quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

HÁ VERDADEIRA DEMOCRACIA NUM PARLAMENTO REPUBLICANO?

 



O primeiro parlamento que pode se dizer “republicano” da era moderna foi a famosa assembleia dos deputados durante a Revolução Francesa de 1789. Foi ele assim descrito por um grande estudioso daquela revolução:

 “Reacionários e privilegiados, os parlamentares pediam que convocassem esses Estados[1] segundo as velhas fórmulas que, mencionando e frisando as hierarquias de nascimento, de cargos e de fortunas, asseguravam a preponderância das duas primeiras ordens. Igualitários e discípulos de Rousseau, os liberais queriam uma verdadeira assembléia, submetida à única lei do número, sem distinção de classe nem de origem. O ideal dos parlamentares era uma monarquia fraca, na qual o Rei não seria senão o primeiro dos seus nobres, onde os poderes administrativos passariam por intendentes para a aristocracia local e na qual, finalmente, nada se faria sem a aprovação das Cortes de Justiça, guardas e intérpretes das leis fundamentais. Os liberais sonhavam com uma constituição que faria da coroa uma magistratura honorífica, mas suprimiria também os privilégios individuais, familiares e corporativos, para submeter a nação nivelada ao governo das “luzes”.

A Vontade Geral não é a vontade do maior número, mas sim a vontade dos puros, que são os encarregados de elucidar a nação sobre os seus verdadeiros desejos e a sua verdadeira felicidade (Saint-Just)”.

(“Revolução Francesa”, de Pierre Gaxote, Livraria Tavares Martins, Porto, págs     Pierre Gaxote, pág. 277)

Como funcionava a Assembléia Legislativa

“Na Legislativa falava-se muito. De 745 deputados, 400 são advogados, isto é, 400 moinhos de palavras, dos quais uns 20 ressoam sempre em conjunto. As sessões da Constituinte eram desordenadas; as da Legislativa são anárquicas. Imaginemos, diz uma testemunha ocular e habitual, “uma sala de colégio onde questionem centenas de estudantes ,a ponto de, a todo instante, se pegarem pelos cabelos. O vestuário mais que descuidado, os movimentos arrebatados, a passagem brusca dos clamores aos insultos – tudo isto constituía um espetáculo que não se pode comparar nem pintar”. As tribunas cospem sobre os oradores moderados. Grupos de homens e mulheres são autorizados a atravessar a sala, soltando gritos e ameaças. Admitem-se na teia todas as delegações e todas as manifestações, sejam elas indecentes ou pueris. É um barulho contínuo, realçado com intermédios de vaias e apupos.

Apenas os grandes oradores conseguem impor silêncio e fazer-se ouvir, pelo menos de entrada. No entanto, nunca houve tão grande embriaguez de palavras, discursos tão pomposos e uma retórica tão oca. O “bric-a-brac” das “canciones (arengas) soa ali com um ruído de ferro velho. O círculo de Pompílio, os Gracos, os fachos de himineu, Brutos, Catão, o tormento de Cévola, a plebe retirada para o Monte Sagrado, Catilina, Cincinato e sua charrua, Saturno devorando os filhos, o Senado vendendo o campo onde acampava Aníbal, todas as velhas reminiscências escolares se precipitam do alto da tribuna, entremeadas com ninharias solenes, prosopopéias, apóstrofes aos deuses e citações do “Contrato Social”.

(“ Revolução Francesa”, de Pierre Gaxote, Livraria Tavares Martins, Porto, págs  Pierre Gaxote, págs. 161/162)

Há alguma diferença entre o parlamento acima descrito e os que existem hoje nas modernas repúblicas espalhadas pelo mundo? Por exemplo, é diferente da nossa Câmara dos Deputados e do nosso Senado? Quer dizer, a Revolução Francesa fez escola e tem seguidores fanáticos até os dias de hoje.

 


[1] Foi a convocação dos Estados Gerais (uma espécie de assembléia constituinte da monarquia) que deu início à Revolução propriamente dita.


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