No ano de 1951, Dr.
Plínio Corrêa de Oliveira fez algumas conferências sobre o Tratado da Verdadeira
Devoção à Santíssima Virgem, posteriormente
publicadas em forma de apostila sob a revisão do mesmo. Desse texto extraímos
os comentários a seguir:
Nosso
sinal: o “thau”, ou o calcanhar?
“Eles serão pequenos e pobres aos olhos do mundo, e
rebaixados diante de todos, como o calcanhar, calcados e perseguidos como o
calcanhar em comparação com os outros membros do corpo” (tóp. 54).
Fato terrível: a
vocação do apóstolo de Nossa Senhora é ser como que o calcanhar do gênero
humano, que o pisa e anda calcando-o. A vocação daqueles que são apóstolos de
Maria Santíssima consiste em servir de calcanhar. De calcanhar ativo, que
retribui os golpes, mas, enfim, de calcanhar.
Quando consideramos a
nossa situação de apóstolos da Contra-Revolução, devemos reconhecer que ela tem
muito de “calcanharesco”. Realmente, somos uma categoria de pessoas da qual
todos se julgam no direito – sem recriminação da parte de ninguém – de falar
mal e de pensar mal, e que ninguém receia sabotar, pois – afirmam – “o que
atacamos nada tem de mal”; mas ai de nós se fizermos qualquer coisa: “é
perigoso, é nocivo; é preciso reprimir!”
Quando consideramos,
por outro lado, a situação de exílio permanente a que as condições de vida da
sociedade contemporânea nos reduzem; quando consideramos o fato de que, aos
poucos, ficamos marcados, diferentes de todos, pela fidelidade a nossos ideais,
havemos de reconhecer bem que a nossa situação tem muito de “calcanharesco”. Se
não tivéssemos escolhido por nosso sinal o “thau”, escolheríamos o calcanhar!
O calcanhar tem uma
sublime missão. Se é bem verdade que ele é calcado, é dele a glória de calcar.
E há uma cabeça que foi feita para ser por ele pisada: a de Lúcifer. Devemos
estar a procura dessa cabeça para pisá-la. Com a graça de Nossa Senhora, no
rabo, várias vezes já o temos feito.
Serão
santos superiores a toda criatura
“Mas, em troca, eles serão ricos em graças de Deus,
graças que Maria lhes distribuirá abundantemente. Serão grandes e notáveis em
santidade diante de Deus, superiores a toda criatura, por seu zelo ativo...”
(tóp. 54).
São Luís Grignion
faz-nos um outro prenúncio: os apóstolos dos últimos tempos serão santos
excepcionais, como não há em nossa época e não houve nas passadas. Dizendo
“superiores a toda criatura” envolve, pois, as do passado. Serão Santos maiores
do que todos os dos séculos passados. Deverão florescer no futuro, mas de sua
santidade e de sua vocação participam desde já todos aqueles que batalham nesta
mesma luta contra o poder das trevas.
“... e tão fortemente amparados pelo poder divino que,
com a humildade de seu calcanhar, e em união com Maria, esmagarão a cabeça do
demônio e promoverão o triunfo de Jesus Cristo”. (idem).
É o final da
profecia: haverá um período de justiça alcançado por estes apóstolos. Eles
esmagarão a cabeça do demônio.
Vemos, portanto, as
características fundamentais desses apóstolos postas por São Luís Grignion:
a) É uma raça de
homens, raça espiritual, oposta e irredutivelmente adversa à Lúcifer e à raça
dele;
b) São homens que
viverão num estado de perseguição constante;
c) Serão chamados por
Maria Santíssima, de um modo especial, a uma grande dedicação à causa da
Igreja;
d) Acabarão por
vencer, porque esmagarão a cabeça do demônio.
São os traços
distintivos dos Santos dos Últimos Tempos. Mas, como estes tempos já começaram[1],
os santos de nossa época estão já numa espécie de relação com os dos últimos
dias da Igreja. O santo de nossa época é, pois, o tipo do santo dos últimos
tempos, descrito por São Luís Grignion, que ele apresenta como um fruto
característico da devoção a Maria Santíssima.
Há, portanto, uma
conexão muito grande entre os últimos tempos e a nossa época, entre os Santos
dos últimos Tempos e os batalhadores da causa da Igreja em nossos dias.
