Tudo indica que os órgãos mais privilegiados no Paraíso celeste são
nossos olhos, pois é através deles que se terá a “visão beatífica”, a
contemplação de Deus por toda a eternidade. Aqui na terra eles foram úteis para
se ter uma antevisão dessa beatitude contemplando o belo e as maravilhas da
natureza, tudo aquilo que Santo Agostinho chamou de “vestígios de Deus”. São
Tomás de Aquino fala sobre essa contemplação, alertando que por serem
“vestígios de Deus” não devem ser venerados ou adorados, mas apenas admirados
em função do Criador, o único que deve ser adorado.
Eis o que diz o Catecismo da Igreja Católica sobre a visão beatífica, no
tópico 1028: “Em razão de sua transcendência, Deus só poderá ser visto tal como
é quando Ele mesmo abrir seu mistério à contemplação direta do homem e o
capacitar para tanto. Esta contemplação de Deus em sua glória celeste é chamada
pela Igreja de “visão beatifica”. Em seguida cita São Cipriano: “Qual não será
tua glória e tua felicidade: ser admitido a ver a Deus, ter a honra de
participar das alegrias da salvação e da luz eterna na companhia de Cristo, o
Senhor teu Deus (...) desfrutar no Reino dos Céus, na companhia dos justos e
dos amigos de Deus, as alegrias da imortalidade adquirida”[1] Em
outro tópico, diz o seguinte: A visão beatífica, na qual Deus se revelará de
maneira inesgotável aos eleitos, será a fonte inexaurível de felicidade, de paz
e de comunhão mútua” (1045)
São Gregório de Nissa, citado também no Catecismo, diz que “A promessa
de ver a Deus ultrapassa todas as bem-aventuranças. Na Escritura, ver é
possuir. Aquele que vê a Deus obteve todos os bens que podemos imaginar”[2]
São João Evangelista diz numa Epístola que no Paraíso “seremos semelhante a
Ele, porque o veremos como Ele é” (I Jo
3.2). São Paulo fala da vida na eternidade, quando “vier o que é perfeito, será
abolido o que é imperfeito”, completando: “Nós agora vemos como num espelho, em
enigma; mas então veremos face a face”(I Cor 13,12). O Apóstolo também se
refere aos olhos, dizendo que ninguém jamais viu o que Deus preparou para
aqueles que Ele ama.
De outro lado, o mesmo Catecismo mostra que a condenação do inferno é
exatamente a privação da visão de Deus: “A Escritura denomina a Morada dos
Mortos, para a qual Cristo desceu, de os Infernos, o sheol ou o Hades, visto
que os que lá se encontram estão privados da visão de Deus” (tópico 633).
.
SANTO
ANSELMO E O DESEJO DE CONTEMPLAR A DEUS.
Santo Anselmo fala
sobre a presença de Deus através dessa luz interior que nos leva ver a Deus já antes
da eternidade:
“Eia, homenzinho, deixa um momento
tuas ocupações habituais; entra num instante em ti mesmo, longe do tumulto de
teus pensamentos. Lança fora de ti as
preocupações esmagadoras; aparta de ti vossas inquietações trabalhosas.
Dedica-te por um
instante a Deus e descansa pelo menos um momento em sua presença. Entra no
aposento de tua alma; excluí tudo, exceto Deus e o que possa ajudá-lo a
buscá-Lo; e assim, fechadas todas as portas, segue após Ele. Diz, pois, alma
minha, diz a Deus: “Busco vossa face; Senhor, desejo ver vossa face”.
E agora, Senhor, meu
Deus, ensina meu coração onde e como buscar-Vos, onde e como encontrar-Vos.
Senhor, se não estás
aqui, onde Vos buscarei, estando ausente? Se estás em todos os lugares, como
não encontro vossa presença? Certo é que habitas numa claridade inacessível.
Porém onde se encontra essa inacessível claridade? Como me aproximarei dela?
Quem me conduzirá até aí para ver-Vos nela? E assim, com que sinais, sob qual
coisa Vos buscarei? Nunca jamais Vos vi, Senhor, Deus meu; não conheço vossa
face.
Que fará, altíssimo
Senhor, este vosso desterrado tão longe de Vós? Que fará vosso servidor,
ansioso de vosso amor e tão longe de vossa face? Deseja Vos ver e vosso rosto
está muito longe dele. Deseja aproximar-se de Vós e vossa morada é inacessível.
Arde no desejo de encontrar-Vos e ignora onde vives. Não suspira mais que por
Vós e jamais viu o vosso rosto.
