SANTO INÁCIO DE
LOYOLA
Plínio Corrêa de
Oliveira
Quem passasse
outrora pelos arredores de Azpeitia, na província basca de Guipuzcoa, veria, em
uma altura que domina todos os arredores, um imponente castelo-forte, edifício
quadrado, guarnecido de seteiras, ameias, torreões, e ao qual enormes pedras de
cantaria davam um aspecto de majestosa solidez.
Esse castelo,
construído no século XIII, era o solar dos Oñaz y Loyola, “fidalgos de
linhagem, cota de armas e solar conhecido”, ligados às principais famílias de
Espanha e titulados de “parientes mayores”, remontando sua árvore genealógica a
1180. Família de guerreiros, em mil refregas tremulou vitorioso o pendão em que
se viam as insígnias dos Loyola: dois lobos ou leões segurando uma panela ou
“olla”.
A “olla”
representava o direito de alimentar as tropas por sua própria conta. Os lobos
simbolizam o valor e a força que os nobres põem ao serviço de Deus e do Rei.
Nos fins do século
XV era senhor do castelo de Loyola, como chefe da família, D. Beltran Yáñez de
Oñaz y Loyola, que havia desposado D. Marina Sáenz de Licona y Balda.
Foi do matrimonio
desses fidalgos que, em 1491 nasceu aquele que devia ser uma das maiores entre
as grandes glórias da Santa Igreja de Deus: Santo Inácio de Loiola.
O Senhores de
Loyola, “cristianos viejos” que eram, deram a seu filho uma educação cristã,
como convinha a um descendente dos heróis que haviam derramado seu sangue na
luta contra o turco infame (muçulmanos, n.d.c.). Aos sete anos, D. Iñigo –
assim se assinou o Santo até 1546 – foi mandado à luxuosa corte de D. João
Velaszques de Cuellar, e mais tarde aos paços de Carlos V, para receber as
últimas lições de “bem viver e alta cortesia”.
No fim de alguns
anos, D. Iñigo é oficial das tropas do vice-rei de Navarra. Extraordinariamente
inteligente, “muito bom escrivão”, elegante, músico e bom poeta, soldado
destemido, o jovem Loyola seria um cavaleiro perfeito. Infelizmente, porém,
embora muito afeiçoado à sua fé, vivia de modo pouco conforme a ela. Mas era
audaz, rijo, valente, animoso em enfrentar empresas árduas, prudente em
dirigi-las e constante em leva-las a cabo.
É importante
conhecer-se o nobre nascimento de S. Inácio porque, como a graça não destrói
mas aperfeiçoa a natureza, o Santo conservou, depois de sua conversão, tudo o
que de mais magnífico e admirável se encontrava no caráter dos fidalgos de sua
época.
Nesse tempo Carlos
V estava em luta com o seu constante inimigo, Francisco I de França. D. Iñigo
foi designado para governador da cidade de Pamplona. Cercada a praça de guerra
pelos franceses, o jovem Grande de Espanha tudo fez para bem defende-la. Mas
outros eram os planos da Providência. O fidalgo Loyola feriu-se no joelho
esquerdo e os franceses apoderaram-se da cidade. Muito ferido, retirou-se para
o castelo de seus pais, onde esperou a cura.
Qual não foi seu
desapontamento quando verificou que o estado em que sua perna ficara
prejudicava de maneira irreparável a sua elegância incomparável e a graça de
seus movimentos fáceis, graça essa conhecida e comentada. Mandou pois quebrar
de novo a perna para ser convenientemente encanada, não temendo a brutalidade
dos métodos então empregados no tratamento de fraturas.
Durante todo esse
período, foi ele tomado de tédio, acabando por ordenar que lhe trouxessem
livros. Os únicos que havia no castelo eram “A vida de Cristo”, de Ludolfo de
Saxônia, o Cartuxo, e a “Flos Sanctorum”. Aborrece-se o cavaleiro ao deparar
com estes títulos. Mas, à falta de outros, pôs-se a lê-los.
E eis que o jovem e
brilhante oficial é vencido pela graça divina e, depois de hesitar por algum
tempo, toma a resolução de fazer o que fizeram os Santos.
