“E aquele que receber uma criança como esta por causa do meu nome, recebe a mim. Caso alguém escandalize um destes pequeninos que creem em mim, melhor seria que lhe pendurassem ao pescoço uma pesada mó e fosse precipitado nas profundezas do mar. Ai do mundo por causa dos escândalos! É necessário que haja escândalos, mas ai do homem pelo qual o escândalo vem!” (Mt 18, 5-7)).
Praticamente, toda
a doutrina sobre escândalos encontra-se nessa passagem do Evangelho. Nosso
Senhor Jesus Cristo mostrou uma criança para que todos vissem ali uma alma
inocente que pode ser atingida pelos escândalos feitos pelos pecadores que lhe
querem tirar a inocência. Ele frisa também que aquela criança, ou “aqueles
pequeninos” são escandalizados porque creem n’Ele, quer dizer, a Fé deve estar
com ela e a animar para a prática do Bem. Quanto ao causador de escândalos
entre os inocentes, as crianças, os pequeninos, Nosso Senhor não fala que
melhor seria lhe colocar uma “pedra de tropeço” ao pescoço, mas uma “pesada
mó”, quer dizer, uma grande rocha, pois além de tropeço o causador deste tipo
de escândalo fica preso eternamente por algo do qual ele não pode se
desvencilhar. No fim, vem a apóstrofe: “ai do homem pelo qual o escândalo vem”,
embora seja necessário que haja escândalos. Essa necessidade não é porque eles
façam algum bem ás pessoas, mas para advertir os bons sobre as ciladas dos
maus, pois o escândalo surge como uma cilada, uma “pedra de tropeço” e serve de
advertência para o justo evitar cair nela..
Essa imagem da
grande pedra atada ao pescoço significa que o fato do pecador provocar
escândalo com seus atos também fica imobilizado sem poder sair de sua perdição,
especialmente quando tal escândalo fere a inocência. Isso ocorre porque o
escândalo é consequência de um pecado social, tornado assim por causa de sua
propagação na sociedade. Aí está também representado o encalhe espiritual de muitos,
como fala Dr. Plínio (comentários sobre o livro o poder da oração de Santo
Afonso de Ligório) presos a uma pesada mó. Nesse sentido, pode-se dizer que, de
algum modo, o pecado social e os escândalos que ele provoca são pecados contra
o Espírito Santo, pelos quais a perdição é certa.
Segundo a
etimologia da palavra, escândalo é um fato ou acontecimento que contraria e
ofende sentimentos ou o pensamento comum, crenças sociais, convenções morais,
sociais ou religiosas de um povo. O escândalo é provocado porque o fato causa
indignação, perplexidade ou até mesmo sentimento de revolta entre parte ou de
toda a sociedade envolvida. Pode também servir de mal exemplo e divulgar um mal
costume.
Vejamos a definição
dada pelo Catecismo da Igreja Católica: “O
escândalo é a atitude que leva outrem a praticar o mal. Aquele que escandaliza
torna-se o tentador do próximo. Atenta contra a virtude e a retidão; pode
arrastar seu irmão à morte espiritual. O escândalo constitui uma falta grave
se, por ação ou omissão, conduzir deliberadamente o outro a uma falta grave”
(tópico 2284). Se é grave conduzir “um outro” a uma falta grave, imaginem
se levar toda uma sociedade ou parte dela à prática ou pertinácia no pecado:
nesse caso a gravidade do mal é maior ainda.
De modo geral, o termo se origina da expressão “pedra de tropeço”, tanto em hebraico quanto em grego. O termo português se origina do grego “skandalon”, que significa também “pedra de tropeço”, ao qual se associa o verbo “skandalizo”, com o mesmo sentido de fazer alguém tropeçar, ou pecar. Esta expressão era usada no Antigo Testamento, como em Isaías, quando comparou o próprio Deus como “pedra de tropeço e rocha de escândalo” para ambos os reinos de Israel daquele tempo (Judá e Israel) (Is 8, 14). Isso quer dizer que até mesmo o próprio Deus pode causar escândalo, desde que a sociedade não entenda suas revelações e até se revolte contra elas pelo fato de contrariar certos costumes sociais. Em outra ocasião Isaías se refere aos “tropeços do caminho” que devem ser removidos para a chegada do Messias (Is 57, 14), semelhante ao que pregou São João Batista pedindo para “preparar os caminhos e endireitar as veredas”(Mt 3, 3), isto é, retirar do caminho aquilo que poderia atrapalhar o Messias, como, por exemplo, os escândalos que dava a sociedade judaica como os pecados de adultério de Herodes..
