Na
cidade de Daroca, localizada no nordeste da Espanha, os habitantes se orgulham
de seu passado histórico e de sua importância durante os tempos romanos. É
protegida por muros altos em todos os lados e possui mais de cem torres para
vigilância e observação. Está a cerca de 75 quilômetros de Zaragoza e foi
escolhida pelo Senhor para uma notável manifestação sobrenatural eucarística. É
a primeira povoação espanhola, e talvez do mundo, que estabeleceu uma festa
pública em honra do Santíssimo Sacramento.
O
passado da cidade ainda parece vivo mostrando muros e castelos medievais,
torres, praças e ruas conforme o traçado romano daquela época. Nas igrejas e
museus podem ser encontradas a inestimável arte romana e dos mouros,
observando-se também a predominância do estilo gótico e a influência do Renascimento.
Todavia,
embora tenha toda esta riqueza histórica, o maior tesouro de Daroca é a
relíquia dos Sagrados Corporais, que data de 1239, quando aconteceu o milagre.
Por aquele ano, quando a cidade de Valencia estava sob o reinado do Rei
católico Dom Jaime, o rei sarraceno Zaen Moro decidiu tomar a cidade com as
tropas que haviam chegado do norte da África. O rei católico vendo as intenções
do sarraceno, e sabendo que a força militar espanhola era menor, ordenou oferecer
uma Santa Missa ao ar livre, e encorajou os soldados assim como os oficiais, a
receberem a Sagrada Eucaristia. O Rei Jaime assegurou aos militares que se eles
fossem fortalecidos espiritualmente com o Corpo do Senhor, poderiam lutar sem
medo porque receberiam a proteção e a ajuda Divina.
As
tropas cristãs de Daroca, Teruel e Calatayud se dispunham a conquistar dos
mouros o Castelo de Chio, Luchente, distante três léguas de Jativa. Estávamos a
23 de fevereiro de 1239. O Capelão celebrara, momentos antes, a Santa Missa na
qual consagrou seis hóstias destinadas à Comunhão dos seis capitães daquelas
tropas: Jiménez Pérez, Fernando Sánchez, Pedro, Raimundo, Guilhermo e Simone
Carroz. O sacerdote ficou confuso e aterrorizado com o estrondo de canhões, os
tiros, gritos e toda a confusão que se formou, pois os mouros iniciavam um
ataque de surpresa. Foi obrigado a interromper a Missa, escondendo as sagradas
espécies que já estavam consagradas, envoltas nos corporais, num pedregulho do
monte.
Num
intervalo da batalha, quando os sarracenos se retiraram para agrupar as suas
forças, os soldados católicos se ajoelharam diante do altar para dar graças a Deus
por aquela primeira vitória alcançada. Saindo os cristãos parcialmente
vitoriosos, os comandantes pediram ao sacerdote que lhes desse a Comunhão em
ação de graças ao Senhor pela vitória alcançada. Sem perca de tempo, o padre
Mateo tentou encontrar o lugar onde havia escondido as Hóstias e teve grande
dificuldade, porque em face da confusão reinante ficou em dúvidas quando ao local.
Mas por fim encontrou os Corporais e logo abriu para verificar se estava tudo
bem com as Hóstias Consagradas. Ficou perplexo com o que viu! As seis Hóstias
tinham desaparecido e ficaram em seu lugar seis manchas de sangue no Corporal.
Tinha acontecido uma notável manifestação milagrosa. Apressado, o sacerdote
subiu ao altar improvisado e mostrou aos militares o Corporal com as manchas do
Sangue do Senhor, para reverência e veneração de todos.
Os
comandantes se regozijaram ante o que viram. Tomaram isto como um sinal de
Jesus de que iam ser vitoriosos. Fizeram com que o sacerdote levantasse o
corporal manchado de sangue num mastro como se fosse um estandarte. Voltaram á batalha contra os mouros e o
castelo de Chio foi recapturado. O mérito desta batalha deu-se ao milagre
eucarístico.
A
notícia do milagre circulou ligeira e inclusive despertou ciúmes nos habitantes
das cidades vizinhas. Como a celebração da Santa Missa foi realizada no campo,
bem distante da cidade de Valência, as três cidades: Teruel, Catalayud e
Daroca, reivindicaram que o milagre havia acontecido dentro de suas jurisdições
territoriais. Todas as três queriam ficar com a custódia dos Santos Corporais.
