sábado, 23 de julho de 2016

O ÁPICE DE OURO DA CRIAÇÃO




(COMENTÁRIOS DE DR. PLÍNIO CORRÊA DE OLIVEIRA SOBRE A SANTÍSSIMA VIRGEM MARIA)

Entre o Padre Eterno e a criação existe o Homem-Deus: inteiramente Deus, como as outras Pessoas da Santíssima Trindade e tão homem quanto cada um dos descendentes de Adão.
Resta, contudo, um tal abismo separando Nosso Senhor Jesus Cristo das demais criaturas, que a pergunta se impõe: na ordem das coisas não deveria haver um outro ser que, ao menos de algum modo, preenchesse esse hiato?
Ora, a criatura chamada a completar esse vácuo no conjunto da criação, a criatura excelsa, infinitamente inferior a Deus, mas ao mesmo tempo insondavelmente superior a todos os Anjos e a todos os homens de todas as épocas – é precisamente Nossa Senhora.
A Virgem Santíssima é, para Deus Padre, a mais eleita das criaturas, escolhida por Ele, desde toda a eternidade, para ser a Esposa de Deus Espírito Santo e a Mãe de Deus Filho. Para estar á altura dessa dignidade, Maria havia de ser a ponta de pirâmide de toda a criação, acima dos próprios Anjos, elevada a uma inimaginável plenitude de glória, de perfeição e de santidade.
Compreende-se. Sendo Mãe de Jesus Cristo, Ela foi verdadeiramente Esposa do Divino Espírito Santo. E não poderia corresponder a tão elevada prerrogativa se não fosse maior do que o maior dos Anjos. Assim, Ela, mera criatura humana, é mais perfeita e mais santa do que toda a coorte angélica, e incomparável com qualquer outro ser.

Elo de ouro entre Deus e os homens

Por causa disso, Dante Alighieri, o grande poeta italiano da Renascença, na sua “Divina Comédia” (que alguns dizem ser a Suma Teológica de São Tomás de Aquino posta em verso), registra de modo emocionante o momento em que encontra a Santíssima Virgem no Céu.
Após ter passado pelo Inferno e pelo Purgatório, ele percorre os vários círculos dos bem-aventurados, até chegar no mais alto coro angélico, ou seja, no píncaro da mansão celeste, onde começa a divisar a glória de Deus. É uma luz difusa, que seus olhos não conseguem sustentar. Ele repara então num outro ser que está acima dos Anjos. Nossa Senhora. A Virgem Santíssima lhe sorri, e Dante contempla nos olhos d’Ela o reflexo da luz incriada da Eterna Majestade.
Acabou-se a “Divina Comédia”.
Depois de a pessoa ter posto os olhos nos olhos virginais de Nossa Senhora, não tem mais nada que contemplar, senão a Deus, face a face. Pois o olhar humano fitou o olhar puríssimo, o olhar sacralíssimo, o olhar sumamente régio, o olhar indizivelmente materno de Nossa Senhora. Tudo está consumado: a “Divina Comédia” termina na mais alta das cogitações que pode alcançar um filho de Eva.
Nossa Senhora é o grampo de ouro – ou de um metal ainda mais precioso – que une a Nosso Senhor Jesus Cristo toda a criação, da qual Ela é o ápice e a suprema beleza.