A Revolução usa escândalos para propagar os pecados sociais
Assim, quando
alguém comete um grande pecado que chama a atenção de todos, nem sempre é
porque o próprio pecador quis que o fato fosse de conhecimento geral, muitas
vezes ocorre fortuitamente de haver tal revelação pública. E qual a causa do
escândalo?
Primeiramente, isso
ocorre quando a pessoa é tida como virtuosa, mas comete alguns pecados graves
às escondidas que são depois revelados, ou então, no dia em que resolveu
cometer um deles é descoberta em flagrante por alguém que o revela aos demais.
Aqui temos o exemplo do escândalo mais comum, que é a revelação pública de um
pecado, ou prática habitual dele, por uma pessoa tida como boa e virtuosa. Por
exemplo, uma pessoa tida por todos como bom esposo e pai de família é flagrado
num romance amoroso adulterino com outra mulher: não somente sua esposa e
família, mas a sociedade em peso fica escandalizada com o ato dele; isso só não
ocorreria com todo o corpo social se as pessoas já estivessem vivendo naquele
modo de vida pecaminosa como coisa normal.
Em segundo lugar há
casos também de escândalos causados por pessoas que os provocam de propósito,
isto é, praticando atos imorais e pecados públicos a fim de que todos o saibam
e propaguem seu modo de vida. O escândalo ocorre porque as pessoas não aceitam
pacificamente aqueles atos como exemplo para a sociedade, daí o escândalo. Faz
parte de uma técnica revolucionária de mover a opinião pública através da
divulgação de escândalos a fim de que as pessoas se acostumem aos poucos com
pecados sociais transformadores dos bons costumes. Quando a primeira mulher
usou os reduzidos biquínis numa praia causou grande escândalo na época, mas aos
poucos a sociedade foi aceitando aquilo como normal até que tornou-se um
hábito corriqueiro como ocorre hoje em dia.
Sobre a natureza do escândalo assim
falou São Paulo: “Deixemos, portanto, de
nos julgar uns aos outros, cuidai antes de não colocar tropeço ou escândalo
diante de vosso irmão” (Rom 14, 13).
Quer dizer, em vez de julgar devemos servir de bom exemplo e nunca causar
escândalos.
Em algumas passagens do Antigo Testamento é
usada a expressão “pedra de tropeço” ou simplesmente “tropeço”, como em
Ezequiel 14, 3-4, cujo escândalo ou tropeço era a idolatria, quer dizer, um
pecado social. Esse mesmo sentido é usado por São Paulo, ou de pedra de tropeço
ou de escândalo, advertindo os cristãos para não provocarem escândalos que
levam os outros a pecar (Rom. 14, 13 e I Cor 8, 9). Também São João em seu Apocalipse
usa a expressão “pedra de tropeço” (Ap 2, 14).
"Escândalo ativo" é realizado por uma pessoa; "escândalo passivo" é a reação de uma pessoa ao escândalo ativo (escândalo fornecido ou em Latim scandalum datum), ou a atos que, por causa da ignorância do espectador, ou sua fraqueza, ou malícia, são considerados como escandalosos (escândalo aceito ou em latim ”scandalum acceptum”).
Escândalo ou “Pedra de Tropeço”?
Ocorre também
chamar de escândalo um ato virtuoso, praticado por uma pessoa santa, mas que
choca a sociedade porque rompe com alguns maus costumes sociais. São Bento, por
exemplo, resolveu deixar a corrupta sociedade romana de seu tempo para viver na
solidão, causando certo escândalo em pessoas de sua família ou de seu
relacionamento pelo fato de romper completamente com os péssimos costumes
sociais. Outros exemplos desta natureza podemos ver entre os antigos mártires,
que escandalizavam a sociedade pagã pelo fato de não aceitar a idolatria dos
falsos ídolos.
