quarta-feira, 31 de outubro de 2012

A cultura americana e os furacões






Há um detalhe curioso nas notícias sobre o furacão “Sandy”: é que a mídia se mostrou mais precisa e profusa nas informações sobre o fenômeno apenas quando o mesmo começou a atingir os EEUU. Alguns dias antes a procela andava provocando destruições e mortes em outros países vizinhos, como os da América Central, mas pouco se divulgava sobre o fato. Qual a razão disso?

Poder-se-ia argumentar que a razão principal é que nos Estados Unidos o Sandy atingiu uma região bem maior e mais habitada, enquanto que na América Central foi numa região bem menor. É verdade, este parece ser um argumento muito forte em defesa daqueles que se preocupam mais com a grande nação do norte do que com seus vizinhos. Outros dirão, e com razão, que deve ser dada mais atenção àquele país porque é mais rico e onde promanam mais recursos para o resto do mundo. Seria esta razão de tanta gente calculando os prejuízos materiais do furacão, como, aliás, sempre fazem em qualquer evento da natureza.

No entanto, vamos analisar a questão sobre outro enfoque. Os EEUU é a nação mais rica da terra e estadeia numa vida nababesca e egoística, deixando de se preocupar com as misérias alheias, até mesmo com as de seus vizinhos. Um exemplo foi o terremoto ocorrido no Haiti, onde morreram milhares de pessoas e centenas de milhares ficaram sem casas, sem famílias e sem ter como viver. Muitas organizações humanitárias idealizaram uma atitude lógica e cristã: levar estas populações miseráveis para os EEUU, onde teriam mais oportunidades de uma vida melhor e, também, fugiriam de futuras catástrofes que são comuns no Haiti. O que fez o governo americano? Proibiu rigorosamente que se transportassem aquelas populações para lá, e os que foram levados a imigração americana simplesmente os deportou de volta. Aqueles miseráveis tinham que procurar sobreviver em seu próprio país e ficar na ansiosa espera de que outros terremotos os dizimem por completo.

Vejam agora no exemplo do furacão Sandy. O povo americano é tão rico e tão bem estruturado que os males da catástrofe foram amenizados com todo o aparato que eles possuem para se proteger. Esta mesma proteção eles não tiveram o cuidado de oferecer às nações pobres que sofreram os mesmos efeitos do Sandy, e que ficam bem ali na sua vizinhança. Antes de chegar aos Estados Unidos o Sandy já havia matado mais de 100 pessoas em seu périplo pela América Central, mas no território americano, numa área bem maior e mais populosa até o momento morreram pouco mais de 40 pessoas. É claro que os prejuízos materiais são bem maiores, nem se compare! Mas, tão ricos que são, vão recuperá-los com muita rapidez. No entanto, os prejuízos havidos entre os países de menos recursos, apesar de bem menores, serão bem mais difíceis de serem sanados.

Lá predomina uma concepção de vida, prazerosa e egoísta, chamada de “american way of life”, e que não é vivida somente pelos americanos, mas por todos os povos que procuram gozar a vida com os prazeres modernos e desprezar tudo o que está em sua volta. É a vida moderna que leva os povos a agir assim, mesmo inconscientemente. Mas, nos Estados Unidos da America, esta concepção de vida é mais brutal e mesquinha do que qualquer outro povo. Explico-me: lá é pior porque, sendo mais rica, a nação americana tem mais obrigação de ajudar as demais. Um povo de maioria protestante, que sempre pensou somente em si, desprezando outros povos e outras crenças (como soe acontecer com outros como o inglês, o holandês, etc.) teve sempre em sua cultura a idéia de isolamento e de desprezo pelos demais. Por que preocupar-se com o Haiti, com Cuba, com a Jamaica, mesmo estando em seu quintal? A preocupação primordial deles é sempre consigo mesmo. É o neo-paganismo que campeia, para não falar em ateísmo aberto e declarado.  Tenho certeza de que se fossem os espanhóis (portanto, católicos) que tivessem colonizado toda a nação americana, outra seria a concepção deles em matéria de convivência com os povos mais necessitados.

domingo, 28 de outubro de 2012

Qual o valor social de um esquerdista?

