Na beatificação de
Pio X, é intenção da Igreja afirmar que este Papa praticou, em vida, em grau
heróico, as virtudes teologais de Fé, Esperança e Caridade, as virtudes
cardeais de Justiça, Prudência, Fortaleza e Temperança, pelo que está gozando
no Céu a glória correspondente. Em conseqüência, permite a Igreja que lhe seja
prestado culto público em certos lugares.
Este pronunciamento
tem por objetivo próximo e explícito a própria pessoa do Papa Pio X.
Implicitamente, porém, envolve de certo modo uma apreciação sobre seu modo de
governar a Igreja. Pois, se o Papa foi heróico nas virtudes cardeais, é que no
gerir os mais altos interesses espirituais da Cristandade, não se mostrou nem
injusto, nem imprudente, nem fraco, nem intemperante. Antes pelo contrário, foi
exímio na prática destas virtudes, não só enquanto homem privado mas ainda
enquanto Papa. E suas ações, não só enquanto homem como enquanto Papa nos podem
e devem ser propostas como modelo digno de imitação.
Vem pois muito a
propósito analisar a conduta do santo Pontífice num episódio absolutamente
memorável da vida da Igreja em nosso século, tirando daí preciosos ensinamentos
para nossa santificação.
A Igreja se
encontra, hoje, em uma das fases mais dramáticas de sua História. Jamais foram
tão poderosos, tão radicais, tão militantes os seus inimigos. Lembremos antes
de tudo o mundo soviético, que vai da Indochina até a Alemanha, constituindo
pois um Império maior do que o de Alexandre ou Carlos Magno. É inútil fechar os
olhos à realidade: esse "mundo" forma o maior quisto de ateísmo
jamais existente sobre a face da terra. Dentro dos limites circunscritos pela
cortina de ferro, agonizam nos cárceres, nos campos de concentração, em outras
prisões talvez mais disfarçadas porém não menos cruéis, Cardeais, Arcebispos,
Sacerdotes, Missionários, Religiosas, e simples fiéis. É uma oitava parte da
população católica do globo que está sujeita assim a um governo direta e
oficialmente ateu, que tem por intenção oficial e declarada extinguir a
Religião. E este imenso quisto comunista não constitui senão a cabeça do polvo.
Seus tentáculos se estendem pelas regiões vizinhas, a Indonésia, Índia, a
Pérsia, a desditosa Áustria, a Alemanha Ocidental, e se dividem em ramificações
ativas que envolvem como em uma rede toda a Europa Ocidental, a América do
Norte e do Sul, e grande parte da África. Nas Universidades, nos Parlamentos,
na imprensa, no cinema, no rádio, nos sindicatos, os filamentos desta rede se
multiplicam a todo momento. O inimigo não está "ante portas". Está
instalado em nossas próprias entranhas.
E se fosse só este!
Em face do corpo de doutrinas maciço do comunismo, de sua organização férrea,
nada é mais fluido, mais inconsistente, menos orgânico do que a amálgama de
princípios, instituições e povos habitualmente considerados anticomunistas.
O extremo oposto do
comunismo é o Catolicismo. E, assim, tudo quanto contribui para enfraquecer a
influência do Catolicismo constitui cooperação preciosa - se bem que às vezes
não intencional - à expansão comunista. E a sociedade ocidental está sendo corroída
por toda sorte de vermes que trabalham assim para a vitória do adversário. A
literatura e os espetáculos imorais que enervam as forças da resistência da
família cristã; a propaganda socialista que sob pretexto de justiça social
lança de fato os pobres contra os ricos, mina o princípio da autoridade e
semeia o espírito de revolução; o ensino superior ou secundário que apresenta o
universo como um grande todo tendo imanentes em si mesmo forças de sua evolução
gigantesca e indefinida, um todo que não foi criado por nenhum Deus pessoal e
em que o homem não tende para uma felicidade sobrenatural, extra-terrena e
eterna; tudo isto fere a civilização cristã na sua própria alma, que é a Igreja
Católica, e prepara o campo para o advento do comunismo.
Consideradas assim
em seu conjunto as forças que trabalham contra a Igreja, numa imensa ofensiva
ora violenta, ora sutil, ora adocicada (é este, tantas vezes, o caso dos
socialistas, p. ex.), em que o adversário conquista posições com todas as
armas, desde a pólvora até o açúcar, qual deve ser a atitude católica?