Embora chamem de
escândalo, na verdade tais atos podem ser considerados o que na Sagrada
Escritura se chama de “pedra de tropeço”, expressão usada em outras ocasiões
como, por exemplo, no nascimento de Cristo, quando São Lucas escreveu no
Evangelho o que disse Simeão: Ele seria motivo de quedas, mas também de
soerguimento de muitos (Lc 2.34). Isso
foi explicado depois por São Paulo, citando o Antigo Testamento: “Eis que ponho
em Sião uma pedra de tropeço, uma rocha de escândalo, mas quem nela crer não
será confundido” (Rom 9, 32-33). São Pedro usou da mesma expressão para se
referir aos que rejeitaram a Revelação (I Ped 2, 7-9). Em outra ocasião São
Paulo afirma que Cristo crucificado era motivo de escândalo para os judeus e
loucura para os gentios (I Cor 1, 23).
Dr.
Plínio Corrêa de Oliveira assim comentou sobre isso:
“Quando o Profeta Simeão teve nos braços o
Menino Jesus e entoou o seu famoso cântico Nunc dimittis servum tuum, Domine… –
Senhor, agora envia em paz o teu servo… –, ele disse que Nosso Senhor foi
enviado como pedra de escândalo para a perdição e salvação de muitos, e para que
se conhecessem as cogitações ocultas dos corações.
Portanto, Nosso Senhor foi mandado para
salvar a todos, mas a perdição daqueles que O recusassem não significava o
fracasso d’Ele, e sim um elemento intrínseco à sua Missão, ou seja, criar
condições para os justos conhecerem a verdade e se salvarem, para os ímpios
manifestarem a sua impiedade e, não se arrependendo, irem para o Inferno.
Christianus alter Christus – o cristão é um
outro Cristo. Também nós somos pedra de escândalo posta para a salvação e a
perdição de muitos, e para que se revelem as cogitações dos ímpios. A nossa missão é, pois,
suscitar nas pessoas a definição, para a salvação dos bons”.[1]
O próprio Dr.
Plínio Corrêa de Oliveira foi, em toda a sua vida, uma espécie de “pedra de
tropeço”, pois todas as suas atitudes demonstravam as divisões latentes entre
bons e maus e, com isso, ao mesmo tempo provocava a fidelidade a Deus dos bons
e uma maior prevaricação dos maus. Os verdadeiros escândalos, porém, começaram
com a investida dada pelos progressistas apresentando ao público católico
reformas litúrgicas ofensivas às leis divinas, como o caso de Taubaté citado na
revista Dr. Plínio (edição de março 2023, página 18). De modo que quando Dr.
Plínio, em 1943, lançou seu livro “Em Defesa da Ação Católica”, causou uma
espécie de escândalo entre alguns católicos, especialmente, nos meios
eclesiásticos, mas podemos classificar isso como se fosse uma “pedra de
tropeço”. O seu brado de alerta abriu os olhos dos bons, provocando entre os
maus uma reação fulminante contra ele, causando-lhe grande ostracismo, pelo que
ele mesmo disse que sua atitude foi um ato semelhante aos dos pilotos japoneses
“kamikazi”: destrói o inimigo mas também morre...
Em depoimento sobre
os episódios que antecederam ao lançamento de seu livro “Em Defesa da Ação
Católica”, declarou ele alguns anos depois:
“Eu notava que a corrente oposta ia crescendo cada
vez mais, não só em São Paulo, mas no Brasil, e penetrando nos seminários,
tomando influência no clero, enfim, entrando como uma torrente em todos os
lados.
Percebi, num relance só, o seguinte: se nós
demorássemos para ataca-los, acabariam levando para o lado deles todo o mundo,
inoculando sua mentalidade. Ou eu denunciava toda a trama para a maioria
ingênua que, tomando a sério os esmagaria pela recusa, ou ela se deixaria
cominar completamente. Existia um só meio de conter a gangrena: criar um escândalo. Criado esse
escândalo, muitos ficariam atemorizados e recuariam. Essa gente não se uniria a
nós, mas também não aderiria a eles. Ficaria com uma interrogação na cabeça.
