sábado, 7 de março de 2020

SOMOS APENAS DISCÍPULOS DE CRISTO E A SUA CÁTEDRA É MAIS ALTA PORQUE É A PRÓPRIA CRUZ








BENTO XVI RESPONDENDO A PERGUNTAS DE SEMINARISTAS - III


(DIMOV KOICIO, Diocese de Nicópolis (Bulgária) IV ano - 2º de Teologia)

4. Beatíssimo Padre, comentando a Via Sacra de 2005 falou da sujeira que há na Igreja, e na homilia para a ordenação dos sacerdotes romanos do ano passado admoestou-nos contra o risco "do carreirismo, da tentativa de sucesso, de procurar obter uma posição através da Igreja". Como devemos colocar-nos face a estas problemáticas do modo mais sereno e responsável possível?
É uma pergunta não fácil, mas parece-me que já disse, e é um aspecto importante, que o Senhor sabe, sabia desde o início, que na Igreja também há o pecado e para a nossa humildade é importante reconhecê-lo e ver o pecado não só nos outros, nas estruturas, nos altos cargos hierárquicos, mas também em nós próprios para sermos, desta forma, mais humildes e aprender que não conta diante do Senhor a posição eclesial, mas estar no seu amor e fazer brilhar o seu amor.
Pessoalmente considero que, sobre este ponto, seja muito importante a oração de Santo Inácio que diz: "Suscipe, Domine, universam meam libertatem. Accipe memoriam, intellectum atque voluntatem omnem. Quicquid habeo, vel possideo, mihi largitus es: id tibi totum restituo, ac tuae prorsus voluntati trado ad gubernandum. Amorem tui solum, cum gratia tua mihi dones: ed dives sum statis, nec aliud quicquam ultra posco"(*). Precisamente esta última parte me parece muito importante: compreender que o verdadeiro tesouro da nossa vida é permanecer no amor do Senhor e nunca perder este amor. Depois seremos realmente ricos. Um homem que encontrou um grande amor sente-se realmente rico e sabe que esta é a pérola verdadeira, que este é o tesouro da sua vida e não todas as outras coisas que talvez possua.
Nós encontrámos, aliás fomos encontrados pelo amor do Senhor e quanto mais nos deixarmos tocar por este amor na vida sacramental, na vida de oração, na vida do trabalho, do tempo livre, tanto mais podemos compreender que encontramos a pérola verdadeira e que o resto não conta, que o resto só é importante na medida em que o amor do Senhor me atribui estas coisas. Eu sou rico, sou realmente rico e me destaco se permaneço neste amor. Encontrar nele o centro da vida, a riqueza. Depois deixemo-nos guiar, deixemos que a Providência decida o que fazer de nós.
Vem-me agora em mente uma pequena história de Santa Bakhita, esta bela Santa africana, escrava no Sudão, e que depois na Itália encontrou a fé, fez-se freira e quando já era idosa o bispo visitava o seu mosteiro, na sua casa religiosa e não a conhecia; viu esta pequena irmã africana, já curvada, e disse-lhe: "Mas o que faz a Senhora, irmã?"; Bakhita respondeu: "Faço o mesmo que Vossa Excelência". O bispo, admirado respondeu: "Mas o quê?", e Bakhita respondeu: "Mas Excelência, nós queremos fazer ambos a mesma coisa, fazer a vontade de Deus".
Parece-me uma resposta muito bonita, o Bispo e a pequena irmã, que quase já não podia trabalhar, faziam, em posições diferentes, a mesma coisa, procuravam cumprir a vontade de Deus e assim estavam no lugar justo.
Vem-me também em mente uma palavra de Santo Agostinho que diz: todos nós somos sempre apenas discípulos de Cristo e a sua cátedra é mais alta, porque esta cátedra é a cruz e só esta altura é a verdadeira altura, a comunhão com o Senhor, também na sua paixão. Parece-me que, se começarmos a compreender isto, numa vida de oração quotidiana, numa vida de dedicação, ao serviço do Senhor, nos podemos libertar destas tentações tão humanas.

(VISITA AO PONTIFÍCIO SEMINÁRIO MAIOR ROMANO
POR OCASIÃO DA FESTA DE NOSSA SENHORA DA CONFIANÇA - ENCONTRO DE SUA SANTIDADE BENTO XVI
COM OS SEMINARISTAS -
Sábado 17 de Fevereiro de 2007)


(*) Tomai, Senhor, e recebei toda a minha liberdade e a minha memória também. O meu entendimento e toda a minha vontade, tudo o que tenho e possuo vós me destes com amor. Todos os dons que me destes com gratidão vos devolvo. Disponde deles, Senhor, segundo a vossa vontade. Dai-me somente o vosso amor, vossa graça. Isto me basta, nada mais quero pedir.


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