Na segunda-feira seguinte ao Domingo da Ressurreição, comemora-se na Itália a “festa do Anjo”, conforme explica o Papa João Paulo II. Festa muito simbólica pois foram os Santos Anjos que nos anunciaram a Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo. Vejamos os relatos dos Evangelhos:
Texto de São Mateus: “Após
o sábado, ao raiar do primeiro dia da
semana, Maria Madalena e a outra Maria vieram ver o sepulcro.
E eis que houve um grande terremoto: pois
o Anjo do Senhor, descendo do céu e aproximando-se, removeu a pedra e
sentou-se sobre ela. O seu aspecto era como o do relâmpago e a sua roupa, alva
como a neve. Os guardas tremeram de medo dele e ficaram como mortos. Mas o
Anjo, dirigindo-se às mulheres disse-lhes: “Não temais! Sei que estais
procurando Jesus o crucificado. Ele não está mais aqui, pois ressuscitou,
conforme havia dito. Vinde ver o lugar onde ele jazia.
Ide já contar aos discípulos que ele
ressuscitou dos mortos...” (Mt 28, 2-7)
Texto de São Marcos: “Passando
o sábado, Maria Madalena e Maria, mãe de Tiago, e Salomé compraram aromas para
ir ungi-lo. De madrugada, no primeiro dia da semana, elas foram ao túmulo ao
nascer do sol...
E diziam entre si: “Quem rolará a
pedra da entrada do túmulo para nós?” E erguendo os olhos, viram que a pedra
fora removida. Ora, a pedra era muito grande. Tendo entrado no túmulo,
elas viram um jovem sentado à direita, vestido com uma túnica branca, e
ficaram cheias de espanto. Ele, porém, lhes disse: “Não vos espanteis! Estgais
procurando Jesus de Nazaré, o Crucificado. Ressuscitou, não está aqui. Vede o
lugar onde o puseram. Mas ide dizer a
seus discípulos...” (Mc 16, 1-7).
Texto de São Lucas: “No
primeiro dia da semana, muito cedo ainda, elas foram à tumba, levando os aromas
que tinham preparado.
Encontraram a pedra do túmulo
removida, mas, ao entrar, não encontraram o corpo do Senhor Jesus. E aconteceu
que, estando perplexas com isso, dois homens se postaram diante delas,
com veste fulgurante. Cheias de medo, iclinaram o rosto para o chão; eles,
porém, disseram: “Por que procurais Aquele que vive entre os mortos? Ele não
está aqui; ressuscitou. Lembrai-vos de como vos falou, quando estava na Galileia:
“É preciso que o Filho do Homem seja entegue às mãos dos pecadores, seja
crucificado, e ressuscite ao terceiro dia. E elas se lembraram de suas
palavras”. (Lc 24, 1-8)
Texto de São João: “No
primeiro dia da semana, Maria Madalena vai ao sepulcro, de madrugada, quando
ainda estava escuro, e vê que a pedra fora retirada do sepulcro. Corre então e
vai a Simão Pedro e ao outro discípulo, que Jesus amava, e lhes diz: “Retiraram
o Senhor do sepulcro e não sabemos onde o colocaram”.
...Maria estava junto ao sepulcro, de
fora, chorando. Enquanto chorava, inclinou-se para o interior do sepulcro e viu
dois anjos vestidos de branco, sentados no lugar onde o corpo de Jesus fora
colocado, um à cabedeira e outro aos póes. Disseram-lhe então: Mulher, por que
choras? Ela lhes diz: Levaram o meu Senhor e não sei onde o colocaram”. Dizendo
isso, voltou-se e viu a Jesus de pé. Jesus lhe diz: “Mulher, porque choras? A
quem procuras?” Pensando ser ele o jardineiro, ela lhe diz: “Senhor, se foste tu
que o levaste, dize-me onde o puseste e eu o irei buscar!” Diz-lhe Jesus:
“Maria!” Voltando-se, ela lhe diz em hebraico: “Rabboni”, que quer dizer
“Mestre”. (Jo 20, 1-16)
1º Princípio tomista: um ente superior
ilumina o inferior
Toda a
Revelação foi feita pelos Santos Anjos aos homens, e entre eles mesmo sempre
foi feita uma revelação de um superior a um inferior. Assim, tanto a Encarnação
do Verbo quanto sua Ressurreição teriam que ser reveladas aos homens pelos
Santos Anjos. Será que a revelação da Ressurreição de Cristo não tenha sido
feita a Nossa Senhora em primeiro lugar? Sim, e é provável que Ela mesma tenha
ordenado aos dois Anjos que fossem anunciar a nova para as santas mulheres. A
razão disto é que competia aos discípulos de Cristo propagar esta notícia aos
demais, pois eram testemunhos mais fidedignos – pelo menos naquelas
circunstâncias em que se encontravam.
