O “pentecostalismo” é coisa nova, recente, do século passado. Segundo tal doutrina o Espírito Santo continua a atuar nas pessoas da mesma forma que o fez no dia de Pentecostes, isto é, de uma forma extraordinária, transformando as pessoas momentaneamente em pregadores de uma forma milagrosa e estupenda, concedendo dons extraordinários como o das línguas, dos milagres, etc.. Com base nesse pressuposto surgiram várias seitas protestantes, alegando que o Espírito Santo desceu sobre eles, ou sobre alguns de seus pastores, operando maravilhas, como o fez no dia de Pentecostes. Não somente seitas protestantes, mas até entre católicos houve quem acreditasse nessa doutrina, daí surgindo movimentos dentro da Igreja com essa crença e finalidade. Um movimento pentecostal, ou uma seita pentecostal, procura realizar atos extraordinários e milagrosos alegando que é fruto da atuação do Espírito Santo.
Ora, não é bem assim. Não foi assim que o
Espírito Santo deixou a sua principal mensagem. É claro que, como Deus, o
Espírito Santo pode atuar a qualquer momento em uma ou outra pessoa, operar
coisas extraordinárias e milagres com o fim de propagar o Evangelho e o Reino
de Cristo. Mas, não constitui o procedimento normal, trata-se de algo
esporádico.
No dia de Pentecostes o Espírito Santo baixou
em forma de línguas de fogo sobre os Apóstolos que estavam reunidos com Nossa
Senhora e as Santas Mulheres no Cenáculo, dando assim início à Igreja fundada
por Cristo. O resultado foi extraordinário, saindo todos dali cheios de dons e
carismas especiais destinados à pregação do Evangelho. Mas, estes dons e
carismas passaram a ser transmitidos a outras pessoas pelos próprios Apóstolos,
de uma forma constante ao longo dos anos: é como se a partir daquela data a
Igreja fosse a única comunicadora dos dons do Espírito Santo. Nem São Paulo,
nem São Marcos e nem São Lucas estavam naquele grupo, portanto, não estavam
presentes quando o Espírito Santo desceu naquele dia de Pentecostes. Mas, sem
passarem por uma descida assim milagrosa estes santos foram inspirados pelo
Espírito Santo a escreveram os Evangelhos, Atos dos Apóstolos e as famosas
epístolas paulinas, pois obtiveram todos estes dons pelo fato de pertencerem à
Igreja de Cristo. O Novo Testamento foi inspirado e escrito por santos que
estavam no dia Pentecostes e por outros que se converteram depois. Além disso,
operaram milagres tão extraordinários quanto os que fizeram os demais. O
Espírito Santo desceu neles de uma forma diferente daquela primeira vez que
apareceu em Pentecostes, isto é, usando da Igreja e de seus apóstolos e não
diretamente, mas através da simples imposição das mãos dos primeiros bispos ou
apóstolos (At 8, 17).
Essa ação do Espírito fez-se notar logo no
início em vários episódios, como nesse relatado nos Atos:
“Eis que chegaram logo três homens à casa,
onde eu estava, enviados a mim de Cesaréia. E o Espírito disse-me que fosse com
eles, sem hesitação alguma. Estes seis irmãos foram também comigo e entramos na
casa daquele homem. Ele contou-nos como tinha visto na sua casa um anjo
apresentar-se diante dele, dizendo: Manda a Jope chamar Simão, que tem por
sobrenome Pedro, o qual te anunciará palavras, pelas quais serás salvo, tu e
toda a tua casa. Tendo eu começado a falar, desceu o Espírito sobre eles,
como sobre nós no princípio...”
(At 11, 11-15). Estas palavras foram pronunciadas pelo próprio São Pedro
que, como se sabe, foi convencido por São Paulo a aceitar os gentios entre os
cristãos sem nenhuma restrições como se vinha fazendo antes. Os dois futuros apóstolos,
São Paulo e São Barnabé, receberam os dons do Espírito Santo através da “imposição
das mãos” (At 13, 3). Não tratava-se aqui de um batizado, pois já haviam sido
batizados antes, mas do recebimento das ordens sacerdotais.