Os Apóstolos dos
Últimos Tempos. São Luís Grignion nos fala agora especificamente
dos Apóstolos dos Últimos Tempos.
“Deus quer, finalmente, que Sua Mãe Santíssima seja agora mais conhecida, mais amada, mais
honrada, como jamais o foi...” (tóp. 55).
Dizíamos acima que,
nos últimos tempos, Nossa Senhora seria mais conhecida e mais amada. Neste tópico São Luís Grignion nos afirma que
é agora, isto é, no tempo dele.
Portanto, sua época já participa dos últimos tempos.
“E isto acontecerá, sem dúvida, se os predestinados
puserem em uso, com o auxílio do Espírito Santo, a prática interior e perfeita
que lhes indico a seguir.” (tóp. 55).
Eis o papel histórico
da devoção que prega. É o meio pelo qual os predestinados da graça podem
adquirir este espírito e colocar-se de acordo com a sua vocação. É a devoção
que até aí conduz.
“E, se observarem com fidelidade, verão então claramente,
quando[2] lho
permite a Fé, esta bela Estrela do Mar, e chegarão a bom porto, tendo vencido
as tempestades e os piratas. Conhecerão as grandezas desta Soberana, e se
consagrarão inteiramente a seu serviço como súditos e escravos de amor” (jdem).
Será que antes de São
Luís Grignion – poder-se-ia perguntar – ninguém conheceu Nossa Senhora? Maria
Santíssima não levou antes dele ninguém a bom porto? Será que Ela não fez
manifestar na Igreja, antes ou fora dele, as suas grandezas? Seria absurdo
admiti-lo. Por que, então, ele apresenta estas coisas como típicas do seu
espírito? É porque elas serão mais reais nas almas formadas em sua escola de
espiritualidade do que em qualquer outra. O que já é verdade de todos os
santos, de todos os que seguem a doutrina da Igreja, será muito mais ainda dos
que seguirem a espiritualidade de São Luís Grignion.
Ele aqui apenas
insinua o que irá dizer mais tarde: a devoção que ensina e os princípios
mariais que inculca, não são acessíveis ao conhecimento de qualquer homem.
Conhecer bem Nossa Senhora, praticar esta devoção, é uma predestinação, é uma
graça especial, não comum. Esta não é uma devoção para qualquer pessoa, mas
apenas para alguns predestinados. É uma graça especialíssima que Deus reserva
para os últimos tempos. Por isso, mais tarde ele dirá que, para compreender
esta devoção e praticá-la verdadeiramente, é preciso ter recebido um chamado
muito especial.[3]
Serão
setas para perfurar
“Mas, quem serão esses servidores, esses escravos e
filhos de Maria?” (tóp. 56).
Aqui segue a
descrição dos Apóstolos dos Últimos Tempos:
“Serão ministros do Senhor, ardendo em chamas
abrasadoras, que lançarão por toda parte o fogo do divino amor.
Serão sicut
sagittae in manus potentis (Sl 126, 4) – flechas agudas nas mãos de Maria
todo-poderosa, pronta a transpassar seus inimigos” (idem).
Como isto corresponde
ao gênero de devoção que devemos ter a Nossa Senhora!
A devoção a Maria
Santíssima, segundo São Luís Grignion, está aliada à combatividade. Não se trata apenas de fazer cordeirinhos de
Cristo Rei! Trata-se de transformar cada um de nós numa seta posta nas mãos de
Maria. Evidentemente não para, como bálsamo, aliviar e curar, porque isso não é
próprio da seta, mas para perfurar os seus adversários. Para isso é que estão
destinados os Apóstolos do Últimos Tempos.
Para transpassar é
preciso não estar pregando bondades untuosas, vagas, sem consistência. A seta é
arma de guerra, é feita para o combate, e o seu principal objetivo é derrubar o
inimigo e matá-lo. Para isso, e não para outra coisa, elas existem. São Luís
Grignion é explícito: “sicut sagitti”. É mesmo seta, e seta para perfurar os
inimigos. É preciso não ter ilusões, o fruto característico da devoção que ele
prega é o de tornar o apóstolo uma seta nas mãos de Nossa Senhora.
Serão
ascetas, colados, sem interstício algum, a Deus e à Sua Igreja
“Serão filhos de Levi, bem purificados no fogo das
grandes tribulações, e bem colados a Deus...(idem).
