sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Problemas da vida moderna (III)

O problema da solidão

Trechos de reportagens publicadas pelo jornal "Diário de São Paulo", de outubro de 1964:

“Um dos aspectos mais desumanos da vida em São Paulo é o problema da solidão. Por estranho que pareça, é um mal que atinge a muitos, a quase todos, e que poucos sabem identificar. Os outros sentem apenas a insatisfação, um angustioso mal-estar que não a que atribuir. Sentem, por exemplo, que não têm um lugar definido no mundo, que não são nada, que ninguém os quer verdadeiramente, que são injustiçados ou perseguidos, e não sabem que é a solidão que está fazendo com que se sintam assim. A solidão que é, acentuadamente nas grandes cidades, um dos principais fatores de estados angustiosos e de neuroses.
Cidade grande é um deserto humano”, frisou o psicoterapeuta especializado na Alemanha, Sr. Wilhelm Kenzler. Conforme também acentuou outro analista, Sr. José A. Gaiarsa, “todos falam da solidão nas grandes cidades, mas esta solidão é o anonimato, a falta de um grupo orgânico da qual a pessoa faça parte”. Todos os ambientes são constituídos de grupos heterogêneos, escolhidos por acaso, a pessoa não se encontra e às vezes não forma amigos. Daí a solidão maior, que é a solidão da pessoa que está sempre rodeada de gente estranha, sem nada em comum. A solidão de quem muitas vezes nem tem condições para estar só e, por paradoxal que pareça, saber resolver assim o seu problema de solidão.
“...o sr. Wilhelm Kenzler acentuou que uma característica de que há neurose é notar-se que o paciente não consegue estar sozinho. Assim que se dispõe a ficar só, imediatamente tem uma idéia, surge um estímulo e, atraído por estes estímulos, o indivíduo, por intranqüilidade, procura sempre a companhia dos outros. Este é um fenômeno comum em São Paulo, pois os grandes aglomerados humanos e os grupos heterogêneos tornam o indivíduo mais isolado”.
“Assim, por exemplo, as firmas enormes ligam menos os seus empregados do que as pequenas, as escolas superlotadas não incrementam a amizade entre os estudantes.
“Por mais paradoxal que seja, a cidade grande isola o indivíduo e não dá condições para o isolamento material, estimula o relacionamento e não permite o relacionamento sadio, que é o bi-pessoal ou de pequenos grupos. Assim, as pessoas saem de casa com a intenção precípua (às vezes sem o saber), de encontrar um relacionamento significativo com os outros e, não encontrando, sentem-se frustradas em seu anseio básico. Assim é como se sente muita gente depois de certos passeios. Embora não saiba localizar direito o motivo da sua insatisfação, sente que o passeio não valeu a pena. Este é um dos desencadeantes precípuos de neuroses".

Passados mais de 40 anos da reportagem acima, verificamos que esta situação só piorou de lá pra cá - não só em São Paulo, mas em todas as grandes cidades. Lembremo-nos do que falou Leão XIII na encíclica "Parvenu á la vingt-cinquième amnée", de 1902, anteriormente citada, cuja descrição coincide com o que fala o jornal acima.

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