Aliás, antes do Pentecostes o Espírito Santo
já se manifestava pela forma comum, como no caso de Santa Isabel que, apenas ao
ouvir a saudação de Nossa Senhora “ficou cheia do Espírito Santo” conforme
escreveu São Lucas no Evangelho (Lc 1, 41). E, é claro, que Nossa Senhora já se
encontrava nesse momento cheia do Espírito Santo, pois somente sua saudação fez
o mesmo descer sobre santa Isabel. O Anjo da Anunciação disse: “O Espírito
Santo descerá sobre ti e a virtude do Altíssimo te cobrirá com tua sombra” (Lc 1, 35). A forma de “sombra” era uma das
maneiras como o Espírito Santo se manifestava no Antigo Testamento. E assim
continuou a atuar ao longo de toda a história da Igreja, inspirando dons e
carismas extraordinários em Santos e Papas. Quem revelou tal fato a São Lucas,
com tantos detalhes inclusive da oração do Magnificat? Houve testemunhas que
guardaram fielmente tal episódio? Sim, mas, provavelmente, não eram mais vivos
na época em que São Lucas escreveu o Evangelho. Enquanto Nossa Senhora, não,
ainda estava viva e, portanto, pode muito bem ter revelado a ele alguns
aspectos daquele episódio para serem incluídos no Evangelho e tudo sob a
inspiração do Espírito Santo.
Pode ser que ocorra uma nova ação do Espírito
Santo semelhante ao de Pentecostes? Pode ser, mas não é normal que ocorra, pois
o método que Deus utiliza após a fundação de Sua Igreja é o de usar de
intermediários, de intercessores, para distribuir seus dons e carismas. E
supõe-se que possa ocorrer novamente isso somente numa situação muito convulsa,
em que a Igreja esteja prestes a sucumbir, com vistas a salvar e proteger o
Corpo Místico de Cristo. É provável que isso só ocorra talvez na vinda do
Anti-Cristo, no fim do mundo, ou numa época anterior em que esteja ocorrendo
situação análoga a do fim do mundo..
É sob a ação do Espírito Santo que o Corpo Místico de Cristo forma uma
só unidade, conforme ensinou São Paulo:
“E ninguém pode dizer: Senhor Jesus a
não ser no Espírito Santo. Há diversidade de graças, mas um mesmo é o Espírito;
e os ministérios são diversos, mas um mesmo é o Senhor; e as operações são
diversas, mas o mesmo Deus é o que opera tudo em todos. A cada um, porém, é
dada a manifestação do Espírito em vista do bem comum. Assim, a um é dada
pelo Espírito a linguagem da sabedoria, a outro, porém, a linguagem da ciência,
segundo o mesmo Espírito; a outro a fé, pelo mesmo Espírito; a outro o dom das
curas, pelo mesmo Espírito; a outro o dom de operar milagres; a outro, a
profecia; a outro o discernimento dos espíritos; a outro, a variedade de
línguas; a outro a interpretação das palavras. Mas todas estas coisas as opera
um só e o mesmo Espírito, repartindo a cada um como quer” (I Cor 12, 3-11)
Do mesmo modo que o corpo é um e tem muitos membros, mas como todos os membros do corpo, embora sejam muitos, formam um só corpo, assim é também Cristo. Com efeito, num mesmo Espírito fomos batizados todos nós, para sermos um só corpo, ou sejamos judeus ou gentios, ou servos ou livres; e todos temos bebidos de um único Espírito”. (I Cor 12, 12-13)
Simbologia
Várias são as formas como o Espírito Santo se
faz representar. As mais comuns até hoje foram as seguintes, conforme está
consignado no Catecismo da Igreja Católica: água, dedo de Deus, fogo, luz, mão,
nuvens, pomba, selo e unção. É muito
usado hoje apenas a simbologia da pomba, querendo indicar somente a paz, mas
não foi essa a forma muito usual conforme veremos a seguir. Esta foi a forma
como Ele desceu sobre o próprio Cristo em seu batismo, tornando-o um Sacramento
a ser adotado pela Igreja criada por Nosso Senhor Jesus Cristo. E essa não é a
forma como o Espírito Santo infunde seus dons sobrenaturais na alma humana,
pois Jesus Cristo, sendo Deus, não necessitava deles naquele momento, mas
apenas um sinal de batismo de fé.
