domingo, 9 de outubro de 2016

VALENTE RESISTÊNCIA DAS MULHERES CATÓLICAS AOS HOLANDESES NO NORDESTE





Os piratas protestantes que invadiram e dominaram o Nordeste brasileiro no século XVII enfrentaram forte resistência de nossas mulheres.
Para fugir da terrível perseguição e das crueldades que os holandeses vinham praticando no litoral do Nordeste, a população se sujeitava a tudo. De Alagoas, da Bahia ou de Pernambuco corriam pelos matagais e serranias multidões de trânsfugas, algumas vezes protegidas pelos nossos guerreiros, com grandes sofrimentos, como relata o Padre Manoel Calado:
"Aqui os tristes ais dos meninos, os suspiros das mães, o desamparo das donzelas descalças, e metidas por a lamas, e passarem os rios com pouca compostura de seus corpos, alheios da honestidade, e recolhimento em que haviam sido criadas (o que sentiam mais que perder as vidas) aqui umas desmaiadas, outras com os pés abertos, porque o descostume de andar não as deixava dar um passo adiante; as pragas que rogavam ao Conde de Banholo (o qual depois que entrou em Pernambuco tudo foi de mal a pior) o ver os amancebados levar a cavalo as mancebas brancas, mulatas e negras, e deixarem ir suas mulheres a pé, e sem saberem parte delas, a fome que todos iam padecendo, o dormirem por os pés das árvores, sem amparo, nem abrigo; não é coisa que se pode escrever, porque muitos dos que o viram com os olhos, como eu, tendo os corações férreos, não se podiam refrear sem derramar grande cópia de lágrimas" 
Em outro episódio, D. Jerônima de Almeida, esposa de Rodrigo de Barros Pimentel (o qual fugira para a Bahia), foi presa em Porto Calvo e levada para Recife por haver agasalhado em sua casa e dado comida a uma tropa de soldados brasileiros que vinham da Bahia em direção de Pernambuco para combater os invasores. Colocaram-na em uma prisão juntamente com seus nove filhos, incomunicável com quem quer que fosse, e, depois de iníquo julgamento, foi condenada a morrer degolada. Sabedoras da notícia, várias mulheres de homens nobres foram até Maurício de Nassau pedir que lhe poupasse a vida. Fazendo-se passar por compassivo, o conde atendeu o pedido das mulheres e deu ordens que D. Jerônima fosse indultada
Quando a situação dos hereges invasores holandeses era quase insustentável, utilizaram-se de mais um artifício diabólico para sobrepujar os nossos. Publicaram um edital, pelo qual ordenavam que "todas as mulheres dos moradores que se haviam retirado com João Fernandes Vieira para os matos, fossem em cinco dias naturais próximo seguintes em busca de seus maridos com seus filhos, e filhas, sob pena de morte, a fogo, e sangue, e perdimento de seus bens, e que passado este termo de cinco dias, senão usaria de clemência, nem piedade com aquelas que tendo seus maridos, irmãos, ou filhos ausentes, se achassem em suas casas". 
Houve grande clamor entre as moradoras de Recife: "Umas se prostravam de joelhos, e com as mãos levantadas ao Céu, e os olhos arrasados em lágrimas, pediam a Deus perdão, e misericórdia, outras com os Rosários da Virgem Maria nas mãos, os passavam uma, e muitas vezes, outras se abraçavam com os inocentes filhinhos, e com soluços, e gemidos se despediam deles, outras caiam desmaiadas em terra sem dar acordo de si, outras que nunca haviam saído de suas casas, se não era no tempo da Quaresma, ou nos dias das festas principais à Igreja, e ainda então arrimadas em pajens, por não caírem; vendo-se neste aperto, e estreitura arremetiam com súbito temor a entrar por entre os matos, e ali se punham aos pés das primeiras árvores que achavam, pedindo a misericórdia a Deus, e a proteção, e amparo à Virgem Maria, e aos Santos, de quem eram mais devotas; porque de outra parte não esperavam que lhes pudesse vir socorro, nem remédio". 
