Assim era chamada a
Santa por causa de sua origem: Lídia era uma província do Egito, colonizada
pelos filhos de descendentes de Ludim (Gen 10, 13). Soldados ludianos muitas
vezes tomaram parte em guerras contra o Povo Eleito (Jer 46,9; Ez 27, 10, e I
Mac 4, 25). Nossa santa era natural da
cidade de Tiatira, mas residindo em Filipos, na Macedônia, onde o Apóstolo São
Paulo, em companhia de Silas, Timóteo e Lucas, chegou na segunda viagem
missionária, entre os anos 50 e 53.
Tiatira que
ficava, pois, na região chamada Lídia, na parte ocidental da Ásia Menor, era conhecida
pela sua indústria de tingimento e é provável que Lídia tivesse aprendido ali
as habilidades que vieram a tornar-se a sua profissão. A existência de
fabricantes de corante tanto em Tiatira como em Filipos é comprovada por
inscrições descobertas por arqueólogos. É possível que Santa Lídia se tivesse
mudado por causa do trabalho, quer para cuidar do seu próprio negócio, quer
como representante de alguma firma de tintureiros tiatirenos, não se sabe ao
certo. Mais tarde, já em Filipos, Lídia vendia a púrpura tíria[i], quer o corante, quer o
vestuário e tecidos tingidos com ele. Parece que era ela quem dirigia a sua
casa, o que pode ter incluído escravos ou servos, e, portanto, possivelmente
era viúva ou solteira, haja vista que não se menciona se era casada.
O corante púrpura era extraído de várias fontes. O mais caro era de certos
tipos de moluscos marinhos. Segundo Marcial, poeta romano do Século I, um manto
da mais fina púrpura de Tiro, outro centro fabricante dessa substância
(sempre citada ao lado de Sidônia), chegava a custar 10.000 sestércios, ou
2.500 denários, o equivalente ao salário de 2.500 dias de um trabalhador. É
óbvio que essas roupas eram artigos de luxo ao alcance de poucos.
Santa Lídia é descrita por
São Lucas, nos Atos dos Apóstolos, como "adoradora de Deus", o que
indica que poderia ser uma gentia convertida ao judaísmo.
Pelo fato de
negociar com tecidos é a padroeira dos tintureiros, tendo sido a primícia do
cristianismo na Europa. Os missionários de Cristo, após terem pisado o solo
europeu, aguardaram o sábado para encontrar os correligionários hebreus em
algum lugar, na margem do rio Gangas, onde presumiam que eles pudessem se
reunir (na falta de uma sinagoga) para a oração em comum e para a leitura de
alguma página da Escritura. Assim descreve São Lucas como ocorreu este
encontro:
"No sábado, saímos porta afora,
às margens do rio, onde supúnhamos que se fizesse oração. Sentados, dirigimos a
palavra às mulheres que se haviam reunido. Uma delas, chamada Lídia, negociante
de púrpura, da cidade de Tiatira, adoradora de Deus nos escutava. O Senhor lhe
abriu o coração, de sorte que ela aderiu às palavras de Paulo. Tendo sido
batizada ela e a sua família, fez este pedido, dizendo: Se julgais que eu sou
fiel ao Senhor, entrai em minha casa e ficai nela. E forçou-os (a isto). (At 16, 11-15).
Supõe-se que Lídia
fosse abastada e tivesse muita autoridade na família, uma vez que o tecido com
que trabalhava era precioso, e seu testemunho foi suficiente para que seus
familiares pedissem o batismo, aceitando os missionários em casa como hóspedes.
Sabe-se também que São Paulo era tecelão e pode ter havido algum encontro entre
os dois do tipo “negocial” fora do religioso.
Esta deve ter sido
a primeira conquista cristã em terra europeia, fora de Roma, é claro: Lídia,
desde então, foi tida como protótipo e símbolo de todas as mulheres que trariam
entre as paredes de seu lar a chama da fé em Cristo. A rica comerciante, dócil
à graça, havia anteposto os interesses do espírito aos interesses econômicos,
abandonando o comércio para recolher-se com outras mulheres num lugar de
oração, junto às margens do rio Gangas. Lídia, trazida à sua alma pelas
palavras do Apóstolo e pela graça batismal, pediu com doce insistência, ou
melhor, obrigou os missionários a aceitarem a sua hospitalidade.(At 14, 14-40).
