A 10 de novembro celebra-se a festa de São Leão Magno, o Papa que enfrentou o terrível Átila.
Nos primórdios da Igreja já era a
patente o poder de regência d’Ela, inclusive sobrepujando o poder temporal em
alguns casos.
O poder temporal começa a
respeitar o divino – O imperador Teodósio não resiste a Santo Ambrósio que o
impede de entrar na igreja
Este fato é resumidamente narrado por Dr. Plinio
Corrêa de Oliveira em uma de suas conferências chamadas de “Santo do Dia”:
“Há fatos na
vida da Igreja que ficam como símbolos para todos os séculos da história
eclesiástica.
Santo Ambrósio teve um atrito com o imperador
Teodósio, que era um dos maiores magnatas, dos homens mais influentes de seu
tempo. E isto a propósito de questões de seu pecado público. No momento em que
Teodósio ia entrar na igreja, encontrou Santo Ambrósio com todo o seu clero, do
lado de fora, proibindo-o. E enfrentando o imperador, este se arrependeu e se
humilhou.
Essa atitude do poder espiritual em relação ao
poder temporal lembra um princípio ao qual devemos ser sumamente afeitos: todas
as grandezas humanas, sejam elas de que natureza e título forem, por mais que sejam
exaltadas e glorificadas na sociedade civil, se se apresentam com vistas a
enfrentarem a glória de Deus, é missão do clero humilhá-las.
É missão do clero, quando essas potências humanas
não andam bem, enfrentá-las e colocá-las em seu devido lugar. É missão do
clero, por esta forma, tornar claro que todas as coisas humanas, por mais altas
que sejam, em face de Deus, não são nada! Em face da eternidade, elas passam e
se reduzem a nada! E que, afinal de contas, a única coisa que fica sempre, que
vale, e está acima de tudo, é a Santa Igreja Católica, Apostólica, Romana, ou
seja a Igreja de Deus”. [1]
A regência do poder
temporal começa a ruir quando cresce o da Igreja
As várias invasões bárbaras, que terminaram
por abalar aquele império em seus alicerces, não conseguiram demover das
populações cristãs a verdadeira doutrina da regência divina entre os homens. Os
bárbaros entravam e ficavam na Europa, destruíam cidades, acabavam com reinados
e dinastias, mas, logo, logo, surgia entre eles uma nova elite já convertida ao
Cristianismo e com idéias completamente diferentes a respeito do governo
humano. Em poucos séculos já havia sido feita uma enorme troca de poderes entre
as elites européias, e os católicos passaram a dominar todos os reinos.
Aplicava-se então a doutrina do Sermão da Montanha de que “os mansos possuirão
a terra”. De início, ainda cheios de vícios trazidos de suas terras bárbaras,
mas, com o passar do tempo, a Igreja foi aos poucos transformando-os, dando
lugar a uma das elites mais bem estruturadas e orgânicas de todos os tempos.
Havia também uma crescente ascensão do
princípio da boa regência na sociedade romana por causa da grande influência do
Cristianismo que tomava conta de todas as classes sociais. Um exemplo marcante
tivemos no episódio guerreiro entre Constantino e Maxêncio: tendo o primeiro
colocado a Cruz como símbolo de seu exército, e muitos dos cristãos que lutavam
no lado inimigo vendo tal símbolo brilhar nas hordas contrárias, logo passaram
para o lado de Constantino, ocasionando grandiosa vitória deste último e,
consequentemente, dos cristãos. Assim, o
predomínio do Cristianismo em toda a Europa foi decorrente do império pacífico
da regência da Igreja (que antes de conquistar reis já conquistara os corações
dos súditos).
Um exemplo de
regência mansa e pacífica
No início do século V, os bárbaros invadem
Roma. Como a religião Católica já era reconhecida pelo Império, logo os seus
opositores viram nela um motivo para condenação: julgavam que se Roma fosse
dominada pelas religiões pagãs e seus ídolos não teria sido arrasada e saqueada
pelos bárbaros. Foi com o intuito de desfazer tais falsas ideias, em geral
defendidas por alguns que desejavam restaurar a idolatria, que Santo Agostinho
publicou sua famosa obra “Civitate Dei”
(A Cidade de Deus). Nessa obra o Santo
faz um resumo histórico dos acontecimentos que culminaram com as invasões dos
bárbaros, demonstrando que, pelo contrário, estes últimos tiveram mais respeito
às populações romanas, mesmo as pagãs, quando estas se refugiavam nos templos
católicos:
“...Testemunhos são desta verdade as capelas dos mártires
e as basílicas dos Apóstolos, que na devastação de Roma acolheram dentro de si
aos que, precipitadamente e temerosos de perder sua vida., na fuga punham
suas esperanças, em cujo número se compreendiam não somente gentis, mas também
cristãos. Até estes lugares sagrados vinha executando seu furor o inimigo,
porém ali mesmo se amortecia ou apagava o furor do encarniçado assassino, e,
por fim, para estes lugares sagrados conduziam os piedosos inimigos aos que,
encontrados fora dos santos asilos, tinham perdoado suas vidas, para que não
caíssem nas mãos dos que não usavam exercitar semelhante piedade...” “pelo que é muito digno de notar que uma
nação tão feroz, que em todas partes se manifestava cruel e sanguinária,
fazendo cruéis estragos, logo que se
aproxima dos templos e capelas onde estava proibida sua profanação... refreava
de todo o impero furioso de sua espada, desprendendo-se igualmente do prazer
pela cobiça de fazer uma grande presa numa cidade tão rica e abastecida. Desta
maneira libertaram suas vidas muitos daqueles que infamam e murmuram dos
templos cristãos, imputando a Cristo os trabalhos e penas que Roma padeceu, e,
não atribuindo a este grande Deus o benefício incomparável que conseguiram por
respeito a seu santo nome de lhes conservar as vidas...”[2]
A Igreja comprova o poder de regência de origem divina: o
Papa São Leão Magno faz o terrível Átila, o “flagelo de Deus”, recuar
Alguns anos após
Santo Agostinho, nova onda de bárbaros invadia o Império. Desta vez comandados
pelo terrível Átila e com mais furor e causando mais destruição do que nas
anteriores. Só havia um poder terreno, e
ao mesmo tempo divino, que poderia detê-lo: o poder de regència da Igreja
Católica, personalizado no Sumo Pontífice:
Átila, Rei dos Hunos,
era um chefe bárbaro temido. Cruel e implacável com seus adversários. Ele mesmo
se auto intitulava o "Flagelo de Deus". Destruiu, praticamente tudo,
na Gália. Saqueou Tongres, Treves e Metz. A cidade de Troyes não foi destruída
graças a intervenção de São Lupo, e o mesmo aconteceu com Orleans que foi salva
por Santo Aniano.