Tornava-se, pois, urgente preparar uma denúncia monumental,
que não podia ser feita num artigo de jornal ou de revista, porque tantos eram
os fatos a mencionar e os argumentos a dar, que só mesmo redigindo um livro.” (revista “Dr. Plínio”, março 2023, pág. 19)
Este livro deixou-o
em completo isolamento, mas, aos poucos foi se unindo em torno dele um pequeno
punhado de seguidores, aumentando gradativamente ao longo dos anos, até que ao
final de sua vida constituiu um grandioso movimento católico que se espalhou
pelo mundo todo. Então, aquilo que pode ser chamado por alguns de escândalo, ou
de “pedra de tropeço”, tornou-se, nada mais nada menos, do que a “pedra
angular” de uma grande obra.
Há referências
também à chamada “pedra angular” porque esta era a pedra principal das
construções antigas, aquela pedra que sustentava as demais numa edificação.
Após narrar a parábola dos vinhateiros, Nosso Senhor assim se refere à tal
Pedra que Ele representava: “Nunca
lestes nas Escrituras: A pedra que os
construtores rejeitaram tornou-se a pedra angular: pelo Senhor foi feito isso e
é maravilha aos nossos olhos? Por isso vos afirmo que o Reino de Deus vos
será tirado e confiado a um povo que o fará produzir seus frutos. Aquele que
cair sobre esta pedra ficará em pedaços, e aquela sobre quem ela cair, ficará
esmagado” (Mt 21. 42 Mc 12, 10, e Lc 20,
17).
Tudo indica que
Nosso Senhor está se referindo acima ao que consta no livro de Isaías: “É por esta razão que assim diz o Senhor
Javé: Eis que porei em Sião uma pedra, uma pedra de granito, pedra angular e
preciosa, uma pedra de alicerce bem firmada: aquele que nela puser a sua
confiança não será abalado” (Is 28, 16).
O mesmo sentido é utilizado nos Atos dos Apóstolos: “É Ele a pedra desprezada por vós, os construtores, mas que se tornou a pedra angular” (At 4, 11). A mesma pedra pode ser motivo de escândalo, sendo por isso desprezada, mas também ser alicerce e sustentação para os que a aceitam, por isso chamada de angular, conforme explica detalhadamente São Pedro: “Com efeito, nas Escrituras se lê: Eis que ponho em Sião uma pedra angular, escolhida e preciosa; quem nela crê não será confundido. Isto é, para vós, que credes, ela será um tesouro precioso, mas para os que não creem, a pedra que os edificadores rejeitaram, essa tornou-se a pedra angular, uma pedra de tropeço e uma rocha que faz cair. Eles tropeçam porque não creem na Palavra, para os que também foram destinados” (I Ped 2, 6-8)
O Juízo Final –
Revelação e eliminação de todos os escândalos de uma só vez e de forma
universal
Nosso Senhor disse: “O Filho do Homem enviará
seus anjos e eles apanharão do seu Reino todos os escândalos e os que praticam
a iniquidade e os lançarão na fornalha ardente”
(Mt 14, 41). “De maneira que, assim como é
colhida a cizânia e queimada no fogo, assim acontecerá no fim do mundo. O Filho
do homem enviará os seus anjos, e tirarão do seu reino todos os escândalos e os
que praticam a iniqüidade, e lançá-los-ão na fornalha de fogo. Ali haverá choro
e ranger de dentes. Então, resplandecerão os justos como o sol no reino de seu
Pai”. (Mt 13, 40-43).
São Crisóstomo comentando a correspondente
passagem de S. Mateus, escreveu alguns comentários sobre o Juízo Final, assim
concluindo: “Oh, pecador miserável, colhido
por todos os lados! Por onde poderás escapar? Conseguirás ocultar-te? Não; isso
é impossível; visível permanecerás ainda que isso te resulte intolerável”.
Todos os delitos e iniquidades dos réprobos ficarão
postos de manifesto no juízo de que falamos, como disse Jeremias: “Chegará o dia em que nossas obras ficarão
tão patentes como se as houvéssemos pintado num quadro”. O veredito,
finalmente, se executará sem demora, naquele mesmo instante, com a rapidez de
um abrir e fechar de olhos”.[2]
Segundo Santo Agostinho “com suma diligência nos
recordará as palavras de nossa profissão e frente a elas fará desfilar tudo o
que temos obrado, o lugar e a hora em que pecamos e o que deveríamos ter feito
em vez do que realmente fizemos
O pecador verá que todos seus males praticados em
vida ficarão expostos, como afirma o Livro da Sabedoria no capítulo 4: “Tremerão ao recordar suas culpas; suas
iniqüidades se voltarão contra eles, acusando-os”. “Todas suas obras”, comenta
São Bernardo, “falarão ao mesmo tempo e
dirão ao pecador: Tu nos tens feito; coisa tua somos; não te abandonaremos;
permaneceremos sempre junto a ti; contigo estaremos quando fores julgado”. Essas obras acusarão ao pecador de muitos e
de diversas más ações.