Dessa maneira, a casa de
Lídia tornou-se o primeiro centro comunitário, a primeira igreja na Europa. Mais tarde, depois de Paulo e Silas terem sido soltos da prisão, eles
foram novamente ao lar de Lídia. Encorajaram ali os irmãos e então partiram de
Filipos (Atos 16, 36-40).. Pode ser que os crentes na recém-formada congregação
ou igreja filipense usassem a casa de Lídia como local para reuniões. É lógico
imaginar que sua casa tenha continuado a ser um centro de atividades cristãs na
cidade.
O culto a Santa
Lídia é uma tradição das mais antigas da Igreja Católica, foi inscrita
na lista dos santos católicos pelo cardeal César Barónio em 1607. A santa é festejada no dia 3 de agosto
O PAPEL DE SANTA
LÍDIA NA PROPAGAÇÃO DO CRISTIANISMO NA EUROPA
Os episódios e comentários a seguir foram
extraídos de uma biografia de São Paulo, de autoria do alemão Joseh Holzner:
“Lídia, a comerciante de púrpura de Filipo (Act 16, 11-15)
Foi um
grande dia da história do gênero humano, quando São Paulo e seus três
companheiros puseram seus pés pela primeira vez ns Macedônia, em solo europeu.
Noutros tempos viveu aqui um valente, são e nobre povo, que pela atrevida
empresa de um jovem rei não somente foi célebre no mundo, mas também, no
pensamento da Providência, já séculos antes havia de preparar ao Evangelho o
caminho sobre a terra. Com uma simplicidade e grandeza admiráveis, disse a
Sagrada Escritura no início do Livro dos Macabeus: “E sucedeu que depois que
Alexandre da Maceônia derrotou Dario, rei dos persas e medos, tomou por assalto
todas as fortalezas, vencendo todos os reis da terra e penetrado até nos
últimos termos do orbe, emudeceu o mundo diante dele... Depois caiu enfermo e
conheceu que havia de morrer”. (I Mac 1, 1-8). Mesmo os maiores homens, chamados Alexandre ou César,
são somente preparadores do caminho e criados de Deus. Eles haveriam de abrir
os sulcos em que o divino Semeador pudesse espalhar sua semente. Entre todos os
povos da antiguidade os macedônios foram os que mais assemelharam-se aos
romanos. Desde o ano 167 antes de Cristo os romanos foram senhores do país e o
dividiram em quatro distritos de governo, dos quais os mais importantes foram
Tessalônica e Filipos.
Ao
longe já se via o templo de Diana da pequena cidade marítima de Neápolis (hoje
Kawalla), a qual está situada em forma de teatro sobre um saliente rochedo
banhado pelo mar. Um círculo, no pavimento da igreja de São Nicolau assinala
hoje o lugar onde São Paulo desembarcou.
Junto à pequena cidade, nossos viajantes, ora pela famosa estrada romana
Via Egnacia, ora por um caminho escavado na rocha, subiram ao monte costeiro
Pangeo até à altura do desfiladeiro, onde se abriu ante seus olhos uma vista
admirável até o norte. Viram sob a planície do vale, rico em fruteiras, na qual
se levantava defronte, sobre o último prolongamento da montanha, Filipos com
sua acrópole. Era uma paisagem cheia da antiga poesia bucólica. Agora estava
ali os mensageiros de uma nova liberdade, os arautos de um novo conquistador do
mundo, que sem espada havia feito mais pela liberdade do mundo que todos os
campeões da liberdade juntos. O imperador Augusto havia elevado Filipos à categoria
de colônia militar romana com direito municipal itálico e isenção de tributos.
Os veteranos se julgavam romanos genuínos e haviam levado consigo, com suas
divindades romanas, Minerva, Diana, Mercúrio e Hércules, a honradez e conduta
romanas. Pela estrada militar romana que atravessava toda Macedônia de leste a
oeste e à outra parte do Adriático ia por Brindis até Roma, sentiam-se unidos
com a capital do mundo e o Júpiter Capitolino. Desta forma, Filipos veio a ser
uma cidade provincial típica romana, uma Roma pequena com foro, teatro,
acrópole e muralhas fortificadas. Os cidadãos estavam orgulhosos de sua
constituição favorável à liberdade e à maneira dos cônsules elegiam cada ano
dois prefeitos ou “arcontes”, chamados também pelo povo de “estrategas”. Quando
estes iam ao foro para pronunciar sentença, precediam-lhes como em Roma dois
litores.