Em outros termos, o
que fazer: enfrentar a onda ou procurar flutuar sobre ela?
Vários aspectos da questão
Como se enfrentaria
a onda? Marcando muito definidamente a diferença entre o espírito da Igreja e
as mil e uma manifestações do espírito neopagão de nossos dias, desde as
manifestações brutais do comunismo russo até as mais macias blandícies das alas
conciliadoras do socialismo, do protestantismo, ou do liberalismo: argumentando
do modo mais eficiente contra o espírito neopagão, e a favor da doutrina da
Igreja manifestada em toda a sua inteireza, no arrojo de sua nobreza, na
sublimidade nua e por vezes trágica de sua austeridade; mostrando às almas que
não podem ficar a meio termo entre as duas posições ideológicas; fazendo o
possível e até tentando o impossível para as trazer à Igreja de Jesus Cristo.
Como se flutuaria
sobre a onda? Evitando de discordar abertamente de qualquer coisa: homens,
fatos, doutrinas. Procurando aplaudir o lado bom que há em tudo (pois até o
demônio, no mais fundo dos infernos, totalmente mau como é do ponto de vista
moral, tem entretanto um ponto em que pode ser elogiado: é o fato de ser
criatura de Deus). Acomodando o Catolicismo, tão completamente quanto possível,
ao gosto do século: sonhando com a abolição do traje talar para os Sacerdotes,
e do celibato eclesiástico, ansiando pela supressão das Ordens meramente
contemplativas; formando votos por que a eleição do Papa não toque mais ao
Colégio Cardinalício mas ao povo de Roma; preconizando uma participação dos
fiéis na celebração litúrgica, mais largamente do que em qualquer outra época
de vida da Igreja; trabalhando pela introdução de paramentos litúrgicos muito
simples, ou até pela autorização aos Sacerdotes para que celebrem com o
"macacão" operário; dando apoio franco ao combate contra todas as
diferenças de fortuna ou classe social, etc., etc. Em matéria doutrinária,
flutuar sobre a onda consiste em apresentar a doutrina católica do modo mais
parecido possível com os erros daquele com quem conversamos. Se ele é
panteísta, falemos sobre o Corpo Místico de tal maneira que, sem desmentir
claramente nossa doutrina, ele sinta nela um pouco de "sal"
panteísta. Se é socialista, brademos mais energicamente do que ele contra toda
diferença de classe social. Se é protestante, restrinjamos tanto quanto
possível em presença dele os limites do magistério da Igreja.
Sem prejulgar a
questão, lembremos aqui um ponto fundamental. É que ela se relaciona com todo
um delicado problema de caráter e de feitio mental.
Assim, se alguém é
amigo da lógica, da clareza, da franqueza; se tem entusiasmo pela doutrina
católica e lhe dói presenciar a impunidade do erro; se é idealista e portanto
está disposto a lutar e sofrer para a afirmação dos princípios que professa,
será partidário da tática de enfrentar a onda.
Se pelo contrário
alguém sofrer de um "complexo" (perdoem-nos os leitores a bárbara
expressão) de timidez; se não tem absoluta certeza de suas opiniões nem coragem
de as afirmar; se não lhe dói nem lhe incomoda que os outros glorifiquem e
propaguem o vício ou o erro; se é amigo sobretudo de sua consideração social,
gostando de passar por simpático, moderno, compreensivo, esclarecido; se por
fim ama o sossego, e está disposto a todos os silêncios para não suportar lutas
e discussões, então será um partidário de "deixar a onda passar", de
flutuar sobre ela e de praticar uma política de "prudente" e extensa
"adaptação".
Para resumir, há
católicos que caminham para o adversário com a espada de fogo de São Miguel
Arcanjo; outros pelo contrário julgam fazer melhor aconselhando o guarda-chuva
de Chamberlain...
Este problema não é
novo. E nem se coloca apenas no terreno religioso. Pois esta diferença de
caráter e feitio deita reflexos em todos os campos da atividade humana. Diante
do protestantismo, Filipe II personificou a atitude dos que enfrentam o perigo,
e de fato se o protestantismo não conquistou a Europa tal se deve - humanamente
falando pelo menos - ao grande Rei. Luiz XVI, pelo contrário, procurou
contemporizar com a Revolução. Nicolau II também. Foram precursores de
Chamberlain... que por sua vez teve e terá seguidores.
