Hoje é festa de São Domingos (Caleruega, Burgos, 24-7-1170 - Bolonha, 6-7-1221), confessor, é apostolo da devoção ao Santo Rosário, Fundador da Ordem dos pregadores (dominicanos). Lutou contra os albigenses.
A respeito de São
Domingos temos um trecho da obra “Diálogo da Divina Providência”, em que Deus
trata com Santa Catarina de Sena, que foi terceira dominicana, a respeito de
seu Fundador:
“Foi precisamente
sobre a luz, disse Deus e Santa Catarina de Sena, que o pai dos pregadores
estabeleceu o seu princípio. E fez dele o objeto próprio de sua arma de
combate. Ele tornou para si o ofício do Verbo, meu Filho, disseminando minha
palavra, dissipando as trevas, e esclarecendo a Terra. Maria, pela Qual Eu o
apresentava ao mundo, fez dele o extirpador das heresias (op. cit., 158).
É interessante esse
trecho porque mostra todo o valor que Deus dá à missão de extirpador das
heresias.
Agora, um trecho do
famoso Dom Guéranger em sua obra “L'Année Liturgique”, em seu comentário
relativo à festa de São Domingos (outrora celebrada a 4 de agosto, n.d.c.):
“Assim, a Ordem,
chamada a ser o principal apoio do Pontífice na perseguição das falsas
doutrinas, deveria – em um certo sentido – justificar melhor ainda esta
expressão (“extirpador das heresias”) do que o seu patriarca: os primeiros
tribunais da Santa Igreja, a Inquisição romana, o Santo Ofício, investido da
missão do Verbo com o gládio com duas lâminas (Apoc. 19, 11-16) para converter
ou castigar, não teve instrumento mais fiel e mais seguro do que a Ordem
dominicana”.
Os senhores podem
aquilatar bem como penetrou a "heresia branca" também na hagiografia.
Considerem a vida de qualquer santo escrita na concepção da "heresia
branca", de modo geral figura sempre isto: “Ele foi muito booom... perdoou
muito, curou muitos doentes, agradava muito as criancinhas...” Ou seja, a
santidade quer dizer ser dulçuroso no trato. A bem dizer, nunca os senhores
verão elogiar o seguinte: “Velou pela doutrina, odiou e extirpou a heresia”.
Porque isto parece à “heresia branca” uma cogitação de caráter intelectual e
não moral. Portanto não se trata de manifestação de virtude. Seria até
antipático, porque a pessoa que combateu a heresia, fez sofrer outros. E, pois,
assim se tornou antipática.
Havia um alto
personagem da Igreja aqui no Brasil, que deu ao seu secretário este conselho
(era um tempo um pouco antiquado em que ainda a santidade era apresentada como
norma...): “Padre Fulano, o senhor tome como norma de santidade: qualquer ato
que lhe pareça bom, mas que possa fazer sofrer alguém, não o faça porque não é
bom. Pois o bem nunca faz sofrer a ninguém”.
Esta é a
mentalidade estritamente “heresia branca”! Ela não compreende nem de longe a
necessidade de se defender a doutrina. Menos ainda compreende a necessidade de
corrigir os que erram: “Isso não é virtude, é uma preocupação de caráter
intelectual. É uma elucubração de caráter estudioso. Isso não é virtude...”
dizem os adeptos dessa mentalidade.
Ora, é o contrário
que é verdade. O amor de Deus tem como expressão necessária o amor daquele que
a boa doutrina diz a respeito de Deus. Porque eu não posso amar Deus como Ele
não é. Eu tenho que amar a Deus como é. E sei como Deus é de acordo com a boa
doutrina. E o amor meu a Deus é o amor que a boa doutrina me diz a respeito de
Deus. Portanto é o que a boa doutrina me diz a respeito de Nosso Senhor Jesus
Cristo, Verbo de Deus encarnado, daquilo que Ele ensinou e fez. A ortodoxia não
é senão o amor de Deus.
De maneira que uma
pessoa pretender ter virtude sem ter ortodoxia, é uma verdadeiro absurdo; é a
mesma coisa que pretender ter virtude sem ter amor de Deus. E ser ortodoxo sem
odiar o mal é outro absurdo.
Portanto, virtude
primeira: ortodoxia. Porque é um dos aspectos do amor de Deus. E quem diz
ortodoxia, diz combatividade. Quanto mais combativa, mais ortodoxa, tanto mais
ama a Deus.