A "Folha de São Paulo" de ontem, 26 de outubro, divulga que os advogados dos criminosos do chamado "Mensalão" vão pedir diminuição das penas com base num argumento sui generis: pedem que considerem o "valor social" de José Dirceu, o chefe da gang. A idéia realmente é inusitada e eufemística, pois admite o pressuposto de que todos aqueles que lutaram contra o regime militar são santos, devem ser canonizados. Tiveram um ideal? Sim, dizem: lutar pela democracia. Ideal tão vago como o daqueles que dizem que lutam contra a pobreza ou pela paz. O mesmo argumento é utilizado pelas FARCs na Colômbia: matam, sequestram e saqueiam em luta pela democracia. Que democracia é essa? É a democracia da esquerda, onde só prevalece seus primados e seus corifeus, e onde todos os demais não têm nem voz e nem vez. Será que o STF vai engolir isto? Então o fato de que alguém no passado tenha lutado por algum bem social (pressupondo que tais marginais tenham realmente lutado por algo de bom) pode ser atenuante pelos crimes atuais? Daqui a pouco Fernandinho Beira-Mar vai usar o mesmo argumento para diminuir sua pena: afinal de contas ele ajudou as FARCs na Colômbia, e lá o pessoal também luta pela democracia.
Que tipo de democracia José Dirceu e seus corifeus trouxeram para nós? Todos sabem que o banditismo aumentou consideravelmente no Brasil justamente insuflado pelas esquerdas, foram eles os pioneiros de assaltos a bancos e demais arrastões de criminalidades no país. Com relação ao fato de ter caído o regime militar e vingado o regime civil e de eleições diretas, nada disso foi fruto da ação de Lula, José Dirceu e seus apaniguados. Tudo foi fruto de um consenso social, onde entrou o bom senso dos militares que então estavam no poder e uma parcela razoável dos políticos da época. Dizer que isto foi fruto da ação da esquerda é um esbulho político, um roubo de direitos autorais contra  a parte sã de nossa sociedade.
A respeito do legado que as esquerdas deixaram, vejam , por exemplo nossa postagem a seguir:
Os filhos não abortados da montanha vermelha.

domingo, 7 de outubro de 2012

PERSONALIDADE E TRAÇOS FÍSICOS DE JESUS CRISTO








Imbuídos de falsas concepções do mundo pagão, nunca os judeus poderiam entender que o Messias seria um Homem dotado de grande mansidão e bondade. Talvez o único historiador judeu a tratar de Jesus Cristo teria sido Flávio Josefo (séc. I), mas quase nada fala da personalidade e traços físicos do Messias. 

Aspectos admirativos de Jesus

A Beata Anna Catharina Emmerich nos traz um relato sobre o  que ela viu no porte físico e personalidade de Nosso Senhor Jesus Cristo:
“Vi de súbito diante de mim o Senhor, como viveu na terra. Era uma figura alta, esbelta e viril, tinha o rosto comprido, de uma alvura puríssima, a fronte alta, de um branco sem mescla e o nariz bem formado e oblongo. O cabelo, repartido no alto da cabeça, caía-lhe de ambos os lados do rosto, até os ombros; vestia uma longa túnica, de cor cinzenta, semelhante a uma camisa, terminando em simples pregas e cingida debaixo do peito. As mangas eram bem largas, as mãos cruzadas sobre o peito. O Senhor tinha algo de imóvel, reto, comovedor, sério e amável. Era infinitamente nobre, simples e bom.
“Jesus era mais alto do que os apóstolos; onde iam ou estavam, sempre parecia sobressair-lhe a fronte branca e séria. Tinha o andar sempre ereto e direito; não era magro nem corpulento, mas de aparência absolutamente sadia e nobre, com peito e ombros largos. Tinha músculos bem exercitados pelas viagens e exercícios, mas não mostravam sinais de trabalho pesado. As palavras, o som da voz do Mestre eram como raios vivos, penetrantes. Falava sem defeito de pronúncia, calmo e forte, nunca muito depressa, a não ser algumas vezes aos fariseus, mas então as palavras eram como flechas agudas e o som da voz mais severo. A voz era barítono agradável, puríssima, sem igual. Ouvia-se-lhe a voz entre todas as outras vozes, numa multidão, sem que Ele gritasse.
“Era um aspecto comovedor o de Jesus pelas ruas de Cafarnaum, ora com as vestes compridas, ora arregaçadas, sem muito movimento, mas também sem rapidez, tão calmo, quase sem tocar a terra, mais simples e mais poderoso do que os outros homens.  Nada de excêntrico, nada de vacilante ou de afetação; tudo n’Ele era natural no ardor, no olhar e no falar.
“Os amigos de Lázaro, Nicodemos, o filho de Simeão, João Marcos, tinham falado com Jesus e todos ficaram cheios de admiração pela atitude, pela sabedoria, pelas qualidades humanas e até corporais do Mestre e sempre que Este estava ausente, diziam uns aos outros: “Que homem extraordinário! Tal não houve e nem haverá; tão sério, tão amável, tão sábio e perspicaz e ao mesmo tempo tão simples. Não compreendo tudo que diz, mas vejo-me obrigado a crer, de tal modo fala. A gente não o pode olhar de frente; Ele parece ler todos os pensamentos e sentimentos do coração. Que figura, que porte sublime! Que rapidez, sem se lhe notar precipitação!  Quem pode andar com Ele? Caminha com tanta velocidade; chega, sem mostrar cansaço e, após uma hora, já está novamente a caminho. Que homem excelente se tornou!”  Mas ninguém imaginava que era do Filho de Deus que falavam. Achavam-no o maior de todos, veneravam-no com certo temor, mas sempre o tomavam por homem, apesar de maravilhoso” [1]