Durante o pontificado de Pio X
Em última análise,
como se vê, a questão é muito velha. De fato ela é até mais antiga do que
Felipe II. Data dos primórdios da humanidade. De quando em quando, isto é no
que os franceses chamam com toda a propriedade de expressão "les tournants
de l’Histoire", ela se põe.
No tempo de Pio X,
a atual ofensiva contra a Igreja ainda não tinha atingido o clímax hodierno,
mas já estava francamente em vias de desenvolvimento. Nem todos os problemas
religiosos daquele tempo se punham como hoje. Mas pelo menos em suas grandes
linhas gerais a situação podia ser vista como hoje a vemos. Já havia um forte
movimento comunista, o socialismo se estendia por todo o Ocidente, a corrupção
dos costumes já tinha entrado a fundo até em lares "cristãos", o
espírito de revolta já lavrava francamente por toda a parte. O materialismo, o panteísmo,
o evolucionismo já estavam na ordem do dia.
Por isto mesmo, os
dois feitios temperamentais também já se tinham definido inteiramente entre os
católicos. Uns eram favoráveis à luta. Outros à acomodação. Procuravam
"modernizar" o Catolicismo.
Eram os chamados
católicos "modernistas". Constituíam um "movimento" que
tinha uma doutrina, uma estratégia, objetivos bem definidos, uma rede de
instituições a seu serviço, e toda uma galeria de grandes homens para os
chefiar. Como todo "movimento" que se preza, os modernistas tinham
até seus "tabus".
A doutrina
modernista consistia em última análise numa longa série de estratagemas e
artifícios destinados a conformar o Catolicismo com as idéias religiosas do
tempo.
Como dissemos, estas
idéias admitiam um Deus impessoal, que estava latente em todas as forças do
universo, e que se identificava em última análise com a "Natureza".
Este Deus entranhado nos kosmos guiava todas as forças para um progresso
indefinido, em que se aperfeiçoaria o mesmo kosmos, e especialmente o gênero
humano. Entranhado em todos os seres como a água numa esponja, ou a tinta num
mata-borrão, este Deus impessoal também está "embebido" no homem. É
uma força que produz em nós sensações interiores, aspirações de caráter
religioso mais ou menos vagas. Cada qual procura, então, satisfazer estas
aspirações forjando uma religião conforme lhe convenha, ou escolhendo uma das
várias religiões já conhecidas. Isto posto, todas as religiões existentes, ou
as que ainda se vierem a produzir, são igualmente legítimas, pois preenchem seu
papel desde que satisfaçam as aspirações religiosas dos homens que a
engendraram. Diante desta concepção, é perfeitamente indiferente indagar se os
dogmas desta ou daquela religião são verdadeiros. De fato, todos os dogmas são
falsos, produtos da mente humana que os concebeu para sua satisfação. São para
os adultos mais ou menos como os contos de fadas para as crianças. Visto deste
ângulo, o Catolicismo apresento dois aspectos. De um lado, muito bom: enquanto
religião engendrada por uma grande quantidade de homens para se satisfazerem
quanto a necessidades religiosas. Outro muito mau: enquanto se pretendesse que
os nossos dogmas são realmente verdadeiros pois que, sustentavam,
manifestamente eles são tão falsos quanto os de outra religião qualquer. E
vinha então toda uma explanação de objeções contra a doutrina católica:
negava-se a divindade de Jesus Cristo, a existência do sobrenatural, a própria
existência de um Deus pessoal, a veracidade dos fatos narrados nos Livros
Sagrados, etc., etc. Se se perguntasse a um sábio desta escola se era Inimigo
do Catolicismo, responderia que não, mas que acharia perfeitamente ridículo ver
nele uma religião objetivamente verdadeira. Seus dogmas eram falsos, eram mutáveis,
de fato já tinham sido uns no início do Cristianismo e seriam outros com o
decurso do tempo.