O assunto foi debatido durante muito tempo e depois de muitas palavras,
decidiram que a disputa seria resolvida através da sorte. Embora fosse um
critério incomum, foi o escolhido de comum acordo entre as partes. Através da
sorte seria indicada a cidade que ficaria na posse dos Panos Sagrados.
Concordaram ainda, que os Corporais, devidamente acondicionados e protegidos,
seriam colocados sobre uma mula e o animal deveria escolher qual a direção e o
caminho a seguir.
E
assim foi feito! A mula deixou o monte onde estava e iniciou sua jornada,
seguida pela assistência composta dos guerreiros e sacerdotes com velas acesas.
Depois de vaguear durante 12 dias, num
percurso de cerca de 200 milhas, dobra os joelhos e cai morta em frente à
Igreja de São Marcos (hoje Igreja da Trindade), em Daroca. Então Daroca foi a
cidade escolhida. Há vários relatos que se referem à viagem da mula, quando
ocorreram muitos milagres em seu percurso, ouviram-se cantos e músicas
angelicais ao lado de fúria de demônios que abandonavam pessoas que tinham
possuído, ao lado, também, de conversões de vários pecadores. O Corporal ficou
nesta igreja até que se trasladou para a de Santa Maria. Estávamos a 7 de março
de 1239, festa de São Tomás de Aquino (que era vivo e tinha cerca de 14 anos de
idade), um grande devoto e defensor da Eucaristia. Mais tarde, São Tomás foi
nomeado o protetor do Milagre Eucarístico de Daroca.
Os
habitantes felizes com o desfecho, providenciaram a construção de uma igreja,
para ser a depositária dos preciosos Panos de linho. Num altar especial
colocaram os dois Corporais dentro de molduras e vidros protetores, a fim de
que os fiéis pudessem apreciar e venerar as seis manchas com o Sangue do Senhor.
Atualmente a Igreja em Daroca onde estão os Corporais Sagrados é denominada,
Igreja de Santa Maria Colegiada, ou simplesmente “A Colegiada”. Nas paredes
foram pintadas cenas admiráveis do milagre, e junto ao altar existem muitas imagens
e estátuas feitas de alabastro, multicoloridas, no estilo medieval.
No
ano de 1261, no reinado do Papa Urbano IV, a cidade de Daroca e o seu cabido
resolveram enviar uma delegação à Roma a fim de informar detalhadamente Sua
Santidade sobre as maravilhas operadas por Deus no portentoso milagre. E tinha aumentado tanto a piedade dos fiéis
que foi necessário construir fora dos muros da cidade uma pequena torre de
pedra para abrigar a Santa Relíquia. O Papa Urbano IV era contemporâneo da
Beata Juliana de Liege, a monja que passou
sua vida tentando instituir a Festa do Santíssimo Sacramento e foi ele
quem declarou a autenticidade do milagre de Daroca. Um ano depois, em 1262,
instituiu a Festa de Corpus Christi. Acredita-se que o Papa tenha visto no
milagre de Daroca um sinal divino para que fosse instituída a festa de Corpus
Christi.
Chegou
também ao Papa os informes de dois grandes santos, São Boaventura e São Tomás
de Aquino, conclamando a Igreja para uma veneração pública das Sagradas
Espécies, o que inclinou o ânimo do Santo Padre
na assinatura dos decretos que instituíram na Igreja a soleníssima festa
de “Corpus Christi”, ordenando que desde então se fizessem procissões públicas
e solenes e que nelas se levasse o Santíssimo Sacramento para ser adorado.
São
Vicente Ferrer, em 1414, pregou na torre onde estavam as relíquias e converteu
na ocasião 110 judeus. De tal forma repercutiu tal milagre em toda a
Cristandade que a partir de então começaram a vir peregrinos de todo o mundo
para venerar aquelas relíquias.
Em
1444, o Papa Eugênio IV concedeu um ano de jubileu para Daroca, cada 10 anos.
Este foi o mesmo Papa que reconheceu como autênticos os milagres eucarísticos
de Walldürn, na Alemanha e de Ferrara, na Itália.
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