Senhor, Vós sois meu Deus, meu dono, e, contudo,
nunca Vos vi. Me tens criado e renovado, me tens concedido todos os bens que
possuo e ainda não Vos conheço. Me criaste, enfim, para Vos ver, e, todavia,
nada é feito para aquilo para o qual fui criado.
Então, Senhor, até
quando? Até quando Vós esquecereis de nós, apartando de nós vosso rosto?
Quando, finalmente, nos olharás e nos escutarás? Quando encherás de luz nossos
olhos e nos mostrará vosso rosto? Quando voltarás para nós?
Olha-nos, Senhor;
escuta-nos, ilumina-nos, mostrai-Vos a nós. Manifesta-nos novamente vossa
presença para que tudo nos ocorra bem; sem isso tudo será mal. Tem piedade de
nossos trabalhos e esforços para chegar até Vós, porque sem Vós nada podemos.
Ensina-nos a buscar-Vos
e mostrai-Vos a quem vos busca; porque não posso ir em vossa procura a menos
que Vós me ensine, e não posso Vos encontrar se não Vos manifestas. Desejando
Vos buscarei, buscando Vos desejarei, amando Vos acharei e encontrando-Vos vos
amarei”.[3]
UMA
FENOMENAL DESCRIÇÃO DE FLASH
“Flash”. É isso,
não é? “Flash” é isso. Isso é um “flash” concreto. Agora, alguém me mandou um
outro texto além de Santa... Ah, Santo
Agostinho! Santo Agostinho e Santa Faustina Kowalska, ambos de forma diferente
falam a respeito do “flash”, não de máquina fotográfica, o “flash”
sobrenatural, o “flash” espiritual. E o Sr. Dr. Plínio também tem toda uma, eu
já fiz um simpósio uma vez, com dez conferências dele sobre o “flash”, dez
conferências. E estes dois santos, Santo Agostinho e Santa Faustina, e também o
Doutor Plínio, tratam do assunto “flash” com muita propriedade. Santo
Agostinho, esse trecho, é uma pena, foi no ofício divino destes dias, eu creio
que foi de anteontem, anteontem, foi... foi anteontem, foi no avião ainda,
rezando o ofício divino no avião que eu me deparei com o texto esse do “flash”.
O “flash”
corresponde ao quê? Deus quer nos santificar, Deus quer que nós cheguemos à
perfeição e quer que , chega em determinado momento, em que Ele possa dar-se a
si mesmo a conhecer e amar como Ele mesmo se conhece e Se ama, a cada um de
nós. Então, Ele quer que vivamos da vida d’Ele. Porque nós temos em nós
minerais, vegetais, animais, somos
homens, e temos algo alguinho de Anjo. Mas, esses cinco graus de criação
que existe em nós, porque se vão fazer
exame de sangue, vão encontrar ferro, vão encontrar potássio, vão
encontrar... tudo isso é mineral. Então, está cheio de mineral no organismo.
Depois nós vamos ter na vida de um cada um vegetal, algo de vegetal. Veja, eu
estou vendo que um ou outro vai ter que passar pelo barbeiro, depois... Depois
de chegar de viagem, claro, eu mesmo antes de viajar tive que cortar o cabelo. Agora, imagine só, imagine só se o
cabelo não fosse vegetal , mas, o cabelo fosse animal, quando metesse a tesoura
o cabelo [gritasse]Ai! Imagine só, imagine se fosse cortar a unha, e a gente
quando metesse o cortador de unha sentisse como se fosse uma vida animal, não
fosse vida vegetal. É que a unha tem uma parte animal, que está posta na carne,
e uma parte vegetal. Então, temos minérios, temos vegetal e temos a parte
animal.
Tudo isso é na
nada perto do que se chama vida divina. Como é que se define a vida divina?
Como é que se define a vida de Deus? Como é que Deus vive? Qual é a vitalidade
de Deus? Deus vive na seguinte essência: Ele se vê a Si próprio tal qual Ele é,
e Se ama a Sim próprio tal qual Ele é. O ver-Se a Si e amar-Se é a vida de
Deus. E essa vida é que Deus quer dar para nós, porque nós não temos essa vida.
