quinta-feira, 1 de outubro de 2020

SANTA TERESINHA DO MENINO JESUS, DOUTORA DA IGREJA

 


Santa Teresinha do Menino Jesus e da Santa Face foi declarada Doutora da Igreja no dia 19 de outubro de 1997 pelo Papa João Paulo II. Na oportunidade, o Vaticano informou que a Igreja concedeu a honraria à Santa Teresinha porque, apesar de ter morrido jovem e de não ter cursos superiores, ela mostrou a todos os fiéis a importância do exemplo de sua vida no ensino teológico.

Das Doutoras da Igreja ela é, portanto, a única que tem uma doutrina que foi sua própria vida. Evidentemente, Santa Teresinha não escreveu nenhuma obra doutrinária ou ascética a não ser sua autobiografia. Nela, a Santa expõe a doutrina de santificação que denominou de “Pequena Via”, e o faz apenas contando como procurou viver e praticar tal caminho de perfeição. Dir-se-ia que não há muito o que contar de uma vida passada entre as paredes de um convento de clausura, onde impera apenas a oração e o silêncio. A superficialidade de quem assim pensa o impede de ver quanto de sofrimento e de trabalho pode passar por quem ama, especialmente se este amor se eleva até o mais alto, até Deus.

A vocação de Santa Terezinha, pode-se dizer, foi uma vocação que abrange todas as outras, pois nela se insere todas as aspirações de perfeição em busca da santidade. O Papa São Pio X declarou, ao assinar o decreto de introdução da causa de sua canonização em 1914, que até aquele momento Santa Terezinha era a maior santa dos tempos modernos. Resumindo sua grande Vocação, declarou ela em um de seus manuscritos autobiográficos:

“Ser tua esposa, ó Jesus, ser carmelita, ser mãe das almas pela união contigo, deveria ser bastante para mim...  Mas, assim não acontece...  Sem dúvida, as três prerrogativas constituem exatamente minha vocação: Carmelita, Esposa e Mãe.  Contudo, sinto em mim outras vocações. Sinto em mim a vocação de GUERREIRO, de SACERDOTE, de APÓSTOLO, de DOUTOR, e de MARTIR. Sinto, afinal, a necessidade, o desejo de realizar por ti, Jesus, todas as obras, as mais heróicas...  Sinto na alma o arrojo de Cruzado, de Zuavo Pontifício[1]. Desejaria morrer no campo de batalha pela defesa da Igreja..

“Sinto em mim a vocação de SACERDOTE. Com que amor, ó meu Jesus, não te carregaria nas mãos, quando à minha voz descesses do Céu... Com que amor te não daria às almas!...  Mas, que fazer? Com todo o desejo de ser sacerdote, admiro e invejo a humildade de São Francisco de Assis, e sinto a vocação de imitá-lo, quando recusou a sublime dignidade do sacerdócio.

“Oh! apesar de minha pequenez, quisera esclarecer as almas, como os Profetas, os Doutores. Tenho vocação de ser Apóstola... Quisera percorrer a terra, apregoar teu nome, e chantar em terras de infiéis tua gloriosa Cruz. Mas, ó meu Bem-Amado, uma única missão não me seria bastante. Quisera anunciar, ao mesmo tempo, o Evangelho pelas cinco partes do mundo até as ilhas mais remotas... Quisera ser missionária não só por alguns anos, mas quisera sê-lo desde a criação do mundo, e sê-lo até a consumação dos séculos...  Mas, acima de tudo, quisera, ó meu amado Salvador, por ti quisera derramar meu sangue até a última gota...

“Martírio! Eis o sonho de minha juventude! O sonho que cresceu comigo à sombra dos claustros do Carmelo... Aí, também, percebo que meu sonho é loucura, pois não conseguiria limitar-me a apreciar um só gênero de martírio... Para me satisfazer, precisaria de todos eles...  Quisera como tu, meu adorado Esposo, ser flagelada e crucificada...   Como São Bartolomeu, quisera morrer esfolada...  Como São João, quisera ser escaldada em azeite a ferver. Quisera submeter-me a todos os tormentos que se infligiam aos mártires... “

Finalmente, Santa Terezinha encontrou a resposta para suas indagações:

