Vamos falar aqui sobre a virtude da Esperança, mas ela não poderia
existir sem as outras virtudes teologais, a Fé e a Caridade.. A Esperança se
sobressai no nosso cotidiano porque é necessária ao cumprimento das promessas
divinas, embora não possa existir sem as outras duas.
A definição está no “Livro da Confiança”, citando São Tomás de Aquino :
a Confiança é uma Esperança fortalecida por sólida convicção. Lá também se diz
que a esperança comum perde-se pelo desespero, tolerando apenas certa
inquietação.
Segundo a Escolástica, “a Esperança é como uma fagulha dos bens futuros
na mente”... trata-se de “uma certa memória das alegrias invisíveis, que no
coração do homem aquece interiormente seus lugares mais escondidos e não
permite que se seque pelo frio da infidelidade no inverno do mundo presente. E
enquanto a esperança viver em nossa mente, nunca se secará a árvore da
sabedoria”.
Temos aí, então, a memória como parte importante na prática das
virtudes, pois é nela que se alimenta a Esperança. Só se espera por aquilo que
imaginamos para o futuro, e em geral só se espera em paz pelo gozo de bens
celestes. Ora, estes bens celestes, a Salvação eterna, não estariam presentes
na memória humana se Deus não houvesse de antemão falado deles, seja através
das Escrituras ou da Doutrina Cristã.
Mas de nada adiantaria Deus haver falado à alma humana de tais bens
celestes se o homem não os houvesse acolhido em seu coração, amado-os e
guardado-os na memória.
Na ordem prática, a Confiança é uma virtude
que fortalece a alma nos fatos imediatos, enquanto a Esperança nos futuros.
Quando São Pedro afundava no lago, Nosso Senhor disse: “confiança, por que
duvidais?” Mas quando era necessário manter os Apóstolos mais firmes na Fé, de
forma mais duradoura, Ele lhes anunciava o Reino de Deus como algo para o
futuro, e falando das promessas de vida eterna (também futura),
alimentando-lhes a virtude da Esperança; “o meu Reino não é deste mundo”, etc.
E assim sempre foi: a Divina Providência
conforta e fortalece as almas com a Confiança no o dia a dia de cada uma:
“vejam os pássaros que não guardam no celeiro; vejam os lírios do campo”, etc.,
foi uma lição para que se tivesse Confiança na Providência Divina, que nunca
falta em nossas necessidades mais urgentes. No entanto, quando se tratava de
preparar as almas para a paciente ascese das virtudes ao longo de toda a vida,
Ela lembrava o Reino de Deus, a Ressurreição, o Juízo Final, a vida eterna, a
glória futura, e com isto fomentava a virtude da Esperança.
Os milagres, de forma geral, são feitos para
animar os cristãos na Confiança, pois eles ocorrem sempre para suprir uma
necessidade de momento, corrigir um defeito ou um aleijo, com vistas ao
fortalecimento da Fé. Já o apostolado com a pregação da Doutrina, a formação
espiritual e a ascese, prepara a alma para a Esperança nos bens futuros (mesmo
que não estejam visíveis e palpáveis no presente) e assim alimenta uma Fé mais
robusta. Talvez esta seja uma das razões pelas quais são poucos os milagres em
nossos dias, quer dizer, aqueles mais palpáveis e vistos de forma mais
retumbantes sobre a natureza, enquanto que são mais comuns os milagres ocultos
da Graça que nos preparam para os dias futuros, alimentando-nos na
Esperança.
De outro lado, a Esperança nos anima aos bens
espirituais superiores àqueles aspirados pela Confiança, pois enquanto esta
confia na obtenção de favores e graças em geral caducos e momentâneos (embora
nos fortaleça a Fé), a Esperança nos faz aguardar pacientemente os bens da
eternidade: a vida futura, uma boa morte, a Ressurreição, a implantação do
Reino de Maria aqui na terra, etc. Embora quem espera também confia, pois estas
virtudes se interpenetram, agem conjuntamente em nossa alma: não nos esqueçamos
que a Confiança é um tipo de Esperança.
É desta forma que se compreende que a
Providência tenha nos preparado cruzes tão profundas, as quais, no dizer de São
Luís Grignion de Montfort, são mais pesadas e mais profundas que o mar. Como é
que criaturas tão fracas podem suportar cruzes tão pesadas e permanecer fiéis?
É que, ao mesmo tempo em que nos dias que correm a Providência parece nos
abandonar e nos entregar à solidão, ao desamparo, nos inspira no interior da
alma a virtude da Esperança, pela qual a alma espera, aguarda, com paciência e
resignação, a transformação de tudo, da Igreja e da sociedade, com os castigos
previstos em Fátima e, depois, a vitória do Imaculado Coração de Maria e implantação
do Reino de Maria sempre presentes em nossos horizontes como algo prestes a
acontecer, como os acontecimentos do futuro. Enquanto a Esperança nos anima
para as coisas futuras, aparentemente sufocando no presente os anseios da
Confiança, nossa alma se fortalece com o exercício de uma Fé mais pura, livre
de consolações e entregue nas mãos da Providência Divina.
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