HISTÓRIA DOS CONCLAVES - Próximos à realização de mais um Conclave para a eleição de um novo Papa, publicamos abaixo um relato dos Conclaves havidos na História feito pelo padre Rômulo Cândido de Souza, C. Ss. R.
SIGNIFICADO DA
PALAVRA
Conclave significa Debaixo de chave. Na jurisprudência eclesiástica expressa o local onde se reunem os cardeiais, depois da morte do papa, para se ocuparem unicamente da eleição do seu sucessor. Indica também a assembléia dos cardeais reunidos para a eleição. Esta palavra aparece pela primeira vez num documento do papa Gregório X, no II Concílio de Lion, Julho de 1274. O título do documento era ·Ubi periculum.· (Quando houver algum perigo).
DURAÇÃO DAS
ELEIÇÕES
Algumas eleições foram bem rápidas. O papa Alexandre IV,1254-1261, foi eleito dentro de cinco dias. Outras eleições começaram a prolongar-se demasiadamente. Para a eleição do papa Urbano IV, 1261-1264, levaram três meses. Na eleição do papa Clemente IV, 1265-1268, precisaram de quatro meses. Depois da morte deste papa, os cardeais levaram três anos para se decidir. Foi a eleição que mais tempo levou.
CIDADE
DE VITERBO
Para evitar o problema da demora era necessário encontrar medidas. Os cardeais achavam-se reunidos em Viterbo, onde Clemente IV tinha morrido. Esta cidade era considerada a segunda em importância na Cristandade. Por sua posição estratégica e suas torres numerosas, a cidade colocava os papas ao abrigo das invasões e ingerência dos imperadores alemães, sempre em guerra contra a Igreja.
TRÊS ANOS SEM
PAPA
Depois da morte do papa Clemente IV, 29 de Novembro de 1268, os cardeais que compunham o Colégio eleitoral não conseguiam entrar
SOLUÇÃO
ENCONTRADA
São Boaventura, chefe geral dos Franciscanos,
encontrava-se em Viterbo nessa ocasião. O santo aconselhou os habitantes da
cidade a trancar os cardeais no palácio episcopal para se apressarem na escolha
do papa, longe das pressões e influências de fora. Ainda hoje podem ser vistas
em Viterbo as marcas dos ferrolhos nas portas do quartos dos cardeais.
UMA INSPIRAÇÃO
Esse idéia foi inspirada num fato acontecido
50 anos antes . Os habitantes de Perúsia tinham recorrido ao mesmo estratagema
para forçar os cardeais a escolher o sucessor de Inocêncio III.
SOLUÇÕES
RADICAIS
Entretanto esta solução não produziu efeito
OS CARDEAIS
ACORDAM
Os eleitores, então, diante do argumento do
estômago, se apressaram a escolher como papa um santo homem, Filipe Benitti,
chefe geral dos Padres Servitas. Mas o santo não quis saber de conversa. Fugiu
de casa e se escondeu nas montanhas. Os eleitores tiveram de procurar outro
nome. Escolheram alguém fora do conclave, o arquidiácono de Liége, Teobaldo
Visconti. Não era cardeal, mas exercia as funções de Legado
Apostólico na Síria. Ele aceitou e tomou o
nome de Gregório X, 1271-1276.
NOVAS LEIS
PARA O CONCLAVE
O papa Gregório X, para evitar os problemas
das eleições anteriores, convocou o Concílio de Lion, onde promulgou novas
determinações para a eleição do papa. O documento se intitula Ubi perículum
(Quando houver perigo), 7 de julho de 1274 e determina: na morte do papa, os
cardeais presentes na cidade onde ele morreu, devem esperar seus colegas
somente por 10 dias.
Após esse prazo, devem reunir-se para a
eleição no palácio onde habitava o pontífice. Cada cardeal pode levar consigo
um ou dois criados, clérigos ou leigos.
Os cardeais ficarão numa sala comum, sem
nenhuma separação. O local do conclave permanecerá bem trancado, de modo que
ninguém possa entrar ou sair. (Esse rigor foi abrandado posteriormente. Foi
abolida a obrigação de um dormitório comum. Podiam passar a noite em quartos
separados, por uma cortina).