E imediatamente
começa a pôr em prática sua resolução.
Assim que teve
forças, levantou-se e, a custo, apoiado a uma bengala, prostrou-se de joelhos
ante uma imagem da Santíssima Virgem e Lhe pede que aceite o compromisso que
ele toma de servir para sempre sob Sua bandeira. No mesmo instante, formidável
abalo seguido de espantoso estrondo produziu uma larga fenda na parede do
quarto em que se achava D. Iñigo. Era o demônio que manifestava seu ódio
impotente contra aquele que seria um de seus piores inimigos.
Logo que a doença o
permitiu, Iñigo partiu da casa paterna, com intenção de nunca mais voltar.
Depois de visitar o Duque de Nájera, seu tio, dirigiu-se ao Mosteiro Beneditino
de Monserrate. Ao iniciar essa peregrinação, fez voto de castidade perpétua.
Chegado ao
Mosteiro, pediu para se confessar com um dos Monges do Patriarca São Bento.
Confessa-se com grandíssima dor de seus pecados, troca suas ricas vestes por
uma túnica de tecido grosseiro, e faz a “vigília de armas” diante do altar da
Virgem, como o faziam os futuros cavaleiros na véspera do dia em que deviam ser
armados. Era o dia 25 de março (festa da Encarnação do Verbo, n.d.c.) de 1522.
Fugindo à afluência
de peregrinos, o novo cavaleiro de Nossa Senhora se dirige a Manresa, onde se
abriga em uma hospedaria destinada aos indigentes, pois de agora em diante ele
também é um mendigo.
Impedido de seguir
para a Terra Santa, conforme era sua intenção, o fidalgo mendigo ficou bastante
tempo em Manresa (foto acima, tal qual se apresenta em nossos dias este
histórico local). Foi aí que fez seu noviciado espiritual, com grandes
penitencias, muitas consolações e, depois, terríveis tentações e escrúpulos.
À tempestade
seguiu-se a bonança. Santo Inácio recebeu então extraordinárias luzes divinas e
admiráveis revelações. Essas revelações ele as coligiu em um livro “em todos os
pontos de vista prodigioso”, como diz a Santa Liturgia: o livro dos Exercícios
Espirituais.
Em 29 de março de
1523, depois de viajar à custa de esmolas, chegou a Roma. Daí, vencendo com sua
férrea força de vontade enormes dificuldades e obstáculos, vai em peregrinação
à Palestina.
Em fevereiro de
1524, Santo Inácio, que contava então 33 anos de idade, começa a estudar latim
e ciências.
Em 1526, ei-lo na
Universidade de Alcalá, onde ouve dialética, teologia e filosofia. Já então
tinha vários discípulos espirituais e várias senhoras, entre as quais algumas
penitentes, confiavam-lhe a direção de suas consciências. Três jovens foram
arrebatados pelos seus ideais apostólicos e se uniram a ele: João de Arteaga,
Lopez de Caceres e Calixto.
Mas em Alcalá e
Salamanca (para onde se passou e onde adquiriu mais um sócio) Santo Inácio foi
preso e julgado pela Inquisição, que temia que aqueles homens fossem hereges, e
muito se espantava de vê-los discorrer sobre pontos difíceis da doutrina
católica sem serem formados. Embora provado que a doutrina que ensinavam era
perfeitamente ortodoxa, foi-lhes proibido continuar ensinando determinados
pontos mais complexos. Diante disso Iñigo se põe a caminho para Paris. A 2 de
fevereiro de 1528, chega à principal metrópole do saber da Europa, e se torna
um entre os quatro mil estudantes que frequentavam as aulas da cidade
universitária.
Aí conhece o
tomismo cujo imenso valor percebe imediatamente.
Aos 44 anos de
idade, depois de muito lutar com a falta de dinheiro e outras dificuldades,
Santo Inácio é doutor. Graças a esse contato com as principais universidades
poderá, mais tarde, traçar normas admiráveis para a formação intelectual dos
membros da sua Ordem.
