segunda-feira, 19 de dezembro de 2022

NOS MAUS MINISTROS REINA O PECADO DA LUXÚRIA

 


                       (casamento místico entre Santa Catarina e o Menino Jesus)

 

Após verificarmos os exemplos da resistência de personagens bíblicos,  de santos e de outros cristãos, que se esmeraram não somente contra as tentações de impureza, mas na prática exímia e heroica de tão excelsa virtude da Castidade, veremos agora alguns casos de castigos que visaram claramente punir os pecados contra aquela angélica virtude.

Antes de tudo, convém que se leia o texto em que Santa Catarina de Sena expõe com crueza a situação do clero no que diz respeito aos pecados de luxúria (especialmente no seu tempo, início da Renascença) o que teria motivado o terrível castigo de Udo (que viveu séculos antes), conforme relato de Santo Afonso de Ligório transcrito em seguida.

 

Eis o texto de Santa Catarina:

"Tenho te mostrado, queridíssima filha minha, uma pequena parte da vida dos que vivem em religião, em que miséria se acham na ordem, vestido com roupas de ovelhas sendo lobos.

Agora volto aos clérigos e ministros da Santa Igreja, lamentando-me contigo de seus pecados, ademais dos que te tenho narrado, e das três colunas dos vícios de que te falei em outra ocasião, queixando-me contigo deles, ou seja, da imundície da inchada soberba, pois por ela vendiam a graça do Espírito Santo.

Cada um destes três pecados dependem um do outro.  O fundamento das três colunas é o amor a si mesmos. Enquanto elas se mantêm em pé, são suficientes para manter a alma fixa e obstinada em qualquer outro vício.  Por isso te disse que todos os vícios têm sua origem no amor-próprio, pois do amor a si mesmos nasce o principal de todos, que é a soberba. O soberbo se acha privado da dileção da caridade, e da soberba procedem a imundície e a avareza.

Agora te digo, filha queridíssima:  olha com quanta imundície têm manchado seu corpo e seu espírito. Ainda te quero dizer algo mais para que conheças melhor a fonte de minha misericórdia e tenhas compaixão dos miseráveis a quem se faz referências. Têm alguns tão convertidos em demônios, que não só não guardam reverência ao sacramento nem estimam a excelência do estado em que os tenho posto por minha bondade, senão que, como totalmente desmemoriados por causa do amor que têm a uma determinada criatura, ao não poder lograr o que desejam, se darão aos encantamentos demoníacos[1]. Com o sacramento que os tenho dado farão bruxarias para satisfazer seus miseráveis desejos e pensamentos desonestos e os porão em prática. A minhas ovelhas, cujas almas devem guardar e alimentar, as atormentam por estes e outros meios, que omitirei para não fazer-te sofrer. Como tens visto, as fazem andar desgarradas e fora de si, chegando a querer fazer o que não desejaram por meio de bruxarias que aquele demônio da carne lhes tem feito, e, pela resistência que se fazem a si mesmas, seus corpos sofrem grandíssimos trabalhos. Quem tem causado estes e outros miseráveis males que tu sabes e que não é preciso saber que te conte? Sua vida desonesta e miserável.

Oh caríssima filha! A carne, que está sobre os coros dos anjos pela união da natureza divina com vossa natureza humana, a entregam a tanta miséria! Oh homem abominável e desgraçado; não homem senão besta! Tua carne, ungida e consagrada a Mim, a entregas tu às meretrizes e até a algo pior. Tua carne e a de todo o gênero humano, a que Adão havia chagado com seu pecado, foi livrada da chaga no madeiro da cruz pelo chagado corpo de meu Filho unigênito. Oh miserável! Ele te tem dado honra, e tu procuras vergonha? Te hás curado pelas chagas de seu corpo, e ainda mais, te tem feito ministro, e tu o feres com lascivos e desonestos pecados! O bom Pastor tem banhado as ovelhas em seu sangue, e tu as manchas para que não estejam limpas e fazes o possível para introduzi-las no lodo? Deves ser exemplo de honestidade e o és da desonestidade?

Tens inclinado todos os membros de teu corpo para que obrem miseravelmente  e a fazer o contrário do que por ti tem feito minha Verdade. Eu permiti que Lhe fossem vendados os olhos para iluminar-te, e tu, com os teus lascivos, lanças flechas envenenadas à tua alma e ao coração daquelas a quem olhas com tanta malícia. Permiti que Lhe dessem fel e vinagre, e tu, como besta indômita, te comprazes nos alimentos delicados, fazendo de teu ventre um deus. Em tua língua desonesta há palavras impuras e vãs. Com ela estás obrigado a corrigir ao próximo, a proclamar minha palavra, a recitar o Ofício com o coração e a boca, e não ouço mais que pestilência, jurando e perjurando como se fosses um bufarinheiro, e muitas vezes blasfemando. Permiti que Lhe fossem atadas as mãos para livrar-te das ataduras do pecado a ti e todo o gênero humano. Tuas mãos estão ungidas e consagradas para administrar o santíssimo sacramento, e tu as usa torpemente em miseráveis toques. Tudo o que se faz com tuas mãos está corrompido e dirigido ao demônio. Oh miserável! Te coloquei em tão grande dignidade para que me sirvas unicamente a Mim e a toda criatura racional.

Eu quis que Lhe fossem traspassados os pés e aberto o costado, fazendo de seu corpo escada, para que visses o segredo do coração. O coloquei como adega aberta onde podias ver e gozar do inefável amor que vos tenho quando achais e vês minha natureza divina unida à vossa, que é humana. Aqui vês o sangue que vós administrais, que é dado como banho limpar vossas maldades. Tens feito de teu coração templo do demônio. Teu afeto, simbolizado nos pés, não tem nada a oferecer senão corrupção e vitupério.  Os pés de teu afeto não levam a alma a outro lugar que aos lugares do demônio. De modo que todo teu corpo fere ao de meu Filho, porque fazes o contrário do que Ele tem feito e do que todas as criaturas estais obrigados a fazer.

Os membros de teu corpo têm recebido seu castigo, porque as três potências se acham unidas nele em nome do demônio, quando deveriam estar reunidas em Meu nome.

Tua memória deveria estar cheia dos benefícios que de mim tens recebido, e o está de desonestidades. Com a luz da fé deverias por os olhos de teu entendimento em Cristo crucificado, de quem te tenho feito ministro, e tu os tem posto nas delícias, posição social e riquezas do mundo, com mísera vaidade. Teu afeto deveria amar-Me sem intermediário algum, e tu o hás posto miseravelmente em amar as criaturas e em teu corpo, e até amas a teus animais mais que a Mim. Que é que me o demonstra? A impaciência que tens comigo se te tiro o que tu amas, o desagrado que encontras no próximo quando te parece receber algum prejuízo temporal dele.  Quando o odeias e maldizes, te aparta de meu amor e do seu. Desventurado de ti se, feito ministro do fogo de minha caridade, tu, por teus próprios e desonestos prazeres, perdes essa caridade pelo pequeno dano que recebes de teu próximo!

Oh filha queridíssima! Esta é uma das três miseráveis colunas de que falei".[2]

 

 

(Extraído de “A FELICIDADE ATRAVÉS DA CASTIDADE”, págs. 248/251 – O texto integral desta obra poderá ser obtido enviando mensagem para meu email juracuca@gmail.com )



[1] Seriam as "missas negras", onde se ultrajam a Hóstia consagrada?

[2] "Obras de Santa Catalina de Siena" - BAC - págs. 299/301.

 


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