Até mesmo o mundo em que viveu acusará o pecador. “Se perguntas”, escreve São Gregório, “quem te acusará, responder-te-ei; todo o mundo; porque quem ofende ao Criador, ao mundo em sua totalidade ofende”. Como os escândalos foram pecados sociais, estes afetaram o mundo em que o pecador viveu, sendo este um dos acusadores no referido Juízo. Sobre isso diz São Crisóstomo: “Nada teremos que responder naquele dia, quando o céu, a água, o sol, a lua, os dias, as noite e todo o universo levante sua vós contra nós denunciando ante Deus nossos delitos; porém mesmo que todas as coisas calassem, não calarão ante o Senhor contra nós e darão testemunho de nossos pecados”.
O olhar de Jesus no
Juízo Universal
Podemos apenas imaginar, ter uma pálida ideia, de como o olhar de Nosso
Senhor Jesus Cristo refletiu o Seu bondoso coração. Já antes de nascer, os
místicos dizem que Ele se privou da luz de seus olhos no seio virginal de Maria
Santíssima como um verdadeiro martírio, prevendo já os piores momentos que iria
passar ao final de Sua vida. Ao nascer, derramou todo seu inocente olhar dentro
dos olhos de Sua Mãe Santíssima, com a qual teve colóquios e olhares amorosos
durante toda a vida terrena.
Na Cruz, Nosso Senhor pronunciou o
“Consumatum est” referente à Sua Missão na primeira vinda à terra; no Juízo
Final, repetirá a frase, mas desta forma como sinal da consumação de sua Obra e
do fim dos tempos: após o sétimo anjo derramar a sua taça pelo ar, saiu uma
grande voz do templo (vindo) do trono, que dizia: está feito ou então,
estão consumados os tempos. (Ap 16, 18).
Finalmente, no Juízo Final teremos o último olhar de Jesus Cristo, que
será terrível para os ímpios e cheio de bondade para os justos. Naquele momento
ninguém terá poder suficiente para lhe colocar uma venda como o fizeram na sua
Paixão. Santa Catarina de Sena diz como será aquele olhar final: “Aos
olhos do condenado, sem embargo, ele aparecerá com aquele olhar terrível e
tenebroso, que tem o mesmo condenado em si mesmo”. Completa Santa
Catarina dizendo que isto não quer dizer que Jesus Cristo, a Bondade suma e
infinita, tenha um “olhar temível e tenebroso”, mas sim que será esta a forma
com que o condenado O verá por “ter o mesmo olhar dentro de si mesmo”... Este
olhar será bastante forte e poderoso para destruir todos os escândalos
produzidos pelos pecados dos homens naquele Juízo Universal.
Santa Teresa de Jesus manifesta também grande temor daquele olhar
terrível: “Nunca tive tanto medo dos
tormentos do inferno que não fosse menos que nada em comparação do que tinha
quando me lembrava que os condenados haviam de ver irados estes olhos tão
formosos e mansos e benignos do Senhor...”[3]
“Seu
olhar”, escreve
o Papa São Leão, é impressionante. Ante ele, o compacto se torna transparente; o
oculto, manifesto; o luminoso obscuro e os mudos se tornam loquazes; em sua
presença até o silêncio fala e a mente, sem necessidade de vocábulos, declara
seus pensamentos. Sendo, pois, tal sua sabedoria e tanta, de nada valerão
frente a ela nem os discursos dos advogados nem os sofismas dos filósofos nem a
brilhante eloquência dos oradores nem a habilidade dos mais astutos e sagazes”.
