Um exemplo bem marcante da educação
religiosa que recebiam as jovens no decorrer do século XIX, principalmente
aquelas de elevada posição, tivemos na Imperatriz Leopoldina. Não se trata de
uma educação dada no Brasil, mas na culta e católica Áustria. No entanto,
espelha a realidade de uma época, que se refletiria futuramente também entre
nós. A arquiduquesa Leopoldina casou-se com Dom Pedro I e veio morar no Brasil,
transformando-se na saudosa e querida Imperatriz. Após o seu falecimento foi
encontrado entre seus pertences um livrinho de percalina vermelha com bordas de
ouro, onde se lê os propósitos que ela, ainda noiva, fizera para sua futura
vida de casada. O livrinho foi escrito em francês, contendo ainda a seguinte
nota em alemão:
"Do dia 13 de maio, meu dia de
casamento, em diante proponho-me:
1o. Reprimir a minha
veemência, ser boa para com o meu pessoal a fim de acostumar-me à brandura e
condescendência.
2o. Quero evitar todo
pensamento menos casto, pois deste dia em diante pertenço ao meu marido.
3o. Quero esforçar-me com
zelo por trabalhar no meu aperfeiçoamento.
4o. Quero aplicar todos os
esforços para falar sempre a verdade".
Lembrai-vos! - Que tendes um deus a glorificar,
Jesus a imitar e vossa alma a salvar (S. Mateus, XXII, 37-40).
1. Procurarei ter sempre uma hora
determinada para me levantar e para me deitar, evitando o excesso de
sensualidade durante o repouso.
2. Desde o despertar o meu primeiro
pensamento será a lembrança da presença de Deus; minhas primeiras palavras
serão: Ó Santíssima e adorável Trindade! Eu vos dou meu coração e minha alma,
eu Vos adoro com todos os coros dos Anjos. Ó Jesus! Meu Salvador! Tende piedade de mim! Minha
primeira ação será o sinal da cruz, que farei então desta maneira: em nome do
Pai, que me criou à Sua Imagem, e do Filho, que me remiu com seu sangue
precioso, e do Espírito Santo, que me tem santificado.
3. Para começar o dia com um ato de
mortificação me levantarei prontamente e convencida de estar inteiramente
diante de Deus, vestir-me-ei com toda a modéstia possível. Se estiver fraca de
saúde que eu não possa me levantar rápido, ocupar-me-ei dos santos exercícios
de um cristão, que deve começar seu dia santamente.
4. Tomando água benta, que terei sempre
em meu quarto, por-me-ei de joelhos perante meu crucifixo, e penetrada da
presença de Deus rezarei com fervor minha oração matinal.
5. Farei todas as manhãs uma meditação
sobre uma leitura espiritual.
6. Assistirei à Missa com modéstia e
piedade exemplares, comungando sempre, nem que seja espiritualmente.
7. Após meus exercícios de piedade
empregarei o resto do tempo em observar os deveres de meu estado, e dos
cuidados que a ele estão ligados. Nada de despesas inúteis que desorganizam a
economia; mas da esmola farei tanto quanto possível; me reservarei daquilo que for frívolo para
poder socorrer melhor os infelizes.
8. Farei muitas vezes atos de fé, de
esperança e de caridade. Formarei sempre em meu coração tais sentimentos: Ó meu Deus! Penetrada de Vossa infinita
Majestade eu Vos adoro com os santos Anjos, que rodeiam Vosso trono.
Jesus! Meu Salvador! Uno-me a Vós em
todas as minhas ações.
9. Aproveitarei todas as ocasiões, que
se me apresentarem, para fazer atos de humildade, e mortificações exteriores e
interiores. Me esforçarei do mesmo modo, no que for possível, para adorar Jesus
Cristo
10. Farei minhas orações da noite como
as da manhã, diante de uma imagem do Crucificado e da Santíssima Virgem, as
quais terei sempre no meu quarto, e aí acrescentarei o exame especial de minha
conduta do dia. Mudando a roupa modestamente na presença de Deus terminarei o
dia com estas palavras: "Ó meu Jesus crucificado. Recebei-me
Às sextas e sábados farei pequenas
mortificações, como de me privar de qualquer coisa na refeição, ou de guardar o
silêncio durante algum tempo ou de privar de uma distração; entretanto, sem que ninguém note. Farei tais coisas
para me lembrar particularmente daqueles dias da Santa Paixão de Nosso Senhor,
e para me preparar melhor para comemorar os Domingos.
Para lhes santificar evitarei tudo que
possa lhes profanar; assistirei ao ofício divino e ao sermão com toda
edificação, dedicando mais tempo à meditação e à leitura espiritual, sobretudo
ao cumprir minha devoção. Abster-me-ei nos dias de festas de todos os prazeres,
espetáculos, festins, etc., que possam profanar estes santos dias ou impedir sua
santificação. Não negligenciarei as
obrigações que assumi como membro da Ordem da cruz estrelada[1],
e observarei no que for possível os estatutos que são prescritos a todos os
membros.
Terminarei o último dia do ano com uma
revisão geral de minha conduta; farei com ardor a preparação para a morte
segundo orientação de meu Diretor de consciência, e lerei de novo minhas
resoluções para gravá-las mais tempo no coração e no espírito.