Vejamos primeiramente as denominações dadas
ao Divino Espírito Santo, enumeradas no referido Catecismo:
“Ao anunciar e prometer a vinda do Espírito
Santo, Jesus o denomina “Paráclito”, literalmente: aquele que é chamado para
perto de, “advocatus” (Jo 14, 16-26); 15, 26; 16, 7). “Paráclito” é
habitualmente traduzido por “Consolador”, sendo Jesus o primeiro consolador. [1]
O próprio Senhor chama o Espírito Santo de “Espírito de Verdade” [2]
Além de seu nome próprio, que é o mais empregado nos Atos dos Apóstolos e nas Epístolas, encontram-se em São Paulo as denominações: o Espírito da promessa (Gl 3, 14; Ef 1,13), o Espírito de adoção (Rm 8, 15; Gl 4,6), o Espírito de Cristo (Rm 8,11), o Espírito do Senhor (2Cor 3, 17), o Espírito de Deus (Rm 8,9-14; 15,19; 1Cor 6,11; 7, 40) e, em São Pedro, o Espírito de glória (1Pd 4,14)
OS
SÍMBOLOS DO ESPÍRITO SANTO
A água. O simbolismo da água é significativo
da ação do Espírito Santo no Batismo, pois após a invocação do Espírito Santo
ela se torna o sinal sacramental eficaz do novo nascimento: assim como a
gestação de nosso primeiro nascimento se opera na água, da mesma forma também a
água batismal significa realmente que nosso nascimento para a vida divina nos é
dado no Espírito Santo. Mas “batizados
em um só Espírito” também “bebemos de um só Espírito” (1Cor 12, 13): o Espírito
é, pois, também pessoalmente a água viva que jorra de Cristo crucificado[3]
como de sua fonte e que em nós jorra em Vida Eterna.[4]
A unção. O simbolismo da unção
com óleo também é significativo do Espírito Santo, a ponto de tornar-se símbolo
dele. [5]
Na iniciação cristã , ela é o sinal sacramental da confirmação, chamada com
acerto nas Igrejas do Oriente de “crismação”. Mas, para perceber toda a força
deste simbolismo, há que retornar à unção primeira realizada pelo Espírito
Santo: a de Jesus. Cristo (“Messias” a partir do hebraico) significa “Ungido”
do Espírito de Deus. Houve “ungidos” do Senhor na Antiga Aliança[6]:
de modo eminente o rei Davi[7]. Mas Jesus é o Ungido de Deus de uma forma
única: a humanidade que o Filho assume é totalmente “ungida do Espírito Santo”.
Jesus é constituído “Cristo” pelo Espírito Santo.[8]
A Virgem Maria concebe Cristo do Espírito Santo, que pelo anjo o anuncia como
Cristo por ocasião do nascimento dele[9]
e leva Simeão a vir ao Templo para ver o Cristo do Senhor[10];
é Ele que plenifica o Cristo[11],
é o poder dele que sai de Cristo em seus atos de cura e de salvação.[12]
É finalmente Ele que ressuscita Cristo dentre os mortos.[13]
Então, constituído plenamente “Cristo” em sua Humanidade vitoriosa da morte[14],
Jesus difunde em profusão o Espírito Santo até “os santos” constituírem, em sua
união com a Humanidade do Filho de Deus, “esse Homem perfeito... que realiza a
plenitude de Cristo” (Ef 4, 13): “o Cristo total”, segundo a expressão de Santo
Agostinho.[15]
O fogo. Enquanto a água
significa o nascimento e a fecundidade da Vida dada pelo Espírito Santo, o fogo
significa a energia transformadora dos atos do Espírito Santo. O profeta Elias,
que “surgiu como um fogo cuja palavra queimava como uma tocha” (Eclo 48, 1),
por sua oração atrai o fogo do céu sobre o sacrifício do monte Carmelo[16],
figura do fogo do Espírito Santo que transforma o que toca. João Batista, “que
caminha diante do Senhor com o o espírito e o poder de Elias” (Lc 1, 17),
anuncia o Cristo como aquele que “batizará com o Espírito Santo e com o fogo”
(Lc 3, 16), esse Espírito do qual Jesus dirá: “Vim trazer fogo à terra, e
quanto desejaria que já estivesse aceso (Lc 12, 49). É sob a forma de línguas
“que se diriam de fogo” que o Espírito Santo pousa sobre os discípulos na manhã
de Pentecostes e os enche de Si.[17]
A tradição espiritual manterá este simbolismo do fogo como um dos mais
expressivos da ação do Espírito Santo.[18]
“Não extingais o Espírito” (1Ts 5, 19).
A nuvem e a luz. Estes dois símbolos
são inseparáveis nas manifestações do Espírito Santo. Desde as teofanias[19]
do Antigo Testamento,a Nuvem, ora
escura, ora luminosa, revela o Deus vivo e salvador, escondendo a
transcendência de sua Glória: com Moisés sobre a montanha do Sinai[20],
na Tenda de Reunião[21]
e durante a caminhada no deserto[22];
com Salomão por ocasião da dedicação do Templo[23].
Ora, estas figuras são cumpridas por Cristo no Espírito Santo. É este que paira
sobre a Virgem Maria e a cobre “com sua sombra”, para que ela conceba e dê à
luz Jesus.[24]
No monte da Transfiguração, é ele que “sobrevém na nuvem que toma” Jesus, Moisés e Elias, Pedro, Tiago
e João, “debaixo de sua sombra”; da Nuvem sai uma voz que diz: “Este é meu
Filho, o Eleito, ouvi-o sempre” (Lc 9, 34-35). É finalmente essa Nuvem que “subtrai
Jesus aos olhos” dos discípulos no dia da Ascensão[25]
e que o revelará Filho do Homem em sua glória no Dia de sua Vinda.[26]
O selo é um símbolo próximo
ao da unção. Com efeito, é Cristo que
“Deus marcou com seu selo” (Jo 6, 27) e é nele que também o Pai nos marca com
seu selo[27].
