(Comentários de Dr. Plínio Corrêa de Oliveira sobre a Santíssima Virgem Maria)
Na bula Ineffabilis Deus, com a qual Pio IX definiu o dogma da Imaculada
Conceição, encontra-se este trecho:
“A
doutrina que sustenta que a Beatíssima Virgem Maria, no primeiro instante de
sua conceição, por singular graça e privilégio de Deus onipotente, em vista dos
méritos de Jesus Cristo, Salvador do gênero humano, foi preservada e imune de
toda mancha de pecado original, essa doutrina foi revelada por Deus, e por isto
deve ser crida firme e inviolavelmente por todos os fiéis”.
Rompida
a lamentável herança da culpa original
O Sumo Pontífice afirma, portanto, que
Nossa Senhora, por uma graça singular e em vista dos méritos de Jesus Cristo, a
partir do primeiro instante de seu ser foi isenta da mancha do pecado original.
Essa doutrina foi revelada por Deus, ou seja, está na Bíblia, e por isso deve
ser “crida firme e inviolavelmente por todos os fiéis”.
Para se avaliar o extraordinário
significado da Imaculada Conceição, é preciso ter em conta que, em conseqüência
da queda de Adão, todos os seus descendentes haviam de nascer com o pecado
original. Lamentável herança em virtude da qual os sentidos do homem
continuamente se revoltam contra a sua razão, expondo-o a novos e incontáveis
pecados.
Durante milênios verificou-se,
inexorável, essa lei da maldição. Em determinado momento, porém, os Anjos
assistem atônitos a um fato sem precedentes na história da Humanidade decaída:
Deus quebranta a funesta lei, e um ser é inteiramente concebido sem pecado
original. É Nossa Senhora que surge imaculada, resplandecente, com todo o
brilho e todo o fulgor de uma criatura perfeita, como o foram Adão e Eva ao
saírem das mãos do Onipotente.
Pode-se imaginar que, nesse sublime
instante, um frêmito de júbilo e de glória percorreu todo o universo, acentuado
pelo fato de que Maria, isenta do pecado original, era também a obra-prima da
criação. Acima d’Ela haveria de estar, apenas, a humanidade santíssima de Nosso
Senhor Jesus Cristo.
Narra a Sagrada Escritura que o Padre
Eterno, depois de concluída a obra da Criação, repousou na enlevada
consideração do que Ele tinha feito.
Descansou, porém, tendo-se proposto
criar um ser que superasse em maravilha tudo o que até então sua onipotência
realizara, uma mulher da qual haveria de nascer o Verbo Encarnado. E foi
precisamente no momento da Conceição Imaculada de Nossa Senhora que Deus
executou essa sua obra-prima.[1]
“Como
um exército em ordem de batalha”
Concebida sem pecado original, Nossa
Senhora não sentia em si nenhuma inclinação
para o que fosse ruim. Pelo contrário, possuía todas as facilidades para
dar à graça de Deus uma perfeita e constante correspondência. De sorte que, n’Ela,
as grandezas sobrenatural e natural se entrelaçavam numa profunda e maravilhosa
harmonia.
Em conseqüência, Nossa Senhora tinha
como ninguém uma altíssima noção da excelência de Deus, e da glória que Lhe
devem render todas as criaturas. Por isso, nutria em sua alma vivíssimo horror
ao pecado, que é um ultraje à mesma glória divina. Donde possuir Ela, também,
uma ardorosa combatividade, no sentido de execrar toda forma de mal.
Compreende-se, à vista disso, porque
Nossa Senhora é comparada a um exército em ordem de batalha: sicut castrorum acies ordinata. Ou, como
d’Ela se diz, que sozinha esmagou todas as heresias na Terra inteira. Por quê?
Exatamente porque, já no privilégio de sua Imaculada Conceição, Ela é o modelo
de combate ao mal.
Início
da vitória da Contra-Revolução
Porque concebida sem pecado original, Nossa
Senhora, afirmam os teólogos, foi dotada do uso da razão desde o primeiro
instante de seu ser. Portanto, já no
ventre materno Ela possuía altíssimos e sublimíssimos pensamentos, vivendo no
seio de Sant’Ana como num verdadeiro tabernáculo.
Temos uma confirmação indireta disso
no que narra a Sagrada Escritura (Lc 1, 44) a respeito de São João Batista.
Ele, que fora engendrado no pecado original, ao ouvir a voz de Nossa Senhora
saudando Santa Isabel, estremeceu de alegria no seio de sua mãe.
Assim, pode-se acreditar que a
Bem-aventurada Virgem, com a altíssima ciência que recebera pela graça de Deus,
já no seio de Sant’Ana começou a pedir a vinda do Messias e, com Ele, a derrota
de todo mal no gênero humano. E desde o ventre materno se estabeleceu,
certamente, no espírito de Maria, aquele elevadíssimo intuito de vir a ser, um
dia, a servidora da Mãe do Salvador.
