No mesmo dia de seu casamento com Eulógio, prefeito
de Nicomédia, Juliana comunicou a seu marido que, se não se fizesse cristão,
jamais consentiria em ter relações conjugais com ele, e como este lhe fizera
saber que não tinha o menor propósito de converter-se à religião cristã,
abandonou a seu esposo e retornou à casa de seus pais. O pai se negou a receber a filha,
desautorizou o que havia feito, lhe golpeou brutalmente e a conduziu novamente
ao domicilio de seu marido. Eulógio a recebeu benignamente. Depois, falando com
ela, disse-lhe:
- Minha dulcíssima Juliana, tens me
decepcionado. Por que te negas a cumprir
teus deveres matrimoniais?
Juliana lhe respondeu:
- Os cumprirei se te convertes a meu Deus; mas, se
não te convertes, não poderei considerar-te como meu esposo.
- Senhora minha - replicou Eulógio - eu não posso
fazer o que me pedes, compreende-o; se o fizesse, o imperador mandaria que me
cortassem a cabeça.
Juliana treplicou com vivacidade:
- De maneira que tu temes a teu rei, que é mortal,
e pretendes que eu não tema ao meu, que é imortal? Faz o que queres, mas tem a completa certeza de
que jamais conseguirás nada de mim enquanto persistas em tua atitude.
Após este diálogo, Eulógio, na qualidade de
prefeito, mandou que golpeassem selvagemente a sua esposa; depois ordenou que a
prendessem pelos cabelos. Durante meio dia a manteve suspensa do teto na forma
indicada e, ao longo daquelas horas, os criados, por ordem de seu senhor,
várias vezes lançaram sobre a cabeça da santa cubos de chumbo derretido.
Posteriormente, em vista de que suportava o tormento como se não recebesse dano algum, Eulógio mandou que a prendessem
com cadeias e a jogassem num calabouço.
Quando estava já recolhida na prisão, apresentou-se
ante ela o diabo, disfarçado de anjo bom, e lhe disse:
- Juliana, sou um enviado do Senhor. Ele mandou-me
que visse ver-te e me encarregou que te dissesse que deves sacrificar aos
ídolos para livrar-te dos tormentos que padeces e da horrorosa morte que pensam
dar-te.
Ao ouvir tão estranha mensagem, Juliana chorou
muito e rezou desta forma: "Senhor, meu Deus! Faz que eu saiba quem é este
que acaba de vir a ver-me; ele assegura que é um enviado teu; porém, disse-me
umas coisas tão raras!" Imediatamente ouviu uma voz que lhe dizia:
"Prende-o e obriga-o a que ele mesmo confesse quem é". Imediatamente Juliana subjugou fortemente o
misterioso emissário e lhe exigiu que se identificasse, e o que pretendeu ao
fazer-se passar por anjo do céu; declarou ele que era um demônio enviado por
seu pai para enganá-la. Então Juliana lhe perguntou:
- Dizes que foi teu pai quem te enviou; mas quem é
esse pai?
O diabo respondeu:
- Belzebu; é ele quem manda em nós e nos envia aos
cristãos para que realizemos perto deles más embaixadas; se não conseguimos
fazer-lhes cair em nossas tentações, em nosso regresso nos castiga cruelmente.
Eu tive a desgraça de que me encarregasse esta missão de confundir-te e, como
não o tenho logrado, já sei o que me espera quando regressar ao inferno.
Mais coisas disse o demônio naquela ocasião a
Juliana, entre outras esta: que era muito difícil enganar os cristãos que
ouviam missa, ou aos que rezavam ou assistiam aos sermões.
Juliana amarrou as mãos do diabo pelas costas, logo
o jogou no chão e lhe deu uma boa surra com a ponta da cadeia à qual ela mesma
havia sido presa. A cada golpe, o demônio, entre alaridos, gritava:
- Minha senhora Juliana! Tem compaixão de mim!
Nisto, por ordem do prefeito, que queria falar com
ela, tiraram a prisioneira do cárcere; porém Juliana, sem soltar ao diabo, o
levou consigo, arrastando-o como se fosse uma besta. O diabo, caminhando após
ela, cheio de vergonha, suplicava:
- Minha senhora Juliana! Não me obrigues a fazer o
ridículo desta maneira. Quem, me vendo assim, se fiará doravante em minhas
palavras? Dizem que os cristãos sois clementes; tu, no entanto, não estás tendo
clemência alguma comigo.
Depois de haver passeado com o demônio desta forma,
por ruas e praças, Juliana decidiu desfazer-se dele e o jogou numa latrina.