Mais tarde, os holandeses começaram a cumprir suas ameaças. Estavam os insurrectos aquartelados pelas matas do interior pernambucano, sob o comando de João Fernandes Vieira, quando lhes chegou o aviso: já tinham sido levadas prisioneiras a mulher de Francisco Berenguer, D. Antonia Bezerra, a de Antonio Bezerra, D. Isabel de Góis e a de Amaro Lopes de Madeira, D. Luzia de Oliveira. E a notícia dizia que os inimigos estavam em busca de prender outras mulheres. Sabedor disto, levantou-se Fernandes Vieira e gritou para seus homens: "Vamos acudir por nossa honra, e por nossas mulheres, e filhos, morramos na demanda, pois mais vale uma morte honrada, que mil vidas com afronta. Porventura não somos nós Portugueses, filhos, e netos de nossos pais, e avós, que em outro tempo foram assombros do mundo? Que fazemos? Como não caminhamos? ". Tal foi o entusiasmo de sua tropa que, ao grito de "vamos! Vamos!" todos partiram com seu general para dar combate ao inimigo.
Quando estavam a caminho, resolveu Fernandes Vieira descansar numa fazenda, porque chovia muito e estavam todos enlameados. Quando dormia, teve um sonho, no qual lhe aparecia Santo Antonio repreendendo-o de descuidado, "e pouco zeloso do serviço de Deus, e das necessidades, e aflições de seus próximos, e que lhe mandava que se levantasse com pressa, e fosse a buscar o inimigo, porque lhe daria seu favor, e adjutório em paga dos serviços que nas suas confrarias havia feito". 
Ao se acordar, vendo naquele sonho alguma inspiração divina, o comandante mandou acordar toda a tropa e partir imediatamente. Quando chegaram ao acampamento holandês onde as mulheres estavam cativas, que era apenas uma fazenda, as sentinelas que lá restavam disseram que o inimigo já havia saído em direção de Recife com suas presas. Alguns quilômetros adiante o grupo de Fernandes Vieira se encontra com dois sentinelas inimigos, com os quais trocam tiros, matando um deles. Mais adiante estavam os holandeses aquartelados numa fazenda, já prestes a montar de novo, quando ouvem os tiros e voltam para dentro da casa. Neste local houve uma renhida batalha.
Desesperados, colocaram os hereges as três mulheres prisioneiras numa das janelas da casa da fazenda, juntamente com uma criança de quatro meses de nascida nos braços de uma delas, ameaçando matá-las se os portugueses não parassem de atirar. João Fernandes Vieira, sensatamente, mandou suspender o fogo. Teria que haver negociações. Mandou uma pessoa negociar, com a bandeira branca em sinal de paz, mas os holandeses traiçoeiramente mataram o emissário. Cheios de ódio por causa desta traição covarde, os nossos invadem a casa da fazenda, atirando e matando, livrando da morte as três mulheres e a criança e ainda matando todos os holandeses que estavam ali aquartelados. 
Bem diferente era o tratamento que as mulheres prisioneiras tinham nas mãos de João Fernandes Vieira ou dos portugueses, brasileiros ou negros de modo geral. Logo após o episódio acima, tiveram outro entrechoque no lugar chamado Afogados, onde fizeram prisioneiros dois holandeses e uma mulher que andava com eles. Os dois homens foram postos na prisão para serem interrogados, mas a mulher foi remetida a Recife, com um recado de Fernandes Vieira: que estava devolvendo a mulher para a liberdade e de volta para seus amigos, os holandeses, para demonstrar o cavalheirismo e cortesia com que os portugueses sabiam lidar com as mulheres, tratadas com respeito e sem lhes fazer qualquer agravo como os holandeses costumavam fazer com as nossas mulheres. 
João Fernandes Vieira era um rico comerciante de Recife, outrora amigo dos holandeses, que resolveu apoiar o levante popular para expulsar os invasores. Soube este que dois grandes senhores de engenho haviam perdido quase toda sua riqueza na guerra contra os batavos: os senhores Antonio Cavalcanti e Francisco Berenguer de Andrada, que já pensavam em desertar de tão nobre causa. Chamou-os João Fernandes Vieira para um acordo. Tanto Antonio Cavalcanti quanto Francisco Berenguer tinham dois filhos, um casal de cada um. Que fez Fernandes Vieira? Tratou que se casassem os dois filhos homens com as duas filhas mulheres, sendo que ele, Fernandes Vieira, seria o padrinho e lhes daria como dote engenhos e bens que possuía. Com este presente de padrinho os filhos de ambos os senhores de engenho (quase falidos) ficariam ricos. Perante tal oferta, os dois comandantes voltaram com redobrada coragem para o campo de batalha...


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