Pioneira da
virgindade consagrada
Prossegue Anchieta:
“Ele
foi o primeiro a ensinar-te a pureza:
com
tal mestre tens vida, espírito e carne ilesa,
a
fim de ao mundo encher fecunda virgindade,
e
ser honra do céu casta fecundidade.
Primeira,
em sendo oculta, és magnífica guia
Primeira
a ir ao céu por desusada via.
Primeira
entre espinhais a abrir largo caminho,
A
palmilhar locais, cheios de horror maninho.
Primeira
que por senda escabrosa se atreve
Dura
rocha a calcar com alvos pés de neve.
Primeira
a dominar, por escarpas estranhas,
Os
brancos alcantis intactos das montanhas.
Pões
no alto, qual bandeira, o pudor, que se eleve
Mais
fulgente que o sol, mais cândido que a neve.
A
senda, áspera há pouco, é suave demanda;
Aquela
que foi dura é por teus passos branda.
Já
turmas virginais seguir-te-ão as pegadas,
E
à bandeira da luz hão de correr ousadas.
Muito
homem e mulher atarão com um voto,
Seguindo
teu exemplo, o coração devoto.
Ó
tu, mestra e raiz da pureza guardada,
Da
honestidade mãe, da virgindade estrada,
Noiva,
glória da terra e fulgor das alturas,
Modelo
de virtude, ápice d’almas puras,
Agradece-te
o céu, pois na argila que a veste
A
terra, por teus pés, chega ao candor celeste.
Agradece-te
a terra: embebendo-a em costumes
Do
céu, se faz capaz dos teus celestes cumes”
[1]
Perfeita virgindade
que traz como prêmio a maternidade divina
“Sobre essa admirável prerrogativa mariana, ouçamos
o comentário do Pe. Henry Bolo:
“Em Maria, veremos nascer, sustentar-se e se
desenvolver a mais perfeita, a mais ideal virgindade. Antes de tudo, um
primeiro dom de Deus que suprime, na Imaculada Conceição, todo movimento de
concupiscência, toda tendência corrompida.
Depois, a colaboração da vontade de Maria que, escolhendo o templo por
asilo, e o serviço exclusivo de Deus por função, demonstra-nos a celestial
conduta de seu coração e de seu espírito, e nos assegura de que, nEla, a alma
não contradiz a integridade da carne, que Ela é tão incomparavelmente pura na
intimidade da consciência quanto na inalterável calma de seus sentidos,
proclamados “bem-aventurados” pela Igreja (Off. Virg. Sep. Dolor.)
“Enfim, o coroamento, o complemento de sua
virgindade, manifestou-se no seu diálogo com o Anjo, quando Ela se perturba com
o pensamento de se tornar mãe, e externa o motivo pelo qual não pode nem deseja
sê-lo (Lc 1, 34).
“Mas então que fará Deus? Como se comportará Ele em
relação a uma criatura que apresenta aos seus olhos o espetáculo de uma pureza
mais intensa que a angélica, posto que esta imaculada pureza floresce na carne,
e tira sua sublimidade da própria fragilidade do vaso que a contém? Que fará
Ele por essa maravilhosa criatura, da qual Bossuet pôde dizer que nada, entre
os espíritos angélicos, é comparável à simples pureza de seu corpo? (...) Que
fará Ele, portanto?
“Para o supremo grau de pureza, Ele também se dará
num grau supremo. Criará, entre Ele e sua inigualável e pudica escrava, o mais
estreito vínculo, o liame único e incomparável. E se Lhe é necessário
encarnar-se, se Lhe importa pedir a uma criatura a carne e o sangue de que será
feita sua vestimenta mortal, em outros termos, se Ele deve ter nesta Terra uma
mãe, esta será a Virgem singular, a Virgem das virgens, a Santa Virgem.
“E de qualquer lado que se considere, esta
associação da virgindade e da maternidade divina em Maria se impõe pela própria
natureza das coisas. Cumpre que a Virgem perfeita se torne mãe de Deus, porque
sua união com Ele deve ser a mais íntima possível. A mãe de Deus deve ser perfeita, para ser digna
de uma tão grande honra.
“Assim, o grande milagre está menos, talvez, na
associação desses dois estados: a virgindade perfeita e a maternidade divina –
que não são compatíveis senão na aparência e aos olhos de nossa profunda
ignorância – do que na criação de uma virgindade tão perfeita quanto a de
Maria, e de uma maternidade tão sublime quanto a maternidade divina.