Na realidade, por essa forma Nossa
Senhora já começava a influir nos destinos da humanidade. Sua presença na Terra
era uma fonte de graças para todos aqueles que d’Ela se aproximavam na sua
infância, ou mesmo quando ainda se encontrava no seio de Sant’Ana. Pois se dá
túnica de Nosso Senhora – conta o Evangelho (Lc 8, 44-47) – se irradiavam
virtudes curativas para quem a tocasse, quanto mais da Mãe de Deus, Vaso de
Eleição!
Por isso, pode-se dizer que, embora
fosse Ela criancinha, já em seu natal graças imensas raiaram para a humanidade.
Naquele bendito momento, a vitória da Contra-Revolução começou a ser afirmada e
o demônio a ser esmagado, percebendo que algo de seu cetro estava
irremediavelmente partido.
Derrota
dolorosa para o demônio
Por isso, tem o demônio especial ódio
à Imaculada Conceição. Esta singular prerrogativa de Nossa Senhora constitui
para ele uma derrota dolorosíssima e, por assim dizer, pessoal.
Com efeito, tendo Satanás conseguido
arrastar nossos primeiros pais ao pecado original, as vantagens que lhe traria
essa queda, caso não houvesse a futura Redenção, seriam simplesmente
espetaculares. O homem, criatura nobre de Deus, ficou desfigurado pelo pecado e
sujeito às más tendências. Com isso, tornou-se incalculável o número de pessoas
capazes de cair, ao longo dos séculos, no Inferno. Portanto, imenso foi o êxito
imediato que o demônio obteve com o pecado de Adão e Eva.
O unido modo de anular esse triunfo do
mal seria o Verbo se encarnar e, enquanto Homem-Deus, oferecer-se como vítima
pela nossa salvação.
Ora, essa vitória do Bem teve sua
primeira realização no nascimento de uma criatura excelsa, imaculada, que,
apesar de todos os embustes do demônio, surgia livre da trama na qual ele
pretendia envolver todo o gênero humano. Em favor dessa criatura, Deus rompeu a
urdidura satânica, e Ela nasceu inteiramente fora da lei do pecado original.
Essa criatura eleita é Maria Santíssima, Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Portanto, a raiz da salvação do mundo,
o ponto de partida da Redenção da humanidade, foi o fato de Nossa Senhora ter
sido concebida isenta do pecado original. Donde nos ser fácil compreender como
o primeiro lance da Contra-Revolução foi, precisamente, a Imaculada Conceição
de Maria Virgem, prelúdio da Encarnação do Verbo.
Invocação
propícia aos contra-revolucionários
Compreendemos, de outro lado, como
Nossa Senhora, concebida sem pecado original, realmente pisa na cabeça do
demônio. E, portanto, o profundo sentido teológico que há no fato de se
representar a imagem da Imaculada Conceição calcando a serpente.
Imaculada Conceição! Essa é a
invocação propícia para os contra-revolucionários. O modelo para estes é Nossa
Senhora que, ao contrário de Eva, não conversa com a serpente e, ademais,
esmaga-lhe constantemente a cabeça. Tal é a atitude de espírito que devemos
pedir a Nossa Senhora da Imaculada Conceição.
Pois, que outra coisa é o calcanhar da
Virgem, senão os filhos que Ela suscitou para seu serviço, humildes,
desapegados de honras e glórias mundanas, unicamente desejosos de serem
instrumentos d’Ela para esmagar a Revolução?
Esse deve ser o nosso maior anelo:
sermos células vivas do glorioso calcanhar da Santíssima Virgem, a cuja pressão
nada tem resistido ao longo da História!
Especial
brilho da imaculada beleza de Maria
Na mesma Bula Ineffabilis Deus, o Papa Pio IX assim se exprime: “E depois
reafirmamos a nossa mais confiante esperança na Beatíssima Virgem que, toda
bela e imaculada, esmagou a cabeça venenosa da crudelíssima serpente, e trouxe
a salvação ao mundo”.
É interessante notar que o Sumo
Pontífice reúne, no mesmo pensamento, a beleza e o poder de Nossa Senhora. De
outro lado, evoca ele, por contraste, a hediondez e a fraqueza do demônio, o
qual é esmagado por Ela.
Portanto, uma vez que existe a diabólica
serpente, a beleza e a perfeição da Santíssima Virgem só se manifestam
completas porque Ela triunfa, vence e esmaga o demônio. Satanás é um escabelo
aos pés d’Ela. Sendo Maria imaculada e soberanamente linda, não basta que todas
as criaturas deste mundo, as do Céu e as do Purgatório Lhe prestem homenagem:
importa que o inimigo esteja quebrado sob seu calcanhar.
Uma perfeita consideração de esplendor
de Nossa Senhora envolve, portanto, a idéia do demônio estraçalhado e humilhado
por Ela. Essa vitória sobre Satanás resulta em particular brilho na celestial
beleza da Imaculada Conceição.
(Revista “Dr. Plínio”, nº 81, dezembro de 2004)
[1]Até
aqui o texto está também transcrito no Pequeno Ofício da Imaculada Conceição
Comentado, João S. Clá Dias, pág. 62; a seguir, na revista “Dr. Plínio”
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