(COMENTÁRIOS DE DR. PLÍNIO CORRÊA DE OLIVEIRA SOBRE A SANTÍSSIMA VIRGEM MARIA)
Entre o Padre Eterno e a criação existe o
Homem-Deus: inteiramente Deus, como as outras Pessoas da Santíssima Trindade e
tão homem quanto cada um dos descendentes de Adão.
Resta, contudo, um tal abismo separando Nosso
Senhor Jesus Cristo das demais criaturas, que a pergunta se impõe: na ordem das
coisas não deveria haver um outro ser que, ao menos de algum modo, preenchesse
esse hiato?
Ora, a criatura chamada a completar esse
vácuo no conjunto da criação, a criatura excelsa, infinitamente inferior a
Deus, mas ao mesmo tempo insondavelmente superior a todos os Anjos e a todos os
homens de todas as épocas – é precisamente Nossa Senhora.
A Virgem Santíssima é, para Deus Padre, a
mais eleita das criaturas, escolhida por Ele, desde toda a eternidade, para ser
a Esposa de Deus Espírito Santo e a Mãe de Deus Filho. Para estar á altura
dessa dignidade, Maria havia de ser a ponta de pirâmide de toda a criação,
acima dos próprios Anjos, elevada a uma inimaginável plenitude de glória, de perfeição
e de santidade.
Compreende-se. Sendo Mãe de Jesus Cristo, Ela
foi verdadeiramente Esposa do Divino Espírito Santo. E não poderia corresponder
a tão elevada prerrogativa se não fosse maior do que o maior dos Anjos. Assim,
Ela, mera criatura humana, é mais perfeita e mais santa do que toda a coorte
angélica, e incomparável com qualquer outro ser.
Elo de
ouro entre Deus e os homens
Por causa disso, Dante Alighieri, o grande
poeta italiano da Renascença, na sua “Divina Comédia” (que alguns dizem ser a
Suma Teológica de São Tomás de Aquino posta em verso), registra de modo
emocionante o momento em que encontra a Santíssima Virgem no Céu.
Após ter passado pelo Inferno e pelo
Purgatório, ele percorre os vários círculos dos bem-aventurados, até chegar no
mais alto coro angélico, ou seja, no píncaro da mansão celeste, onde começa a
divisar a glória de Deus. É uma luz difusa, que seus olhos não conseguem
sustentar. Ele repara então num outro ser que está acima dos Anjos. Nossa
Senhora. A Virgem Santíssima lhe sorri, e Dante contempla nos olhos d’Ela o
reflexo da luz incriada da Eterna Majestade.
Acabou-se a “Divina Comédia”.
Depois de a pessoa ter posto os olhos nos
olhos virginais de Nossa Senhora, não tem mais nada que contemplar, senão a
Deus, face a face. Pois o olhar humano fitou o olhar puríssimo, o olhar
sacralíssimo, o olhar sumamente régio, o olhar indizivelmente materno de Nossa
Senhora. Tudo está consumado: a “Divina Comédia” termina na mais alta das
cogitações que pode alcançar um filho de Eva.
Nossa Senhora é o grampo de ouro – ou de um
metal ainda mais precioso – que une a Nosso Senhor Jesus Cristo toda a criação,
da qual Ela é o ápice e a suprema beleza.
Papel único na
salvação das almas
Embora a maternidade divina, por si só, já
granjeasse a Nossa Senhora o título de primeira das criaturas, para tanto não
deixam de concorrer também as demais prerrogativas, virtudes e dons com que a
Santíssima Trindade A enriqueceu, assim como todos os excelentíssimos méritos
que Ela obteve em sua vida terrena, pela prática constante e crescente de um
indizível amor a Deus, de uma incansável caridade para com o próximo.
Dizem os teólogos que do alto da Cruz, Nosso
Senhor, cuja inteligência era infinita, conhecida todos os homens pelos quais
Ele estava derramando seu preciosíssimo sangue. E que Ele via a cada um dos
pecados que esses homens cometeriam até o fim do mundo, sofria por todos eles
e, ao mesmo tempo, imolava sua vida para que os homens se salvassem e
atingissem a bem-aventurança eterna.
Ora, unida de modo indissociável a seu Divino
Filho, compartilhando com Ele todas as duas dores inenarráveis e, por isso
mesmo, Co-Redentora do gênero humano, a Santíssima Virgem também nos conheceu a
cada um de nós naquela ocasião. Para que a compaixão d’Ela fosse completa, Ela
sofreu por nós com Jesus, e rezou pela remissão de cada um de nós, pedindo ao
Redentor pelas almas de todos os seus filhos.