Papel único na salvação das almas

Embora a maternidade divina, por si só, já granjeasse a Nossa Senhora o título de primeira das criaturas, para tanto não deixam de concorrer também as demais prerrogativas, virtudes e dons com que a Santíssima Trindade A enriqueceu, assim como todos os excelentíssimos méritos que Ela obteve em sua vida terrena, pela prática constante e crescente de um indizível amor a Deus, de uma incansável caridade para com o próximo.
Dizem os teólogos que do alto da Cruz, Nosso Senhor, cuja inteligência era infinita, conhecida todos os homens pelos quais Ele estava derramando seu preciosíssimo sangue. E que Ele via a cada um dos pecados que esses homens cometeriam até o fim do mundo, sofria por todos eles e, ao mesmo tempo, imolava sua vida para que os homens se salvassem e atingissem a bem-aventurança eterna.
Ora, unida de modo indissociável a seu Divino Filho, compartilhando com Ele todas as duas dores inenarráveis e, por isso mesmo, Co-Redentora do gênero humano, a Santíssima Virgem também nos conheceu a cada um de nós naquela ocasião. Para que a compaixão d’Ela fosse completa, Ela sofreu por nós com Jesus, e rezou pela remissão de cada um de nós, pedindo ao Redentor pelas almas de todos os seus filhos.
De maneira tal que, naquela hora em que o Verbo Encarnado antevia a multidão de pecados que se desprendia da história ao longo dos séculos, Ela suplicava o perdão para cada homem, e Ele os dia perdoando em atenção aos rogos de sua Mãe amantíssima. Somente Ela, sendo inocente, poderia nos merecer a indulgência que nós, pecadores, não merecemos.
E aí vemos o papel de Maria, ápice de toda a ordem da criação, como nossa Mãe e nossa Advogada.
Mãe de Cristo, Ela é Mãe de todos aqueles que nasceram para a graça do Filho de Deus.  Mãe d’Ele, tornou-se Mãe dos homens, e Mãe particularmente solícita dos pobres pecadores. Nessa qualidade Ela desempenha um papel que, de algum modo, o próprio Deus não poderia desempenhar. Porque Deus é Juiz e, uma vez ofendido, ultrajado, no rigor de sua justiça infinitamente perfeita, Ele tem de castigar. Porém, Maria é a Mãe, e todos sabemos que as mães não se arrogam o papel de julgar. Antes, são de modo natural as advogadas dos filhos. E por mais miserável que seja um destes, mais imundo, mais asqueroso, mais crápula, até mesmo em relação à própria mãe, ela o perdoa e pede ao pai que o perdoe também. Ela está solidária com o filho, ainda quando o pai o abomine por inteiro.
Assim é Nossa Senhora, a Mãe supremamente boa que reza por todos e cada um de nós. Ela, considerando que aquelas chagas abertas no santíssimo corpo de seu Divino Filho foram feias em parte por meus pecados, suplicou-Lhe: “Meu Deus, meu Filho, pela minha inocência, pela minha virgindade, pelo amor que Vós sabeis que Vos tenho, rogo-Vos por ele. E essa ferida que sofreis por causa dele, peço-Vos, em nome dessa dor, que tenhais toda a clemência para com ele”.
E dessa forma cada um de nós foi perdoado. Então, por meio de Nossa Senhora Deus veio a nós no seu Nascimento na Gruta de Belém; por meio de Nossa Senhora, nós viemos a Deus no momento da Cruz, na hora da Paixão, nos sofrimentos da Redenção e no alto do Calvário.

Divina Protetora que jamais nos abandona

Essa compaixão e esse  desvelo de Nossa Senhora, longe de esmorecerem com a morte de Jesus, redobraram e cresceram em intensidade, em desejo de abarcar o coração de todos os seus filhos, de levar a todas as almas os méritos infinitos da imolação regeneradora do Verbo Divino. Por isso, Ela continuou a ser a grande intercessora, a grande intermediária que nunca dos nuncas abandonou nenhuma espécie de homem.
A Santíssima Virgem reúne os Apóstolos depois que Nosso Senhor expirou no madeiro; agrupa-os, ainda, quando o Salvador parte para o Céu; Nossa Senhora está junto deles, no Pentecostes, quando vem o Espírito Santo; Ela acompanha a Igreja nos primeiros passos de sua vida e depois, ao longo de toda a sua existência, Maria é a suprema protetora da Santa Igreja Católica Apostólica Romana.
Nossa Senhora esteve sempre presente nas batalhas que os católicos têm travado no volver da história, em defesa dos mais valiosos interesses da Fé. Ela se encontra presente nas lutas incessantes de cada homem contra seus defeitos, de maneira que, noite e dia, enquanto combatemos nossas imperfeições, nossos vícios e mazelas morais, enquanto nos esforçamos para adquirir maiores virtudes, ainda que não nos lembremos de Nossa Senhora, Ela está se lembrando de nós no alto do Céu. E está pedindo por nós, com uma misericórdia que nenhuma forma de pecado pode esgotar.
Com inteira propriedade, Ela é chamada pela Igreja de “Porta do Céu”. É por essa porta que todas as orações e súplicas  dos homens chegam a Deus; e é também por essa porta que todas as graças e favores de Deus baixam do alto para os homens. Tudo vai ao Senhor, e tudo nos vem, por intermédio de nossa Mãe, Rainha e  Medianeira Universal, Maria Santíssima.
Basta nos voltarmos para Ele, que seremos atendidos com uma profusão de bondade e de misericórdia inimagináveis. Nossa Senhora nos atende e nos limpa a alma, nos dá forças para praticarmos a virtude e nos transforma de pecadores em homens justos. Nunca nos faltará ânimo e vigor para praticar a Lei de Deus, desde que, cheios de esperança e filial devoção, o peçamos à Santíssima Virgem. Os que se voltam a Ela, tudo recebem d’Aquela que tudo pode.

(Extraído da revista “Dr. Plínio”, nº 43, outubro de 2001)




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