  

 A Sagrada Face de Jesus, reflexo de personalidade fascinante
  
Transcrevemos alguns comentários de Dr. Plínio Corrêa de Oliveira sobre aspectos do semblante de Nosso Senhor Jesus Cristo, especialmente Sua Sagrada Face:
“Claro está, Nosso Senhor Jesus Cristo, em sua humanidade santíssima, é o único acima de sua Mãe. Aliás, algumas revelações de Sóror Maria de Ágreda a respeito de ambos, nos dão a conhecer aspectos tocantes. Segundo a vidente, o Divino Redentor era sumamente parecido com Nossa Senhora, cujo rosto seria a transposição para um semblante feminino do semblante masculino de Jesus. Então, a perfeição de todas as perfeições tinha de ser, forçosamente, a Sagrada Face de nosso Salvador.
“Por quê? Pelo olhar e fisionomia, Ele espelhava todas as formas e graus de excelência de alma possíveis no homem, além de sua natureza divina inefável. Por outro lado, sendo perfeito, o que Nosso Senhor deveria ter de mais sublime era a face, pois esta é a condensação de todas as riquezas do corpo.
“Certo estou de que se alguém conseguisse conhecer essa Face em seu estado normal (não, portanto, desfigurada pelas torturas da Paixão), na sua integridade, compreenderia que as proporções de seus traços tinha de conter as regras de harmonias do universo, cuja beleza nos seria dado decifrar, em se estudando o mesmo sagrado semblante.
“Assim como entenderíamos outra coisa, tão raramente encontrada unida à beleza: a graça, o charme, o encanto. Frequentemente se acham modalidades de encanto, mas separadas da verdadeira beleza.  Ora, em Nosso Senhor essas qualidades se uniam na sua plenitude. E como Ele era atraente! Era a majestade mais empolgante e arrebatadora aliada à graciosidade mais meiga, afável, acessível, capaz de se fazer pequena e nos acariciar; era o charme incomparável por trás da beleza  perfeita, somado à expressão de uma inteligência infinita e uma santidade transcendente.  Tudo isso nos faria ter a ideia da esplendorosa fisionomia d’Ele.
“No fundo, o que São Tomás entendeu e escreveu, o que o Beato Angélico discerniu e pintou, é o que no Reino de Maria se verá. Contemplar-se-á através de todas essas harmonias, algo que nos faça pensar no semblante imaculado, sacratíssimo, régio, maternal e meiguíssimo de Nossa Senhora. E naquilo para o qual não há palavras, cessam os adjetivos, tudo é silêncio e adoração reverente: a Face de Nosso Senhor Jesus Cristo.
“Compreendendo essas harmonias nos preparamos para entender a Sagrada Face e para a visão beatífica, por toda a eternidade”. [2]

