava a mais ardorosa e esperava o milagre.
Quando o clamor das alunas estava no auge, a porta abriu-se sem ruído, entrando por ela uma claridade intensíssima, que crescia, crescia, como a chama de um enorme fogo. No meio deste clarão, um globo cheio de luz abriu-se mostrando um Menino lindíssimo e risonho, todo vestido de luz. O Menino sorria, não falava, e todas as alunas sorriam também, tranquilas e contentes. Depois o globo fechou-se devagar e desapareceu suavemente. A porta fechou-se sem que ninguém a tocasse. As crianças olhavam ainda para lá quando um grito agudo se fez ouvir. Aterrada, olhos esgazeados, braços esticados, a professora gritava com louca: “Ele veio! Ele apareceu!” E fugiu completamente desnorteada, batendo com a porta.
O padre Norberto disse que interrogou as crianças uma por uma. E atestou, sob juramento, que não encontrou nas suas palavras a menor contradição.
Quanto à professora Gertrudes, teve o fim que merecia: enlouquecida, teve de ser internada numa casa de saúde. E ali, sob o impacto de tremendo abalo que sofreu, não cessava de repetir: “Ele veio! Ele Veio!”


quarta-feira, 5 de dezembro de 2018

A IMACULADA CONCEIÇÃO




(Comentários de Dr. Plínio Corrêa de Oliveira sobre a Santíssima Virgem Maria)


Na bula Ineffabilis Deus, com a qual Pio IX definiu o dogma da Imaculada Conceição, encontra-se este trecho:
“A doutrina que sustenta que a Beatíssima Virgem Maria, no primeiro instante de sua conceição, por singular graça e privilégio de Deus onipotente, em vista dos méritos de Jesus Cristo, Salvador do gênero humano, foi preservada e imune de toda mancha de pecado original, essa doutrina foi revelada por Deus, e por isto deve ser crida firme e inviolavelmente por todos os fiéis”.

Rompida a lamentável herança da culpa original
O Sumo Pontífice afirma, portanto, que Nossa Senhora, por uma graça singular e em vista dos méritos de Jesus Cristo, a partir do primeiro instante de seu ser foi isenta da mancha do pecado original. Essa doutrina foi revelada por Deus, ou seja, está na Bíblia, e por isso deve ser “crida firme e inviolavelmente por todos os fiéis”.
Para se avaliar o extraordinário significado da Imaculada Conceição, é preciso ter em conta que, em conseqüência da queda de Adão, todos os seus descendentes haviam de nascer com o pecado original. Lamentável herança em virtude da qual os sentidos do homem continuamente se revoltam contra a sua razão, expondo-o a novos e incontáveis pecados.
Durante milênios verificou-se, inexorável, essa lei da maldição. Em determinado momento, porém, os Anjos assistem atônitos a um fato sem precedentes na história da Humanidade decaída: Deus quebranta a funesta lei, e um ser é inteiramente concebido sem pecado original. É Nossa Senhora que surge imaculada, resplandecente, com todo o brilho e todo o fulgor de uma criatura perfeita, como o foram Adão e Eva ao saírem das mãos do Onipotente.
Pode-se imaginar que, nesse sublime instante, um frêmito de júbilo e de glória percorreu todo o universo, acentuado pelo fato de que Maria, isenta do pecado original, era também a obra-prima da criação. Acima d’Ela haveria de estar, apenas, a humanidade santíssima de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Narra a Sagrada Escritura que o Padre Eterno, depois de concluída a obra da Criação, repousou na enlevada consideração do que Ele tinha feito.
Descansou, porém, tendo-se proposto criar um ser que superasse em maravilha tudo o que até então sua onipotência realizara, uma mulher da qual haveria de nascer o Verbo Encarnado. E foi precisamente no momento da Conceição Imaculada de Nossa Senhora que Deus executou essa sua obra-prima.[1]

“Como um exército em ordem de batalha”
Concebida sem pecado original, Nossa Senhora não sentia em si nenhuma inclinação  para o que fosse ruim. Pelo contrário, possuía todas as facilidades para dar à graça de Deus uma perfeita e constante correspondência. De sorte que, n’Ela, as grandezas sobrenatural e natural se entrelaçavam numa profunda e maravilhosa harmonia.
Em conseqüência, Nossa Senhora tinha como ninguém uma altíssima noção da excelência de Deus, e da glória que Lhe devem render todas as criaturas. Por isso, nutria em sua alma vivíssimo horror ao pecado, que é um ultraje à mesma glória divina. Donde possuir Ela, também, uma ardorosa combatividade, no sentido de execrar toda forma de mal.
Compreende-se, à vista disso, porque Nossa Senhora é comparada a um exército em ordem de batalha: sicut castrorum acies ordinata. Ou, como d’Ela se diz, que sozinha esmagou todas as heresias na Terra inteira. Por quê? Exatamente porque, já no privilégio de sua Imaculada Conceição, Ela é o modelo de combate ao mal.