Da vida de São Metódio relata-se o fato de ter
pintado um quadro representando o Juízo Final. São Metódio converteu à fé
cristã a Bulgária no século IX. Um dia ele foi chamado pelo rei dos búlgaros,
de nome Bógoris, o qual lhe pediu que pintasse um quadro para colocar em seu
palácio. Queria que ao olhar no quadro todas as pessoas sentissem terrível
medo. O santo, então, recomendando-se a Deus, pintou o Juízo universal. No meio
do quadro via-se Jesus Cristo em sua tremenda majestade entre as nuvens e num
trono de glória, rodeado pelos anjos; à direita uma fila de pessoas com os
rostos esplendorosos de luz (os justos); à esquerda uma multidão de pessoas
monstruosas com caras horríveis, cheias de pavor e de desesperada angústia (os
pecadores). Em baixo afinal se via um abismo cheio de figuras horrendas de
demônios, e desse abismo saíam chamas ameaçadoras e foscas.
Quando o rei
viu esse quadro, ficou impressionado e perguntou: “Que espetáculo é esse tão magnífico e pavoroso?” Após narrar a
explicação do significado do Juízo Final que São Metódio deu ao rei pagão,
conclui o Autor no texto que ora citamos que, apenas mediante o olhar de Jesus
como supremo Juiz de todos houve um “exame de consciência” geral dos pecadores.
Em seguida o Autor narra um exemplo de como um simples olhar pode revelar a
consciência pecaminosa.
O rei Frederico II da Prússia (1756), durante a
guerra dos 7 anos, após uma batalha vitoriosa, invernava na Saxônia. Ali um
copeiro de nome Glasau deliberou matá-lo, e lhe apresentou num copo uma bebida
envenenada. O rei, que havia notado qualquer coisa estranha na atitude de seu
servo, fixou-o profundamente no rosto. Ante este olhar o servo começou a tremer
tão forte, que lhe cai da mão o copo. Aí confessou ao rei o assassínio que
havia meditado. – Eis como só o olhar penetrante de um rei bastou para fazer
tremer e aniquilar um malvado.
Ora, como deverão tremer os pecadores quando os
fulminar o olhar de Deus que tudo conhece e que de tudo pedirá
pormenorizadíssimas contas.
E tudo o
que está oculto surgirá, e ninguém ficará impune.”[4]
Os escândalos do
mundo moderno que difundem pecados sociais
Quatro vícios e crimes predominam hoje em
toda a sociedade humana, em todo o orbe terrestre: o homicídio, a sodomia, a
opressão dos pobres e viúvas e a defraudação do salário do trabalhador. Com
estas quatro espécies de vícios e torpes crimes todos os outros se difundem na
sociedade. Alguns anos atrás tais pecados sociais, ou crimes, causavam grande
escândalo na sociedade. Mas, hoje, por tornarem-se prática comum vão aos poucos
deixando de causar escândalos. No entanto, são pecados que por si mesmo pedem a
Deus por vingança, pois se não causam escândalos entre os homens o promovem
entre os Santos Anjos, os Bem-Aventurados e a Santíssima Trindade.
Tudo começou, mais ou menos na Renascença,
após a decadência da Idade Média. E os escândalos a partir dessa época
começavam sempre nas cortes e na nobreza, que deveriam ser modelo de pureza e
castidade. Havia sempre um “caso” amoroso de um rei ou de um príncipe ou
princesa que causava escândalo à sociedade da época. Até culminar com os
escândalos mais audazes no período que antecedeu à Revolução Francesa,
geralmente girando em torno do adultério e pecados da carne. A moda, a forma de
propagar costumes de vestir, surgiu nessa época já escandalizando o público com
vestidos decotados. No âmbito civil e religioso os escândalos ficavam por conta
das heresias como o protestantismo, preparando o terreno para o surgimento das
filosofias agnósticas e ateias que vieram depois. Com o passar dos anos a
sociedade ocidental e cristã foi se acostumando com tais escândalos e começou a
achar normal o adultério, a poligamia, a vida conjugal irregular, ou
concubinato, como se fosse um casamento normal. Hoje, é tão comum tais uniões
malformadas como os adultérios que já não causam mais escândalos como
antigamente. O que poderia causar escândalo na atualidade seria o casamento
monogâmico e indissolúvel como prescreve as leis divinas.