O fascínio na conquista das almas

Como Nosso Senhor mostrou-Se inicialmente a seus Apóstolos, a ponto de atraí-los para Si? Imaginemos como isto deveria ter ocorrido, acompanhando o pensamento de Thomas Walsh:
“Como pareceu o Senhor aos olhos desse pescador, uns poucos anos mais velho do que Ele, que O contemplava com algo de desconfiança, esperança, temor, curiosidade e uma rígida certeza de que uma força decisiva, acima de seu poder de compreensão, penetrava em sua vida? Para o judeu médio de Seu tempo pareceria Ele provavelmente com qualquer outro jovem rabino, usando uma túnica inconsútil de lã, um tanto mais comprida do que a usada pelos outros, uma barba curta e sérios olhos sondadores.  Talvez nada houvesse na Sua aparência que sugerisse ao observador comum (a menos que esse observador recebesse uma secreta e profunda certeza espiritual do fato) que aqui, diante dele, havia infinita imensidade inclusa em carne humana vulnerável, onipotência ligada com simples faixa sob um turbante enrolado, o Verbo Eterno que saltou do céu à terra, nas proféticas palavras do Livro da Sabedoria, “enquanto todas as coisas estavam em tranquilo  silêncio e a noite no meio do seu curso”, para submeter-se às algemas do tempo e de lugar. Isto era obviamente oculto para muitos, do contrário toda Israel tê-Lo-ia imediatamente reconhecido e aceito, quando menos apenas por motivos de interesse próprio. Até mesmo os homens corruptos teriam adquirido grátis o dom que devia ser pago com humildade, sinceridade e amor. Evidentemente isto não ocorria.
“Nenhuma palavra descrevendo Nosso Senhor foi deixada por qualquer dos quatro evangelistas. Este silêncio em si mesmo é uma espécie de descrição, sugerindo inefável e majestática presença, que tinha ás vezes um predominante efeito tanto sobre amigos como sobre inimigos. Contudo, em outros momentos, parecia tão comum na sua humanidade que os homens não hesitavam em deitar sobre Ele mãos violentas...” 
“..Tudo quanto Simão sabia, ao olhar aquele rosto, pela primeira vez, era que reverenciava e amava aquele Homem, como nunca reverenciara e amara ninguém mais. E antes que pudesse dizer qualquer coisa, Jesus olhou-o fixamente dentro dos olhos e disse:
- Tu és Simão, o filho de Jonas. Serás chamado “Kepha”. “Kepha” significa “Rocha”; em latim, “Petrus”; em português, “Pedro”.
“Foi somente anos mais tarde que pôde Simão Pedro escrever a respeito do “inefável e abençoado deleite”  (I Ped 1, 9) de contemplar o Cristo. É duvidoso que então tivesse ele plenamente compreendido a significação do momento, ou as duas Naturezas do Homem que lhe estava falando.  Mas sentia n’Ele alguma qualidade que antes nunca encontrara em qualquer ser humano.  Era algo ao mesmo tempo aterrorizador e tranquilizador, de devastador e de exaltante, uma censura ardente e um infinito deleite e consolação. Torna a pessoa pronta e esquecer tudo – trabalho, prazer, ambição, a própria vida – e a acompanhar aquele Homem aonde quer que Ele pudesse levá-la”  [3]
Thomas Walsh não o vislumbrou, mas na realidade Nosso Senhor fascinou São Pedro para em seguida tocar seu coração com a graça da conversão.

Que dizer de Seu sacrossanto olhar?

