segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Quem tirou o Brasil do encalhe?

Imaginemos um pequeno conto, como tantos outros criados pelos autores de histórias de ficção. Havia um navio que estava meio encalhado, um tanto avariado e mais ou menos desgovernado por causa de imperícias e desmandos das tripulações que lhe dirigiam. Certo dia, inesperadamente, o navio começou a desencalhar e a navegar tranquilamente em mar alto. Os passageiros comemoraram, a tripulação ficou eufórica e surgiu a indagação: de quem foi o feito, a obra magistral de manobra e de perícia que salvou todos daquela situação? Havia um novo comandante e lá de cima da cabine de comando veio o grito: foi o comandante! A tripulação logo fez eco àquele grito e anunciou a todos os passageiros que o comandante era um homem muito experimentado e habilidoso, a ponto de livrar a embarcação daquele encalhe. A euforia tomou conta de todos e logo estavam carregando o homem nos braços e o saudando com vivas e aclamações.
Mas, uma criança lembrou-se de olhar por cima do tombadilho e verificar que a maré havia subido, pois a água já estava prestes a cobrir a mureta do cais. Não era necessária muita experiência para verificar tal evento: bastava lembrar-se que antes de entrar no navio havia pisado em chão limpo e agora a água batia violentamente no alto da mureta do cais. Logo o grito do menino fez-se ouvir: vejam como a água do mar subiu, está quase cobrindo a parede! E um passageiro diz para o outro: ora, se o mar subiu o navio teria que subir com ele e se desencalhar – como é que o comandante está dizendo que foi ele o responsável pelo desencalhe? Tentou espalhar sua versão, mas logo teve sua voz abafada por uma equipe de marujos, dizendo que houve uma pequena colaboração do mar, mas que o principal responsável teria sido mesmo o novo comandante. E não adiantou explicar a todos o óbvio porque era tal a credibilidade dada agora ao comandante que quase ninguém acreditava mais na força do mar, mas sim no perito do timão. E a festa foi total e durou até o comandante passar o timão para outro...
Esta pequena história foi imaginada por causa de um fato ocorrido em São Paulo, noticiado pelo jornal “Folha de São Paulo”. Ironicamente o jornal noticia o evento com a seguinte manchete: “Doutor em Lulismo”. É que o senador do PT Aloísio Mercadante conseguiu ser aprovado em tese de doutorado por uma banca examinadora de Economia da Unicamp, sem unanimidade, com vários reparos ao seu discurso. Qual a razão? Muito simples: em vez do aluno se ater aos princípios da economia, simplesmente ocupou a maior parte de seu tempo em elogiar e bajular o governo, seu partido e o presidente Lula. Seria natural que o fizesse num debate, como membro que é do partido e do governo. Mas é contra as normas da ética, beirando o fanatismo, fazer tais defesas numa tese de doutorado. Especialmente se baseando em dados falsos e mentirosos do próprio governo, que se elogia a si e não reconhece nenhuma falha em sua administração.
Muito judiciosamente, um dos examinadores, o economista Delfim Neto, comentou que o governo diz que é o responsável pelo crescimento do Brasil da mesma forma que um comandante dissesse que o navio subiu não porque a maré está alta, mas por que ele soube manobrar. Foi este comentário do ex-ministro que me levou a imaginar a pequena história acima. E não se parece com a situação do Brasil atual? O mesmo diga-se da China, que está crescendo não porque o regime comunista promove tal desenvolvimento mas porque houve um movimento mundial de empresários bilionários levando pra lá suas indústrias e seus investimentos. O governo comunista, pelo contrário, atrapalha. Aqui o governo não é comunista, mas dirigido por um partido de cunho socialista e contrário à riqueza e ao capitalismo: como é que poderia facilitar ou alimentar o desenvolvimento econômico? Então o Brasil cresceu não por causa do governo Lula, mas apesar dele: apesar das taxas de juros mais altas do mundo; apesar dos impostos mais altos do globo; apesar dos escândalos envolvendo autoridades do governo; apesar do descaso para com a saúde e segurança, quando amargamos os maiores índices de violência e criminalidade; pois bem, apesar de tudo isso (e poderiam ser alinhados tantos outros pesares), crescemos e continuamos a crescer, muito menos do que cresceríamos se o governo fosse outro, mas crescemos.

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