terça-feira, 11 de outubro de 2022

A VIRGEM MARIA SANTÍSSIMA, MODELO CASTÍSSIMO DE PUREZA (III)

 



 

 

Pioneira da virgindade consagrada

Prossegue Anchieta:

“Ele foi o primeiro a ensinar-te a pureza:

com tal mestre tens vida, espírito e carne ilesa,

a fim de ao mundo encher fecunda virgindade,

e ser honra do céu casta fecundidade.

Primeira, em sendo oculta, és magnífica guia

Primeira a ir ao céu por desusada via.

Primeira entre espinhais a abrir largo caminho,

A palmilhar locais, cheios de horror maninho.

Primeira que por senda escabrosa se atreve

Dura rocha a calcar com alvos pés de neve.

Primeira a dominar, por escarpas estranhas,

Os brancos alcantis intactos das montanhas.

Pões no alto, qual bandeira, o pudor, que se eleve

Mais fulgente que o sol, mais cândido que a neve.

A senda, áspera há pouco, é suave demanda;

Aquela que foi dura é por teus passos branda.

Já turmas virginais seguir-te-ão as pegadas,

E à bandeira da luz hão de correr ousadas.

Muito homem e mulher atarão com um voto,

Seguindo teu exemplo, o coração devoto.

Ó tu, mestra e raiz da pureza guardada,

Da honestidade mãe, da virgindade estrada,

Noiva, glória da terra e fulgor das alturas,

Modelo de virtude, ápice d’almas puras,

Agradece-te o céu, pois na argila que a veste

A terra, por teus pés, chega ao candor celeste.

Agradece-te a terra: embebendo-a em costumes

Do céu, se faz capaz dos teus celestes cumes”  [1]

 

Perfeita virgindade que traz como prêmio a maternidade divina

“Sobre essa admirável prerrogativa mariana, ouçamos o comentário do Pe. Henry Bolo:

“Em Maria, veremos nascer, sustentar-se e se desenvolver a mais perfeita, a mais ideal virgindade. Antes de tudo, um primeiro dom de Deus que suprime, na Imaculada Conceição, todo movimento de concupiscência, toda tendência corrompida.  Depois, a colaboração da vontade de Maria que, escolhendo o templo por asilo, e o serviço exclusivo de Deus por função, demonstra-nos a celestial conduta de seu coração e de seu espírito, e nos assegura de que, nEla, a alma não contradiz a integridade da carne, que Ela é tão incomparavelmente pura na intimidade da consciência quanto na inalterável calma de seus sentidos, proclamados “bem-aventurados” pela Igreja (Off. Virg. Sep. Dolor.)

“Enfim, o coroamento, o complemento de sua virgindade, manifestou-se no seu diálogo com o Anjo, quando Ela se perturba com o pensamento de se tornar mãe, e externa o motivo pelo qual não pode nem deseja sê-lo  (Lc 1, 34).

“Mas então que fará Deus? Como se comportará Ele em relação a uma criatura que apresenta aos seus olhos o espetáculo de uma pureza mais intensa que a angélica, posto que esta imaculada pureza floresce na carne, e tira sua sublimidade da própria fragilidade do vaso que a contém? Que fará Ele por essa maravilhosa criatura, da qual Bossuet pôde dizer que nada, entre os espíritos angélicos, é comparável à simples pureza de seu corpo?  (...)           Que fará Ele, portanto?

“Para o supremo grau de pureza, Ele também se dará num grau supremo. Criará, entre Ele e sua inigualável e pudica escrava, o mais estreito vínculo, o liame único e incomparável. E se Lhe é necessário encarnar-se, se Lhe importa pedir a uma criatura a carne e o sangue de que será feita sua vestimenta mortal, em outros termos, se Ele deve ter nesta Terra uma mãe, esta será a Virgem singular, a Virgem das virgens, a Santa Virgem.

“E de qualquer lado que se considere, esta associação da virgindade e da maternidade divina em Maria se impõe pela própria natureza das coisas. Cumpre que a Virgem perfeita se torne mãe de Deus, porque sua união com Ele deve ser a mais íntima possível.   A mãe de Deus deve ser perfeita, para ser digna de uma tão grande honra.