O prefeito, quando a prisioneira compareceu em sua
presença, ordenou que estendessem sobre uma roda e que a atormentassem, e tanto
a torturaram que lhe quebraram todos os ossos até o extremo de que o tutano dos
mesmos ficou derramado pelo chão. Em determinado momento surgiu naquele lugar
um anjo do Senhor, rompeu a roca e curou repentinamente a santa. Quantos presenciaram
este milagre se converteram ao cristianismo, a exceção do prefeito, que
permaneceu obstinado em sua infidelidade e mandou decapitar aos quinhentos
homens e cento e trinta mulheres que acabavam de converter-se. Seguidamente
ordenou que metessem Juliana numa tina cheia de chumbo derretido; porém, quando
a santa foi mergulhada no recipiente aquele espesso e abrasador líquido
transformou-se repentinamente em água transparente e morna, como a de um banho
muito agradável.
Ante este novo milagre o prefeito começou a
maldizer de seus próprios deuses e a jogar-lhes na cara que fossem incapazes de
castigar uma jovenzinha da que haviam recebido e estavam recebendo tantos
desprezos e desgostos, e, para terminar de uma vez, mandou que cortassem a
cabeça de sua esposa.
Quando levavam Juliana ao lugar designado para sua
decapitação, saiu ao encontro da comitiva um jovem, que na realidade era aquele
diabo anteriormente castigado e humilhado pela prisioneira, e, dirigindo-se aos
verdugos encarregados da execução, disse-lhes aos gritos:
- Não tenhais compaixão dela! Não a merece, porque
não tem feito mais que desacreditar constantemente de vossos deuses. A mim
mesmo, à noite passada, me açoitou sem piedade! Dai-lhe agora seu merecido!
Nisto Juliana abriu os olhos, o olhou atentamente,
e como o diabo notasse que havia sido reconhecido por ela, deitou a correr
dizendo aos gritos:
- Ai! Desgraçado de mim! Esta mulher é capaz de
prender-me outra vez e de amarrar-me e açoitar-me de novo!
Juliana morreu decapitada; porém poucos dias depois de seu martírio, indo seu marido o prefeito a bordo de um navio com outros trinta e quatro homens, se desencadeou uma forte tempestade e o navio foi a pique, e tanto eles como seus companheiros afundaram no fundo do mar e pereceram afogados; seus corpos posteriormente subiram à superfície, porém as ondas os lançaram a um litoral onde foram devorados por feras e aves de rapina.
A castidade conjugal exige também pureza na fé
O rei pediu à rainha que fosse falar com sua irmã,
pois a mesma se recusava a ter relações conjugais com seu marido.
...Regressou a rainha à corte e perguntou-lhe o
rei:
- Como hás tardado tanto em voltar?
Sua esposa lhe respondeu:
- Quando saí de casa acreditava como vós que Migdonia, minha irmã, havia cometido
uma enorme estupidez; porém convenci-me de que tem agido com grande sabedoria;
ela me pôs em contato com o apóstolo e ele me tem feito conhecer o caminho da
verdade e compreender claramente que os verdadeiros néscios são aqueles que não
creem em Cristo.
Também a rainha se negou ora em diante de ter
relações conjugais com seu esposo, o qual, assombrado até a estupefação, chamou
a seu cunhado e lhe disse:
- Por ajudar-te a recuperar a tua mulher tenho
perdido eu a minha, que se comporta comigo exatamente igual que a tua contigo.
Mandou então que fossem em busca do apóstolo e que
atado de pés e mãos o trouxessem a sua presença. Quando o teve ante si lhe
ordenou que sem perca de tempo recordasse a ambas as mulheres a obrigação que
tinham de manter vida marital com seus respectivos esposos e as exortasse que a
cumprissem. São Tomé, entretanto, respondeu ao monarca que enquanto ele e seu
cunhado persistissem no erro religioso em que viviam elas fariam muito bem em
não aceder a suas pretensões e em negar-se às relações conjugais. Para
convencer ao soberano de que a resposta que acabava de dar-lhe era razoável,
expôs-lhe três exemplos fundados, segundo ele mesmo declarou, um no próprio
rei, outro numa torre e outro numa fonte.
- Não é verdade, disse-lhe, que tu és rei, não
toleras ao teu lado servidores imundos? Não exiges uma decente limpeza aos
servos e servas que andam próximos de ti? Pois também Deus, que é mais rei que
tu, deseja e exige que quem lhe sirva se apresente a ele com decoro e
honestidade. Podes razoavelmente declarar-me culpável por pregar que o rei do
céu pede a seus servidores o mesmo que tu pedes aos teus?
- Construí uma torre muito alta. Crês que agora,
porque a ti se te agrada, vou a derrubá-la?
- Desejava tirar água, cavei nas entranhas da terra e logrei que da profundidade do abismo brotasse um manancial. Como se te ocorre pensar que agora, não mais que por tu o digas, vou obstruir essa fonte? [1]
(Extraído
de “A Felicidade Através da Castidade”, -Págs. 283/287 – Desejando receber o
texto integral desta obra enviar mensagem para meu e.mail juracuca@gmail.com )
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