Eis o
princípio dado por São Tomás:
“Por corresponder á ordem da divina
Providência que os seres inferiores estejam submetidos à ação dos superiores,
como dissemos (q. 109 a .2;
q. 110 a .1)
os homens, que são inferiores aos anjos, são iluminados por estes, como os mesmos anjos inferiores
são iluminados pelos superiores...”
(“Tratado sobre os Anjos”, Q. 111, art. 1).
2º Princípio tomista: as revelações
angélicas são feitas aos homens através de imagens
“...Mas o entendimento humano não pode
captar a verdade em sua pura inteligibilidade por ser-lhe conatural ententer
por meio de imagens, como dissemos (q. 84 a .7). Por isso, os anjos propõem aos homens
as verdades inteligíveis sob semelhanças de coisas sensíveis...” (“Tratado sobre os Anjos”, Q 111, art. 1).
Estes
princípios explicam a razão de não haver inteira concordância dos evangelistas
em seus relatos. Por exemplo, São Mateus e São João falam claramente tratar-se
de um “Anjo do Senhor” (ou dois) , enquanto São Marcos fala de “um jovem” e São
Lucas informa que era, não um, mas dois homens, embora com vestes fulgurantes
para dar a entender que eram sobrenaturais, figuras angélicas. A referência a
“homens”, e não a anjos, é porque os anjos sempre aparecem aos homens sob
formas humanas. Já São João, descreve as cenas com mais detalhes e informa que
eram dois os santos anjos, uma vez que deve ter recebido a primeira notícia de
viva voz de Santa Madalena. Isto quer dizer o quê? Quer dizer que, como cada um
ouviu o relato de pessoas e de formas diferentes, o escreveu da forma em que o
ouviu. Não houve nenhum entendimento entre os evangelistas para escrever
uniformemente sobre os mesmos assuntos, eles o faziam conforme o Espírito Santo
os inspiravam, sem cotejar detalhes que consideravam insignficantes. É possível
que tenha sido dois anjos? Sim, e é muito simbólico que o fosse, pois
certamente queriam indicar que um estava sujeito ao outro (o 1º princípio
acima). E por que São Mateus e São Marcos dizem que era só um? Provavelmente,
quem lhes fez o relato só viu um anjo, enquanto que a pessoa que transmitiu a
notícia que chegou aos ouvidos de São Lucas, ou a própria Santa Madalena disse a São João que
eram dois os espíritos celestes. Supõe-se que viram os anjos as duas mulheres
citadas por São Mateus: Santa Madalena e Maria (mãe de São Tiago). São Marcos fala em três mulheres,
acrescentando Salomé, mas indicando apenas que foram três as que foram comprar
os aromas no sábado, não indicando quantas foram até o túmulo. Se eram duas as
mulheres, talvez uma viu um só anjo e a outra viu dois, o que é natural e comum
nestas visões sobrenaturais.
Uma das perfeições angélicas consiste
em transmitir uns para os outros a sua própria perfeição. Participam mais
perfeitamente da vida divina os anjos que estão mais próximos de Deus, e menos
os que estão mais afastados. Assim, as primeiras inteligências celestes
aperfeiçoam, iluminam e purificam às de graus inferiores. O segundo grupo
recebe as perfeições divinas por intermédio do primeiro, e o terceiro por
intermédio do segundo. Cada uma das ordens angélicas é portadora de revelações
e notícias das ordens precedentes. A primeira ordem as recebe de Deus diretamente,
transmitindo-as em seguida às demais ordens ou coros inferiores. Assim, compete
à última escala da hierarquia celeste transmitir as revelações divinas aos
homens.