Por indicar o efeito indelével da unção do Espírito Santo nos sacramentos do
batismo, da confirmação e da ordem, a imagem do selo (“sphragis”) em sido
utilizada em certas tradições teológicas para exprimir o “caráter” indelével
impresso por estes três sacramentos que não podem ser reiterados.
A mão. É impondo as mãos que Jesus cura os
doentes[28]
e abençoa as criancinhas[29].
Em nome dele, os apóstolos farão o mesmo.[30]
Melhor ainda: é pela imposição das mãos dos apóstolos que o Espírito Santo é
dado[31].
A Epístola aos Hebreus inclui a imposição das mãos entre os “artigos
fundamentais” de seu ensinamento[32].
A Igreja conservou este sinal da efusão onipotente do Espírito Santo em suas
epicleses[33]
sacramentais.
O dedo. “É pelo dedo de Deus
que (Jesus) expulsa os demônios”[34].
Se a Lei de Deus foi escrita em tábuas de pedra “pelo dedo de Deus” (Ex 31,
18), a “letra de Cristo”, entregue aos cuidados dos apóstolos, “é escrita com o
Espírito de Deus vivo não em tábuas de pedra, mas em tábuas de carne, nos
corações” (2 Cor 3,3). O hino “Veni, Creator Spiritus” (Vem, Espírito criador) invoca
o Espírito Santo como “dedo da direita paterna”
(digitus paternae dexterae).[35]
A pomba. No fim do dilúvio
(cujo simbolismo está ligado ao batismo), a pomba solta por Noé volta com um
ramo novo de oliveira no bico, sinal de que a terra é de novo habitável[36].
Quando Cristo volta a subir da água de seu batismo, o Espírito Santo, em forma
de uma pomba, desce sobre Ele e sobre Ele permanece[37].
O Espírito desce e repousa no coração purificado dos batizados. Em certas
igrejas, a santa Reserva eucarística é conservada em um recipiente metálico em
forma de pomba (o columbarium)
suspenso acima do altar. O símbolo da pomba para sugerir o Espírito Santo é
tradicional na iconografia cristã.
(Extraído do Catecismo da Igreja Católica, Edições Loyola, 1999, tópicos 694 a 701, págs. 200/203)
[1] Epístola I Jo 2, 1
[2] Jo 16, 13
[3] Jo 19,34; 1Jo 5,8
[4] Jo 4, 10-14; 7, 38; Ex 17, 1-6; Is 55,1; Zc 14,8; iCor 10,4; Ap 21, 6; 22, 17.
[5] 1Jo 2, 20-27; 2Cor 1,21;
[6] Ex 30,22-32.
[7] 1Sm 16, 13.
[8] Lc 4, 18-19; Is 61,1.
[9] Lc 2,11
[10] Lc 2, 26-27
[11] Lc 4,1
[12] Lc 6,19; 8,46.
[13] Rm 1,4; 8,11.
[14] At 2,36.
[15] Serm. 341, 1.1; PLm39, 1493; ibid 9,11: PLm 39,1499.
[16] 1Rs 18, 38-39.
[17] At 2,3-4
[18]
São João da Cruz, A chama viva do amor.
[19]
Teofania é como se denomina a manifestação visível do próprio
Deus no Antigo Testamento. A palavra teofania
tem origem na combinação de duas palavras gregas, theos, que
significa “Deus”, e phainein,
que significa “mostrar” ou “manifestar”. Portanto, literalmente teofania
significa “manifestação de Deus”.
[20] Ex 24, 15-18.
[21] Ex 33, 9-10.
[22] Ex 40, 36-38; 1Cor 10, 1-2.
[23] 1RS 8, 10-12.
[24] Lc 1, 35.
[25] At 1, 9.
[26] Lc 21, 27.
[27] 2Cor 1,22; Ef 1,13 e 4,30.
[28] Mc 6,5; 8, 23.
[29] Mc 10,16.
[30] Mc 16, 18; At 5,12 e 14,3.
[31] At 8, 17-19; 13,3 e 19,6.
[32] Hb 6,2.
[33] Do grego epíklesis,
«apelação”, oração usada nas liturgias orientais após a consagração.
[34] Lc 11, 20.
[35] Em Dominica Pentecostes, Hymnus as I et II Vesperas: Liturgia horarum, v. 2, Tipografia Poliglota Vaticana, 1974, PP. 795 e 812.
[36] Gn 8,8-12.
[37] Mt 3, 16.
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