Os castos terão um lugar
especial reservado para eles no Céu Empíreo. É desta forma que São João fala deles
no Apocalipse:
“Olhei, e eis que o Cordeiro estava de pé sobre o
monte de Sião e com ele cento e quarenta e quatro mil que tinham escrito sobre
suas frontes o nome dele e o nome de seu Pai. Ouvi uma voz do céu, como o rumor
de muitas águas e como o estrondo de um grande trovão. A voz que ouvi, era como
de tocadores de citara que tocavam as suas cítaras. Cantavam um cântico novo
diante do trono, diante dos quatro animais e dos anciãos. Ninguém podia cantar
este cântico, senão aqueles cento e quarenta e quatro mil, que foram resgatados
da terra. Estes são os que não se
contaminaram com mulheres, porque são virgens. Estes seguem o Cordeiro onde
quer que ele vá. Estes foram resgatados dentre os homens como primícias para
Deus e para o Cordeiro, e na sua boca não se achou mentira, porque estão sem
mácula diante do trono de Deus. (Apoc
14, 1-5).
A propósito,
transcrevemos abaixo um texto publicado por Reginaldo Garrigou-Lagrange, O.P.,
extraído das anotações de uma Fundadora, Madre Francisca de Jesus, mística
brasileira que fundou a Companhia da Virgem sob o beneplácito de São Pio X. A
exemplo de Santo Inácio de Loiola, Madre Francisca de Jesus fundou também sua
“Companhia”, inteiramente feminina e destinada exclusivamente a rezar pelo Papa
e pelo Clero:
“A festa da encantadora santinha romana, uma de
nossas mais caras Padroeiras, é particularmente propícia a uma palestra sobre a
virgindade. O seu próprio nome evoca esta lembrança: Inez significa “cordeiro”
da palavra latina “agnus”. Quem não terá
experimentado, à vista de um cordeirinho, uma impressão de doçura, candor e
pureza? O cordeiro era uma das vítimas escolhidas, ofertadas a Deus em
holocausto pelos sacerdotes do Antigo Testamento. Conheceis o “Cordeiro” assim
figurado: Aquele a Quem na Santa Missa diariamente invocais por três vezes com
esse nome, o que apaga os pecados do mundo, e do qual dizia São João Batista:
“Ecce Agnus Dei, ecce tollit peccata mundi”;
Aquele, enfim, que sendo o Cordeiro de Deus – os outros eram apenas
cordeiros dos homens – é a única Vítima pura, santa e imaculada; a única Vítima
digna de Deus.
“O Sacrifício do Cordeiro de Deus perdura sempre.
Deus tomou posse de sua Vítima no Calvário e dele se apoderou uma vez por
todas.
“A Vítima se imolará dia por dia em nossos altares,
de modo incruento embora, até ao fim dos tempos.
“No céu Ela permanecerá eternamente!
Quando em Patmos, arrebatado em espírito, São João
viu na Jerusalém celeste um “cordeiro que parecia ter sido imolado”...
“O Cordeiro divino, Nosso Senhor Jesus Cristo, é o
ponto central para onde tudo converge: desse ponto culminante tudo nos vem e
para ele tudo se dirige. Todas as coisas por Ele nos vêm e só por Ele podemos
chegar a Deus.
“Foi figurado na Antiga Aliança; é imitado na Lei
Nova.
“Somente em vista de seu Sacrifício, real, completo, perfeito, é que Deus
aceitava as oblações, que apenas fraca e pobremente o figuravam; é ainda só em
consideração desse mesmo Sacrifício que Ele aceita as nossas homenagens, orações,
pobres ofertas, e se digna recompensá-las à medida de nosso amor.
“Até ao fim imitou Inez o Cordeiro de Deus, motivo
pelo qual se acha entre aqueles que São João contemplou a ocupar lugar
especial: “Vi sob o altar as almas do que foram imolados por causa do Verbo de
Deus e do testemunho por eles dado”.
“Inez colheu a palma do martírio na flor de sua
virgindade, eis a razão de achar também entre aqueles que, segundo a palavra do
mesmo São João, “não se tendo maculado, acompanham o Cordeiro por toda parte”.