As chaves do conclave ficam guardadas por
duas pessoas. Dentro do conclave, pelo cardeal chefe. Do lado de fora, pelo
oficial da guarda. (Considerava-se um cargo importante. Durante cinco séculos a
chave ficou na família dos nobres Savelli. Depois para os príncipes Chigi.)
As pessoas de fora não podem comunicar-se com
os cardeais, reunidos em conclave, nem de viva voz, nem por escrito, nem
publicamente, nem secretamente. Essa regra só pode ser quebrada pelo consenso
unânime dos cardeais. Mas o assunto deve estar ligado à eleição. Esta regra
vale sob pena de excomunhão ipso facto.
Embaixadores de reis e imperadores devem ser
recebidos na porta do conclave.
Deve-se providenciar uma abertura em forma de
janela, por onde são introduzidos os alimentos para os cardeais. (Os alimentos
eram levados em grande pompa, por seus criados, vestidos a rigor. Faziam um
solene procissão desde o palácio do cardeal até o conclave. À porta do conclave
os alimentos eram examinados para não serem introduzidos recados secretos por
escrito, como hoje se faz nas penitenciárias, nas visitas dos parentes.) Também
as cartas recebidas devem ser examinadas. Depois de três dias de conclave, se a
eleição não se consumou, os eleitores são castigados por um rigoroso jejum. Nos
cinco dias seguintes recebem apenas um prato no almoço e no jantar. Se depois
de cinco dias a eleição não aconteceu, eles recebem apenas pão, água e vinho.
Este cardápio deve durar até que a eleição seja feita.
(Era rigor demais, principalmente porque
muitos cardeais tinham idade avançada. O papa Clemente VI permitiu melhorar o
cardápio: um prato de peixe, ovos, queijo, ervas cruas. Mas nada de especial,
além disso).
Nenhum cardeal podia receber a porção dada
aos mais idosos. Além disso, cada um devia comer separado, em sua cela.
Enquanto durar o conclave, nenhum cardeal
pode tocar no cofre da Igreja, nas entradas e doações feitas. O camerlengo deve
recebê-las e entregar ao futuro papa.
Durante o conclave nenhum cardeal pode
ocupar-se de outro assunto senão a eleição do papa. Exceção se houver uma causa
urgente ou perigo para a Igreja.
Durante o conclave os cardeais perdem sua
jurisdição. Não podem atender às causas e processos de seus tribunais. Não
podem assinar nenhum documento, conceder favores, nem atender nenhuma
solicitação.
Todos os cargos são suspensos com a morte do
papa. Os pedidos e súplicas que chegam à Dataria Apostólica de qualquer parte
do mundo, não podem ser examinadas, nem mesmo abertas. São conservadas intactas
e entregues ao futuro papa.
O cardeal chefe (camerlengo) só pode exercer
funções e despesas ligadas ao conclave. Se um cardeal não estiver participando
do conclave, ou precisar sair por motivo de doença manifesta, a eleição será
realizada sem ele.
Se o papa morre fora da cidade onde mora, os
cardeais farão o conclave numa cidade do mesmo território onde ele morreu, caso
a cidade não esteja interditada por revolta contra a Igreja. Nesse caso os
cardeais se reúnem na cidade mais próxima.
Os magistrados e chefes da cidade onde é
feita a eleição, devem prestar juramento de observar as regras do conclave. O
juramento é feito na presença do clero e do povo. Se não observarem o juramento
ficam excomungados ipso facto (automaticamente). Perdem todos os direitos e
privilégios concedidos pela Igreja Romana. Sua cidade será interditada e
privada de sua Sede episcopal.
Os cardeais, em assunto tão importante como é
a eleição papal, devem esquecer todo interesse pessoal, e inspirar-se
unicamente no interesse superior da Igreja. Qualquer pacto, convenção ou
contrato, mesmo sob juramento, com a intenção de eleger alguém para o Supremo
Pontificado, realizados de modo antecipado, são proibidos sob pena de
excomunhão, e declarados nulos. Toda eleição realizada com simonia, compra de
votos, é declarada nula.
Se alguém for eleito desta forma, mesmo que
tenha a unanimidade dos votos, o que parece impossível, deve ser deposto como
herege, até do cardinalato. Ficará para sempre impossibilitado de receber
qualquer cargo ou benefício eclesiástico.