1. Conservarei no meu coração as boas
instruções que tenho recebido de meus parentes e das pessoas encarregadas de
minha educação.
2. Terei sempre que for possível um
confessor, ao qual obedecerei com exatidão e que o consultarei sempre nas
coisas que concernem a minha salvação.
3. Evitarei todas as leituras que sejam
contrárias à minha Santa Religião, que ferem a delicadeza da consciência e que
excitem à sensualidade ou uma paixão qualquer.
4. Jamais o respeito humano me impedirá
de me declarar abertamente pela Santa Religião Católica; empregarei, ao contrário, todos meus esforços
e todas minhas rendas supérfluas para a propagar, para construir ou decorar as
igrejas, sobretudo para sustentar os Institutos que se consagrem á educação da
juventude ou que faça profissão de assistir os necessitados.
5. Meu coração será eternamente fechado
ao espírito perverso do mundo; assim, bem longe de mim os gastos inúteis, o
luxo nocivo, os adornos indecentes e as mundanidades e vestimentas
escandalosas. Minha virtude tão necessária será sempre a modéstia para
conservar a pureza de meu coração, sem a qual jamais agradarei a Deus.
6. Não me cansarei de combater minhas
paixões, começando pela dominante, e para lhes destruir mais rápido voltarei
contra elas todas as armas espirituais: a vigilância sobre meu coração e sobre
meus sentidos, o exame quotidiano, a contrição e a penitência depois de cada
queda, a leitura, a meditação, a freqüência usual ao Santíssimo Sacramento, as
orações fervorosas, enfim, a invocação dos santos, que se destacaram na virtude
oposta ao vício que quero destruir.
7. Principiarei todas as ações na presença de
Deus, unindo-as às de Jesus Cristo, mesmo aquelas que me sejam agradáveis, como
o beber e o comer, o repouso, as recreações e divertimentos. Vigiarei que a
sensualidade e o amor próprio não me roubem o mérito, mas que seja santificado
por coisas sobrenaturais.
8. Na conversação falarei com muita
prudência, para não falar muito, e para não ficar calada, que possa ferir a
verdade, a caridade, e a modéstia; e se outros começarem conversas contrárias a
essas virtudes, que não possa evitar ou impedir, eu farei ao menos com meu
olhar um imperioso respeito, e pelo silêncio o desprazer que tenho nisso.
9. Lembrar-me-ei sobretudo das
promessas que fiz no dia de meu casamento perante a Igreja e das obrigações ali
contraídas. Guardarei inviolavelmente a fidelidade devida a meu marido e
evitarei todas as familiaridades com as pessoas de outro sexo. Deus me guarde
de estar jamais a sós com outro homem, por mais sábio que pareça, num local
ermo; não terei amigos que não sejam pessoas virtuosas.
10. Se a Providência me favorecer
dando-me filhos, eu lhes protegerei como uma dádiva preciosa do céu, que Deus
cobrará um dia de minhas mãos. Terei cuidado de lhes dar uma educação muito
cristã, e longe de fazer qualquer frivolidade em suas presenças tratarei de
lhes imprimir o respeito que os filhos devem a seus pais.
11. Nenhuma familiaridade com meus
domésticos; mas lhes tratarei com clemência, e, dando-lhes bom exemplo,
exortando-os á virtude, em lhes reprimir todas as ocasiões criminosas, tratarei
de salvar ou de santificar minha casa.
12. Considerarei sempre a mentira como
a obra-prima do diabo, e como uma peste na sociedade. Eu me guardarei de sentir-me culpável. Se
Deus pede uma conta rigorosa de cada palavra que é proferida, quanto mais das
mentiras.
13. Longe de mim todo ar de grandeza e
de altivez; mas serei grave e modesta para todos, honesta, doce, afável, e
polida com os grandes e os pequenos.
14. Aceitarei todas as penas e aflições
da mão de Deus, unindo-as aos sofrimentos de Jesus Cristo; não comentando isto
a não ser a Jesus e a meu confessor.
15. Jamais falarei demasiado em meu
proveito, ou daquele que me olha, e se alguém me elogiar eu lhe reportarei a
Deus, bem persuadida que todos os bens da natureza e da graça que tenho
recebido, mesmo aqueles da fortuna, se me pertencem não vêm senão dEle, e que,
no fundo, eu tenho de nascimento o pecado e as más inclinações.
16. Todos os momentos da vida dados
para minha salvação eu lhes empregarei segundo as vias de Deus. Assim, longe de mim os vestidos escandalosos
e longos, visitas perniciosas e inúteis.
Terei os divertimentos convenientes á minha idade; nunca terei o gozo
das maneiras que me sejam nocivas, mas somente para descansar meu espírito e
meu corpo, a fim de lhes deixar mais capazes de servir a Deus com mais ardor.
Todo o resto do tempo será reservado às ocupações úteis. Minha piedade não será
pouco sociável nem sombria, mas grave e agradável. Eis aí, Jesus Cristo, meu
divino Senhor, as resoluções que Vós me destes a graça de me inspirar. Eu Vos
ofereço com meu coração. Abençoai e concedei-me os socorros necessários para
lhes colocar em prática. Assim seja". [2]
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