Embora tendo sofrido uma
série de derrotas nas planícies de Chalons, graças aos esforços militares
conjuntos de Aécio, Meroveu, rei dos francos, e Teodorico, rei dos visigodos,
Átila não desistiu de seus intentos, não desanimou.
Sua sanha destruidora
voltou-se para o norte da Itália, destruía tudo que podia a ferro e fogo. Quem
conseguia, fugia de suas incursões destruidoras. Muitos se refugiaram nas
pequenas ilhas existentes nas lagunas do Mar Adriático, onde deram origem à
cidade de Veneza.
Átila atacou e saqueou
Milão. O imperador Valentiniano III, não se julgou protegido em Ravena e fugiu
para Roma. Mas, a meta de Átila era dominar Roma, capital do Império, sede do
Papado, centro da Igreja Católica. E não demorou muito para o bárbaro chegar às
portas da Cidade Eterna. Invasão, morticínio, destruição e saques era o que se
esperava da ação iminente do "Flagelo de Deus".
Sem condições de se
livrar dele, o Imperador, o Senado e povo romanos, num lance que depois
mostrou-se ter sido de bom senso, imploraram socorro ao Sumo Pontífice. Pediram
ao Papa que salvasse Roma da invasão. A missão do Vigário de Cristo era clara e
de tremenda responsabilidade. Sua missão não era apenas defender Roma. Ele
deveria salvar também sua pátria, seu povo e o mundo cristão: uma tarefa nada
fácil, e de sucesso imprevisível.
Pastor que
se expõe
Como Pastor que deseja sempre preservar a vida de suas
ovelhas, o Papa aceitou o encargo de enfrentar o "Flagelo de Deus".
Como desdobramento de sua ação ele estaria defendendo a Igreja, o Império, o
Ocidente.
Além de demonstrar não ter medo, ele dava mostras de que
acreditava no auxílio sobrenatural, na importância do Papado e na força dos
símbolos religiosos. Sem perder tempo, revestiu- se dos paramentos pontificais
reservados para as maiores solenidades e, acompanhado por sacerdotes e diáconos
também em trajes sacerdotais, o Papa pôs-se a caminho para enfrentar o temível
Rei dos Hunos, em Peschiera, uma pequena cidade próxima de Mântua.
O Papa que não tinha soldados a sua disposição, foi ao
encontro do conquistador, que, contra toda a expectativa, o recebeu com honras.
E mais, Átila desistiu de seus objetivos e, cessando as hostilidades,
atravessou os Alpes, retornando para sua terra, sem atacar Roma. Era o ano de
453.
O que se passou com
"Flagelo de Deus" para agir assim?
Os bárbaros perguntaram a seu chefe por que, contrariando
seu costume, havia mostrado tanto respeito para com o Papa. Átila respondeu que
"não foi a palavra daquele que veio me encontrar que me inspirou um medo
tão respeitoso; mas eu vi junto ao Pontífice um outro personagem, de um aspecto
muito mais augusto. Venerável por seus cabelos brancos, que se mantinha de pé,
usando hábito sacerdotal, com uma espada nua na mão, ameaçando-me com um ar e
um gesto terríveis, se eu não executasse fielmente tudo o que me era pedido
pelo enviado". Esse personagem que causava terror a Átila era o Apóstolo
São Pedro que tinha a seu lado, segundo outra tradição, o Apóstolo São Paulo
que também aterrorizou o Bárbaro”[3]
Cumpria-se, assim, as palavras de Nosso Senhor quando falou no Sermão da Montanha que os mansos possuirão a terra. Naquele momento era novamente demonstrada a eficácia da regência pacífica sobre a imperativa, pois em pouco tempo aqueles bárbaros amoleciam seus corações e se tornavam cristãos. E a mansidão era uma virtude pregada pela Igreja para que com ela pudesse reger os povos.
E Deus passou a reger a Humanidade através de Sua Igreja.
[1]Plinio Corrêa de Oliveira – Conferência “Santo do Dia” – 07 de dezembro de 1964
[2] Civitate Dei, liv. I, cap. I -
[3]
Texto extraído da hagiografia de São Leão Magno publicada no site dos Arautos
do Evangelho http://www.arautos.org/especial/31322/Sao-Leao-Magno.html
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