sábado, 17 de abril de 2021

O SACRATÍSSIMO CORAÇÃO DE JESUS, NOVA DECLARAÇÃO DE AMOR DE DEUS AOS HOMENS

 




 Novidades que supõe

Já tem quase dois séculos de existência entre nós a devoção ao Coração de Jesus, mas nunca foi de tanta atualidade como na hora presente. Esta devoção é um remédio e o remédio supõe um mal, o mal estar geral da sociedade moderna.

E' lei geral da Providencia acomodar às necessidades dos tempos as  instituições que inspira e suscita. Pode dizer-se que a história da Igreja não é senão a execução desta lei admirável.

Se a devoção ao Coração de Jesus nos foi dada como remédio aos males dos últimos tempos , se estamos em plena era do Coração de Jesus, grande correspondência há de existir entre esta devoção e aqueles males.

Na verdade, estudando a índole e caracteres da nova devoção e as  necessidades modernas, descobre-se logo entre eles a mesma relação entre o remédio e a doença, entre o veneno e o antídoto.

Qual é o espírito e o mal dos nossos tempos ? qual é o espírito e o fruto da devoção ao Coração de Jesus ?

Vejamo-lo no seguinte esquema de Costa Rosetti.

 

Índole e crlmes  característlcos do nosso tempo

1 . Apostasia, renegando de Cristo.

2_ Infidelidade total e dia a dia cada vez mais alastrada.

3. Desesperança e pessimismo : desesperação causada pelas calamidades sociais e pela miséria geral : freqüentes suicídios

4· Enregelamento da caridade para com Deus e Cristo : indiferentismo.

5. Langor da vida católica com manifesto definhamento : a tibieza e oscilante claudicação própria do liberalismo.

6. Opressão da Igreja, disfarçada ou desfaçada ; indiferença ou hostilidade para com o Sumo Pontífice.

7· Materialismo teórico ou pratico.

8. Voluptuosidade de terrenas deleitações ; fastio dos bens celestes.

9· Sórdida cobiça de granjearias terrenas ; descaridoso egoísmo na economia particular e pública, esbulhando os mais opulentos aos menos abastados ate á miséria.

10. Rivalidades sociais e discórdias acerbíssimas : a questão operária, a questão agrária, libertação civil e franquias populares

11 . O socialismo fremente e o comunismo, cada vez mais vorazes e insaciáveis.

12. A relaxação, a lenta decomposição da família  e da sociedade, operada pelo liberalismo por meio das escolas emancipadas da religião e dos inumeráveis ardis dos pedreiros livres.

 

Espírito e frutos do culto do SS. Coração

1 . Estreita união com Cristo.

2. Fé viva, fomentada pela caridade do SS. Coração.

3. Melhoria da esperança, aumentada pela consideração da clemência e infinita misericórdia do SS. Coração.

4· Caridade, acesa pelo Coração inflamado de Jesus : afervoramento da vida cristã.

5. Florescência da vida católica, visivelmente patenteada ; frequência de sacramentos; pujança de associações católicas, opostas ao liberalismo.

6. Amor ao Vigário de Jesus Cristo ; defesa enérgica dos direitos da santa Igreja, esposa de Cristo.

7· Anelo aos bens supras sensíveis e sobrenaturais, ateado peIas labaredas do amor do SS. Coração.

8. Saudades e uso freqüente da SS. Comunhão.

9· Abnegação caridosa a bem do próximo, haurido no vulnerado Coração de Deus, circundado de espinhos e coroado pela cruz.

10. Solução feliz de toda a questão social, se vão todas as classes beber no SS. Coração os seus sentimentos de abnegação, de justiça comutativa e legal, o seu inesgotável amor.

11 . O socialismo e comunismo debelados com reformas sociais  inspiradas pela justiça e caridade do SS. Coração.

12. A tutelar conservação católica, consentânea com o verdadeiro progresso, que há de sanar todos os males sociais com a virtude regeneradora do divino Coração.

 

Hoje, como no tempo de S. Agostinho, como sempre, o mundo está dividido em duas grandes cidades ou reinos: a cidade de Deus, o reino da luz, e a cidade do erro, o reino das trevas e de Lúcifer.

As grandes lutas e combates no mundo travam-se todos em volta de Jesus.

Os partidos intermédios e as outras lutas são pequena coisa em comparação  da eterna luta que d1vide o mundo naqueles dois grandes reinos.

Não queremos que Jesus reine sobre nós ! “nolumus hunc  regnare super nos”, exclamam hoje com mais furor do que no tempo de Pilatos os blasfemos filhos do erro.