“Mas, a partir do momento, ó Maria, em que “o Senhor é convosco” para Vos fazer tão
pura, é menos espantoso, embora mais admirável, que “o Senhor esteja convosco” como Filho, e que Vós estejais com Ele,
como Mãe. É vossa incorruptibilidade que permitiu à sua graça de estabelecer,
entre Ele e Vós, esta inenarrável união”. [2]
A pureza de Nossa
Senhora sobrepujou a dos Santos Anjos
“Que é toda a beleza deste mundo visível comparada
com a do invisível? Que é toda a formosura dos corpos diante da dos espíritos
angélicos, senão uma estrela comparada com o sol?” [3]
“Tal é a excelsitude dos Anjos, que o próprio São
Bernardo confessa sua incapacidade de exaltar a “admirável dignidade”
daqueles: “Que dirá um simples mortal a
homens mortais, de coisas que nem ele consegue expressar, nem estes entender? Na
verdade, se a boca fala da abundância do coração, é preciso igualmente que cale
a língua quando há escassez de pensamentos...”
“Entretanto, São Francisco de Sales nos apresenta
Maria muito acima dos Anjos, por ser Ela puríssima: “A virgindade e a absoluta
castidade são virtudes angélicas; a
pureza de Nossa Senhora sobrepujou infinitamente à dos Anjos, com três grandes
excelências sobre a dos próprios Querubins e Serafins.
• Por sua
fecundidade
“A virgindade de Nossa Senhora teve a excelência e o
privilégio, acima da de todos os Anjos, de ser fecunda. A dos Anjos é estéril e
não ter fecundidade; a de nossa gloriosíssima Virgem, pelo contrário, foi muito
fecunda, não somente por haver produzido o doce fruto da vida, Nosso Senhor e
Mestre, mas também por ter engendrado a outras virgens, que, à sua imitação,
consagraram sua castidade.
“Porém, a virgindade destra divina Mãe tem, ademais, a
virtude de restabelecer a virgindade manchada ou perdida em algum momento da
vida. A Sagrada Escritura atesta que durante seu tempo mortal, Nossa Senhora
chamou a si grande quantidade de virgens e que várias A acompanharam por toda a
parte: Santa Marta, Santa Marcelina, as piedosas Marias e tantas outras. Mas
particularmente, por sua mediação e exemplo, Maria Madalena, que era como que
o receptáculo da própria imundície,
alistou-se sob o estandarte da pureza da Santíssima Virgem, convertendo-se num
frasco de cristal resplandecente e diáfano, capaz de receber e guardar os mais
preciosos licores e as mais salutares águas.
“A virgindade de nossa divina Mestra não é, pois,
estéril, como a dos Anjos; é tão
fecunda, que desde o instante em que se consagrou a Deus, até agora, deu sempre
novos frutos. E não só Ela mesma frutifica, ma faz com que a virgindade, por si
mesma, engendre outras virgindades.
(...)
•Por ter sido
consagrada a Deus
“A virgindade de Nossa Senhora excedeu à dos Anjos; estes são puros e castos por natureza, e não
se costuma louvar uma pessoa o que tem por herança, pois não sendo produto de
um esforço, não merece homenagens. Não se exalta o sol porque é luminoso, já
que não pode deixar de sê-lo. Os Anjos não devem ser enaltecidos por sua
castidade, pois não podem ser de outra maneira. Porém, nossa sacratíssima Mãe
tem uma virgindade digna de ser exaltada, posto que foi escolhida entre todas e
consagrada a Deus. E se é certo que esteve desposada com um homem, isto não foi
em detrimento de sua virgindade, pois seu marido permaneceu puro e havia, como
a Santíssima Virgem, feito voto de sê-lo sempre. (...)
•Por ter sido
provada
“A virgindade de Nossa Senhora superou à dos Anjos,
porque foi combatida e posta à prova, o que não pode ocorrer com os espíritos
celestiais, que não podem de modo algum perder sua pureza, nem têm oportunidade
de que seja perturbada nem provada. Nosso glorioso padre Santo Agostinho disse,
falando dos Anjos: “Não vos é difícil ser
puros, ó espíritos bem-aventurados, pois não sois tentados nem podeis sê-lo!”
