O que é fascínio? Trata-se de uma atração.
Não uma atração qualquer, mas um chamamento muito forte para determinada coisa,
tão forte que se torna irresistível. Para tal atração se torna difícil resistir
dado sua força de empuxe. Trata-se portanto de uma atração irresistível.
São Tomás disse que os símiles se alegram,
se atraem (“Similis simili gaudet”) e em decorrência os opostos se repelem.
Quer dizer que esta atração só é possível entre as pessoas que tenham alguma
similaridade. Só funciona entre os bons, ou que possuam algo de bondade; ou
entre os maus, ou que possuam algo de maldade. Mas o bom não fascina o mau, nem
o mau fascina o bom, a não ser de uma forma imperceptível.
E toda atração supõe que haja uma inclinação
preexistente. Inclinar-se é pender para determinada coisa. Como todos os homens
possuem inclinações tanto para o bem quanto para o mal, o fascínio poderá
exercer sua influência para um e outro a depender das inclinações recônditas da
alma de cada um.
Assim, o homem se fascina pela música, pela
dança, pela tecnologia, pelo gozo da vida, pela vida paradisíaca e é ao mesmo
tempo atraído fortemente por todas estas coisas. a televisão, por exemplo, exerce um fascínio impressionante
sobe as pessoas, a tal ponto que praticamente inebria seus espectadores.
Existem pessoas que se fascinam pela sensualidade, pelo liberalismo extremado,
pelo socialismo igualitário, outras pelo deboche, pela irreverência, etc. Há
sempre um ponto de inclinação para onde as pessoas podem se fascinar.
Verificamos assim que as coisas
revolucionárias aparentemente fascinam hoje mais fortemente do que as da Contra-Revolução.
Elas adquiriram um poder de conquista no senso comum das pessoas, no modo de
julgar o bom e o apetecível. De outro lado as coisas da Contra-Revolução
tendem, por sua natureza, a se tornar árduas, insípidas e inapetecíveis. Para
que a Contra-Revolução se defina e se propague ela terá que usar recursos pouco
revolucionários, e hoje pouco fascinadores por si mesmos, como folhetos,
livros, conferências, teatros, músicas clássicas, etc. Destes recursos alguns
podem fascinar mais do que outros, mas eventualmente, e não todo o sempre.
O fascínio pessoal
Não há recurso de fascinação mais forte e eficiente
do que as pessoas. O porte humano, a educação, a bondade, a circunspecção, o
modo de falar, o modo de se vestir. Se fosse possível a um revolucionário
fascinar os maus ele o faria por causa de seus cabelos desgrenhados, seu olhar
sanguinolento, sua roupa esfarrapada e suja; o Contra-Revolucionário, pelo contrário, fascina os bons por causa de
seu cabelo bem penteado, seu olhar casto, sua roupa limpa e decente. Se uma
pessoa leva diversas outras a caminhar mais em direção da Revolução por causa
de maus atributos pessoais, falta de educação, rispidez, indiscrição, etc., o Contra-Revolucionário levará para o
campo oposto as pessoas que gostam de bons atributos, boa educação, finura de
espírito, discrição em tudo.
Agora, se nós tivermos um grupo de pessoas que
congregam as mesmas qualidades e espelham o mesmo espírito, elas conseguirão
fascinar muito mais fortemente para si os demais atuando em conjunto do que
agindo isoladamente. Um façanhudo revolucionário da França de 1789, ou mesmo um
bolchevista de 1917, impressionavam mais pelo aspecto intimidador, causavam
medo e terror, e "atraíam" mais pela força bruta. Um grupo de tais
revolucionários em ação multiplica este predomínio intimidador. Esta
“fascinação” é falsa. Por isso é que a
Revolução optou pela tática de fascinar pelo engodo, pelo orador labioso, pela
música, pelo romantismo, pelo cinema, pela mídia encantadora e pela TV.
Para que os Contra-Revolucionários
consigam fascinar eles terão que agir em grupo e fazer com que seu grupo se
apresente na sociedade todo inteiro, manifestando-se com todas as suas boas
qualidades e demonstrando uma coesão esplendorosa de seus atributos, de seu
espírito, de sua maneira de ser. E os recursos utilizados para isto podem ser
todos aqueles meios lícitos de se mostrar ao público: pela música, pela oração,
pelo modo de se apresentar, pelos cerimoniais, etc.