É importante observar
o grau de união a Deus que está prometido. E só há um meio de estar colado a
Deus: é estar colado à Igreja de Deus. Estar colado significa estar
unido sem qualquer interstício, sem vácuo algum; é estar preso por todas as
aderências possíveis à Igreja de Deus. Este é o sentido que ele nos quer dar,
inculcando o espírito de devoção à Igreja Católica.
“...que levarão o ouro do amor no coração, o incenso da
oração no espírito, e a mirra da mortificação no corpo”. (idem).
É a idéia da ascese,
da austeridade, da virtude dura, mortificada.
Serão
odor de morte
“...e que serão em toda parte, para os pobres e pequenos,
o bom odor de Jesus Cristo; e, para os grandes, os ricos e os orgulhosos do
mundo, um odor repugnante de morte.”
(idem).
O que são, na lingua
da Escritura, os pobres e os pequenos? Não são os sequazes dos demagogos
modernos. Ser pobre e pequeno é ser pobre de espírito, é ser desapegado. Para
esses é que é bom odor a presença dos servidores de Maria. Pelo contrário, para
os que não são seus servidores, para os que são ricos, que têm espírito apegado
(neste sentido um maltrapilho pode ser rico), para os que são orgulhosos e mundanos,
a ação de presença desses apóstolos é um odor de morte.
Nesse sentido,
podemos dizer que, quem tem verdadeiramente o senso católico, simpatiza
conosco. Não encontramos, ao longo do nosso apostolado, pessoa alguma que,
tendo senso católico, fosse hostil a nós. Nem alguém que, por causa das
próprias virtudes, nos tivesse antipatia.
Pelo contrário, é
para os apegados, os igualitários e os orgulhosos que a nossa presença
dissemina, de fato, um odor de morte. E as reações são vigorosas, porque o odor
de morte não é bem recebido em parte alguma!
Serão o
terror do demônio
“Serão nuvens trovejantes...“ (tóp. 57).
Não são zéfiros[4]
nem brisas amenas, que trazem o bom odor das sensações emocionantes e
românticas para as almazinhas adocicadas. São nuvens tonitroantes que voam
pelos ares.
A imagem é majestosa,
grandiosa, reflete, em contraposição à suavidade de certo tipo de religiosidade
sentimental, a grandeza, o poder e a cólera de Deus. A nuvem trovejante é a
nuvem carregada, na qual o raio se forma, e da qual é lançado.
“...esvoaçando pelo ar ao menor sopro do Espírito
Santo...” (idem).
Uma atmosfera cheia
de nuvens trovejantes, a esvoaçar do oriente ao ocidente, não reflete
absolutamente o clima carregado de otimismo que em certos ambientes se encontra...
“.. que, sem apegar-se a coisa alguma nem admirar-se de
nada, nem preocupar-se, derramarão a chuva da palavra de Deus e da vida eterna.
Trovejarão contra o pecado...” (idem).
Não se trata,
portanto, de pregar a bondade contra o pecado.
“...e lançarão brados contra o mundo, fustigarão o
demônio e seus asseclas, e, para a vida e para a morte, transpassarão lado a
lado, com a espada de dois gumes da palavra de Deus (Ef. 6, 17), todos aqueles
a quem forem enviados da parte do Altíssimo”
(idem).
São batalhadores
eficacíssimos, que têm a espada de dois gumes quando forem enviados a alguém da
parte de Deus, perfurá-los-ão dos dois lados.
Podemos aí distinguir
um feitio de espiritualidade e de apostolado que convém a nós. Os apóstolos que
São Luís Grignion assim descreve, são homens cheios de um santo ódio, de um
poder verdadeiramente terrível, que causam ao demônio um medo capaz de desfazer
as suas tramas. Argutos, perspicazes e vigorosos, esses apóstolos são os
protótipo do verdadeiro católico.
[1] Segundo
a linguagem de São Luís Grignion, a sua época estava já dentro da perspectiva
dos últimos tempos.
[2] Na
tradução espanhola (da BAC) está consignado “Enquanto o permite a fé...” e não
“quando”.
[3] O
restante do tópico contém uma série de promessas sobre as quais não há
comentários especiais a fazer.
[4] Zéfiro é
um vento brando e agradável.
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