É necessário que Ele reine, e há de reinar sobre todos ! “oportet illum regnare”, repetem por sua parte com 'S. Paulo os filhos da verdade.

Reinar ou não reinar Jesus no mundo, eis a eterna luta que divide  irreconciliavelmente os homens, eis a vida ou a morte da sociedade.

E' o amor em luta aberta com o ódio.

O grande mal dos nossos tempos não é a pobreza - nunca os recursos foram tantos e tão divididos como hoje·- ; não é a ignorância - a ciência barateou-se e está ao alcance de todos - ; o grande mal, que a todos resume, é o ódio, é o egoísmo desta sociedade sem-fé.

Quando não ha fé nem Deus, o amor é impossível, e sem amor a sociedade é um covil de feras, é o pleno reinado do egoísmo, cada um vive para si.

Então o amor do próximo é um a mentira. O egoísta sem fé nunca chega a ter a noção do amor ; quando dá mostras de amar, é a si que ele ama, é o seu interesse que procura sempre. E, se o próximo o contraria,.afasta-o, persegue-o, mata-o.

E sai da ordem individual e apodera-se da força e faz as leis e as leis são a divinização da matéria, a glorificação das paixões.

Esta é a grande aspiração do reino das trevas, hoje principalmente concretizado na maçonaria, a igreja internacional do ódio.

É no meio d'esta sociedade pervertida e desnorteada que se levanta o Coração de Jesus com o seu reino do amor, para fazer recuar o ódio.

O amor é a vida, é o sangue e a seiva da sociedade ; é o homem que sai para fora de si mesmo, que esquece os seus interesses, domina os seus instintos maus, vive para os outros, sacrifica-se por eles, dá-lhes o que tem, e até a própria vida.

Esta dedicação e este amor não veio, não podia vir da terra : é a lição que o Coração de Jesus constantemente prega aos homens.

Admiravelmente grandiosa é a idéia que a Beata Margarida nos dá do Coração de Jesus.

É o Santo dos santos, o Santo do amor, que desejava ser conhecido, para ser o Mediador entre Deus e os homens ; porque é onipotente para fazer as pazes, afastando os castigos que os nossos pecados provocam, e para nos alcançar misericórdia.»

Esta idéia de mediações ou, melhor, de nova ou segunda mediação entre Deus e os homens aparece com frequência nos escritos da Beata Margarida.

“É o último esforço” do seu amor, “uma redenção amorosa” , “uma nova efusão do amor de Deus, de todos os tesouros de amor, de graça, santificação e salvação que possui”.

E' verdade que Deus já tinha dado tudo, quando deu seu Filho e o Filho tinha consumado a doação de si na Encarnação, na Redenção e na Eucaristia

 - parece que não podia dar mais ; mas deu : a nova declaração de amor que fez aos homens nas revelações de Paray com tais extremos de bondade e misericórdia são um chamamento) paternal, um apelo divinamente  apaixonado ás infinitas ternuras do seu amor.

Como a Eucaristia é um resumo de todas as obras de Deus e encerrando todas as manifestações do amor, constitui a mais excelente e admirável de todas, assim o Coração de Jesus, dando-nos no amor que simboliza e encerra a razão da Eucaristia e de todas as obras de Deus, constitui um novo dom, uma declaração nova do seu amor, um chamamento mais íntimo, um novo descer e caminhar para os homens, oferecendo-lhes o perdão, a vida, o amor e a glória.

Oh ! como é belo este descer de Jesus, este aparecer aos homens com o Coração nas mãos a escorrer sangue e a pedir-lhes o retorno do seu amor infinito ! As revelações de Paray abriram uma nova era na historia do amor de Deus e hoje estamos em pleno esplendor desta era bendita.

O livrinho que vai ler-se despretensioso na forma, sem preocupações de estilo nem artifícios literários, sem querer armar ao efeito nem persuadir com argumentos ou razões humanas, dá-nos a grande novidade de conter o verdadeiro espírito da devoção ao Coração de Jesus e corresponder ás necessidades da hora presente com um remédio aplicado pelo próprio Deus.

Lisboa, 15 d'agosto de 1 907. PADRE JOAQUIM DOS SANTOS ABRANCHES

 (“O Coração de Jesus Segundo a Doutrina da Beata Margarida Maria Alacoque” – Por um Oblato de Maria Imaculada, Capelão de Montmarfe – Introdução do Pe. Joaquim dos Santos Abranches -  Editor Manuel Pedro dos Santos, 1907, Lisboa - Pág. XXX\IllI a XLII– capítulo III da Introdução)

 


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