“...A caridade deu-me a chave de minha vocação. Compreendi que, se a Igreja tinha corpo, composto de vários membros, não lhe faltava o mais necessário, o mais nobre de todos. Compreendi que a Igreja tinha coração, e que o coração da Igreja, e que o coração era ARDENTE DE AMOR. Compreendi que só o amor fazia os membros da Igreja atuarem, e que se o amor se extinguisse, os Apóstolos já não anunciariam o Evangelho e os Mártires se recusariam a derramar seu sangue... Compreendi que o AMOR ABRANGE TODAS AS VOCAÇÕES, ALCANÇANDO TODOS OS TEMPOS E TODOS OS LUGARES... NUMA PALAVRA, É ETERNO...

“Então, no transporte de minha delirante alegria, pus-me a exclamar: Ó Jesus, meu amor, minha vocação, encontrei-a afinal: MINHA VOCAÇÃO, É O AMOR!...” [2]

 Passar o céu fazendo o bem à terra

Eis abaixo um resumo brilhante sobre a vida de Santa Terezinha:

“Em 2 de janeiro de 1873, nasceu Maria Francisca Teresa Martin, em Alençon, França. De seus santos pais – Louis e Zélie Martin, que foram proclamados veneráveis em 1994 e estão a ponto de serem beatificados – aprendeu a amar a Jesus e a Maria. Ficou órfã de mãe aos 4 anos.  Mas, nesse pouco tempo de convívio, recebeu muito carinho materno.

“Aos dois anos, ouviu dizer que sua irmã Paulina seria religiosa. Nessa idade, ela não sabia bem de que se tratava, mas decidiu: “Também eu serei religiosa”.  E acrescentou em suas memórias: “Depois disto, nunca mudei de resolução”. Pouco adiante, afirma: “Desde a idade de três anos, comecei a não recusar nada que o bom Deus me pedisse”.

“Depois da morte da mãe, escolheu sua irmã Paulina para ser sua “mãezinha”.  Esta – juntamente com o pai e as outras três irmãs – cuidou da caçulinha com extremado desvelo, dando-lhe uma educação afetuosa e firme.

“A família mudou-se para Lisieux, estabelecendo-se numa casa chamada “Buissonnets”  (moitinhas).  Perto, residia um tio de Santa Teresinha, o sr. Guérin, cuja virtuosa esposa se encarregou de dar assistência às sobrinhas órfãs da mãe.

 

Uma cura milagrosa

“Alguns anos após, Paulina entrou para o Carmelo. Isso significou nova perda para Teresinha, então com nove anos de idade, mas fortaleceu sua convicção de que também ela seria carmelita. Nesta época, acometeu-a uma estranha enfermidade que, além dos incômodos físicos, causava-lhe terríveis sofrimentos psíquicos.  “Eu dizia e fazia coisas que eu não pensava. Quase sempre eu parecia delirar, dizendo palavras sem sentido’, narra ela. Segundo os diagnósticos médicos, essa doença poderia deixá-la louca se não a levasse à morte.

“Nossa Senhora a curou, como ela própria relata:

“Não encontrando socorro algum na terra, voltei-me para minha Mãe do Céu e Lhe supliquei com todo ardor que Ela tivesse  enfim piedade de mim. De repente, a Santíssima Virgem pareceu-me bela, tão bela que nunca eu tinha visto nada tão formoso. Sua face irradiava inefável bondade e ternura, mas o que me penetrou fundo na alma foi seu sorriso arrebatador. Então, dissiparam-se todos os meus sofrimentos. (...) Oh! – pensei comigo – a Santíssima Virgem sorriu-me! Como sou feliz”

Santa decidida e audaciosa

“Em lugar de brincar como as outras crianças, Teresinha preferia ter sua alma posta nos panoramas da contemplação. Gostava muito de ler, sobretudo certas histórias de cavalaria. Lendo a narração dos feitos heróicos de Santa Joana D’Arc[3], sentia em si mesma inspiração celestial, com um forte desejo de imitá-la. Com essas leituras, recebeu uma graça que considerou uma das maiores de sua vida: a compreensão de que nasceu para a glória dos Céus, nascera para ser santa!

Decidiu então entrar logo no Carmelo de Lisieux, onde já se encontravam suas irmãs Paulina e Maria.  Falou com seu bondoso pai que, apesar de sofrer com essa separação, consentiu, considerando-se privilegiado pelo fato de Jesus tomar por esposa mais uma de suas filhas.