“Ainda criança, a santa já compreendera a graça da
virgindade e a ventura de ser toda de Jesus. “Pertencerei Àquele, repetia aos
que para desposá-la procuravam afastá-la do seu noivo divino, pertencerei
Àquele que me amou primeiro”, designando assim o que, sendo Deus e homem, a
amara desde toda a eternidade.
“A virgindade é em si graça mui preciosa; nem a
todos é dado compreendê-la: “Quem tem ouvidos para ouvir, ouça”, disse o Mestre
muito amado; a fidelidade em conservá-la e desenvolvê-la, traz consigo ainda
maiores graças. É tal a misericórdia do nosso Deus que a correspondência a uma
graça outras atrai.
“Dest’arte a fidelidade de Inez a seu Esposo, que
era também seu Deus, lhe mereceu a graça do martírio.
“Não foi também essa fidelidade que valeu a Maria
tornar-se Mãe de Deus?
“A Sagrada Escritura diz que o Messias nasceria de
uma Virgem. Maria, conservando a virgindade, preparava, sem o suspeitar, a
vinda do Salvador. O Autor de toda
virgindade só de uma Virgem podia nascer. Fazendo-se homem, o Verbo devia a si
próprio o ornar sua Mãe com essa flor dos céus, antes de a oferecer a qualquer
outra criatura.
“Mãe de Deus e Virgem perpétua, Maria arrastou após
si o inumerável cortejo de almas que, renunciando aos laços terrestres, aspiram
à união divina simbolizada por essas núpcias. Sem diminuir de modo algum a
dignidade do matrimônio, deve-se afirmar com os Santos Padres e o Concílio de
Trento ser mais perfeito o estado virginal (Oh! Não há motivo para orgulho,
pois se o estado é mais perfeito em
si, os indivíduos o podem ser menos).
“Que é a virgindade? É a virtude que eleva as
criaturas, adstritas ainda à condição dos mortais, até à semelhança dos Anjos.
“A virgindade perfeita é a abstenção de tudo o que
não é Deus, ou por outras palavras: a integridade completa da obra de Deus em
sua criatura. Para defender essa integridade (com a qual Deus nos dotou,
dando-nos a vida da natureza e da graça) é preciso lutar, combater até ao
último suspiro. A pobre natureza humana prende-se facilmente a tantas coisas
capazes de atrair-lhe o espírito e o coração!
“Como poderá ser virgem a religiosa que escuta as
inspirações do erro deixando-se seduzir pela linguagem do demônio, sem mais
respeito pela autoridade? Como se conservará virgem a religiosa cuja
consciência esteja manchada pelos estigmas de funestas doutrinas? Se a virgem
destinada ao Esposo celeste deve apresentar-lhe o coração livre de qualquer
pensamento mundano, a fim de lhe agradar e merecer o seu amor, poderá acaso
conservar a graça da virgindade aquela que traz o coração cheio de pensamentos
de independência ou contrários à caridade?
“Não, sem dúvida; embora haja conservado a pureza
do corpo, a parte mais íntima e bela do ser, a alma, não deixará de assim
perder a candura virginal.
“E que importa permanecer de pé as paredes
exteriores do templo, estando o santuário destruído ou profanado?
“Que importa os véus e hábitos resplandecentes de
brancura se o espírito está maculado?
“Deus perscruta os corações e não se detém no
exterior. Aliás, a corrupção da alma destrói também a pureza de corpo. Esses
juízos ocultos e temerários, gerados pelo espírito de independência e orgulho,
não permanecem no fundo do coração onde nascem; saem para mancar a boca que os
exprime e os ouvidos que os escutam; insinuam-se como mortal veneno e logo
multiplicam suas devastações...
Agradável ao Senhor é a virgem que desde este mundo procura seguir por
toda parte o Cordeiro; são as veredas
por vezes abruptas, escarpadas, mas por todas passou Ele primeiro.
Aliás o Bem-Amado está sempre presente estendendo a mão protetora, à medida da
generosidade da alma. Doçura, paciência,
mortificação, obediência, humildade, humildade, humildade; eis os adornos da esposa de Cristo.
“Minhas queridas filhas,
não vos orgulheis nem vos glorieis jamais de vossa virgindade. Temei antes
diminuir o brilho dessa angélica virtude que alegra o coração de Deus.