Continuamos agora
com a leitura de outro trecho de Dom Guéranger a respeito da Ordem de São
Domingos e o liberalismo:
“Tanto quanto Santa
Catarina de Sena, o ilustre autor da Divina Comédia (Dante) não teria nunca
imaginado que devesse haver um tempo onde o primeiro atributo da família
dominicana, que lhe dava direito ao reconhecido amor dos povos, seria discutido
em certa escola apologética, e lá afastada como um insulto, ou dissimulada com
mal estar. Nosso tempo põe sua glória em um liberalismo que mostrou o que era
multiplicando as ruínas e filosoficamente não repousa senão sobre a estranha
confusão entre licenciosidade e liberdade. Seria necessário um tal desabamento
intelectual para que não se compreendesse mais que uma sociedade onde a fé é a
base das instituições como ela é o princípio da salvação eterna, nem um crime é
igual àquele de abalar o fundamento sobre o qual repousa assim o interesse
social, o mais precioso dos particulares. Nem o ideal da justiça nem o da
liberdade não consistem em deixar à mercê do mal e do maligno os fracos que não
podem defender-se a si mesmos.
“A cavalaria fez
desta verdade seu axioma e foi esta a sua glória. Os irmãos de Pedro Mártir (os
dominicanos) dedicaram sua vida a proteger contra as insídias do ‘forte armado’
(Lc. 11, 21) o contágio que ‘se esgueira pela noite’ (Sal. 90, 6), a segurança
dos filhos de Deus. Esta foi a honra da ‘tropa santa que Domingos conduz por um
caminho que é todo cheio de proveitos e no qual não se extravia’ (Dante,
Paraíso, X, 94-96)”.
É uma bonita
afirmação da legitimidade da Inquisição, da legitimidade das guerras santas, da
legitimidade da polemica, que o irenismo hoje tanto quer negar.
Eu gostaria de
acentuar este pensamento: sempre que se dá ao erro a possibilidade de se
disseminar, ali se dá ao mesmo tempo apoio a uma perseguição à verdade. E
sempre que se dá ao mau ou ao mal a liberdade, apoia-se uma perseguição ao bom
e ao bem. Porque está na índole do erro de ser contagioso. Depois do pecado
original, o homem tem uma apetência de erro. Donoso Cortés (filosofo espanhol,
1809-1853), numa página magnífica que já foi estudada aqui em reunião, dizia
que o milagre da Igreja não consistiu em ser aceita pelos homens por ser boa,
santa, mas apesar de ser boa e santa. Os homens têm uma enorme atração pelo
erro e pelo mal. Se se deixa o erro e o mal livres, permite-se que eles
sublevem os homens. Portanto não há pior tirania e não há pior crueldade do que
advogar a liberdade para o erro e para o mal.
Dom Guéranger
comenta muito bem: o que fazia o cavaleiro andante? Andava de um lado para o
outro para defender as viúvas, os órfãos e os fracos. Pergunta-se: as almas
ignorantes não são mais desamparadas do que as viúvas, os órfãos e os fracos?
As almas que têm maus pendores em conseqüência do pecado original não estão
mais expostos ao erro do que as viúvas, os órfãos e os fracos do tempo da
cavalaria andante? E o que é mais importante: defender almas ou defender
corpos? Evidentemente defender almas.
De maneira que toda
a nobreza da cavalaria andante incide e se concentra nos que, em nossos dias,
combatem o erro e o mal denodadamente.
Há uma melancólica
observação histórica, que não posso deixar de fazer: os senhores considerem o
que foi a Ordem dominicana. Reflitam um pouco no que ela é no Brasil de hoje, e
os senhores compreenderão a enorme decadência das melhores instituições de
nosso século.
Assim os srs.
compreenderão igualmente que o pior mal de nosso século não consiste em que os
comunistas sejam o que são e que tenham o poder que têm. Mas que aqueles que
deveriam combater o comunismo sejam o que são e adotem as posições erradas que
adotam hoje. Essa é a questão.
Na festa de São
Domingos, é inteiramente a propósito darmos à nossa oração da noite de hoje o
caráter de uma reparação àquele santo Fundador por toda a ofensa que essa
torção de seu admirável instituto sofre – em tantas partes, pelo menos –, e
pedirmos que ele nos defenda de seus filhos que tenham se transviado.
(Plínio Corrêa de Oliveira - Santo do Dia, 4 de agosto de 1965)
Nenhum comentário:
Postar um comentário