Nós temos mineral sem vida, nós temos vegetal com vida vegetal, nós temos
animal, mas nós não vemos... Estão vendo a Deus? Não. Vieram pelo caminho,
encontraram a Deus no caminho? Não encontraram a Deus no caminho, não
encontraram porque não se vê a Deus. Mas, me digam uma coisa: no catecismo, todos
já passaram pelo catecismo, não foi? Não perguntaram no catecismo: Deus está
aqui debaixo da mesa? Deus está lá fora na rua? Deus está na França? Deus está
na Espanha? Deus está em Portugal? Então, Deus está por...? - Em todo o lugar. E eu não vejo Deus, como é
que é isso? Por que não vejo Deus? Sabe por que eu não vejo Deus? Porque em
relação a Deus eu sou um morcego. Eu tenho a vista ruim, minha vista não
alcança ver a Deus, porque para ver a Deus precisa ter uma vista
especialíssima, e não dá pra ver a Deus. E é verdade, Deus está aqui, nós todos
estamos dentro de Deus. Não é isso? Deus está dentro de nós, mas nós não vemos
a Deus. Por que? Porque nossa vista é
ruim. Para ver a Deus sabe o que é preciso? Os olhos de Deus. E é o que Deus nos dá quando nós vamos para a
eternidade. Quando nós vamos para a eternidade, Deus nos dá uma parcela da
vista d’Ele. E nós chegamos, então, e vemos a Deus face a face. É uma
maravilha! E vendo a Deus face a face, nós não queremos mais sair de lá. Não
passaram por certos lugares onde disseram: “Ui, se eu morasse aqui! Se eu
vivesse aqui!” Pois fiquem sabendo que,
quando a gente vê Deus face a face, não é que a gente diz: “Ui, se eu vivesse
aqui! Eu vou viver aqui e daqui ninguém mais me tira”. “Não quero sair mais!
Não quero sair mais!” Agarro em Deus e não solto mais. Por isso quem vê Deus
face a face, se está vivo morre, porque se a condição é ir embora com a alma, o
corpo fica aqui não é? Meu corpo, adeus!
Então nessa
caminhada para ver a Deus face a face, Deus que quer me dar essa maravilha,
Ele, de vez em quando, me faz sentir quem é Ele. Sabe como? Numa máquina
fotográfica que tem no Céu e que Ele aperta em um botão, um “flash”, e a gente
sente naquela hora quem é Deus. Sentiu naquela hora quem é Deus, a gente está disposto
a tudo. Quem é chamado ao martírio, morre em estado de “flash”, porque se não
fosse não tinha coragem de enfrentar a morte. E a graça do martírio é uma graça
do Espírito Santo eficaz, produz aquilo de uma forma extraordinária , e a
pessoa morre em estado de “flash”. Por isso, pega um São Tarcísio, por exemplo,
que com dez anos de idade morreu daquela forma tão extraordinária, tendo a
Eucaristia no peito. Pegam Santo Estêvão, qualquer mártir; qualquer mártir
morre em estado de “flash”. E a
Providência nos dá durante a vida estes e aqueles “flashes” para ir nos
educando e para ir abrindo o nosso apetite e chegar ao Céu e chegar à
eternidade. E por isso a gente deve saber cultivar esses “flashes” e não
esquecer mais esses “flashes”.
O meu maior “flash”
na vida foi ter encontrado o Sr. Dr. Plínio. Aí está. A Providência já me tinha
preparado, porque eu vivia meio desgostoso com todos os companheiros, com todos
os parentes, com tudo. Via esse mundo perdido e afundado. E dizia: “Mas tem que
existir alguém, tem que existir alguém que não seja assim, tem que existir
alguém. É um homem!” Isso uns dois, três
anos antes de conhecê-lo. E eu, mais ou menos, de tanto rezar para conhecer
esse homem, eu vi uma silhueta, que,
quando no dia 7 de julho de 1956, estando na basílica do Carmo em São Paulo, eu
vi um conjunto de treze pessoa entrando , doze e mais ele no fim, quando o
olhei, disse: “É este o homem!” Este foi
o “flash” maior que tive na vida, porque eu senti em mim qual era aquela
vocação, quem era aquele homem e aquela missão. E por isso agüentei e estou
aqui; cinqüenta anos depois, estou aqui junto com os senhores.
(Texto extraído, sem revisão do orador, de vídeo postado pelos Arautos
do Evangelho no YouTube, em 05.07.2021- CONSELHOS DE PAI,
PALAVRAS DE FUNDADOR - “Através dos “flashes” Deus nos faz sentir quem é Ele” –
Monsenhor João S. Clá Dias – 31.08.2006)
[1] Referência no rodapé do citado Catecismo: S. Cipriano, Epístola 58, 10.
[2] Catecismo da Igreja católica – Edições Loyola, tópico 2548, pág. 653
[3] Del libro Proslógion de san Anselmo, obispo - (Cap. 1: Opera omnia, edición Schmitt, Seckau [Austria] 1938, 1, 97-100
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