“Guardamos tesouro mui
precioso em vaso de extrema fragilidade.
“Dai graças a Deus por
esse tesouro e acautelai-vos com mil precauções: sede atentas, prudentes, vigilantes. Jesus, no entanto, vos deseja atentas sem
constrangimento, prudentes sem dureza, vigilantes sem escrúpulos. Encha o vosso
coração sincera caridade, e sede por amor fiéis à santa observância; dilate esse amor a vossa alma e uma casta
liberdade vos regule os atos. Caminhai com grande amor na presença do Bem-Amado
que será vosso Juiz.
“Suplicai-Lhe guarde Ele
próprio o precioso tesouro que vos confiou, e sua doce Mãe, que é vossa Mãe a
tantos títulos o guardará também.
“Conheço as vossas almas
e corações; pertencem plenamente a Deus, a seu Cristo, à sua Igreja. É ainda
graça muito superior aos vossos méritos; bendizei a Deus muitas vezes,
repetindo-Lhe – pura verdade! – que sem Ele nada podeis. A ação de graças será
nova graça: de nós, minhas queridas filhas, só temos o pecado...
“Domo poderíamos então –
sem estarmos loucas – ter sequer a tentação de nos gloriar dessa preciosa graça
da virgindade! Estejamos bem certas de que só a possuímos por mera liberalidade
de Deus, cuja misericórdia para conosco é infinita. Esforcemo-nos por ser dignas, ou antes, o
menos indignas possível, de tanto amor e predileção. Se fordes fiéis, Ele usará para convosco de
prodigalidade real, divina. Tão poucos Lhe são verdadeiramente fieis!
“O Senhor gostaria que a
virgindade fosse virtude comum a todos os homens”, diz São João Crisóstomo, e
esse desejo nos é atestado nestas palavras do Apóstolo ou antes de Cristo, que
por sua boca fala: “Quisera, diz ele, que todos os homens fossem castos e puros
assim como sou”. Deus, porém, é indulgente para conosco; sabe que se o espírito
é pronto, a carne é fraca. Não testemunhou esse desejo sob a forma imperiosa do
preceito, deixando-nos a liberdade de realizá-lo ou de a ele nos subtrair.
“Há, no entanto,
convites instantes da parte de nosso Deus e esses convites Ele não os dirige do
mesmo modo a toda a humanidade...
“Para com as almas que
chama à Sua intimidade, mostra-se insistente, suplicante, e lhes revela com tão
grande luz o radioso esplendor da virgindade, que imediatamente elas se
apaixonam pela bela virtude, preferindo mil mortes a dela serem privadas.
“Conheceis todas o apelo
do Mestre; vós o sentistes mendigando o vosso amor... e como Tiago e João tudo
deixastes para segui-Lo. Teríeis julgado
dar-Lhe alguma coisa? Não, também neste caso vós é que recebestes.
“Bem pequenina é a nossa
parte: não fechar a porta ao seu Amor:
eis tudo.
Sei que a Deus abris
completamente a entrada de vosso espírito, de vosso coração, minhas queridas
filhas, e quanto o Bendigo!
“Sede generosas! Jamais
recueis, o que não seria digno d’Aquele que vos escolheu”.
“Só Deus, hóspede dos
corações puros e amigo das almas sem mancha, vos pode elevar pela santa
virgindade até à semelhança dos Anjos.
“No que vos toca, nada
Lhe deveis recusar; Ele fará o resto. Há de guardar-vos e abençoar-vos, a fim
de que, permanecendo sempre virgens sob as vestes de Santa Maria, Mãe de Nosso
Senhor Jesus Cristo, vos apliqueis de contínuo a fazer o que é digno de
recompensa.
“Tomai vossas medidas,
minhas queridas filhas, para que no grande dia do Juízo tenhais na mão a
lâmpada cintilante...
“Deus não vos faltará e
se lhe fordes fiéis sereis daquelas que em companhia de Santa Inez seguirão por
toda parte o Cordeiro”.
(“Madre
Francisca de Jesus”, de Reginaldo Garrigou-Lagrange, Tip. Beneditina Santa
Maria, págs. 127/135)
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