Há uma corrente moderna que procura
encontrar vestígios de adoração de deuses entre nossos selvícolas, mas não
encontra amparo na realidade. Esta nos foi retratada pelos missionários
jesuítas que catequizaram nossos índios, deixando vastos relatos que demonstra
exatamente o contrário.
De modo geral os indígenas brasileiros
não tinham religião, não adoravam nenhum deus ou divindade, como o faziam os
Astecas, Incas e Maias, conforme assevera o padre Manuel da Nóbrega:
“Mas
é de grande maravilha haver Deus entregue esta terra tão boa, tamanho tempo, a
gente tão inculta que tão pouco o conhece, porque nenhum deus têm certo, e
qualquer que lhes digam ser Deus o acreditam...” (1)
A mesma coisa é afirmada por outros
cronistas, como, por exemplo, Cardim e Thevet, os quais acrescentam apenas que
acreditam que têm alma e que esta não morre:
“Este
gentio não tem conhecimento algum de seu Criador, nem de cousa do Céu, nem se
há pena nem glória depois desta vida, e, portanto, não tem adoração nenhum nem
cerimônias, ou culto divino, mas sabem que têm alma e que esta não morre e
depois da morte vão a uns campos onde há muitas figueiras ao longo de um formoso rio, e todas juntas não fazem
outra coisa senão bailar...”(2)
Da mesma forma se expressa também o Pe.
André Thevet:
“Conforme
dissemos precedentemente, esta pobre gente vive realmente sem religião e sem
lei..."
“No
que se refere a este assunto, os selvagens deste lugar mencionam um “Grande
Ser”, cujo nome em sua língua é Tupã...
Não conhecem, entretanto, um modo de dirigir-lhes louvores ou preces,
nunca o fazendo e nem possuindo lugares reservados para tal.. .[porém]...julgam eles que a alma seja imortal”(3)
A mesma opinião é manifestada pelo
calvinista Jean de Léry::
“...Acreditam
não só na imortalidade da alma, mas ainda que, depois da morte, as que viveram
dentro das normas consideradas certas, que são as de matarem e comerem muitos
inimigos, vão para além das altas montanhas dançar em lindos jardins com as
almas de seus avós. Ao contrário, as almas dos covardes vão ter com “Ainham”,
nome do diabo, que as atormentam sem cessar” (4)
O padre Simão de Vasconcelos vai mais
longe e afirma que:
“A
razão porque assim degeneraram de seus progenitores vem a ser a mesma que a de
seus costumes: e porque ocupados nas guerras, e ódios entranháveis, a que são
mui propensos, descuidaram do amor devido a Deus e ultimamente por serem no
comum mais agrestes que todas as outras nações da América...”. E
mais adiante: “...Disse, expressamente;
porque suposto que claramente por comum não reconhecem Deidade alguma; tem
contudo uns confusos vestígios de uma Excelência superior, a que chamam Tupã,
que quer dizer Excelência espantosa; e desta mostram que dependem...” (5).
Em outra parte, comenta o mesmo Autor: “Disse do Brasil: porque dos índios de quase
todas as outras partes da América, do Peru, México, Nova Espanha, etc., sabemos
o contrário; e que acharam aqueles primeiros seus descobridores grandes
indícios, e ruínas de templos famosos, de variedades de ídolos, sacerdotes,
cerimônias e cultos...” (6)
O frade capuchinho francês Claude d’Abeville,
é da mesma opinião:
“Os
egípcios, apesar da cegueira do paganismo, não adoravam ídolos? Não tinham eles
seus sábios, seus sacerdotes, guardas e intérpretes de seus hieróglifos? Os
caldeus, ainda que mergulhados na mais profunda infidelidade, não tiveram seus
ídolos absurdos e não adoraram em especial o fogo? Persas, gregos, romanos e
gauleses não tiveram seus falsos deuses?
“Não
há, penso eu, nenhuma nação no mundo que não tenha uma religião. Todas adoram
um deus, salvo a dos tupinambás que não adora nenhum, nem celeste nem terreno,
que não idolatra nem o ouro nem a prata, nem as madeiras, nem as pedras
preciosas, nem qualquer outra coisa. Não tinha, até nossa chegada, religião; portanto, não tinha sacrifícios,
nem sacerdotes, nem ministros, nem altar, nem templos ou igrejas. Nunca
souberam os índios tupinambás o que fosse nem prece, nem ofício divino, nem
oração pública ou particular... Não têm culto algum, nem exterior, nem
interior”. (7)
Todos os cronistas, sejam católicos,
sejam renascentistas ou até mesmo protestantes, são unânimes nesta
singularidade do aspecto irreligioso do nosso índio. Jean de Léry escreveu:
“...Pois
além de não ter conhecimento algum do verdadeiro Deus não adoram quaisquer
divindades terrestres ou celestes, como os antigos pagãos, nem como os
idólatras de hoje, tais os índios do Peru, que, a 500 léguas do Brasil, veneram
o sol e a lua” (8)
NOTAS:
(1) -
“Cartas Jesuíticas 1 – Cartas do Brasil” – Manuel da Nóbrega – Ed. Itatiaia,
pág. 90.
(2) -
“Tratado da Terra e Gente do Brasil” –
Fernão Cardim – Ed. Itatiaia, pág. 87
(3) -
“As Singularidades da França Antártica”
– André Thevet – Ed. Itatiaia, pág. 99
(4) “Viagem
à Terra do Brasil” – Jean de LérY – Liv. Martins Editora, 1967 – págs.176/177
(5) “Crônica
da Companhia de Jesus” – Pe. Simão de Vasconcelos - Editora Vozes, vol 1, págs.
119/120
(6)
id. ibidem, mesma página
(7) “História
da Missão dos Padres Capuchinhos na Ilha do Maranhão e Terras Circunvizinhas –
Claude d’Abbeville – Ed. Itatiaia e Ed. Universidade de São Paulo, 1975, pág. 249
(8) “Viagem
à Terra do Brasil” – Jean de Léry – Liv. Martins Editora, 1967, pág. 175
(9)
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