sábado, 25 de julho de 2020

APÓLOGO DE ISAÍAS SOBRE A VINHA





 As figuras de linguagem da Sagrada Escritura, como parábolas e apólogos, são aplicáveis a qualquer época. No entanto, algumas delas aplicam-se inteiramente aos dias de hoje, como esta a seguir: 

“Cantarei ao meu amado o cântico do meu parente sobre a sua vinha. O meu amado adquiriu uma vinha, plantada numa colina fertilíssima, Cercou-a duma sebe e tirou dela as pedras, plantou-a de cepas escolhidas, edificou uma torre no meio, construiu na mesma torre um lagar; esperava que desse boas uvas, mas produziu labruscas.[1]
Agora, pois, habitantes de Jerusalém, e homens de Judá, sede vós os juízes entre mim e a minha vinha. Que coisa há que eu devesse mais à minha vinha, que não lhe tenha feito? Far-lhe-ia acaso injúrias em esperar que ela desse boas uvas, em lugar das labruscas que produziu? Pois agora vos mostrarei o que hei de fazer à minha vinha: Arrancar-lhe-ei a sebe e ficará exposta ao roubo; derrubar-lhe-ei o muro e ficará sujeita a ser pisada. Farei com que fique deserta; não será podada nem cavada; crescerão nela os espinhos; mandarei às nuvens que não derramem sobre ela chuva. A vinha do Senhor dos exércitos é a casa de Israel, e os homens de Judá a planta, na qual qual ele tinha as suas delícias; esperei que praticassem a retidão, e eis que só há iniquidade, e que praticassem a justiça, e eis que somente se ouvem clamores.
Ai de vós que ajuntais casa com casa e ides acrescentando campo a campo, até chegar ao fim de todo o terreno! Porventura haveis de habitar sós no meio da terra? Aos meus ouvidos chegam estas coisas, diz o Senhor dos exércitos, Verdadeiramente que muitas casas grandes e belas virão a ficar desertas, sem habitante. Porque dez geiras de vinhas produzirão apenas um pequeno frasco (de vinho) e trinta alqueires de semente não darãomais que três.
Ai de vós os que vos levantais pela manhã para vos entregardes à embriaguez e para beberdes até à tarde com tal excesso, que venhais a ficar de todo esquentados pelo vinho. A cítara, a lira, o pandeiro, a flauta, o vinho encontram-se nos vossos banquetes; e vós não olhais para a obra do Senhor, nem considerais as obras das suas mãos. Por isso é que o meu povo foi levado cativo, porque não teve ciência. Os seus nobres morreram de fome e a sua multidão mudou-se de sede. Por isso é que a habitação dos mortos alargou o seu seio e desmesuradamente abriu a sua boca;  desceram a ela os seus heróis, o seu povo e os seus homens ilustres e gloriosos. O plebeu terá de se curvar, os grandes serão humilhados e os olhos dos altivos serão abatidos. O Senhor dos exércitos será exaltado (pela retidão do) seu juízo, e o santo Deus será santificado pela (administração da sua) justiça. Serão apascentados os cordeiros segundo o seu costume, e dos campos desertos, convertidos em fertilidade, comerão os estranhos.
Ai de vós que arrastais e iniquidade com cordas de vaidade, e o pecado com os tirantes dum carro! Vós que dizeis: Avie já com isso e sem demora venha a sua obra, para que a vejamos, aproxime-se e cumpra-se o decreto do Santo de Israel, a fim de que nós o conheçamos. Ai de vós os que ao mal chamais bem, e ao bem mal, que tomais as trevas por luz, e a luz por trevas, que tendes o amargo por doce, e doce por amargo!
Ai de vós que sois sábios a vossos olhos, e, segundo vós mesmos, prudentes!
Ai de vós os que sois poderosos para beber vinho, e fortes para fazer misturas embriagantes! Vós os que justificais o ímpio pelas dádivas, e ao justo tirais o seu direito!
Por esta causa, assim como a língua do fogo devora a palha, e a brasa  ardor da chama, assim a raiz deles será como a faísca, e o seu renovo se dissipará como pó; porque rejeitaram a lei do Senhor dos exércitos, e blasfemaram da palavra do Santo de Israel. Por isso o furor do Senhor se acendeu contra o seu povo, estendeu a sua mão sobre ele e o feriu; os montes se abalaram e os seus cadáveres foram lançados como esterco ao meio das praças. Com todos estes castigos não se aplacou o seu furor, mas ainda está levantada a sua mão. Arvorará um estandarte para servir de sinal aos povos de longe e chama-los-á com um assobio desde os confins da terra; e acorrerão com uma velocidade prodigiosa. Não haverá neles quem sinta cansaço ou fadiga; não dormitarão nem domirão; ninguém desatará o cinto dos seus rins, nem desatará a correia do seu calçado. As suas setas são agudas e todos os seus arcos estão entesados. As unhas dos seus cavalos são como  pederneira e as rodas dos seus carros têm a rapidez da tempestade. O seu rugido será como o do leão, rugirão como os leõezinhos. Soltarão bramidos, se arrojarão à presa e a levarão, não haverá que lha tire. Soará sobre Israel naquele dia um como bramido do mar; olharemos para a terra, e eis que tudo será trevas de tribulação, e a luz desaparecerá nessa profunda escuridão”  (Is 5, 1-30).

 [1] Labruscas – castas de uvas pretas, de inferior qualidade.

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