Um exemplo vemos em Zacarias 1,13: um
Anjo superior, que falava diretamente a ele, disse para o outro palavras de
consolo. Um Anjo de classe inferior saiu ao encontro do primeiro e dele recebeu
iluminação: “Então, o Senhor, dirigindo-se
ao anjo que falava em mim, disse-lhe [a outro anjo] boas palavras, palavras de
consolação”. Outro exemplo, em Ezequiel. Um Anjo , formalmente designado pelo
Profeta como um querubim, recebe as ordens divinas e instrui outros para
executá-las: “Passai pelo meio da cidade,
seguindo-o, e feri; não sejam compassivos os vossos olhos, não tenhais
compaixão alguma.(Ez. 9,5). Que dizer do Anjo que anunciou a Daniel “a
ordem está dada” (Dan 9, 23), ou do primeiro que tomou fogo no meio dos
querubins (Ez 10, 2), ou do querubim que pôs fogo nas mãos do que vestia a
“sagrada estola” (Ez 10, 6-8) , senão que a boa ordem existente entre os Anjos
permite que uns orientem ou instruem a outros?
Um outro exemplo: um Anjo chama São Gabriel para explicar uma visão a
Daniel: “Ouvi a voz dum homem no meio de
Ulai, o qual gritou e disse: Gabriel, explica-lhe esta visão” (Dan 8, 16).
O PAPA E A FESTA DO ANJO
JOÃO PAULO II
REGINA CAELI
Segunda-feira, 1 de abril de 1991
Hoje é o segundo dia da
oitava da Páscoa. Ontem foi a solenidade de Pácoa, e hoje é segunda-feira de
Páscoa. Na Itália existe a formosa tradição de chamar a este dia “Pasquetta”,
mas eu não quero falar da “Pasquetta”.Segunda-feira, 1 de abril de 1991
Há também outro nome para indicar este dia: o dia da festa do Anjo. Esta é uma tradição muito bela, que corresponde profundamente ás fontes bíblicas da Ressurreição. Recordemos a narração dos evangelhos sinóticos, quando as mulheres vão ao sepulcro e o encontram aberto. Temiam não poder entrar, pois o sepulcro havia sido fechado com uma pedra muito grande. Pelo contrário, estava aberto. De lá de dentro ouviram as palavras “Jesus de Nazaré não está aqui”.
Pela primeira vez se pronunciam as palavras “foi ressuscitado”. Os evangelistas nos dizem que estas palavras foram pronuncias por anjos. Há um significado profundo nesta presença e proclamação angélicas. Do mesmo modo que um anjo, Gabriel, tinha que anunciar a encarnação do Verbo, do Filho de Deus, assim também para expressar pela primeira vez as palavras “foi ressuscitado”, a Ressurreição, não era suficiente um elemento humano, não bastavam as palavras humanas. Era necessária a presença de um ser superior, porque, para o ser humano esta verdade “foi ressuscitado”, e as palavras que a comunicam é tão desconcertante e incrível, que talvez nenhum homem se atreveria a anunciá-la.
Depois deste primeiro anúncio, repete-se: “O Senhor ressuscitou e apareceu a Pedro Simão”, mas o primeiro anúncio exigia uma inteligência superior à humana. Assim, pois, esta festa do Anjo – pelo menos como a entendo eu – completa a oitava de Páscoa. Nas leituras bíblicas e nas passagens evangélicas se lê sempre a respeitos destes anjos, mas a festa italiana destaca o momento desta presença angélica; não só a destaca, senão que ademais explica o porque deste momento da Ressurreição. Além da comprovação humana de que o sepulcro estava vazio, era necessária outra, porém sobrenatural: “Foi ressuscitado”.
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