A castidade deve continuar na viuvez
O pai de Dom João IV, rei de Portugal, Dom Teodósio,
ao enviuvar não procurou novo casamento. O motivo: pretendia praticar a
castidade de um modo mais perfeito: através da renúncia.
Morta a Senhora Duquesa de Bragança D. Ana de
Velasco, não tornou o Duque D. Teodósio a casar, porquanto era tão amigo da
castidade, que segundo afirmam seus criados antigos, e modernos, e as pessoas
Eclesiásticas, que mais sabiam de sua vida, e costumes, em toda sua vida não
conheceu outra mulher, senão aquela com quem foi casado. Tratou de criar seus
três filhos na pureza da santa Fé Católica, e bons, e louváveis costumes,
dando-lhes por mestre o Doutor Jerônimo Soares, varão de grande prudência,
letras, e virtude, o qual se desvelou muito para que aqueles Príncipes saíssem
consumados em todos os bons costumes.
Também os mandou ensinar em algumas artes mecânicas, segundo a
inclinação de cada um, porque para Príncipes tudo isto é necessário, para sair
ao encontro às adversidades, que as mudanças do tempo costumam trazer consigo.
Foi o Duque Dom Teodósio varão de santos e louváveis costumes, e sua vida mais
parecia de um perfeito Religioso, que de Duque e Príncipe secular; todos os dias rezava o ofício divino das sete
horas canônicas; a humildade nele era natural, e tanto que se não era em um dia
de festa, e de ostentação, sempre andava vestido de um trajo ordinário, suas
palavras eram cheias de benignidade, seu semblante majestativo, porém mui
alegre; mentira nunca jamais se ouviu de sua boca. Gostava muito de tratar com pessoas consumadas em
letras, e virtude; grande aborrecedor
das vaidades do mundo, inclinado a ler livros santos e honestos; quando saía por a Quaresma a correr os santos
passos, ia descalço, e vestido todo de luto com opa de rabo, a qual levavam
três, e quatro moças da Câmara; na semana santa desde que se encerrava o
Santíssimo Sacramento, na quinta-feira até o dia de Páscoa, que se cantava a
Aleluia, não saía do côro de sua Capela, nem se deitava em cama, antes ali
estava em oração, acompanhando o Santíssimo Sacramento, o qual até o dia de
Páscoa estava encerrado com grande perfeição; no dia da Quinta-Feira de ceia,
depois da pregação do Mandato, mandava mostrar ao povo o Santo Sudário, que é o
verdadeiro lençol, em que foi amortalhado, e posto no sepulcro o corpo de nosso
Senhor Jesus Cristo. E este é o maior
morgado da Casa de Bragança; e o modo
com que se mostrava ao grande número de gentes, que naquele dia se ajuntam ali
de todas a vilas circunvizinhas, era este.
Vestia-se o Duque de luto, e descalços os pés, e seus irmãos, e filhos,
e cada um com sua tocha acesa nas mãos, iam ao oratório secreto da casa, no
qual estão muitas santas relíquias, e por um Sacerdote, o qual ordinariamente
era o Padre Jerônimo Dias seu esmoler, varão de grande virtude, mandava abrir
um cofre, forrado por fora, e por dentro de veludo negro matizado com pregaria,
e ferramenta de prata, dentro no qual estava outro cofrezinho mais pequeno, de
altura de um palmo, e quatro de comprido, também forrado de veludo negro, e com
pregaria, e ferramenta de ouro, e dali tirava o Padre o Santo Sudário, não com
poucas lágrimas, derramados por os olhos do santo Duque, e com grande
veneração, e silêncio, vinham a sair a uma janela, que cai sobre o terreiro da
porta dos Nós, a qual estava toda armada de panos de damasco negro, e dali o
mostrava o sacerdote ao povo, e eram tantas as lágrimas, soluços, e gemidos de
todo o povo, vendo a própria figura de Cristo nosso Redentor ali estampada, que
eu me não atrevo a escreve-la com a pena.
"Na quinta-feira da Ceia do Senhor lavava o
Duque os pés a doze pobres, e lhes dava de comer, servindo-os à mesa, e os
vestia com vestidos honestos; e com tanta humildade fazia este ato, que em
todos os circunstantes causava devoção, e lágrimas, originadas de compunção. No
dia da Páscoa da Ressurreição fazia o Duque uma grandiosa festa, e assoalhava
todos os ricos ornamentos Eclesiásticos, que tinha no tesouro de sua capela, e
mandava armar suas mais bizarras tapeçarias, por os lugares onde havia de
passar a procissão do Santíssimo, e não somente todos os seus capelães iam com
capas de Asperges de brocado, e tela fina, mas também era lícito, e permitido a
todos os Sacerdotes daquela Vila, os quais são muitos o entrarem na sacristia
da sua capela com suas sobrepelizes, aonde o Tesoureiro-mor os revestia a todos
com capas; acompanhavam esta procissão todos os cavaleiros das quatro Ordens
militares, que serviam a Casa de Bragança, assistentes
(Extraído
de “A Felicidade Através da Castidade”, -Págs. 287/289 – Desejando receber o
texto integral desta obra enviar mensagem para meu e.mail juracuca@gmail.com )
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