À vista disto, o
que faziam os modernistas? Em lugar de desmascarar a doutrina nova, mostrando
que em última análise ela negava todas as religiões, inclusive a católica,
contemporizavam:
a) - uns, mais
"moderados", limitavam-se a fazer coro com os escritores ímpios, em
pontos "secundários", isto é, negando a autenticidade de relíquias e
fatos hagiográficos veneráveis, até então tidos por incontestes; aceitando
interpretações capciosas da Sagrada Escritura, tendentes a dar significado mais
"racional" a este ou àquele tópico; pleiteando uma adaptação de toda
a disciplina da Igreja aos costumes e estilos do século XX;
b) - outros, mais
arrojados, insinuavam a possibilidade de reformar o próprio dogma em pontos
reputados "menos importantes", sob a alegação de que alguns deles
deveriam acompanhar a marcha das ciências. Pleiteavam também a
"reforma" de certos pontos de moral, como a indissolubilidade do
casamento, reputados manifestamente anacrônicos.
c) - outros, por
fim, já não conhecendo limites para suas audácias, apresentavam em seus livros,
em linguagem velada, toda a doutrina dos escritores ímpios.
O "movimento"
O modernismo
"católico" se propagou nos meios eclesiásticos da Europa e da América
com a suavidade e a celeridade de uma mancha de azeite. Quando Pio X subiu ao
trono pontifício, já este movimento ideológico constituía uma potência, que
contava com a cooperação de professores Universitários, escritores,
jornalistas, homens de ação, personalidades de relevo social de toda a espécie.
Houve um diretório
que orientasse todo este esforço? E’ difícil responder a esta pergunta, mas é
certo que muitas coisas se passavam como se este diretório existisse. Assim, os
modernistas de todos os países mantinham entre si uma correspondência estreita,
elogiavam-se mutuamente e com ardor, e cooperavam intimamente para o mesmo
fim... tudo com tanta precisão, tanta harmonia, tanta conjuração de todos para
o objetivo comum, que verdadeiramente em certos momentos se tinha a impressão
de que algo de coordenado havia em tanto trabalho.
Esta impressão era
particularmente nítida para quem observasse com diligência a estratégia
modernista:
a) antes de tudo,
guardavam um tal ou qual segredo. Para melhor "despistar", costumavam
evitar a apresentação sistemática e lógica de sua doutrina. Pareciam até
discrepar entre si num ou noutro ponto. Era necessária uma análise muito madura
para perceber que estas discrepâncias ou eram inteiramente acidentais, ou até
inexistentes; e que em meio a tanta aparente balbúrdia havia uma perfeita
unidade de pensamento;
b) de outro lado,
os mais arrojados não exprimiam inteiramente seu pensamento. Falavam por meio
de metáforas, de circunlóquios. Era necessária uma como que iniciação para se
chegar ao inteiro conhecimento de seu modo de pensar;
c) para escapar a
qualquer condenação pontifícia, chegavam a publicar livros com nome de autores
supostos, o que permitia a um mesmo escritor ostentar várias máscaras, e mais
facilmente embair os incautos;
d) por fim,
intimados a se explicar desdiziam-se com toda a facilidade, para mais tarde, em
outra obra, voltar novamente a pregar o erro.
É doloroso dizê-lo,
mas esta estratégia era seguida não só por leigos, mas até por Sacerdotes, de
tal maneira o fanatismo modernista havia obliterado as consciências.
e) quando alguém
atacava suas doutrinas, moviam-lhe uma "guerra total", que ia desde a
refutação doutrinária até a campanha de difamação pessoal. E quando nada tinham
que objetar doutrinariamente, ou pessoalmente, organizavam a campanha do
silêncio. Ao que era assim "castigado" cerravam-se todas as tribunas,
todas as redações de jornais, as portas de todas as revistas, e até de muitas
associações religiosas. Era o ostracismo.
Os objetivos do
movimenta eram claros. Tratava-se de transformar a Igreja por dentro. Era uma
evolução a ser feita maciamente, sem choques nem barulho, mas que deveria ser,
em última análise, a maior das transformações sofridas pela Igreja em sua
história vinte vezes secular. Para isto, era essencial que os modernistas
ficassem dentro dos ambientes católicos; que ocupassem cátedras, púlpitos,
jornais e revistas católicos; que falassem sempre em nome da opinião católica.
Em nossos dias chamar-se-ia a isto uma quinta coluna. Mas, no tempo de Pio X, o
vocábulo ainda não existia É frisante o caso de um Sacerdote modernista cujo
livro fora condenado. Perguntaram-lhe se se revoltaria e deixaria a batina, ou
se abjuraria suas idéias. Ele sorriu e, indicando que não faria uma coisa nem
outra, deu esta resposta: "comprarei uma batina nova".
