(COMENTÁRIOS DE DR. PLÍNIO CORRÊA DE OLIVEIRA
SOBRE A SANTÍSSIMA VIRGEM MARIA)
Estamos na Novena de Nossa Senhora de
Lourdes, de maneira que poderíamos acrescentar mais uma palavra a respeito
dessa devoção.
Acho que dos muitos aspectos que essa devoção
tem, um me parece que tem sido insuficientemente acentuado e é o seguinte: os
senhores sabem que para o Reinado de Maria, uma verdade fundamental é a
Mediação Universal de Nossa Senhora. Porque para Nossa Senhora ser
verdadeiramente Rainha, é preciso que Ela possa junto a Deus tudo
quanto Ela queira, pois é por esta forma que Ela governa o mundo.
Nossa Senhora, pela Sua própria natureza, -
Ela tem uma natureza humana como a nossa - não tem mais poder sobre os astros,
sobre os homens, do que nós temos. De maneira que, para ter o reinado de todo o
universo, para ser a Rainha de todos os Anjos, a Rainha de todos os Santos, a
Rainha de todos os homens, a Rainha de todo o mundo material e dominadora
terribilíssima e completa do demônio, Ela precisa ter a graça de Deus. E é
exatamente enquanto ponto de convergência de todas as graças de Deus que ela é
Rainha. A onipotência de Nossa Senhora tem sido muitas vezes chamada, e muito
adequadamente, onipotência suplicante, porque é por meio da súplica que Ela
faz, que Ela pode tudo. Porque Ela pode tudo junto d'Aquele que pode tudo, é
por isso que é Rainha. E, portanto, o Reinado de Nossa Senhora é o reinado das
súplicas que Ela faz, do valor das orações que Ela oferece.
Portanto, a realeza de Nossa Senhora está
numa conexão íntima com o fato de Ela ser o canal de todas as graças. Ela é a
Rainha de tudo porque todas as graças passam por Ela. Todas as graças que são
dadas aos homens, são dadas pelas mãos d’Ela. Todos os pedidos que os homens
fazem são apresentados por meio d’Ela. E se todos os santos e anjos do Céu
pedissem algo que não fosse por meio d’Ela não obteriam. Ela sozinha, pedindo
sem nenhum deles, obtém. De tal maneira o foco da predileção divina se
concentrou por inteiro n’Ela. E depois, parte d’Ela de novo para toda a
criação. É porque Ela é medianeira de todas as graças que Ela é onipotente. Há,
portanto, uma espécie de correlação íntima entre uma coisa e outra.
Agora, as aparições de Lourdes se inserem
numa série de aparições de Nossa Senhora no século XIX, que são as mais
célebres dessas aparições e, debaixo de alguns pontos de vista, merecidamente
as mais célebres. Essas aparições de Nossa Senhora no século XIX, que culminam
com Fátima, culminam com a afirmação do Reinado de Maria. E a aparição de
Lourdes, portanto, está num pontilhado de aparições que são como que, nas
noites extremas de nossos dias, uma clarinada do Reino de Maria, pontos alvos
anunciando que o Reino de Maria virá.
Em Lourdes, em cada uma dessas aparições,
seria muito interessante estudar a presença da idéia da Mediação Universal das
graças e do Reinado de Maria. Em Lourdes, especialmente, se pode dizer debaixo
de um título: Nosso Senhor poderia ter dado essa fecundidade estupenda de
milagres a um santuário d’Ele.
Na França, por exemplo, há um santuário
magnífico consagrando uma devoção estupenda a Ele, que é o Santuário de
Paray-le-Monial, onde Nosso Senhor fez suas revelações a Santa Margarida Maria
Alacoque. Ele poderia perfeitamente fazer com que esses milagres se dessem lá,
se dessem em todos os santuários consagrados a Ele. Mas Ele quis que a maior
fonte de milagres que houve na História da Igreja, na História do mundo, fosse
num santuário consagrado a Nossa Senhora. Quer dizer que Ele quis que aquelas
curas todas só fossem obtidas sob a égide de Nossa Senhora, depois de uma
aparição de Nossa Senhora, como uma graça de Nossa Senhora, e mediante um
pedido feito a Nossa Senhora. Ou seja, Ele quis que todas essas curas
estupendas passassem pelas mãos d’Ela.