Outros pecados sociais foram se disseminando
na sociedade através de escândalos. A assombrosa liberdade sexual do mundo
atual começou com os filmes eróticos de Hollywood da década de 50 em diante. No
começo as atrizes apenas ficavam despidas e gravavam cenas de amor lúbrico
escandaloso. Com o passar do tempo foram sempre avançando e gravando cenas mais
escandalosas, chegando aos filmes abertamente eróticos dos dias atuais, sem
qualquer censura, divulgados em todos os recursos de imagens e vídeos da
internet. Não se admira que haja tantos tarados sexuais agindo e promovendo
horrendos crimes até mesmo contra crianças, pois seus baixos instintos são
cotidianamente estimulados por tais filmes.
Os pecados sociais citados acima são no
âmbito da moral e da castidade. No entanto, outros escândalos foram amortecendo
na população os sadios convívios sociais em torno de direitos familiares e
individuais, ocorrendo por causa da investida das idéias socialistas no mundo. De
tal forma que em muitos ambientes o ato de roubar o próximo já não causa
estranheza e até é tido como um “bem social” em favor dos “menos favorecidos”.
Escândalos para todos, mas “blindagem”
de donos de jornais e TV
Um dos meios com que a mídia propaga os
males sociais, os pecados mais horrendos, é através da divulgação de
escândalos. Não podem pregar abertamente a violência urbana, mas divulgam
incansavelmente reportagens sobre os crimes mais hediondos, dando grande
destaque aos mais escandalosos e impactantes na opinião pública. O amor livre,
o adultério, o liberalismo exacerbado, o relativismo, principalmente moral e
religioso, são temas em que eles são especialistas, mas não os pregam
abertamente, apenas dão destaque espalhafatoso aos crimes que servem para
espalhar tais pecados na sociedade. Um exemplo: o aborto não é defendido
abertamente pela mídia, isto é, não dão grande ênfase aos que propagam tal crime;
no entanto, fazem reportagens escandalosas onde mostram mulheres que morreram
por ocasião de um aborto clandestino, dando destaque à idéia de que se fossem
feitos oficialmente pelo governo não causariam tais mortes.
De modo geral, todas as redes de TV e
emissoras de rádio possuem programas de crimes policiais de grande alcance no
público e expostos em horários de grande audiência. Tais empresas da mídia
gastam fortunas no aparelhamento de tais reportagens, usando até helicópteros e
equipamentos caríssimos, tudo com o objetivo de pregar e banalizar a
criminalidade. E o que eles dão muito destaque são os escândalos causados por
políticos ou empresários de grande porte, pois precisam expor à execração
pública os dirigentes da nação e suas elites. .
No entanto, qual a razão de os donos de
empresas jornalísticas nunca serem envolvidos em escândalos políticos ou
financeiros? Há fatos que podem até ser vazados mas não são divulgados, ou
esquecidos após a primeira notícia. Não se sabe quantos porque a falta de
divulgação nos impede de sabê-lo. No entanto, é muito estranho que riquíssimos
proprietários de empresar jornalísticas, muitos deles sócios de outras
envolvidas em escândalos públicos, não tenham seus nomes incluídos quando são
divulgados pela mídia. Protegidos pelo silêncio cumplicioso de seus empregados,
tais cidadãos vivem incólume da degradação pública. Um exemplo foi o famoso
Roberto Marinho, proprietário da maior rede de jornais e TVs do Brasil, homem
que enriqueceu ás custas de golpes e tramas financeiras, mas que nunca teve seu
nome ventilado pela mídia sobre tais aspectos negativos de sua atividade.
Quando falavam dele era para homenageá-lo por alguma medalha de “honra ao
mérito” recebida por alguma instituição que lhe devia alguma coisa. E passado
tanto tempo depois de sua morte, até hoje seus escândalos continuam encobertos.
O mesmo ocorre com os demais proprietários de grandes empresas jornalísticas:
trata-se de uma elite que é “blindada” (protegida) por seus veículos de
publicidade, sempre concordes umas com as outras.
[1] Plínio Corrêa de
Oliveira - Extraído de conferência de 31/1/1966
[2] Legenda
Dourada”, versão espanhola, Editora Alianza Forma, páginas 25/29, volume 2
[3]
Obras Completas de Santa Teresa de Jesus – Carmelo do Porto, Portugal – pág.
801
[4]
Extraído com adaptações de “A Palavra de Deus em Exemplos” – G.
Morotarino J. C. – Ed.Paulinas, 1961 – págs. 68/75.
Um comentário:
Excelente artigo.
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