“Assim, o grande milagre está menos, talvez, na associação desses dois estados: a virgindade perfeita e a maternidade divina – que não são compatíveis senão na aparência e aos olhos de nossa profunda ignorância – do que na criação de uma virgindade tão perfeita quanto a de Maria, e de uma maternidade tão sublime quanto a maternidade divina.

“Mas, a partir do momento, ó Maria, em que “o Senhor é convosco” para Vos fazer tão pura, é menos espantoso, embora mais admirável, que “o Senhor esteja convosco” como Filho, e que Vós estejais com Ele, como Mãe. É vossa incorruptibilidade que permitiu à sua graça de estabelecer, entre Ele e Vós, esta inenarrável união”. [2] 

 

A pureza de Nossa Senhora sobrepujou a dos Santos Anjos

“Que é toda a beleza deste mundo visível comparada com a do invisível? Que é toda a formosura dos corpos diante da dos espíritos angélicos, senão uma estrela comparada com o sol?” [3]

“Tal é a excelsitude dos Anjos, que o próprio São Bernardo confessa sua incapacidade de exaltar a “admirável dignidade” daqueles:  “Que dirá um simples mortal a homens mortais, de coisas que nem ele consegue expressar, nem estes entender? Na verdade, se a boca fala da abundância do coração, é preciso igualmente que cale a língua quando há escassez de pensamentos...”

“Entretanto, São Francisco de Sales nos apresenta Maria muito acima dos Anjos, por ser Ela puríssima: “A virgindade e a absoluta castidade são virtudes angélicas;  a pureza de Nossa Senhora sobrepujou infinitamente à dos Anjos, com três grandes excelências sobre a dos próprios Querubins e Serafins.

Por sua fecundidade

“A virgindade de Nossa Senhora teve a excelência e o privilégio, acima da de todos os Anjos, de ser fecunda. A dos Anjos é estéril e não ter fecundidade; a de nossa gloriosíssima Virgem, pelo contrário, foi muito fecunda, não somente por haver produzido o doce fruto da vida, Nosso Senhor e Mestre, mas também por ter engendrado a outras virgens, que, à sua imitação, consagraram sua castidade.

“Porém, a virgindade destra divina Mãe tem, ademais, a virtude de restabelecer a virgindade manchada ou perdida em algum momento da vida. A Sagrada Escritura atesta que durante seu tempo mortal, Nossa Senhora chamou a si grande quantidade de virgens e que várias A acompanharam por toda a parte: Santa Marta, Santa Marcelina, as piedosas Marias e tantas outras. Mas particularmente, por sua mediação e exemplo, Maria Madalena, que era como que o  receptáculo da própria imundície, alistou-se sob o estandarte da pureza da Santíssima Virgem, convertendo-se num frasco de cristal resplandecente e diáfano, capaz de receber e guardar os mais preciosos licores e as mais salutares águas.

“A virgindade de nossa divina Mestra não é, pois, estéril, como a dos Anjos;  é tão fecunda, que desde o instante em que se consagrou a Deus, até agora, deu sempre novos frutos. E não só Ela mesma frutifica, ma faz com que a virgindade, por si mesma, engendre outras virgindades.  (...)

Por ter sido consagrada a Deus

“A virgindade de Nossa Senhora excedeu à dos Anjos;  estes são puros e castos por natureza, e não se costuma louvar uma pessoa o que tem por herança, pois não sendo produto de um esforço, não merece homenagens. Não se exalta o sol porque é luminoso, já que não pode deixar de sê-lo. Os Anjos não devem ser enaltecidos por sua castidade, pois não podem ser de outra maneira. Porém, nossa sacratíssima Mãe tem uma virgindade digna de ser exaltada, posto que foi escolhida entre todas e consagrada a Deus. E se é certo que esteve desposada com um homem, isto não foi em detrimento de sua virgindade, pois seu marido permaneceu puro e havia, como a Santíssima Virgem, feito voto de sê-lo sempre.  (...)

Por ter sido provada

“A virgindade de Nossa Senhora superou à dos Anjos, porque foi combatida e posta à prova, o que não pode ocorrer com os espíritos celestiais, que não podem de modo algum perder sua pureza, nem têm oportunidade de que seja perturbada nem provada. Nosso glorioso padre Santo Agostinho disse, falando dos Anjos: “Não vos é difícil ser puros, ó espíritos bem-aventurados, pois não sois tentados nem podeis sê-lo!”  