O que faria o Papa?
Diante do modernismo, fecharia os olhos? Muitos motivos pareciam aconselhar
esta tática:
a) vários chefes
modernistas eram inteligentes, capazes de uma atividade apostólica
intensíssima, de uma probidade de vida indiscutível. Seria sumamente doloroso
golpear pessoas dignas de tanta consideração;
b) depois,
golpeando-as não se correria o risco de as arrastar à apostasia? Dado que entre
os apóstatas eventuais estava número não pequeno de Sacerdotes, inclusive
Religiosos, não haveria com isto notável escândalo para o povo fiel?
c) valeria a pena
dividir os católicos numa época de lutas?
d) o Papa é pai de
misericórdia. Fica bem ao seu ministério agir com severidade em relação a uma
corrente em cujas fileiras haveria possivelmente multas pessoas bem
intencionadas?
Este último ponto,
especialmente, chamava a atenção. Pio X era de uma bondade angélica. Ninguém se
aproximava dele sem experimentar os eflúvios de sua bondade. Iria ele agir com
uma severidade que parecia tão contrária a seu temperamento?
Primeiramente, com
bondade paternal, Pio X advertiu em particular aos principais responsáveis,
aconselhando-os, exortando-os, advertindo-os. Dada a inutilidade destes
esforços, começou a tomar atitudes públicas, referindo-se ao assunto com uma
energia cheia de prognósticos severos. A 3 de Julho de 1907, a Sagrada
Inquisição Romana e Universal publicou o famoso decreto
"Lamentabili", em que se condensavam os principais doutrinas modernistas,
todas condenadas pela Igreja. Ainda isto não foi suficiente. Pio X deu então o
golpe fulminante que foi a Encíclica "Pascendi Dominici Gregis", de 8
de Setembro de 1907, em que com uma energia que se poderia chamar hercúlea se,
mais do que isto, não fosse sobrenatural, denunciou e estigmatizou o
modernismo.
Nesta Encíclica,
Pio X expõe longamente toda a doutrina modernista, mostra sua identidade com o
pensamento ímpio em voga no século XX, historia as origens do movimento, sua
tática, a perfídia de seus estratagemas, a insinceridade de seus processos de
ação, e por fim indica os remédios para esta "torrente de gravíssimos
erros que às claras e às ocultas se vai avolumando".
Por fim, uma série
de excomunhões das mais severas, expulsando das fileiras católicas muitos
chefes do movimento, acabou por desmontar todo o sistema de incrustação
modernista nas fileiras da Igreja.
A atualidade do exemplo
Antes de tudo,
notemos como Pio X se colocou em posição inteiramente oposta ao campo dos que
acham melhor recuar diante do adversário, e passar por debaixo dele, do que
enfrentá-lo. É este um primeiro exemplo que devemos atentamente meditar.
De outro lado,
notemos como Pio X - o próprio Pontífice em que os homens aclamavam uma bondade
que mais parecia de Anjo do que de homem - soube ser de uma energia invencível
face ao mal. É que a bondade não exclui a energia, pelo contrário, a completa.
E contra os que se obstinam no mal cumpre ser enérgico em toda a medida do
necessário para impedir que eles propaguem seus erros e transviem os bons.
Assim é que age o Bom Pastor, em relação ao lobo com pele de ovelha...
Por fim,
consideremos a confiança de Pio X no sobrenatural. A força da Igreja não vem
dos homens, mas de Deus. No cumprimento de sua missão, não tem que recear, nem
tiranos, nem multidões. Confiante em Deus, pode proceder com evangélico
desassombro, porque a vitória será sua.
Estes exemplos têm
uma aplicação profunda na vida de todos nós. Quando tivermos de lutar contra os
erros modernos de que está saturado o ambiente que todos freqüentamos,
saberemos que nosso dever é de reagir e não de recuar. Quando um falso ideal de
bondade nos sugerir a covardia diante da impiedade triunfante, saberemos que a
bondade não consiste em permitir que os maus dizimem à vontade os nossos
irmãos. Quando nos parecer que a luta é por demais desigual, continuaremos a
lutar até com vigor redobrado, pois saberemos que nossa vitória vem de Deus e
não de nós.
(Plínio Corrêa de Oliveira – “Catolicismo” –
junho de 1951)
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