O fim último: o amor a Deus
O fim último do fascínio deve ser o amor a Deus.
Deus manifesta o Seu amor às criaturas fascinando-as. Se a Revolução fascina
para afastar as pessoas do amor a Deus, a Contra-Revolução
deve ter como fim último levar todos à prática deste amor. Mas para isto não é suficiente
fazer conferências, pregar doutrinas e princípios. Basta que as doutrinas e
princípios sejam coerentemente vividos pelos Contra-Revolucionários que as pessoas se sentirão atraídas
fortemente, isto é, fascinados naquela direção. É intuitivo.
Não basta somente ensinar o que é a bondade,
o que é a gentileza, o que é o cavalheirismo, a ortodoxia e a coerência de
princípios doutrinários. Basta que nos modos, no linguajar, no vestir, na
música, em todo o nosso ser, pratiquemos a bondade, a gentileza, sejamos
cavalheiros e vivamos coerentemente de acordo com a doutrina e os princípios que
defendemos, de dia e de noite, a todo o momento. As pessoas vão ver e se
fascinar, dizendo: que maravilhoso! que beleza! fenomenal!
Primeiro
passo: o maravilhamento, uma graça externa
O fascínio atrai, como se disse,
irresistivelmente, como que arrasta as pessoas em determinada direção. Mas o
primeiro passo para isso é causar maravilhamento. Um centurião romano, São Pacômio, quando
ainda era pagão voltava da guerra e teve que acampar com seus soldados próximos
a uma localidade de cristãos. Tal foi o seu maravilhamento vendo o procedimento
dos cristãos que pediu para ser um deles, tornando-se depois não só cristão,
mas mártir e santo.
São Francisco de Sales diz que
esta graça externa, que nós chamamos de maravilhamento, é um impulso ou comoção
provocado por Deus nos corações das pessoas para excitá-los ao bem. E desta
forma “como um vento sagrado, nos impele para a atmosfera do santo amor, move a
vontade, e pela impressão de um certo gozo celeste (pode ser um flash?),
enternece-a, dilatando e desenvolvendo a inclinação natural que ela tem para o
bem, de forma que esta mesma inclinação lhe sirva de meio para prender o nosso
espírito; e tudo isto, como já disse, se faz “em nós e sem nós”, porque é a
graça divina que nos precede desta maneira”.[1]
Para que se cause tal maravilhamento é
necessário um desdobramento de si mesmo, um crescimento, uma ascese tal, que
somente um milagre para que possamos chegar a tal ponto. Mas aquilo que não
conseguimos fazer sozinhos, isolados, poderemos atingir juntos, é claro que por
uma graça divina toda especial dada por Nossa Senhora. E é tal a unção, o
enlevo, o ar celestial que orvalha quando os Contra-Revolucionários estão juntos que irremediavelmente os outros
se maravilharão. Poderão se maravilhar por causa dos rostos, das roupas, das
vozes, das etiquetas ou até mesmo por verem o quanto sofrem abnegada e
desinteressadamente, ou ouvindo falar sobre a cruz e as durezas da vida. Depois de se maravilhar, caminhar juntos.
Diferença entre fascínio e admiração ou maravilhamento
O
fascínio é uma atração, é o pender para determinado objetivo ou pessoa, é o
caminhar irresistível em direção ao objeto de dileção. A admiração é apenas o
pasmo, a contemplação enlevada pelo mesmo objeto, pessoa, ou algo que lhe digam
respeito. O maravilhamento é a admiração cheia de entusiasmo. Assim, alguém pode admirar mas permanecer
estático e não ir ao encontro do objeto que contempla. Alguém pode admirar, por
exemplo, a sinceridade de um seu inimigo. Isso ocorria até entre inimigos em
guerra, como se conta o caso de um muçulmano que ordenou receber bem os
soldados de São Fernando em frente a seu castelo porque o admirava como homem
bravo e leal.
Ocorreu também
com muitos adversários do Senhor Dr. Plínio Corrêa de Oliveira, que era
admirado até por seus inimigos, mas nenhum deles fascinou, ou se fascinou pelo Dr.
Plinio, pôs-se logo em movimento o “anti-fascínio” para não mudar de
comportamento. Fascinado, ele teria que ceder interiormente e se inclinar para
o seu adversário, que é o primeiro passo para a conversão. Num segundo passo
esta pessoa deve se entusiasmar e se maravilhar, mas somente o fascínio a fará
acordar e caminhar em direção do objeto fascinador.