“Talvez pareça estranho o que digo, de que a pureza
de Nossa Senhora foi combatida e posta à prova;
porém assim o é. Nem pretendo afirmar que esta prova se assemelhe às
nossas, pois sendo Ela toda pura e a própria pureza, não podia receber os
ataques que recebemos, e que atormentam aos que levamos a tentação em nós
mesmos. Estas não se atreveriam a aproximar-se dos inexpugnáveis muros da
integridade de Maria. Elas são tão importunas, que São Paulo pediu por três
vezes a Nosso Senhor que lhas afastasse, ou que moderasse seu furor até ao
ponto em que pudesse resistir a elas, sem ofensa nem queda.
“Seja como for, a Santíssima Virgem sofreu uma
prova quando viu o Anjo em forma humana.
Podemos deduzi-lo do fato de que Ela se perturbou à vista de São
Gabriel, que, percebendo isso, disse-Lhe:
“Não temas, Maria”, querendo significar: “Embora me vejas em forma de homem, não o sou, nem venho a falar-te
como homem”. Isto Lhe disse, ao ver que o pudor virginal de Nossa Senhora
começava a se inquietar.
“O pudor – escreve um santo personagem – é como o
sacristão da castidade”. Assim como o
sacristão de uma igreja toma o cuidado de fechar bem as portas, temeroso de que
entrem ladrões a despojar os altares, e olha sempre por toda a parte para
observar se algo falta, assim o pudor das virgens está constantemente alerta,
para impedir que alguém possa atentar contra sua castidade ou pôr em perigo sua
virgindade, das quais são extremamente zelosas. E quando percebe a mais leve sombra
do mal, comove-se e se perturba, como o fez a augusta Virgem Maria, (...) a
Virgem por excelência, acima de todos os demais, tanto anjos como homens.
Os Anjos admiram a
virgindade de Maria
“Também segundo São Boaventura, Nossa Senhora
excede em pureza aos Anjos, “por isso eles mesmos exclamam, admirados, no
Cântico dos Cânticos: “Quem é esta, que sobe do deserto? – ou
seja, através da hierarquia arqui-angélica, que foi abandonada pelos anjos
apóstatas -, “como uma coluna formada de
perfumes”, porquanto Ela é purificadora; “de mirra”, porque isenta de toda impureza; “e de incenso”, porque limpa de toda iniqüidade”.
“São Tomás de Villanueva proclama:
“O que é maravilhoso na Virgem, e engrandece
sobremaneira à sabedoria do Altíssimo, é que uma filha de Adão, semelhante pela
natureza ás outras mulheres, não só se assemelhe, mas sobrepuje aos espíritos
angélicos em pureza, formosura, graça e valor.
(...) Maravilha estupenda e admirável
obra do Excelso: uma donzela, filha de Adão, é mais pura, mais bela e mais
sublime que os próprios Anjos!”
Pureza que mereceu a
Redenção do mundo
“Assim – conclui São João Eudes – podemos compreender a relevante pureza desta inigualável Virgem, em cuja comparação qualquer outra pureza é como se não existisse. (...) Conservou-se Maria numa pureza e santidade tão eminentes que mereceu, disse Santo Anselmo, a reparação do mundo. Eis aqui as palavras deste santo Padre: “A puríssima santidade e a santíssima pureza do puríssimo coração de Maria superam incomparavelmente a todas as purezas e santidades de todas as criaturas. Mereceu, por esta admirável pureza de seu coração virginal, ser a digníssima reparadora do mundo que se encontrava imerso no mais profundo abismo de perdição”. [4]
(Extraído
de “A FELICIDADE ATRAVÉS DA CASTIDADE”, Continuação do capítulo 5, págs.138/143.
Desejando receber o texto integral desta obra, favor enviar mensagem para o
email juracuca@gmail.com – Juraci Josino Cavalcante)
[1] Poema da Bem-Aventurada
Virgem Maria, Mãe de Deus – Pe. José de Anchieta – Ed. Loyola – pág. 201
[2] Pequeno Oficio da Imaculada
Conceição Comentado – João S. Clá Dias -
págs. 272 e 274
[3] Frei Luís de Granada – “Guia
de Pecadores" - Editorial Simancas Ediciones
[4] Pequeno Ofício da Imaculada
Conceição Comentado – João Clá S. Dias – págs. 280/283
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