quarta-feira, 18 de julho de 2012

O sonho da liberdade que pode virar pesadelo

A escritora católica baiana Amélia Rodrigues (falecida em 1926) tem um conto ("O Sonho de Fulgêncio") que retrata muito bem em que situação encontra-se o homem moderno, escravo de um ideal frustrado em busca de uma liberdade ilusória.

Eis como ela encerra seu pequeno conto:


"Fulgêncio, o servo, é a alma pecadora – a alma do século de hoje.



Feita para Deus, ela foge de Deus, atraída pela voz de sereia da falsa liberdade.


Foge de Deus para gozar à larga, e afunda-se nos pântanos mais asquerosos; torna-se vil, e nem percebe a própria degradação, ou percebe-a fracamente.


Coitadinha!


A luz da graça lhe aparece enfim, no cimo da montanha da fé. É a única estrela na sua noite pesada de treva e de abandono. Ela a vê, suavíssima; compreende-a, deseja ir até onde está a mansão salvadora, mas o vício, o mau hábito da rebeldia a tem cativa, a ela que sonhara ser livre, inteiramente livre!


Precisamente. Será sempre escrava, e da pior das escravidões.


Ah! Se ela voltasse ao lar donde fugira, ao coração de seu Senhor e de seu Pai, que feliz seria de novo!...


Almas que refulgistes ao sair do batismo cristão e por desgraça agora estais caídas nos charcos do mal, coragem! Quebrai os laços, desprendei-vos da lama, e subi, montanha acima, até os braços do vosso Criador. Ele vos espera e há de receber-vos em festa e coroar-vos de rosas imortais.


Homens do século de hoje, Fulgêncios sequiosos de gozo e de independência, não esqueçais que a verdadeira liberdade é a dos filhos de Deus. Procurai o reino de Deus, se quereis ser livres e atingir o vosso alto destino".


(Transcrito de “Do Meu Archivo – Contos e Phantasias” – Livraria Editora N. S. Auxiliadora – Salvador(BA), 1929 – págs. 208/216)


Para ler o texto completo clique neste link da Glória TV

E aqui para ler sobre o VERDADEIRO SENTIDO DA PALAVRA LIBERDADE






Quem foi Amélia Rodrigues 



Trata-se de notável escritora e dedicada educadora católica, nascida a 26 de maio de 1861 na localidade chamada Oliveira dos Campinhos, na época pertencente ao município de Santo Amaro, Bahia.


Iniciou sua atividade intelectual como poetisa, publicando, ainda jovem, vários poemas em diversos jornais da capital baiana. No entanto, foi como educadora da juventude que mais se destacou, tendo escrito vários contos de caráter cívico e religioso. O seu intuito sempre foi o de instruir a juventude de seu tempo, tendo escrito também dramas sacros.


Escritora católica, tinha grande sensibilidade e discernimento para os grandes problemas que atormentavam a humanidade de seu tempo. Quando a Primeira Guerra estava em seu auge, exatamente no mesmo mês que Nossa Senhora aparecia aos pastorinhos em Fátima (maio de 1917) publicava ela um artigo na revista "A Voz" do Rio, sob o título de "Aos pés de Nossa Senhora", em que dizia: "Ainda este ano surge maio no meio da agonia universal... Apenas um ponto luminoso oferece ao mundo o mês das flores: o altar de Mari-a...".


Fundou em Salvador o “Instituto Maternal”, considerada uma das melhores escolas da época. Dedicou-se ao jornalismo, tendo sido co-fundadora da revista “Paladina”, da Liga das Senhoras Católicas. Fundou também a revista “A Voz”, de circulação nacional, e publicou diversos artigos e poesias em outras publicações como “O Pantheon”, “O Álbum”, “A Renascença”, “A Tarde” e “O Livro”. Em algumas destas publicações usou o pseudônimo de Juca Fidelis.


No final de seus dias, Amélia Rodrigues mudou-se para o Rio de Janeiro, indo residir em Niterói, onde passou a participar ativamente do Movimento Católico Feminino, como dirigente da Liga das Senhoras Católicas. Mesmo deixando tal cargo depois, deram-lhe o título de Presidente Honorária, tal o prestígio que detinha.


Poucos anos depois, em 1926, teve que viajar para a Bahia, onde veio a falecer no dia 22 de agosto daquele ano.


Dentre as obras de caráter educativo de Amélia Rodrigues, destacam-se "Mestra e Mãe" e "Do Meu Arquivo". Esta última é um compêndio de seus principais contos, todos de caráter moral e instrutivos. Quanto à "Mestra e Mãe", assim se refere um seu discípulo sobre o mesmo:


"Quase no findar do século, 1898, Amélia Rodrigues edita o seu excelente livrinho "Mestra e Mãe". Elaborou-o para fins de educação cívica e moral. Na verdade, trata-se de um livro que, além de atender à sua finalidade deixa-nos a impressão de que a história nele contada traduz, afinal, parte da própria vida da autora. No seu pórtico, lê-se a seguinte advertência, dirigida "às jovens brasileiras", cujo sentido define a formação de quem a escreveu. Leiamo-la:


"Escrevi este livro, queridas meninas, para auxiliar vossos pais e vossos mestres na doce tarefa de fazer-vos amar a virtude e a instrução.


Saiu de meu coração e vai para o vosso, sem preocupações de estilo, sem pretensões de mérito, nem ambições que não sejam as de contribuir, pouco que seja, para o vosso bem. Lede-o, se vos agradar, mas com a intenção de tirar dele algum fruto. Sabeis que não se podem cultivar flores sobre rochas duras. Assim também nenhum bom conselho vos aproveitará se o vosso coração for intratável e indiferente como a pedra.


Não! Não o será! Trabalhareis com vontade, com afinco, no vosso aperfeiçoamento moral e conseguireis ser boas, e sereis a glória de vossa família, a honra do vosso sexo, sereis dignas cidadãs de nossa grande Pátria, que de vós espera a geração fu-tura!"


São palavras repassadas de brandura, de meiguice e de ensinamentos bons E o livro foi todo escrito assim. Em suas páginas, impregnadas da alma de Amélia Rodrigues, desdobra-se a história de uma professora. Mulher boa e ilustrada que se tornou amada e respeitada. D. Mercês, é o seu nome, e a sua trajetória na obra sugere autobiografia. Aos que mais de perto conheceram Amélia Rodrigues, a analogia de caráter, humildade, pro-pósitos de bem servir no magistério e, sobretudo, de amor ao próximo, notadamente à in-fância, entre a heroína e a narradora, não escapará ao reparo. E ainda há um preeminente atributo que acentua a verossimilitude do modelo: é o amor ao Brasil.


É o fenômeno que ocorre freqüentemente nos escritores de obras de ficção, o surgir de uma ou mais personagens identificadas com o autor. E isso se dá de caso pensado ou por simples ação do subconsciente.


O livro "Mestra e Mãe" bem merece um estudo mais acurado no sentido de deduções psicológicas necessárias á biografia da grande educadora"


(Aloysio Guilherme da Silva, in "Amélia Rodrigues - Evocação", Editora Livraria São José, Rio, 1963 - págs. 23/24)..

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