De maneira tal que, naquela hora em que o
Verbo Encarnado antevia a multidão de pecados que se desprendia da história ao
longo dos séculos, Ela suplicava o perdão para cada homem, e Ele os dia
perdoando em atenção aos rogos de sua Mãe amantíssima. Somente Ela, sendo
inocente, poderia nos merecer a indulgência que nós, pecadores, não merecemos.
E aí vemos o papel de Maria, ápice de toda a
ordem da criação, como nossa Mãe e nossa Advogada.
Mãe de Cristo, Ela é Mãe de todos aqueles que
nasceram para a graça do Filho de Deus.
Mãe d’Ele, tornou-se Mãe dos homens, e Mãe particularmente solícita dos
pobres pecadores. Nessa qualidade Ela desempenha um papel que, de algum modo, o
próprio Deus não poderia desempenhar. Porque Deus é Juiz e, uma vez ofendido,
ultrajado, no rigor de sua justiça infinitamente perfeita, Ele tem de castigar.
Porém, Maria é a Mãe, e todos sabemos que as mães não se arrogam o papel de
julgar. Antes, são de modo natural as advogadas dos filhos. E por mais
miserável que seja um destes, mais imundo, mais asqueroso, mais crápula, até
mesmo em relação à própria mãe, ela o perdoa e pede ao pai que o perdoe também.
Ela está solidária com o filho, ainda quando o pai o abomine por inteiro.
Assim é Nossa Senhora, a Mãe supremamente boa
que reza por todos e cada um de nós. Ela, considerando que aquelas chagas
abertas no santíssimo corpo de seu Divino Filho foram feias em parte por meus
pecados, suplicou-Lhe: “Meu Deus, meu Filho, pela minha inocência, pela minha
virgindade, pelo amor que Vós sabeis que Vos tenho, rogo-Vos por ele. E essa
ferida que sofreis por causa dele, peço-Vos, em nome dessa dor, que tenhais
toda a clemência para com ele”.
E dessa forma cada um de nós foi perdoado.
Então, por meio de Nossa Senhora Deus veio a nós no seu Nascimento na Gruta de
Belém; por meio de Nossa Senhora, nós viemos a Deus no momento da Cruz, na hora
da Paixão, nos sofrimentos da Redenção e no alto do Calvário.
Divina Protetora que
jamais nos abandona
Essa compaixão e esse desvelo de Nossa Senhora, longe de
esmorecerem com a morte de Jesus, redobraram e cresceram em intensidade, em
desejo de abarcar o coração de todos os seus filhos, de levar a todas as almas
os méritos infinitos da imolação regeneradora do Verbo Divino. Por isso, Ela
continuou a ser a grande intercessora, a grande intermediária que nunca dos
nuncas abandonou nenhuma espécie de homem.
A Santíssima Virgem reúne os Apóstolos depois
que Nosso Senhor expirou no madeiro; agrupa-os, ainda, quando o Salvador parte
para o Céu; Nossa Senhora está junto deles, no Pentecostes, quando vem o
Espírito Santo; Ela acompanha a Igreja nos primeiros passos de sua vida e
depois, ao longo de toda a sua existência, Maria é a suprema protetora da Santa
Igreja Católica Apostólica Romana.
Nossa Senhora esteve sempre presente nas
batalhas que os católicos têm travado no volver da história, em defesa dos mais
valiosos interesses da Fé. Ela se encontra presente nas lutas incessantes de
cada homem contra seus defeitos, de maneira que, noite e dia, enquanto
combatemos nossas imperfeições, nossos vícios e mazelas morais, enquanto nos
esforçamos para adquirir maiores virtudes, ainda que não nos lembremos de Nossa
Senhora, Ela está se lembrando de nós no alto do Céu. E está pedindo por nós,
com uma misericórdia que nenhuma forma de pecado pode esgotar.
Com inteira propriedade, Ela é chamada pela
Igreja de “Porta do Céu”. É por essa porta que todas as orações e súplicas dos homens chegam a Deus; e é também por essa
porta que todas as graças e favores de Deus baixam do alto para os homens. Tudo
vai ao Senhor, e tudo nos vem, por intermédio de nossa Mãe, Rainha e Medianeira Universal, Maria Santíssima.
Basta nos voltarmos para Ele, que seremos
atendidos com uma profusão de bondade e de misericórdia inimagináveis. Nossa
Senhora nos atende e nos limpa a alma, nos dá forças para praticarmos a virtude
e nos transforma de pecadores em homens justos. Nunca nos faltará ânimo e vigor
para praticar a Lei de Deus, desde que, cheios de esperança e filial devoção, o
peçamos à Santíssima Virgem. Os que se voltam a Ela, tudo recebem d’Aquela que
tudo pode.
(Extraído da revista “Dr.
Plínio”, nº 43, outubro de 2001)
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