“Poucos homens, no século XVIII,
trazem em si mais fortemente gravados os sinais do homem da Providência, do que
esse novo Elias, missionário do Espírito Santo e de Maria Santíssima. Toda a
sua vida foi uma tal manifestação da santa loucura da cruz, que os seus
biógrafos são concordes em classificá-lo como São Simeão Salus e São Felipe
Neri. Clemente XI fê-lo missionário apostólico em França, para que ele
empregasse a vida em combater o jansenismo, tão cheio de perigo para a salvação
das almas. Será difícil achar, depois das epístolas dos apóstolos, palavras tão
ardentes como as doze páginas da sua “Prece” pelos missionários de sua
Companhia.
Recomendo-a a todos os que encontram dificuldade em conservar, no meio de
numerosas provações, o fogo primitivo do amor pela salvação das almas.
Grignion de Montfort era ao mesmo
tempo perseguido e venerado em toda parte.
A soma de seus trabalhos é, como a de Santo Antonio de Pádua,
verdadeiramente incrível e inexplicável. Escreveu alguns trabalhos espirituais,
que embora conhecidos há pouco tempo, já têm exercido influência notável na
Igreja, e estão chamados a influência muito maior no futuro. Suas prédicas,
seus escritos, sua conversação eram impregnados de profecias e de visões
antecipadas das últimas eras da Igreja.
Novo São Vicente Ferrer, adianta-se,
como se estivesse nos dias precursores do juízo final, e proclama-se portador,
da parte de Deus, de uma mensagem autêntica: mais honra, conhecimento mais
vasto, amor mais ardente a Maria Santíssima, e anuncia a união íntima que Ela
terá com o segundo advento de seu Filho.
Fundou duas Congregações religiosas,
uma de homens, outra se mulheres, ambas muito prósperas. E, entretanto, morreu
com 43 anos, em 1716, tendo apenas dezesseis anos de sacerdócio.
A 12 de maio de 1853, foi promulgado,
em Roma, o decreto que declara os seus escritos isentos de todo erro que
pudesse servir de obstáculo à sua canonização. Neste trabalho sobre a
verdadeira devoção à Santíssima Virgem, escreveu ele estas palavras proféticas:
“Vejo claramente no futuro animais frementes que se precipitam com furor para
estraçalhar com os dentes diabólicos este pequeno escrito e aquele de quem se
serviu o Espírito Santo para escrevê-lo; ou para sepultá-lo, ao menos, no
silêncio de um armário, a fim de que não seja a luz”.
Apesar disso, prediz, ao mesmo tempo,
a aparição e o sucesso do livro. Cumpriu-se tudo à risca. O autor morreu em
1716, e só em 1832 foi descoberto, como por acaso, este tratado por um dos
sacerdotes de sua Congregação, em Saint-Laurent-sur-Sèvre. O superior de então
pôde atestar que o manuscrito era do venerável fundador e o autógrafo foi
enviado a Roma, a fim de ser examinado no processo de canonização.[1]
Com certeza, os que vão ler este
livro já amam a Deus e desejariam amá-lo ainda mais; todos desejam alguma coisa
para a sua glória: a propagação de uma boa obra, a vinda de melhores tempos, o
sucesso de uma devoção; um empregou durante anos todos os esforços para vencer
um defeito particular e não o conseguiu; outro tem pedido com lágrimas a
conversão de seus pais e amigos, e está admirado de que, apesar de suas lágrimas,
tão poucos dentre eles se tenham convertido à fé; este se entristece por não
ter bastante devoção; e aquele se aflige por ter que carregar uma cruz que lhe
parece muito pesada para a sua fraqueza, enquanto outro encontra no seio da
família perturbações e infelicidades domésticas que lhe parecem incompatíveis
com a obra de sua salvação; e para todas essas tristezas a oração parece trazer
tão pouco alívio! Qual é, pois, o remédio que lhes falta? Qual o remédio
indicado pelo próprio Deus? É, segundo as revelações dos santos, uma dilatação
imensa da devoção à Santíssima Virgem; mas, reflitamos bem, o imenso não admite
restrições nem limites.
Aqui, na Inglaterra, Nossa Senhora
não é bastante pregada e conhecida. A devoção que lhe consagram é fraca, escassa,
mesquinha, transviada pelos escárnios da heresia. Dominada pelo respeito humano
e pela prudência carnal, desejaria fazer da verdadeira Maria uma Maria tão
pequena que os protestantes se pudessem sentir á vontade junto d’Ela. Sua
ignorância da teologia tira a Maria toda a vida e dignidade; ela não é, como
deve ser, o caráter saliente de nossa religião; não tem fé em si mesma. E é por
esta razão que Jesus não é amado, que os hereges não são convertidos, que a
Igreja não é exaltada; almas que poderiam ser santas, desfalecem e degeneram; os sacramentos não são
frequentados como o deveriam ser;. As almas não são evangelizadas com o
entusiasmo do zelo apostólico; Jesus não é conhecido, porque Maria é deixada no
esquecimento; perecem milhares de almas, porque Maria delas está distante. É
esta sombra indigna e miserável, à qual ousamos dar o nome de devoção à
Santíssima Virgem, que é a causa de todas estas misérias, de todos estes males,
de todas estas omissões, de toda esta tibieza. Entretanto, segundo as revelações
dos santos, quer Deus “expressamente” uma devoção mais vasta, mais extensa,
mais sólida, uma devoção muito diferente da atual, para com sua Mãe Santíssima.
Sou de opinião que não há obra mais
excelente, mais eficaz para se conseguir este fim, do que a simples propagação
desta devoção particular do venerável Grignion de Montfort.
Basta apenas que uma pessoa
experimente para si esta devoção; em breve, a surpresa que lhe causarão as
graças que ela traz consigo, assim como as transformações que produzirá em sua
alma, convencê-la-ão de sua eficácia, quase incrível aliás, como meio para
conseguir a salvação das almas e a vinda do reino de Jesus Cristo! Oh! Se Maria
fosse ao menos conhecida, não haveria
frieza para Jesus! Oh! Se Maria fosse ao menos conhecida, quão mais admirável
seria nossa fé, como seriam diferentes as nossas comunhões!Oh! Se Maria fosse
ao menos conhecida, quanto mais felizes, mais santos, menos mundanos seríamos,
como nos tornaríamos imagens vivas de Nosso Senhor e Salvador, seu diletíssimo
e diviníssimo Filho!
Eu mesmo traduzi o tratado todo, o
que me deu muito trabalho; e fui escrupulosamente fiel. Tomo ao mesmo tempo a
liberdade de avisar o leitor de que com uma só leitura do livro não o poderá
compreender a fundo. Acha-se neste livro, se assim ouso dizer, o sentimento de
um não se quê de inspirado e sobrenatural, que vai sempre em aumento, à medida
que nos aprofundamos em seu estudo. Além disto, não se pode deixar de
experimentar, depois de lê-lo repetidas vezes, que nele a novidade parece nunca
envelhecer, a plenitude nunca diminuir, o fresco perfume e o fogo sensível da
unção nunca se dissipar ou enfraquecer.
Digne-se o Espírito Santo, o divino
Zelador de Jesus e de Maria, conceder uma nova bênção a esta obra na
Inglaterra; queira ele consolar-nos dentro em breve com a canonização desse
novo apóstolo e ardente missionário de sua Esposa diletíssima e imaculada, e
mais ainda pelo pronto despontar dessa gloriosa era da Igreja que dever a
gloriosa era de Maria”.
F. W. Faber [2]
(Sacerdote
do Oratório. No dia da apresentação de Nossa Senhora. 1862).[3]
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