Trata-se
de uma das mais célebres mártires do cristianismo primitivo, tendo vivido no
século IV em
Alexandria. De condição nobiliárquica, era filha de um rei de
Costes, talvez alguma possessão de Alexandria, Catarina foi educada entre os
doutores e teve alta ciência profana.
Já aos 17 anos de idade, era considerada não só a mais sábia, mas a mais
formosa e bonita jovem do Império do Oriente.
Como
era costume, toda jovem tinha que se manifestar desde cedo por um casamento.
Sabedora de que seus pais a iriam obrigar a um matrimônio, e tendo já
princípios cristãos, manifestou desde cedo sua escolha: desejava casar-se, sim,
contanto que fosse com um príncipe tão belo e tão sábio quanto ela.
Antes
de tornar-se cristã ela foi instruída por um ermitão, chamado Ananias. Este
disse a Santa Catarina que seria a Virgem Maria quem lhe proporcionaria o noivo
que procurava. Certo dia, a Virgem Maria aparece a Catarina, portando o Menino
Jesus em seus braços. Nossa Senhora
pergunta a Santa Catarina se gostaria de ser noiva do Menino Jesus. Ela
responde imediatamente que sim, mas fica decepcionada porque o Menino Jesus
responde que não a deseja porque era feia.
Catarina vai logo ter com o ermitão e contar o ocorrido.
Na
presença do santo homem, ela se desmancha em lágrimas dizendo que o Menino
Jesus a recusou como noiva por ser muito feia. Esclareceu-lhe, então, o santo
homem que não era seu corpo, mas sua alma que era feia. Tão logo fosse instruída na Religião e
batizada, se tornaria bonita e agradável ao Menino Jesus. Após ser batizada e
fazer propósitos de castidade, Nossa Senhora lhe apareceu novamente, juntamente
com o Menino Jesus, colocando os anéis de noivado nos dedos dos dois...
Aqueles
desponsórios espirituais alimentaram na Virgem o desejo do martírio, meio com o
qual poderia ver seu esposo celestial. A oportunidade lhe surgiu quando passava
por Alexandria o imperador romano Maxêncio, de cuja presença foi motivo para
grande afluência de pagãos para prestarem culto aos ídolos. Vendo que muitos
cristãos cediam, por respeito humano, e aderiam á multidão que adorava aos
deuses pagãos, Catarina ficou indignada e pediu para falar com o imperador.
Na
presença do César romano, a virgem empreendeu vigoroso embate filosófico e
teológico. A certa altura, vendo que o tirano não tinha como refuta-la, disse:
-
Na dissertação que acabo de fazer preferi empregar uma linguagem e alguns
procedimentos científicos porque te honro e considero como homem inteligente e
culto, familiarizado com a filosofia. Porém, agora vos pergunto de uma forma
clara a precisa: que queres com a convocação feita ao povo? por que obrigas
esta gente a adorar a uns estúpidos ídolos? Já que tanto te pasma o contemplar
este suntuoso templo edificado por mãos humanas, e admirar a preciosidade das
riquezas com que está decorado, pese que toda esta magnificência e pompa não é
mais que pó que a qualquer momento pode ser varrido pelo vento. Por que não te
enlevas em considerar o céu, a terra, o mar e as multidões das coisas dignas de admiração que contêm estes
elementos?
A
certa altura da discussão o imperador quis se exaltar, ocasião em que a Virgem
lhe disse:
-
Não te irrites, César, eu vos rogo. O ânimo do varão prudente não deve
deixar-se dominar pela turbação. Recorda o que disse um poeta: "Se segues
os ditames da razão, te comportarás como um rei. Porém se te deixas dominar
pelas paixões de teu corpo, acabarás como um escravo".
Chegando
a este ponto, o imperador, cego pela paixão religiosa, imaginou que a virgem
cristã estava usando de astúcia para dominá-lo. Achou, então, que havia
necessidade de uma argumentação também astuciosa, feita pelos seus sábios
filósofos, para fazê-la mudar de idéia.
Sua
argumentação foi tão coerente e lógica que o imperador não a pôde refutar,
senão pedir-lhe que voltasse no outro dia. Sentindo-se incapaz de responder aos
argumentos de Catarina, Maxêncio pediu socorro aos sábios de Alexandria, os
quais, em número de 50, tentaram refutar a jovem cristã. Foi tal a eloqüência
dela que conseguiu não só calar seus contendores mas fazer com que todos eles
se tornassem cristãos. O imperador,
cheio de ódio, mandou queimá-los nas fogueiras, tornando-os mártires
cristãos. Da mesma forma foram
martirizados a esposa do Imperador do Oriente, Maximino, que reinava em
Alexandria, juntamente com o general Porfírio e 200 soldados, todos convertidos
pela Virgem cristã.
Catarina
foi decapitada, provavelmente por ordem de Maximino, no ano 310 da Era Cristã.
Durante
muitos anos a história de Santa Catarina ficou restrita aos anais dos primeiros
mártires, mas o seu culto teve maior propagação a partir dos milagres que
ocorreram no Monte Sinai, no fim do século XIII ou no começo do século XIV,
comprovando a versão de que seus restos mortais foram para lá levados pelos
anjos.
De
tal sorte Santa Catarina de Alexandria praticou a pureza, que assim se refere a
ela São João Maria Vianey, o Cura d'Ars: "Santa Catarina era pura; por
isso passeava muitas vezes no Paraíso. Quando morreu, os anjos tiraram-lhe o
corpo e levaram-no para o monte Sinai, lá onde Moisés recebera os mandamentos
da Lei. Deus fez ver por esse prodígio que uma alma pura lhe é agradável,
merece que mesmo seu corpo, que lhe participou da pureza, seja sepultado pelos
anjos".