Mas em
meio a estes romanos viviam ainda os descendentes dos nativos da Macedônia e
Trácia que o rei Filipo havia estabelecido aqui noutro tempo para cavar em
busca de ouro no Pangeo. Eram todavia intratáveis. Os homens, ásperos, soberbos
e teimosos; as mulheres, livres e ansiosas por independência, falavam retamente
sobre política e tinham parte nas eleições e turbulências políticas. Se aqui as
mulheres se faziam cristãs, podiam exercer grande influência. Sobretudo as almas das mulheres, tão
sensíveis para o celestial, facilmente se lhes comunicava fervor religioso,
porque estavam em parte imbuídas em doutrinas orientais misteriosas com seus
hinos sublimes e ideias de imortalidade. São Paulo encontrou aqui, sobretudo
entre as mulheres, adeptos entusiastas. Filipos prometia ser um proveitoso
campo de missão.
Nos
dias seguintes indagaram as perspectivas e pontos de contato para a pregação do
Evangelho. Assim chegou o sábado. Viviam poucos judeus em Filipos. Não havia
nenhuma sinagoga, porque faltava o número dos escribas requeridos segundo a lei
rabínica para formar um tribunal. Mas, se não conseguiram possuir uma sinagoga
pelo menos havia de ter um lugar fechado, rodeado de um muro ou cercado de sebe
como lugar de oração. Os rabinos sabiam que o povo sem o exercício público de
religião logo haviam de cair na indiferença ou no ateísmo. São Lucas teve
conhecimento de dito lugar, e conduziu seus compatriotas para a porta da
cidade, ao longo do curso do rio Gangas. Ali viram logo o lugar rodeado de uma
parede baixa de jardim. Com admiração sua encontraram dentro do cercado somente
algumas mulheres, parte judias, parte gentias tementes a Deus, que rezavam suas
devoções da manhã. Majestosamente ao fundo o Pangeo alçava seu cume nevado e ao
lado o arroio murmurava sua melodia. Estas mulheres não sabiam muito
seguramente, mas tinham um vivo interesse religioso; e àquele que tem isso Deus
o leva mais adiante. Aqui ante estas mulheres conseguiu São Paulo dar livre
curso a seu coração. Poucas vezes terá tido um público tão agradecido. Neste
grupo de mulheres causa maravilha ver a uma senhora bem vestida, especialmente
interessada no que toca a religião, a qual não era de Filipos, mas uma piedosa
pagã vinda de Tiatira, na Lídia. Por isso era chamada de Lídia. Era uma rica
comerciante, que, sem dúvida, depois da morte de seu esposo, do qual nada
sabemos, continuou na cidade seu negócio com telas de púrpura. Sua pátria,
Tiatira, era conhecida desde os tempos de Homero (Ilíada 4, 141) pelo comércio
de púrpura. A púrpura era um tecido precioso e o comércio com ele exigia grande
capital. Lídia era uma daquelas almas cristãs por natureza, que, logo ao ouvir
falar de Jesus, o reconhecem ao ponto como o caminho, a verdade e a vida. É uma
representação encantadora saber que a este ato religioso da manhã assistiram
também, além de Lídia, Evodia e Sintique, que mais tarde rivalizaram entre si,
e às quais São Paulo em sua carta aos filipenses exortou tão afetuosamente à
paz. Assim, pois, temos já várias pessoas conhecidas nesta cidade.
Temos
de ser muito reconhecidos a São Lucas pela formosa palavra com que introduz a
conversação de Lídia, e que nos descobre sua compreensão do coração da mulher e
da obra da graça: “O Senhor lhe abriu o coração para que escutasse atentamente
as palavras de São Paulo”. Era uma mulher prudente e refletida. Uma hábil
mulher de negócios analisa tudo detalhadamente. Mas aqui não há para ela
nenhuma demora. Com extraordinária rapidez se resolve receber o batismo. Talvez
tenha sido no mesmo dia, na noite de sábado para o domingo, quando São Paulo e
seus companheiros com as mulheres recém convertidas desceram o sussurrante
Gangas, onde se efetuou a solenidade do batismo. A resoluta comerciante Lídia,
com seu jeito enérgico e vigoroso voz de dona de casa, logo também dispôs que
todos seus criados recebessem o batismo. Mais ainda, dada sua energia é de
suspeitar que não somente em Filipos, mas também em sua terra Tiatira foi uma
apóstola de Cristo, e teve parte no louvor que São João no Apocalipse escreve
por ordem de Jesus ao anjo da comunidade de Tiatira: “Conheço tuas obras, tua
caridade, tua fé, teus serviços e tua paciência” (Apoc 2, 19).
