SANTA CATARINA DE SENA: QUERER VIVER EM PAZ
É, MUITAS DAS VEZES, A MAIOR DAS CRUELDADES
“Santa Catarina de
Sena (1347-1380), virgem. Amou apaixonadamente a Santa Igreja. Pregou a reforma
da Igreja e a Cruzada”.
Uma santa que prega
Cruzada também parece tão contrária à caridade da “heresia branca”.
Sobre Santa
Catarina de Sena há os seguintes dados biográficos:
“A Gregório XI a
Santa fala com severidade daqueles que são caridosos e compassivos por amor
carnal, da mesma maneira que são cheios de complacência para com o próprio
corpo”.
O que significa
“caridoso e compassivo por amor carnal”? É pai, marido, mulher, filho que tem
um apego para além do razoável com os membros de sua família, é “familiosa”;
levado a não ver os defeitos dos seus parentes e a pactuar até com os defeitos
deles, imaginando-os melhores do que são por um amor que é puramente da carne,
por um amor que vem do sangue, que vem do lado físico, que não tem nada de
sobrenatural. É contra isso que ela fala. Naturalmente se aplicava muito,
naquele tempo, aos Papas, bispos - naquele tempo, hoje não... – que tinham
nepotismo e que favoreciam parentes.
“Semelhantes seres,
vendo seus subordinados caírem em pecado, fingem não o perceber...”
Esses subordinados
são os filhos e outros dependentes.
“... a fim de não
se sentirem em obrigação de castigá-los. Ou então, se os castigam, é com tanta
brandura que mais parecem passar unguento sobre o vício, pois temem sempre
desagradar alguém a provocar mais descontentamentos.”
Um Prelado que
agisse dessa maneira também entraria na mesma censura: “Oh, meus filhinhos,
quem sabe se não é inteiramente conveniente que as moças usem a saia cinco
centímetros acima do joelho. Não vos irriteis. Eu não quero dizer que tem mal
nisso, não. Eu digo, quem sabe, talvez etc.” Ou então não dizer palavra
nenhuma...
“... isso provem do
quanto eles se amam a si mesmos”.
Eu acho a
observação esplêndida, porque mostra que essas tendências todas não são
bondade, são egoísmo. É para não ter amolação.
“Querer viver em
paz é, muitas vezes, a maior das crueldades”.
Essa frase
mereceria ser escrita ao pé de uma imagem de Santa Catarina de Sena e posta
numa capela nossa, qualquer coisa assim... “Querer viver em paz é, muitas
vezes, a maior das crueldades”. Ora, o próprio da “familiosa” é querer viver em
paz. E é uma crueldade para com a família, que deveria receber admoestações
salutares, fica privada disso, afinal de contas, para que o apóstolo não sofra
nada.
“Quando o abscesso
está formado, é preciso que ele seja inciso pelo ferro e queimado pelo fogo e
se deixarmos de fazer isso para apenas tratá-lo com bálsamos, alastra em
extensão e a morte, muitas vezes, é precipitada”.
Quer dizer, é
tratar a ferro e fogo. É preciso ser inciso pelo ferro e queimado pelo fogo.
Mas é preciso dizer as coisas.
Os senhores dirão:
“Bom, Dr. Plinio, o sr. muitas vezes não recomenda prudência?” É verdade. Às
vezes interesses superiores da Causa católica recomendam prudência. Mas pelo
menos interiormente a gente deve ter esse estado de espírito. E dever sofrer
essa prudência com sumo padecimento, com suma tristeza. E não é assim: “Ah... o
Dr. Plinio recomendou prudência. Eu não vou precisar brigar com fulano de
tal... tão bonzinho! Uma vez eu suspeitei que ele tem uma concubina. Mas não
deve ser verdade, eu já nem penso mais nisso, porque ele me agrada tanto... É
meu padrinho. Me dá até um presente cada aniversário, cada Natal...”
Quanta miséria em
não querer ver as pessoas com quem a gente tem ligação carnal, como são! Qual é
o resultado disso? O mais das vezes, pelo menos, quem tem essas
condescendências para com quem não é verdadeiro católico, tem muitas
dificuldades em ser condescendente com os verdadeiros católicos. E vice-versa.
Eu conheço essa gente. Vamos dizer que a regra geral é essa. É o quê? Egoísmo,
egoísmo, egoísmo, e com a aparência de bondade...
Agora uma carta de
Santa Catarina ao cardeal Pierre d´Estaing:
“Eu desejo ver em
vós um homem de coragem. A alma que teme a opinião dos homens não atingirá
jamais a perfeição”.
Essa é outra frase
que mereceria ser escrita: a pessoa que teme a opinião dos homens jamais
alcançará a perfeição, quer dizer, jamais alcançará a santidade. É evidente.