“Mas não era comum receber uma noviça de apenas 15 anos... Teresinha não desanimou face á negação do padre superior do Carmelo. Manifestou-se decidida a recorrer ao bispo e mesmo ao Papa, se fosse preciso.

“E assim o fez! Após um infrutífero recurso ao bispo, ela foi a Roma e, ajoelhada aos pés de Leão XIII, com os olhos marejados de lágrimas, expôs seu desejo:

- Santíssimo Padre, venho pedir-vos uma grande graça!

“Surpreso, este inclinou-se para escuta bem, sorriu ao ouvir seu pedido e respondeu-lhe que os superiores decidiriam. Ela contra-argumentou que, com uma palavra dele, todos consentiriam.

- Vamos ver... Entrareis se o bom Deus quiser!... – disse o Papa.

 Lutas na vida carmelita

“E o bom Deus quis. Três meses depois, aquela valente jovem transpôs os umbrais do Carmelo, adotando o nome de Teresinha do Menino Jesus e da Sagrada Face, porque lhe calavam na alma a infância e a Paixão do Salvador.

“Na confissão geral que fez antes de receber o hábito de noviça, ouviu do confessor, Padre Pichon, essa consoladora afirmação: “Na presença do bom Deus, da Santíssima Virgem e de todos os Santos, declaro que jamais cometeste um só pecado mortal”.

“Mas, como tantas vezes ocorre com os Santos, as outras freiras não se davam conta da grandeza de alma daquela carmelita que se fazia tão pequena. Toda a sua vida religiosa, deu sempre bons exemplos e aceitou com agrado todas as humilhações. Sem nunca desanimar, procurava fazer a vontade de Deus prestando serviço às demais, e tinha sempre um sorriso para todas”.

“Travou incessante luta para vencer-se a si mesma, sobretudo nos problemas próprios à vida comunitária. Por exemplo, no recreio, procurava conversar com aquelas que eram de convívio mais difícil; suportava pacientemente o irritante ruído que fazia uma freira, quando entravam no coro; não se queixava quando uma irmã de hábito lhe respingava água suja na hora de lavar a roupa. Sem cessar, oferecia a Deus esses inumeráveis pequenos sacrifícios, como oração e oblação.

“Iniciou ela, assim, uma nova via espiritual: a “pequena via”, a via do abandono nas mãos de Deus, a via da infância espiritual, que todas as almas, até mesmo as mais fracas, podem percorrer e, assim, santificar-se. Tudo fazia por amor a Deus. E sabia que só com auxílio da graça venceria as dificuldades. Gostava de dizer: “Tudo é graça”.[4]

Assim, com apenas 24 anos de idade, Santa Teresinha terminou sua vida, entregando sua alma ao Criador após um alto grau de santidade. Faleceu no dia 30 de setembro de 1897. Decorrido apenas um ano após sua morte, em 1898, foi publicada a primeira edição de sua autobiografia, com dois mil exemplares, logo esgotada em pouco tempo. 30 anos após sua morte, em 1927, o Papa Pio XI a proclamava Padroeira das Missões, juntamente com São Francisco Xavier. Em 1944, Pio XII nomeia Santa Teresinha padroeira secundária da França, ao lado de Santa Joana D’Arc.

A “Pequena Via”, exposta por Santa Teresinha do Menino Jesus em seus “Manuscritos autobiográficos”, denominado por ela mesma de “História de uma alma”, de tal forma fez grande bem às almas, concorrendo para santificação de muitas, que a Igreja a considerou como a explicitação de  uma viva doutrina espiritual, de uma ascese mística de grande vulto, a  ponto do Papa tê-la proclamado de Doutora da Igreja.

 [1]              Zuavo, soldado de infantaria. O Zuavo Pontifício lutou em defesa do Papa Pio IX no século XIX.

[2]              “História de uma Alma – Manuscritos autobiográficos” – Ed. Paulus – págs. 199/201

 [3]              Observar que Santa Joana D’Arc só foi canonizada por São Pio X, no início do século XX.

[4]              In “Arautos do Evangelho” de outubro de 2003, artigo de Juliane Campos “Quero passar meu céu fazendo bem na terra”

 


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