Não temos uma descrição do sacrossanto olhar de Nosso Senhor Jesus Cristo. Mas podemos imaginá-lo analisando o que referido olhar produziu, principalmente na conversão de pecadores. Um exemplo foi a conversão de Santa Madalena. Uma vidente italiana do século XVIII, a Bem-Aventurada Serva de Deus Maria Cecília Baij, assim descreve como Nosso Senhor lhe contou a conversão da Santa, operada de uma forma fulminante pelo olhar divino de Jesus Cristo:
“Chegando, portanto, o dia festivo, concorreu a Jerusalém uma multidão de pessoas, muitas das quais vieram para ouvir-me pregar e para ver-me, outras ainda para serem liberadas de várias enfermidades. Veio também Marta, irmã de Lázaro, e tanto se empenhou que conseguiu trazer também a irmã, Madalena. Tinham eles uma boa casa em Jerusalém para suas vindas nos dias festivos.
“Madalena debatia-se intensamente no íntimo. O demônio com suas sugestões violentas dissuadia-a de vir, temendo o que depois ocorreu. Isto é, que, ouvindo minha prédica, se convertesse, como se converteram também outros pecadores. O demônio segurava-a muito fortemente. Era, no entanto, atraída pelos convites da graça, que poderosamente a impeliam a vir ao Templo. Eu esperava com grande desejo a pecadora para convertê-la e fazê-la inteiramente minha. Em vista disto, pedia ao Pai dar-lhe a graça de superar as sugestões do inimigo infernal, que fortemente a dissuadia, bem como de vencer as persuasões dos amantes que a aconselhavam a não vir, porque ali, diziam eles, havia um certo homem que pregava e atraía todos para seu partido e encantava a quem o ouvia. Por isso, também ela se deixaria enganar e abandonaria seus amores.
“Por fim, venceu a graça divina, que a convidava com veemência. Madalena dominou todas as persuasões e sugestões, e veio; porém não para ouvir minha palavra, nem para ver-me, mas só com a intenção de ser galanteada e conquistar mais amantes.
“Veio a Jerusalém com a irmã. Perdeu a manhã da festa em adornar-se, levantando-se cedo para enfeitar-se mais comodamente. Foi exortada pela irmã a desistir de tanta vaidade.  Mas ela, surda à suas palavras, enfeitou-se mais ainda. A irmã contava-lhe muitas coisas acerca de minha pessoa. Ela, porém, nem sequer quis escutá-la, mostrando-se desgostosa até mesmo de ouvir mencionar-me.
“Eu via tudo. Naquela noite orei sempre ao Pai pela conversão de Madalena, a qual ia desmerecendo cada vez mais a graça da conversão. Mas o Pai prometeu-me para ela a plenitude da graça, conforme me tinha prometido em outras ocasiões.  Eu o louvei e agradeci-lhe por tanta bondade e misericórdia.
“Ao raiar do dia, fui ao Templo com os Apóstolos e discípulos. Demorei-me a orar ao Pai, a fim de que as funções dos Fariseus acabassem.  Nesta oração pedi ao Pai tivesse misericórdia de todo o povo, iluminando-o e fazendo-lhe conhecida a verdade que eu lhe pregasse. Via então que Madalena se mostrava arredia a vir ao Templo. Por isso pedi de novo por ela, a fim de que viesse, vencida pelas exortações da irmã e atraída muito mais ainda pelos convites da graça. Sua vinda causou a todos os presentes grande admiração, atraindo a si os olhares de todos, seja por sua beleza, seja também por sua vaidade.
“Terminadas as funções e tendo pedido ajuda a meu divino Pai, ergui-me para começar a prédica. De pé, fixei os olhos em Madalena.  Ao olhá-la , chamei-a com voz interior a minha sequela. Simultaneamente, Madalena também fixou seus olhares  em minha pessoa. De fato, seu coração ficou ferido pela potente a amorosa seta. De repente, sentindo o convite, deu-se por vencida, tanto que, antes que eu começasse a falar, ficou presa de meu amor. Fez, porém, grande esforço para resistir e ficar a ouvir  minha prédica.
“Comecei a pregar as grandezas do divino Pai. Madalena desfazia-se em lágrimas ao ouvir a doçura e a sublimidade de minhas palavras, ao ver a amabilidade de meu semblante, meus admiráveis atrativos.  Foi necessária uma graça especial para ela não morrer de puro amor e juntamente de dor por suas culpas.  Seu coração estava preso de um vivo incêndio de amor e traspassado de dor aguda. Olhei-a amiúde, para que mais e mais vezes ficasse ferida e inflamada. Seu coração destilava lágrimas de dor e se consumia nas chamas de um amor ardente.
“Dizia-lhe ao coração; “Madalena, Madalena! Bastante tempo viveste longe de mim. Doravante serás inteiramente minha. Sacrificareis todos os teus afetos a mim.  Prova e vê quão suave e quão doce e potente é o meu amor!”  Continuava a falar-lhe ao coração. Ela respondia-me com todo afeto e não cessava de pedir perdão pelos erros cometidos. Ouvia minhas palavras – que lhe pareciam outros tantos dardos – e cada uma delas feria-lhe o coração.
“Prossegui um pouco minha prédica. Todos os presentes estavam admirados ao ouvirem minhas palavras e minha divina sabedoria. Muitos olhavam Madalena. Ao vê-la tão compungida, ficavam eles também compungidos. Alegrei-me muito ao ver aqueles corações e muito mais me alegrei  à vista do coração contrito e amoroso de Madalena. Alegrava-me qual caçador com sua presa.
“Encontravam-se ali numerosos Escribas e Fariseus, os quais começavam também a sentir comover-se-lhes o coração de compunção. Para não se renderem, fechavam os ouvidos a fim de não me ouvirem; tal era sua obstinação maligna, que os pérfidos amarguravam a consolação por mim sentida pela conversão de Madalena.
“Depois de ter falado algum tempo das perfeições divinas, da obrigação de amar o divino Pai e de observar a Lei divina, narrei a parábola do filho pródigo, seja para inspirar ânimo e confiança a Madalena contrita, como também para animar a todos os outros pecadores presentes.
“Madalena, presa de forte resolução, decidiu vir aos meus pés.  Não fez este ato no Templo, porque não ousou aproximar-se de mim, coberta de enfeites e objetos de vaidade.  Mas quis vir despojada de todas as pompas, inteiramente pobre, com veste humilde, como via minha pessoa, totalmente pobre e humilde.
“Terminada minha prédica, Madalena partiu depressa, como louca, vencida pela paixão do amor e traspassada de dor. Chegando a sua casa, despojou-se de todas as pompas, as quais calcou generosamente. E muito mais, despojou-se do amor próprio de qualquer respeito humano, odiando tudo  o que tinha mantido longe de Deus. Soltou também o cabelo, e inteiramente contrita, chorou amargamente. Não podendo no entanto mais reter a chama que lhe ardia no peito, resolveu repentinamente vir aos meus pés para desafogar o amor e a dor.”[4]