Porque se a pessoa está de tal maneira subjugada pela opinião dos outros e tem
pavor de ser criticada por colegas, por outras coisas assim, então não tem
verdadeiro amor de Deus. É evidente.
“Tudo abala uma tal
alma; não levará avante empreendimento algum”.
Bem entendido,
empreendimento bom. Porque fugir nas horas de dificuldades para só aparecer na
hora de vitória, medos, timidezes, isso as obras de negação e de omissão, essas
de toda espécie. Obra boa de apostolado, nenhuma. Muitas vezes as pessoas
fracassam no apostolado e se perguntam porque foi. Se a gente dissesse: “Você
não tem medo do juízo dos outros? - Tenho. - Deus não abençoará sua obra,
porque quem tem medo do juízo dos outros, já coloca contra si uma condição
negativa.
“Ó, como é perigoso
esse receio!”
Receio dos outros.
“Ele paralisa os
santos anseios e pôs obstáculos à sua realização. Cega o homem a ponto de não
mais conhecer a verdade. Pois esse temor procede do amor próprio. Assim que a
criatura humana começa a amar a si mesma, dela se apodera o temor da opinião
dos outros.
“Por que receia o
homem? Porque colocou seu amor e sua esperança nas coisas frágeis, que não
repousam sobre base sólida e que passam como o vento. Ó culpável amor próprio!
Como és pernicioso aos superiores e aqueles que lhe são submetidos! Tratando-se
de um prelado, jamais (repreende) ou castiga seus subordinados, receoso de
desgostá-los. Não leva em conta nem o direito, nem a justiça, julgando segundo
seu próprio capricho ou de conformidade com o capricho das criaturas, de
maneira que aquelas que dirige mais se enraízam no erro”.
“Eu creio que seria
bom que o nosso doce Cristo na terra, o Papa, se libertasse de duas coisas que
corrompem a Esposa de Cristo: a primeira é a afeição demasiada à sua família; a
segunda é brandura excessiva baseada em desmedida indulgência”.
É uma Santa que
censura isso num Papa.
“Corrompem-se os
membros de Cristo porque ninguém os castiga. É com mão firme que precisa ser
restaurada a ordem, pois uma excessiva complacência constitui, por vezes, a
maior das crueldades. Não diga que a Igreja vem a ser menos perseguida, mas
tende fé no porvir glorioso que lhe foi predito”.
Quer dizer, se a
Igreja for perseguida, que seja. Não tem importância, toca para frente! Ela vai
ter seu futuro glorioso mais adiante.
“O bem só triunfará
quando a corrupção atingir o seu auge”.
Alguém poderia me
dizer: “Mas Dr. Plinio, um “geração nova”, débil, capenga etc., como é que vai
praticar esse conselho?” Eu digo: primeira coisa é compenetrar-se disso, ter
isso em vista e reconhecer para a gente mesmo que a gente é assim. Eu vou
reconhecer francamente: eu sou medroso, eu sou poltrão; eu deveria ser
corajoso, não sou. Mas ao menos para o meu olhar interior, eu sempre quando me
vir, verei sempre aquele poltrão. Aqui está o poltrão do fulano, quando eu
pensar em mim mesmo. Porque não tenho coragem de confessar a Deus diante dos
homens; porque não tenho coragem de proclamar Nossa Senhora diante dos homens;
porque tenho mais medo de uma risota do que do olhar soberanamente majestoso e
bondoso e digno de amor de Deus, que perscruta minha alma até o fim, de Nossa
Senhora, que é minha Mãe. Aqui estou eu; eu sei que eu sou assim. E
reconhecendo que sou assim, desejo mudar.
Este é o ponto de
partida de toda forma de emenda, e sem ele não há emenda. Vejamos os nossos
defeitos e reconheçamos o que eles são. O resto virá depois.
Se nós nos olharmos
de frente, rezaremos bem e se rezarmos bem nós obteremos cura. Não adianta a
gente só rezar. “Então está bom: resultado do conselho do Dr. Plinio, três
Ave-Marias por dia, está feito!” Não, assim não se faz... Três Ave-Marias,
esplêndido! Indispensável! Mas é preciso que eu tenha coragem de olhar meu
defeito de frente.
E que eu diga de
mim para mim, francamente, fustigando-me a mim no meu interior: Tal sou eu;
isso eu faço e isso tem tal coisa de ruim. Confio na misericórdia de Nossa
Senhora, sei que Ela me atenderá, sei que Ela vai tomar em consideração minha
debilidade, minha capenguice etc. Está bem, mas isso que eu posso fazer, eu
faço; que é o de ter bem em vista, diante de mim mesmo o meu pecado e de me
estigmatizar.
(Plínio Corrêa de Oliveira - Conferência Santo do Dia, 29 de abril de
1966)
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