Sua
segunda ação como cristã foi convidar todos os missionários a deixar seu
albergue e alojar-se em sua espaçosa casa de comércio: “Se me tendes por fiel
ao Senhor”, disse. Isto estava cordialmente falado. Lídia tinha realmente boas
razões: Sua casa era o único lugar adequado para as reuniões de culto da futura
comunidade cristã. O que também seu pundonor cristão, sua necessidade
material, sua ambição feminina
encontrassem certa satisfação em abrigar a primeira igreja cristã e favorecer
os missionários, quem poderia vituperá-la por isso? “Assim nos obrigou!”,
acrescenta São Lucas, risonho. Era uma honra para Lídia que São Paulo aceitasse
o convite. Ela foi uma coluna para a igreja apostólica, uma amiga maternal do
Apóstolo, de todos os mensageiros da fé e da recente comunidade. Quando São
Paulo escreve depois : “Vós o sabeis, filipenses meus: quando comecei a pregar
o Evangelho entre vós, e depois saí da Macedônia, nenhuma comunidade entrou
comigo numa relação do mútuo dar e recebe senão somente a vossa... Também à
Tessalônica me haveis enviado mais de uma vez algo para socorrer minha
necessidade” (Filipenses 4, 15-16), sem dúvida muitas destas dádivas passaram
pelas mãos de Lídia.
Quem
haveria de pensar que o Evangelho faria sua entrada na Europa tão calada e
ocultamente? Não solenemente como no Areópago ante os filósofos, não
dramaticamente como em Chipre ante o homem de Estado, mas em forma de idílio
como uma manhã de verão fresca pelo rocio ou como uma deliciosa aurora no
Oriente. Estes suaves e contudo vigorosos tons de sentimento introduziu a
mulher no Evangelho já no tempo de Jesus. E em Filipos continua ecoando. Quando
o Evangelho veio para a Europa, chegou primeiramente para as mulheres, porque
os homens não estava presentes, como também entre os samaritanos foi uma mulher
a que Jesus iniciou no mistério do reino de Deus. As mulheres foram as últimas
ao pé da cruz, na sepultura, assim as primeiras junto ao sepulcro vazio. Nas
tristes histórias de hipocrisias, ódios, perseguições, injúrias, deserções e
covardes fugas não encontramos no Evangelho mulher alguma. Os homens, como
mensageiros da fé,e missionários e defensores dos interesses religiosos estão,
na verdade, mais na luz do reverbero; porém, onde estaria a Europa cristã sem a
mulher cristã em casa como mãe, esposa, irmã, como auxiliadora
virginal-maternal da miséria de todas as classes? São Paulo teve para este lado
da feminilidade uma profunda compreensão e foi o primeiro em empregar a mulher
ativamente na missão. Ele aprecia a mulher dotada de gênio, como Priscila que
instrui ao douto Apolo. Em qualquer de suas cartas dispensa saudações e
reconhecimento para as mulheres. Reconhece os serviços de Cloe em Corinto, de
Febe em Cencreas, a quem confia sua carta aos romanos, e o ser pequena mulher a
mãe Rufo que foi também para ele uma mãe. Quando escreve ao rico comerciante
Filemon não esquece de saudar sua esposa Apfia. Aprecia especialmente o
trabalho da mulher de família e a educação dos filhos, pela qual a mulher
adquire o céu; aprecia as filhas virgens de Filipe de Cesarea, dotadas de
profecia; seu cuidado se dirige também às boas viúvas, que se destacavam no
campo da caridade e por isso eram mantidas pela comunidade (I Tim 5, 3-16).
Como profundo conhecedor do gênero humano tem uma olhada para todos os bons
lados do caráter feminino. As nobres mulheres de Filipos como santas figuras
estão às portas da Europa, como se quisessem recordar a todas suas irmãs desta
parte do mundo que as mulheres da Europa têm na Igreja cristã um santo destino,
de ser sacerdotisas, às quais se confiou em primeiro lugar o sagrado fogo que
fez feliz e grande a nossa parte do mundo.
Mas
tampouco devemos esquecer àqueles nobres varões, como Epafrodito, a quem São
Paulo chama seu “companheiro de armas, co-militante e colaborador”, que visita
o Apóstolo preso em Roma e lhe traz presentes. Também Clemente e Sicigo (se
realmente esta última palavra é um nobre mesmo) e muitos outros.estão ao lado
daquelas mulheres, e em verdade com tal constância que São Paulo sabe estar
escritos seus nomes no livro da vida (Fil. 4, 3)
Nenhuma
comunidade foi tão amada por São Paulo como Filipos. Ela foi em solo europeu
seu primeiro amor, “seu gozo e sua coroa” (Fil. 4, 1). “Deus é testemunho de
como os amo a todos vós do fundo do coração” (Fil. 1, 8).