O fascínio maravilha e arrasta
Por que?
Porque o fascínio tem o condão de fazer caminhar, de atrair em direção dos
fascinadores, fazendo com que os outros desejem ser semelhantes a eles. Quando nasce o desejo vem depois a vontade e
os passos seguintes em direção da conversão. São vários passos, mas aí tudo
passa a depender da própria pessoa. Primeiro, desejar ser igual, ou pelo menos
parecer com os Contra-Revolucionários;
depois, desejar ser um deles e caminhar juntos na mesma Causa.
O
fascínio faz-nos ter um comprazimento interior em contemplar espelhado em
outrem o bem que amamos, uma espécie de gozo interior, uma alegria, um
entusiasmo por ver aquele bem sendo posto em prática.
É como se
alguém estivesse dormindo e sonhasse com algo de fantástico e maravilhoso.
Acorda e vê que aquele algo existe e está bem na sua frente. Mas para desfrutá-lo
tem que sair de sua modorra sonolenta, levantar-se e ir em busca do bem que
encontrou. Mas se achar alguém que lhe ajude a levantar-se pegando em sua mão,
sua vontade será mais fortalecida e mais decidida.
Vejamos
como São Francisco de Sales nos conta o exemplo da conversão de São Pacômio:
“São
Pacômio, quando era ainda soldado muito jovem, e sem conhecimento de Deus,
alistado sob a bandeira do exército que Constâncio levantara contra o tirano
Maxêncio, veio com o regimento a que pertencia aquartelar-se perto duma pequena
cidade, não muito distante de Tebas, onde não somente ele, mas todo o exército
se achou em extrema penúria de víveres.
Tendo
isto chegado ao conhecimento dos habitantes da pequena cidade, que por um feliz
acaso eram fiéis a Jesus Cristo, e por conseqüência amigos e caritativos para
com o próximo, imediatamente forneceram aos soldados tudo o que precisavam, mas
com tanta solicitude, urbanidade e desvelo, que Pacômio,
transportado de admiração, perguntou
que nação era aquela, tão benévola, afável
e generosa. Disseram-lhe que eram Cristãos, e inquirindo novamente sobre a
lei e maneira de viver deles, soube que acreditavam em Jesus Cristo, Filho
único de Deus, e que faziam bem a toda sorte de pessoas, com a firme esperança
de receber uma ampla recompensa no Céu. Ah! Teotimo, o pobre Pacômio, apesar de
sua boa índole, dormia ainda nesse tempo no leito da infidelidade; e eis que de
repente, Deus bate à porta do seu coração, e pelo bom exemplo daqueles cristãos,
como por uma doce voz, chama-o, acorda-o, e dá-lhe a primeira impressão do
calor vital do seu amor. Apenas ouviu
falar, como acabo de dizer, da amantíssima lei do Salvador, cheio duma nova luz
e consolação, retirou-se à parte, e refletindo algum tempo em si mesmo,
levantou as mãos ao céu, e com um profundo suspiro, exclamou: “Ó Senhor Deus, que fizestes o céu e a terra,
se vos dignardes lançar os vossos olhos sobre a minha baixeza, e sobre a minha
aflição, para me dardes o conhecimento da vossa Divindade, prometo servir-vos,
e obedecer toda a minha vida aos vossos mandamentos”. Depois desta súplica e promessa, o amor do
verdadeiro bem e da piedade tomou um tal aumento nele, que nunca mais cessou de
praticar mil e mil exercícios de virtude”.[2]
Mais
adiante São Francisco de Sales comenta: “Por certo aquele transporte de admiração que ele teve, outra coisa não
foi, senão o seu acordar, pelo qual Deus tocou, como o sol toca a terra, com um
raio de luz, que o encheu dum grande
sentimento de gozo espiritual”...[3]
Quer
dizer, São Pacônio fascinado, maravilhou-se; maravilhado encheu-se de
entusiasmo, isto é, de Deus, da graça divina; cheio de entusiasmo,
converteu-se; convertido, tornou-se santo.
Autor; Juraci Josino Cavalcante
(espero com este texto contribuir para que se possa entender
como age a opinião pública e até como conquista-la)
[1]
“Tratado do Amor de Deus”, de São Francisco de Sales”, Liv. Apostolado da
Imprensa, págs.. 104/105.
[2] Op.
Cit.
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