Sua eleição não poderá de modo algum ser
realizada posteriormente, nem pela entronização, nem pela coroação, nem pelo
juramento de obediência dos cardeais, nem por prescrição com o correr dos anos.
Pelo contrário, todos, clérigos e leigos devem recusar obediência ao intruso.
(Esta norma foi confirmada posteriormente por vários papas e pelo 4º Concílio
do Latrão, 1512.)
TENTATIVAS
CONTRA ESSAS NORMAS
O papa Adriano V, 1276, procurou modificar e
abolir as regras de Gregório X, mas não teve tempo. Morreu após 40 dias de
pontificado. Também o papa João XXI quis abolir essas leis, e igualmente foi
surpreendido pela morte. Apesar das novas leis, começaram novamente os costumes
anteriores. Houve longos períodos de vacância na Sé de Pedro: 7 meses, 6 meses,
2 meses, 2 anos. O papa Celestino V, um santo, promulgou três Bulas,
restabelecendo o conclave, 1294. O mesmo fez seu sucessor Bonifácio VIII.
DOIS TERÇOS
DOS VOTOS
Para a eleição eram necessários dois terços
dos votos. Ninguém podia votar em si mesmo. Cada cardeal colocava o seu nome
num lado da cédula, e o nome do eleito do outro lado. Os cardeais doentes
recebiam em seu quarto a visita de três cardeais e três escrutinadores para
indicar seu voto.
LUGAR
DO CONCLAVE
Durante quatro séculos, depois do Grande
Cisma do Ocidente, com a eleição de Martinho V no Concílio de Constança, 1417,
todos os conclaves foram realizados em Roma, com exceção de Pio VII. Os dois
primeiros, após o Cisma, foram realizados no convento dos Dominicanos, de
Minerva. O dormitório comum dos frades foi dividido em repartições com biombos,
para as celas dos cardeais. Na porta do dormitório colocaram uma placa:
Memorial. Aqui foram feitos dois papas: Eugênio IV e Nicolau V.
Todos os outros conclaves , desde o século
XIV ao XVIII, foram feitos no Vaticano. Para esse fim se construíram
repartições móveis, desmontáveis, tornando fácil as obras antes e depois do
conclave. Cada cela tinha cerca de cinco metros de comprimento, por quatro de
largura. No tempo do papa Pio VII o conclave foi realizado no Quirinal, mais
espaçoso, oferecendo mais conforto para os cardeais idosos. É preciso lembrar
que, além dos 50 a
60 cardeais, havia seus secretários, dois ou três, um ou outro criado, além de
médicos. Além destes, os sacristães, confessores, mestres de cerimônia.
GENTE
DE FORA
A eleição de um papa sempre despertou a
atenção e também interesse. Reis e príncipes, principalmente em séculos
passados, tinham seus interesses ligados ao papa. Quase sempre procuravam
influenciar a eleição. Tinham nomes de sua preferência para o papa, e também
nomes que desejavam fossem descartados. Exerciam essa influência por meio dos
cardeais de seus países.
Mas era difícil qualquer cardeal formar
maioria em favor de seu país, por causa do grande número de participantes no
conclave. Por esta razão a influência era quase nula.
Mas os chefes de Estado procuravam fazer
conhecer a seus cardeais o nome de seus desafetos. Os cardeais, em geral,
tomavam conhecimento dessa vontade dos chefes de Estado, França, Áustria,
Espanha. A Itália não se interessava por esse tipo de exclusão. A Alemanha,
luterana, menos ainda. Chamavam a isso ·direito de exclusão·. Mas esse direito
não tinha força para invalidar uma eleição. Em um século, a Áustria foi o pais
que mais procurou exercer seu direito de exclusão. Em todos os conclaves,
durante 100 anos, a Áustria sempre apresentou os nomes de seus cardeais
antipáticos
padre Rômulo
Cândido de Souza, C.Ss.R.
Abaixo , 3 vídeos em espanhol, feitos a propósito do último Conclave que elegeu Bento XVI. É pena que, ao comentar os conclaves do século XIX, tenham omitido quase todos eles, especialmente o de Pio IX
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