Santo Inácio havia
tomado a resolução de formar apóstolos imbuídos dos seus princípios. Mas tem
que sofrer algumas desilusões: os seus quatro primeiros discípulos o abandonam
e os três que recrutou em Paris, seguem o exemplo dos primeiros.
Ensinado por essas
defecções, o Santo faz novos recrutas, aos quais propõe o modo de viver que
levariam os membros da futura Companhia. Esses recrutas, que seriam os generais
da gloriosa milícia, foram: o Bem-aventurado Pedro Fabro, São Francisco Xavier,
Laynez, Salmerón, Bobadilha e Simão Rodrigues (para ler comentários do Prof.
Plinio a quadros da época representando a vários deles, basta clicar aqui,
n.d.c.).
Em 1534 reuniu-se
esse pequeno grupo na igreja de Montmartre, em Paris, e, depois da Santa
Comunhão, todos fizeram o voto de abandonar o mundo e entregar-se
exclusivamente ao serviço de Deus. Estava fundada praticamente a Companhia de
Jesus. Inácio foi para Roma, onde exerceu a sua missão.
Em 24 de julho de
1537, Santo Inácio recebe juntamente com os companheiros que ainda não eram
Sacerdotes a Sagrada Ordem do Presbiterado.
Aos 27 de setembro
de 1540, Paulo III, que já o conhecia e estima, assinava a Bula “Regimini
Militantis Ecclesiae” em que aprovava a Companhia de Jesus. Santo Inácio foi
eleito o primeiro Geral da Ordem por ele fundada, cargo que só aceitou depois
de muitas insistências de seus companheiros.
Desde então a
Companhia não cessou de prosperar. Os Reis logo pediram a Santo Inácio alguns
Padres para fundações em seus reinos. O primeiro foi Dom João III de Portugal,
que desejava nada menos de sete Padres. Recebeu dois dos que tinham prestado
compromisso na cripta de Montmartre: Afonso Rodrigues e Francisco Xavier. Este,
porém, logo que a fundação de Portugal poude dispensar-lhe os serviços, recebeu
ordem de partir para a Índia.
Apesar de
extremamente ocupado, Santo Inácio não deixava de ensinar as crianças, de
fundar recolhimentos, de preparar novos Jesuítas. Preocupava-se constantemente
com a situação alemã. Tão ativo foi o Santo espanhol que chegou a circunscrever
em muitos lugares a obra nefasta do protestantismo, apesar de sua Companhia
contar poucos anos de existência.
Uma de suas obras
foi a fundação do Colégio Romano (foto acima) em Roma, obra que só por si
bastaria para imortaliza-lo.
Santo Inácio, antes
de seu glorioso trânsito (31 de julho de 1556), poude ver os primeiros grandes
frutos de sua obra. São Francisco Xavier deitava as sementes do catolicismo no
Japão e nas Índias. Em Mogúncia, Colônia e outras cidades alemãs, a
pseudo-reforma protestante foi completamente sufocada no nascedouro.
Não admira pois que
essa Companhia de Santo Inácio seja a Ordem mais caluniada da Igreja. O seu
Fundador, pouco antes de morrer, revelou aos seus Padres que ela sofreria
perseguição por amor à Justiça, como aconteceu a Nosso Senhor Jesus Cristo,
porque o servo não é melhor que o seu Senhor.
Inúmeras outras
coisas se poderiam dizer sobre aquele a quem a Sagrada Liturgia chama “mestre
especializado na formação dos Santos”; “seu amor suavíssimo e dulcíssimo de
Pai” (palavra do R. Ribadeneira, um dos Jesuítas formados pelo Santo Fundador),
sua intransigência quando se tratava de expulsar um membro indigno, seu amor
aos pobres, seus dons místicos, seu amor à Sagrada Liturgia, sua prudência, e
tantas outras coisas que encheriam vários livros para serem contadas. Todavia
há uma palavra que é sua e que resume de modo perfeito toda a sua vida:
“Omnia ad majorem
Dei gloriam” (tudo para a maior glória de Deus).
(“Legionário”, 30 de
julho de 1944, n. 625, pág. 4)
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