Santa Catarina de Sena teve várias visões em
que ouvia a voz de Deus Pai. Numa delas ouviu o seguinte sobre o pecado da
carne:
"Depois de haver expandido aquela alma
um pouco seu coração com as palavras sobre a misericórdia, esperava
humildemente que lhe fosse cumprida a promessa.
Depois tomou novamente a palavra e disse:
- Filha queridíssima, tens apelado para minha
misericórdia em minha presença, porque te a dei a provar e entender por minhas
palavras ao dizer-te: "Estes são aqueles pelos quais vos peço que
rezeis"; porém tem por certo que,
sem comparação, é maior minha misericórdia para convosco do que possas
compreender. Como tua compreensão é imperfeita e finita, e minha misericórdia é
perfeita e infinita, a comparação que se pode estabelecer não é senão entre o
finito e o infinito.
Desejei que saboreasses esta misericórdia e a
dignidade do homem para que conheças melhor a crueldade e a indignidade dos
pecadores, que vão pelo caminho de baixo. Abre os olhos de tua inteligência e
olha aos que voluntariamente se afogam e quanta indignidade têm caído por seus
pecados.
Primeiramente caíram enfermos. Sucedeu que,
quando conceberam o pecado mortal em suas mentes, o levaram depois à prática e
perderam a vida da graça.
Como o morto, que não pode empreender movimento
algum nem por si mesmo se move, senão por outro, assim estes, afogados no rio
do amor desordenado do mundo, encontraram-se mortos para a graça. Por estar
mortos, a memória não tem conservado o recordo de minha misericórdia, os olhos
do entendimento não viram nem conheceram a verdade, quer dizer, seu
entendimento não teve ante si mais que a si mesmos e o amor a seus próprios
sentidos. Por isto, sua vontade encontrou-se morta para minha vontade e não
amou mais que coisas mortas.
Ao achar-se mortas as três potências, todas
suas obras, temporais e espirituais, estão mortas perante a graça, e já não
podem se defender de seus inimigos nem socorrer-se a si mesmos senão enquanto
são ajudados por mim. É certo que cada vez que algum se acha morto e me pede
ajuda, pode obtê-la; porém nunca por si mesmo enquanto está no corpo, no qual
não há ficado mais que a liberdade.
Se há feito insuportável a si mesmo, e,
querendo dominar o mundo, é dominado pelo que é negativo, quer dizer, pelo
pecado. O pecado é o nada, e eles se fazem seus escravos.
Eu lhes fiz árvores de amor pela vida da
graça que receberam pelo santo batismo, e eles se têm convertido em árvores de
morte, porque se acham mortos.
Sabes onde tem suas raízes esta árvore? Na
presunção da soberba, alimentada pelo mesmo amor-próprio sensitivo. Sua medula
é a impaciência, e sua filha, a indiscrição. .
Estes são os quatro vícios principais que matam a alma daqueles que
disse que eram árvore de morte, pois têm tirado dela a vida da graça.
Dentro desta árvore se alimenta o verme da
consciência, o qual, enquanto o homem vive em pecado mortal, está cego pelo
amor-próprio, e, portanto, não se lhe sente muito. Os frutos desta árvore são
mortais, porque seu jugo tem saído da raiz da soberba. A miserável alma
encontra-se cheia de ingratidão, donde procede todo mal. Se fosse agradecida
aos benefícios recebidos, Me conheceria, e, ao conhecer-Me, se conheceria a si
mesma e permaneceria em meu amor. Porém ela, como cega, vai se apegando mais à
corrente e não vê que a água não espera por ela.
O pecado da carne
"Os frutos desta árvore são tão variados
como o são os pecados. Algumas pessoas não vêem que são frutos próprios para
animais: são os que vivem na imundície, fazendo com sua carne e com seu
espírito o mesmo que o porco, que se revolve na lama da carnalidade. É tal sua
miséria, que nem os suporto Eu, suma Pureza, nem os demônios, de quem se têm
feito seus amigos e escravos, que não podem ver cometer tanta imundície. Oh
alma embrutecida! Onde deixastes tua dignidade? Eras irmão dos anjos, e te hás
convertido numa besta!
Não há pecado tão abominável e que prive o
homem tanto da luz do entendimento como este. Isto o compreenderam os
filósofos, não pela luz da graça, que não tinham, senão que a luz natural os
iluminou, quer dizer, lhes dizia que este pecado cega o entendimento. Por isso
guardavam continência, para dedicar-se melhor ao estudo, e até deitavam de si
as riquezas, para que as preocupações por elas não lhes enchesse o coração. Não
faz assim o falso cristão, ignorante, que tem perdido a graça por sua culpa. ("Obras
de Santa Catalina de Siena" - BAC-
págs. 110/112.)
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