Primeiramente
vamos considerar a “carne”, isto é, nossa natureza. Entende-se por carne (no caso favorecedora
dos pecados) as fraquezas humanas provenientes das más inclinações. Temos
inclinações para o bem e para o mal, sendo que as de natureza maligna são mais
fortes. Inclinações, tendências, facilidades de ceder aos impulsos da natureza.
As tendências e inclinações para o bem exigem esforço e muita disciplina,
enquanto as para o mal, não: basta às vezes se deixar levar, ficando
indiferente ou mesmo fazendo concessões aos impulsos carnais. Para praticar o
bem temos que desenvolver grande luta interior contra as más inclinações,
enquanto que para o contrário basta cair gostosamente no gozo dos prazeres ou
do orgulho próprio.
A
maioria dos pecados nós cometemos cedendo a tais impulsos, dando azo a nossas
más inclinações. O apetite sensual, por exemplo, é despertado ao vermos uma
figura provocativa ou ouvirmos algo na mesma linha, mas ele é despertado quando
interiormente nós cedemos aos impulsos sensitivos. Se reagimos e, sobretudo,
pedimos o amparo da graça divina, o pecado pode ser evitado, a tentação morre
por si mesma.
O
maior exemplo de pecado oriundo de nossas más inclinações tivemos com o
primeiro deles, cometido por Adão e Eva. No primeiro momento teve a
participação do demônio, que tentou Eva não diretamente mas através da
serpente. Talvez se aparecesse a ela tal qual ele é não teria obtido êxito. Eva
pecou incentivada pelo instinto do orgulho, o desejo de se transformar numa
deusa. A partir daí não há mais participação do demônio, mesmo sob a aparência
de uma serpente, mas é a própria Eva que, sozinha, leva a tentação a Adão. E
quem o faz cair é sua carne, quer dizer, a fraqueza de ceder ao orgulho de ser
um deus, tal qual Eva havia cometido. De outro lado, pode-se dizer que o mundo
também o influenciou, aquele mundo tão pequeno constituído apenas de um casal,
mas que formando uma sociedade. A influência de Eva, representando o mundo, fez
Adão cair. Mas, o demônio, desta vez não; pelo menos de uma forma direta.
O
que é o mundo? Trata-se da sociedade em que vivemos e convivemos. A família, os
vizinhos, a cidade e a nação em que nascemos e vivemos constituem o mundo nessa
linguagem moral. E este mundo influencia poderosamente as pessoas, ou para o
bem ou para o bem, sendo mais forte a influência para o mal. Assim, como nossas
inclinações pessoais são mais fortes para a prática do mal, assim também os
costumes vividos no chamado mundo. Se todas as pessoas deste mundo, desta
sociedade, praticarem costumes sérios e castos, isso pode nos influenciar para
a mesma prática. A honestidade, por exemplo, sendo vivida por todos será modelo
para a prática desta virtude. No entanto, não é isso que ocorre na maioria das
sociedades. As tendências naturais de todos, as inclinações pessoais, sendo
propensas para a facilidade da prática do mal, no dia a dia torna-se uma
prática comum e social.
Por
causa disso a maioria das pessoas é levada a pecar por causa do mundo, por
verem os outros fazerem aquilo com naturalidade. Trata-se, portanto, de um
importante e poderoso impulso ao pecado.
Por
último vem o demônio. Nem sempre é o
demônio o incentivador do pecado, como muita gente pensa. A propósito, muitos
santos dizem que o demônio mais tenta os que praticam as virtudes do que
aqueles que levam uma vida pecaminosa. Isso porque os pecadores incorrigíveis
já lhes possuem, estes não precisam ser tentados pelo demônio, basta o mundo e
a carne. Quanto aos demais, que resistem ás más inclinações da natureza (carne)
e aos costumes sociais (o mundo) são mais visados diretamente pelo próprio
demônio.
Como
o demônio é anjo, e tem inteligência superior à nossa, ele age com cautela e de
uma forma sutil a fim de não despertar suspeitas. Deixa que o mundo e a carne
façam o seu papel, só intervindo diretamente quando ver que os outros meios não
tiveram êxito. E nesse caso passa a agir apenas inspirando à nossa mente,
primeiramente, a idéia do pecado e, posteriormente, usando de artifícios
externos provenientes do mundo. À vezes fica até difícil caracterizar uma
tentação como tendo sido proveniente só do demônio. De modo geral, quando elas
não nascem no próprio interior da pessoa, elas provêm de um nosso semelhante ou
de vários fatores existentes nos lugares em que estamos, sendo que a parte do
demônio pode ser apenas de sugestões, de inspirações ou de maquinações muitos
sutis.
Há
casos em que as tentações são diretamente deles, mas é mais raro e só ocorrem
quando a pessoa já está em fase adiantada de ascese cristã.
É
preciso notar que é mais proveitoso para o demônio criar um clima social que
estimule a vida pecaminosa em seus habitante do que investir pessoalmente em
cada indivíduo. Nesse sentido, ele prima
por espalhar o que se chama “pecado social”, pecado coletivo, praticado em
comum por uma sociedade humana. Um exemplo é o liberalismo. A idéia de que a
liberdade é plena, deve ser total, concedido ao bem e ao mal, pode ser aceita e
convivida em toda uma sociedade. Isso se constitui num pecado social, aceito
por todos, que permite enganar-se todos e praticar o mal como se fosse coisa
permissível. Outro exemplo é o relativismo, forma de pensar que julga tudo
relativo, não há verdades eternas e estáveis, e assim considera tanto o bem
quanto o mal como coisas passageiras, podendo ser praticados ou não conforme o
queira a liberdade de cada um. Liberalismo e relativismo constituem, pois, os
dois maiores pecados sociais. Tão abomináveis que podem criar clima favorável à
expansão do “corpo místico do demônio”, uma sociedade de homens maus que,
cientes ou não de suas culpas, participam de uma organização preternatural,
nutrida pelo demônio, que age na sociedade para implementar o culto satânico
através deste maldito corpo místico. Quem pratica o pecado social teve ficar
bem atento ao fato de estar alimento o corpo místico do demônio.
De
algum modo a atuação do demônio, da carne e do mundo pode ser representada na
explicação que Nosso Senhor Jesus Cristo dá sobre a parábola do joio:
“Jesus deixou as multidões e foi para casa.
Seus discípulos aproximaram-se dele e disseram: “Explica-nos a parábola do
joio!” Jesus respondeu: “Aquele que semeia a boa semente é o Filho do
Homem. O campo é o mundo. A boa semente são os que pertencem ao Reino. O
joio são os que pertencem ao maligno. O inimigo que semeou o joio é o diabo.
A colheita é o fim dos tempos. Os ceifadores são os anjos. Como o joio é
recolhido e queimado ao fogo, assim também acontecerá no fim dos tempos: o
Filho do Homem enviará os seus anjos e eles retirarão do seu Reino todos os que
fazem outros pecar e os que praticam o mal; e depois os lançarão na
fornalha de fogo. Ali haverá choro e ranger de dentes. Então os justos
brilharão como o sol no Reino de seu Pai. Quem tem ouvidos, ouça”. (Mt 13, 36-43).
Quer dizer, o mundo é o campo onde se semeia a
boa semente, mas também o joio. O inimigo que é o demônio, no caso faz o papel
de quem semeia o joio, portanto, trata-se de alguém que procura agir no mundo
por via indireta a fim de que a boa semente se transforme e produza frutos
ruins, que são os pecados.
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