Início da vitória da Contra-Revolução
Porque concebida sem pecado original, Nossa Senhora, afirmam os teólogos, foi dotada do uso da razão desde o primeiro instante  de seu ser. Portanto, já no ventre materno Ela possuía altíssimos e sublimíssimos pensamentos, vivendo no seio de Sant’Ana como num verdadeiro tabernáculo.
Temos uma confirmação indireta disso no que narra a Sagrada Escritura (Lc 1, 44) a respeito de São João Batista. Ele, que fora engendrado no pecado original, ao ouvir a voz de Nossa Senhora saudando Santa Isabel, estremeceu de alegria no seio de sua mãe.
Assim, pode-se acreditar que a Bem-aventurada Virgem, com a altíssima ciência que recebera pela graça de Deus, já no seio de Sant’Ana começou a pedir a vinda do Messias e, com Ele, a derrota de todo mal no gênero humano. E desde o ventre materno se estabeleceu, certamente, no espírito de Maria, aquele elevadíssimo intuito de vir a ser, um dia, a servidora da Mãe do Salvador.
Na realidade, por essa forma Nossa Senhora já começava a influir nos destinos da humanidade. Sua presença na Terra era uma fonte de graças para todos aqueles que d’Ela se aproximavam na sua infância, ou mesmo quando ainda se encontrava no seio de Sant’Ana. Pois se dá túnica de Nosso Senhora – conta o Evangelho (Lc 8, 44-47) – se irradiavam virtudes curativas para quem a tocasse, quanto mais da Mãe de Deus, Vaso de Eleição!
Por isso, pode-se dizer que, embora fosse Ela criancinha, já em seu natal graças imensas raiaram para a humanidade. Naquele bendito momento, a vitória da Contra-Revolução começou a ser afirmada e o demônio a ser esmagado, percebendo que algo de seu cetro estava irremediavelmente partido.

Derrota dolorosa para o demônio
Por isso, tem o demônio especial ódio à Imaculada Conceição. Esta singular prerrogativa de Nossa Senhora constitui para ele uma derrota dolorosíssima e, por assim dizer, pessoal.
Com efeito, tendo Satanás conseguido arrastar nossos primeiros pais ao pecado original, as vantagens que lhe traria essa queda, caso não houvesse a futura Redenção, seriam simplesmente espetaculares. O homem, criatura nobre de Deus, ficou desfigurado pelo pecado e sujeito às más tendências. Com isso, tornou-se incalculável o número de pessoas capazes de cair, ao longo dos séculos, no Inferno. Portanto, imenso foi o êxito imediato que o demônio obteve com o pecado de Adão e Eva.
O unido modo de anular esse triunfo do mal seria o Verbo se encarnar e, enquanto Homem-Deus, oferecer-se como vítima pela nossa salvação.
Ora, essa vitória do Bem teve sua primeira realização no nascimento de uma criatura excelsa, imaculada, que, apesar de todos os embustes do demônio, surgia livre da trama na qual ele pretendia envolver todo o gênero humano. Em favor dessa criatura, Deus rompeu a urdidura satânica, e Ela nasceu inteiramente fora da lei do pecado original. Essa criatura eleita é Maria Santíssima, Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Portanto, a raiz da salvação do mundo, o ponto de partida da Redenção da humanidade, foi o fato de Nossa Senhora ter sido concebida isenta do pecado original. Donde nos ser fácil compreender como o primeiro lance da Contra-Revolução foi, precisamente, a Imaculada Conceição de Maria Virgem, prelúdio da Encarnação do Verbo.

Invocação propícia aos contra-revolucionários
Compreendemos, de outro lado, como Nossa Senhora, concebida sem pecado original, realmente pisa na cabeça do demônio. E, portanto, o profundo sentido teológico que há no fato de se representar a imagem da Imaculada Conceição calcando a serpente.
Imaculada Conceição! Essa é a invocação propícia para os contra-revolucionários. O modelo para estes é Nossa Senhora que, ao contrário de Eva, não conversa com a serpente e, ademais, esmaga-lhe constantemente a cabeça. Tal é a atitude de espírito que devemos pedir a Nossa Senhora da Imaculada Conceição.
Pois, que outra coisa é o calcanhar da Virgem, senão os filhos que Ela suscitou para seu serviço, humildes, desapegados de honras e glórias mundanas, unicamente desejosos de serem instrumentos d’Ela para esmagar a Revolução?
Esse deve ser o nosso maior anelo: sermos células vivas do glorioso calcanhar da Santíssima Virgem, a cuja pressão nada tem resistido ao longo da História!

Especial brilho da imaculada beleza de Maria
Na mesma Bula Ineffabilis Deus, o Papa Pio IX assim se exprime: “E depois reafirmamos a nossa mais confiante esperança na Beatíssima Virgem que, toda bela e imaculada, esmagou a cabeça venenosa da crudelíssima serpente, e trouxe a salvação ao mundo”.
É interessante notar que o Sumo Pontífice reúne, no mesmo pensamento, a beleza e o poder de Nossa Senhora. De outro lado, evoca ele, por contraste, a hediondez e a fraqueza do demônio, o qual é esmagado por Ela.
Portanto, uma vez que existe a diabólica serpente, a beleza e a perfeição da Santíssima Virgem só se manifestam completas porque Ela triunfa, vence e esmaga o demônio. Satanás é um escabelo aos pés d’Ela. Sendo Maria imaculada e soberanamente linda, não basta que todas as criaturas deste mundo, as do Céu e as do Purgatório Lhe prestem homenagem: importa que o inimigo esteja quebrado sob seu calcanhar.
Uma perfeita consideração de esplendor de Nossa Senhora envolve, portanto, a idéia do demônio estraçalhado e humilhado por Ela. Essa vitória sobre Satanás resulta em particular brilho na celestial beleza da Imaculada Conceição.

(Revista “Dr. Plínio”, nº 81, dezembro de 2004)




[1]Até aqui o texto está também transcrito no Pequeno Ofício da Imaculada Conceição Comentado, João S. Clá Dias, pág. 62; a seguir, na revista “Dr. Plínio”