Quis que passassem para que? Evidentemente
para documentar o dogma, que ainda não é dogma, é verdade de fé, da Mediação
Universal, para os homens compreenderem bem até que ponto Ela pode tudo. As
piores doenças, os maiores males, os sofrimentos mais horrorosos Ela cura, toma
as leis mais inflexíveis da natureza e as elimina. Ela vence tudo: uma pessoa
que vê sem nervo ótico... Isso é um tal domínio de Nossa Senhora sobre a
natureza, como mais não se pode imaginar! Bem, isto tudo é feito por meio d’Ela.
Por que? Para mostrar que todas as graças vêm por meio d’Ela. E a presença de
todas as graças nas mãos d’Ela para serem distribuídas, por sua vez, quer dizer
que Ela é a Rainha do Céu e da Terra. E por Ela passa tudo.
Eu me lembro de uma cançãozinha religiosa,
que se cantava no meu tempo, em que havia um resto de piedade, e que
dizia: “Salve, ó Mãe! Salve, ó Virgem Santíssima! Do universo portento e
primor; mais esplêndida glória que a Tua, só tem Deus, do universo Senhor.”
É piedosa a canção e realmente a conclusão é esta: mais esplêndida glória que a
Tua só tem Deus, do universo Senhor.
Quer dizer, Nossa Senhora está infinitamente
abaixo de Deus. E tudo quanto está abaixo de Nossa Senhora está
incomensuravelmente abaixo d’Ela. É o que a perenidade das curas de Lourdes nos
diz.
Há uma certa religiosidade um pouco dada a
graças materiais, a pedir favores materiais, etc., etc., que desdenha os
favores espirituais e que se impressiona muito com as graças materiais de
Lourdes. Há quem não compreenda que os favores materiais que Deus dá são de
fato favores. E favores que a gente deve pedir. Mas que só são verdadeiramente
favores, na medida em que levam a nossa alma a desejar os favores espirituais,
as graças para a alma. É por aí que verdadeiramente Deus atrai as almas para
Ele, porque todos os favores tem este fim.
Não se pense que a cura de Lourdes é só
porque Nossa Senhora tem pena do homem que é capenga, no sentido físico da palavra,
e que Ela corrige o coxo. Ela tem pena do coxo, é claro. Ela tem gosto em
corrigir a capenguice do coxo, é claro. Mas muito mais do que isto Ela quer
fazer a ele um bem à sua alma. E serve-se de um milagre físico, para fazer bem
à alma d’Ele e dos outros que vêem isto. E o bem que no caso está em vista é
uma grande fé na verdade de que Ela é medianeira de todas as graças.
Eu digo isto porque nós tivemos, não me
lembro bem se ontem ou anteontem, a cerimônia das velas de São Braz. Eu estava
vendo aquele mundo de gente que vai lá para se proteger contra a dor de
garganta. É claro que Nossa Senhora ama, preza, de nos livrar de um mal da
garganta, nos casos em que esse mal não nos conduza para a salvação. Porque às
vezes uma dor da garganta, e coisas piores do que isto, às vezes muita doença
faz muito bem para muita gente. Se não houvesse doença na terra, o inferno
estaria muitíssimo mais cheio do que está. Não é muito não, é muitíssimo mais
cheio do que está. Portanto, não é qualquer doença que Nossa Senhora cura.
Mas quando é o caso de curar, Ela cura com
amor materno, gosta muito de curar. Mas Ela cura para que? Para fazer sentir às
pessoas a bondade d'Ela. E para lhes estimular o desejo de se curarem dos
males, das doenças da alma, para adquirirem os bens da alma; é para isso que
Ela faz. E é assim que a coisa deve ser vista. Realmente para a cura do corpo,
considerando também em si a cura do corpo, mas visando, sobretudo, a cura da
alma.
Essas são as considerações que na novena de
Nossa Senhora de Lourdes eu podia fazer.
("Conferência", 04 de fevereiro de 1965)
Nenhum comentário:
Postar um comentário