“Talvez pareça estranho o que digo, de que a pureza de Nossa Senhora foi combatida e posta à prova;  porém assim o é. Nem pretendo afirmar que esta prova se assemelhe às nossas, pois sendo Ela toda pura e a própria pureza, não podia receber os ataques que recebemos, e que atormentam aos que levamos a tentação em nós mesmos. Estas não se atreveriam a aproximar-se dos inexpugnáveis muros da integridade de Maria. Elas são tão importunas, que São Paulo pediu por três vezes a Nosso Senhor que lhas afastasse, ou que moderasse seu furor até ao ponto em que pudesse resistir a elas, sem ofensa nem queda.

“Seja como for, a Santíssima Virgem sofreu uma prova quando viu o Anjo em forma humana.  Podemos deduzi-lo do fato de que Ela se perturbou à vista de São Gabriel, que, percebendo isso, disse-Lhe:  Não temas, Maria”,  querendo significar: “Embora me vejas em forma de homem, não o sou, nem venho a falar-te como homem”. Isto Lhe disse, ao ver que o pudor virginal de Nossa Senhora começava a se inquietar.

“O pudor – escreve um santo personagem – é como o sacristão da castidade”.  Assim como o sacristão de uma igreja toma o cuidado de fechar bem as portas, temeroso de que entrem ladrões a despojar os altares, e olha sempre por toda a parte para observar se algo falta, assim o pudor das virgens está constantemente alerta, para impedir que alguém possa atentar contra sua castidade ou pôr em perigo sua virgindade, das quais são extremamente zelosas. E quando percebe a mais leve sombra do mal, comove-se e se perturba, como o fez a augusta Virgem Maria, (...) a Virgem por excelência, acima de todos os demais, tanto anjos como homens.

 

Os Anjos admiram a virgindade de Maria

“Também segundo São Boaventura, Nossa Senhora excede em pureza aos Anjos, “por isso eles mesmos exclamam, admirados, no Cântico dos Cânticos:  “Quem é esta, que sobe do deserto? – ou seja, através da hierarquia arqui-angélica, que foi abandonada pelos anjos apóstatas -, “como uma coluna formada de perfumes”, porquanto Ela é purificadora; “de mirra”, porque isenta de toda impureza; “e de incenso”, porque limpa de toda iniqüidade”.

“São Tomás de Villanueva proclama:

“O que é maravilhoso na Virgem, e engrandece sobremaneira à sabedoria do Altíssimo, é que uma filha de Adão, semelhante pela natureza ás outras mulheres, não só se assemelhe, mas sobrepuje aos espíritos angélicos em pureza, formosura, graça e valor.  (...) Maravilha estupenda e admirável obra do Excelso: uma donzela, filha de Adão, é mais pura, mais bela e mais sublime que os próprios Anjos!”

 

Pureza que mereceu a Redenção do mundo

“Assim – conclui São João Eudes – podemos compreender a relevante pureza desta inigualável Virgem, em cuja comparação qualquer outra pureza é como se não existisse.  (...) Conservou-se Maria numa pureza e santidade tão eminentes que mereceu, disse Santo Anselmo, a reparação do mundo. Eis aqui as palavras deste santo Padre: “A puríssima santidade e a santíssima pureza do puríssimo coração de Maria superam incomparavelmente a todas as purezas e santidades de todas as criaturas. Mereceu, por esta admirável pureza de seu coração virginal, ser a digníssima reparadora do mundo que se encontrava imerso no mais profundo abismo de perdição”.  [4]

 

(Extraído de “A FELICIDADE ATRAVÉS DA CASTIDADE”, Continuação do capítulo 5, págs.138/143. Desejando receber o texto integral desta obra, favor enviar mensagem para o email juracuca@gmail.com – Juraci Josino Cavalcante)



[1] Poema da Bem-Aventurada Virgem Maria, Mãe de Deus – Pe. José de Anchieta – Ed. Loyola – pág. 201

[2] Pequeno Oficio da Imaculada Conceição Comentado – João S. Clá Dias -   págs. 272 e 274

[3] Frei Luís de Granada – “Guia de Pecadores" - Editorial Simancas Ediciones

[4] Pequeno Ofício da Imaculada Conceição Comentado – João Clá S. Dias – págs. 280/283


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