O milagre que fez renascer a devoção à Santa Catarina
Quem conta o caso é Pedro de Ravena na
obra "Gestas Notáveis", publicada na Idade Média.
O bispo de Milão, Dom Sabino, muito
devoto de Santa Catarina, fez uma viagem à Terra Santa em companhia do Abade de
Montecassino, Dom Teodoro. Acompanhavam-nos na viagem dois capelães, dois
soldados e 15 fâmulos. Depois de visitar
os lugares santos, resolverem ir até o Monte Sinai para venerar os restos
mortais de Santa Catarina.
Mas logo tiveram desagradável surpresa:
quando chegaram ao sopé do monte encontraram-se com ferocíssimo chefe de
exército turco que, comandando vários soldados, voltava de uma visita que tinha
feito a um sultão. Quando o capitão
turco viu o grupo de cristãos, de quem era acérrimo inimigo, mandou suas tropas
arremeterem contra eles, assassinando de imediato os criados, os dois soldados
e dois capelães. Percebendo que o bispo e o abade tinham alguma representação
mandou que os trouxesse à sua presença e disse:
- Agora eu mesmo farei com vocês dois o
que já fizeram com os outros membros de seu séquito.
O bispo e o abade vendo-se já perdidos,
mas tentando conseguir ainda algum ato de bondade do capitão turco, pedem-lhe
que os deixe pelo menos subir até o monte e lá venerar as relíquias de Santa
Catarina, para depois então consumar o que queria fazer com eles. Endiabrado, o turco disse-lhes que poderiam
ir lá em cima, mas não da forma que queriam:
- Arrancai agora mesmo os dois olhos as
línguas destes homens! - ordenou aos seus soldados.
Depois
de arrancarem seus olhos e suas línguas, os turcos colocaram os dois
peregrinos, assim mutilados, em cima de seus cavalos para serem conduzidos por
guias, em tom de mofa, até o alto do monte. Em
seguida, assim falou-lhes o capitão turco:
-
Agora, se vos agrada, podereis continuar vossa peregrinação e assim teremos
oportunidade de comprovar se vos serve para algo a vista daquele sepulcro. Vos
dou minha palavra de que se renascerem em vossos corpos os membros que
cortamos, coisa que considero impossível, eu me converterei para vossa religião
sem duvidá-lo um momento.
O
abade não conseguiu chegar ao cimo do monte, morrendo a caminho. O bispo,
rezando e pedindo proteção à sua protetora, Santa Catarina, conseguiu que sua
montaria o levasse até à entrada do sepulcro da santa. Lá deixado, ele rezou contritamente. Quando
deu meia-noite um terremoto sacudiu as profundezas do monte. Cheios de terror,
o capitão turco e seus soldados quiseram sair correndo dali, porém paralisados
pelo medo não puderam mover-se de onde estavam.
Logo
em seguida surgiu grande clarão que iluminou o monte e foi visto a quilômetros
de distância. Enquanto isto, no alto do
Sinai, Santa Catarina saía de sua tumba e se aproximava de seu devoto Dom
Sabino, ungindo-lhe os olhos, a língua e todos os lugares de seu rosto que
haviam sido mutilados. De
imediato, o bispo viu-se completamente
curado de suas mutilações, tendo de volta seus
olhos e sua língua. Assim
falou-lhe a santa:
-
Quero que saibas que meu querido esposo Jesus Cristo está disposto a socorrer
não só agora mas também no futuro a ti e a quantos veneram minha memória. Posto
que, por amor a mim, perdeste a língua, com a qual só falavas teu próprio
idioma, empresto-te a minha, que sabe expressar-se eloqüentemente em grego e
latim. Comunico-te que as almas que vinham contigo já estão gozando no seio de
Abraão da bem-aventurança. Digo-te mais:
amanhã, quando celebrares a missa, ao terminar de ler o Evangelho toma um pouco
de óleo que brota de meu sepulcro e unge com ele uma por uma todas as feridas
que estão no corpo do abade. Depois, continua a celebração do santo sacrifício,
e antes que chegues ao final o abade
ressuscitará completamente são e com todos os membros de que foi despojado.
Ao
amanhecer o dia seguinte, o capitão turco subiu o monte, entrou na igreja que
guarda o corpo da santa, e, ao ver o bispo completamente são celebrando missa,
com todos os membros recuperados, ficou estupefato. Mais ainda quando, acabada a leitura do
Evangelho, testemunhou quando o bispo aproximou-se do cadáver do abade ali
estendido no solo, ungiu-o e o fez ressuscitar inteiramente completo de seus
membros corporais.
Ante
semelhante milagre, o capitão turco e todos os seus soldados pediram para serem
batizados. Este capitão, depois de tudo,
renunciou ao mundo, vendeu todos os seus
bens e mandou construir, por inspiração de Sabino, um mosteiro ao lado da igreja onde até hoje estão
depositados os restos mortais de Santa Catarina, transportado para ali há mais
de mil anos pelos próprios anjos.
São
Sabino viveu ainda mais 10 anos depois do referido milagre, que nele era
permanente. Quando lhe assistiam em seus últimos momentos e amortalhavam seu corpo
já morto, verificaram estupefatos que em sua boca não havia língua alguma, daí
se deduzindo que a língua que se tinha utilizado naqueles últimos dez anos não
era a sua, mas a que Santa Catarina lhe emprestara.
(Relato
extraído da obra “La Leyenda Dorada”, de Santiago de La Voragine, vol. II,
Editora “Alianza Editorial”, Madri, págs. 765/774)
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