(“San
Pablo – Heraldo de Cristo” – de Josef Holzner – Editorial Herder, Barcelona,
1956 – págs. 180/185)
Breve história da “púrpura tíria”
TIRO
foi o principal porto marítimo da antiga Fenícia, no território conhecido
atualmente como Líbano. Essa cidade tinha um próspero comércio de tecido
púrpura. Foi por causa de Tiro que essa cor viva ficou conhecida no Império
Romano como “púrpura tíria”.
Por
causa de seu alto preço, a cor púrpura veio a ser associada com
realeza, honra e riquezas. Inclusive, por meio de um decreto imperial
na Roma antiga, uma pessoa comum que se atrevesse a vestir um traje completo
tingido de púrpura da melhor qualidade era considerada culpada de alta traição.
Esse
corante especial, tanto naquela época como atualmente, é extraído de certos
moluscos em pequenas quantidades — uma gota de cada. Os tírios usavam os
moluscos “múrices”, principalmente o brandaris e
o trunculus, encontrados
em diversas regiões ao longo da costa do Mediterrâneo. Podiam-se obter
diferentes tons desse corante, dependendo do local exato onde os moluscos eram
apanhados.
A “púrpura
tíria” (também chamada de “púrpura de Tiro” em grego:
πορφύρα, porphyra; em latim: purpura)
é uma tinta natural de coloração
vermelho-púrpura, extraída de caramujos marinhos, e que
provavelmente foi produzida pela primeira vez pelos antigos fenícios.
Esta tinta tinha
grande valor na Antiguidade por não desbotar - ao
contrário, ela se torna gradualmente mais brilhante e intensa com a exposição
ao tempo e à luz do sol.
A púrpura
tíria era cara; segundo o historiador Teopompo,
do século IV a.C., "a púrpura para as tintas valia o seu peso em prata em Cólofon",
na Ásia Menor. Estes custos transformavam os
produtos têxteis que utilizavam a púrpura tíria em símbolos de status, e as
antigas leis suntuárias ditavam e até proibiram o
seu uso. A produção dos animais que forneciam a tinta era controlada com rigor
durante o Império Bizantino, e subsidiada pela corte
imperial, que restringia seu uso para a pintura das sedas
imperiais; o filho de um imperador no poder era chamado
de porfirogênito (porphyrogenitos,
"nascido na púrpura"), tanto referindo-se à Pórfira, o pavilhão do Grande Palácio de Constantinopla revestido
de pórfiro onde
os herdeiros do trono nasciam, quanto à púrpura que futuramente trajariam.
A substância
consiste de uma secreção mucosa da glândula hipobranquialde um dos
diversos caramujos marinhos encontrados no Mediterrâneo Oriental, o gastrópode marinho Murex brandaris,
o murex espinhoso Bolinus
brandaris (Linnaeus,
1758), o murex listrado Hexaplex trunculus, e o Stramonita haemastoma.
No hebraico bíblico, a tinta extraída do Murex
brandaris era conhecida como argaman (ארגמן). Outra
tinta, extraída do Hexaplex trunculus, produzia uma cor índigo chamada
de tekhelet (תְּכֵלֶת), usada em
vestes trajadas para funções rituais.
Diversas
espécies de moluscos da família Muricidae,
como por exemplo o Plicopurpura pansa (Gould, 1853), das
regiões tropicais do Oceano Pacífico oriental, e Plicopurpura
patula (Linnaeus, 1758) da região do Caribe,
no Oceano Atlântico ocidental, também
produzem uma substância semelhante (que se transforma numa cor púrpura
duradoura após exposição à luz do sol), e esta característica foi também
explorada pelos habitantes locais nas regiões de ocorrência destes animais.
Alguns outros gastrópodes predatórios, como os membros da família Epitoniidae,
parecem produzir uma substância similar, que ainda não foi estudada nem
explorada comercialmente. O molusco Nucella
lapillus, do Atlântico Norte, também pode ser usado para
produzir tintas púrpura e violeta.
Na natureza
estes moluscos utilizam esta secreção como parte de seu comportamento predatório,
e para funcionar como uma camada antimicrobiana que
cobre seus ovos.
O molusco secreta esta substância quando é tocado ou atacado fisicamente por
humanos, portanto a tinta pode ser extraída através de um processo de "ordenha",
que embora seja mais trabalhoso é um recurso renovável, ou através do método destrutivo,
que consiste da coleta dos moluscos e do esmagamento de suas conchas. Segundo
David Jacoby,[9] "doze
mil conchas de Murex brandaris não
produzem mais que 1,4 g de tinta pura, suficiente apenas para colorir a bainha
de uma única veste."
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