Ao que muito se perdoa é porque muito amou

O episódio seguinte é muito conhecido,  narrado por todos os 4 Evangelistas  (Lc 7, 36-50; Mt 26, 6-13; Mc 14, 3-9 e Jo 12, 1-8): Santa Madalena, após despir-se de todo mundanismo, foi ajoelhar-se aos pés do Salvador para despejar-Lhe um vaso de alabastro cheio de bálsamo e enxugar-Lhe os mesmos pés com seus cabelos.  Pelo relato de São João, São Lázaro participava do banquete de Betânia e já havia sido ressuscitado.
Foi desta forma que o próprio Nosso Senhor narrou à Abadessa Maria Cecília Baij o banquete de Betânia, na casa do ex-leproso Simão:
“Terminada, então, minha oração e tendo dado graças ao Pai, saí do Templo com os Apóstolos e fui à casa de Simão, o leproso, para ali restaurar-me com os apóstolos, porque estávamos muito necessitados.
“Depois de entrar na dita casa e das costumeiras bênçãos, quando estavam todos à mesa, veio a contrita e amante Madalena. Saíra de casa para vir até mim e prostrar-se aos meus pés. Tendo ouvido dizer que eu, com os apóstolos, tinha ido ao banquete na casa de Simão, foi velozmente para lá, superando todo respeito humano.
“Causou admiração aos que a viram. Em verdade, ocasionou admiração e estupor ver uma pecadora pública, pessoa nobre, rica e bela, despojada de toda vaidade, coberta de veste vil, os cabelos soltos, correr velozmente àquela casa. Mas não conheciam o amor que ardia no coração de Madalena, nem a dor que a traspassava. Por isso todos ficaram estupefatos e admirados.
“Veio a penitente e entrou generosamente no lugar do banquete. Não olhou a ninguém. Mas tendo chegado aos meus pés, prostrada em terra, beijou-os amorosamente.  Lavava-os com suas lágrimas e enxugava-os com os cabelos, por meio dos quais havia captado vaidosamente tantas almas. Trouxera também um vaso de precioso e fragrante unguento para ungir-me os pés. Mediante tal perfume pensava ela mitigar o mau cheiro que me causaria sua iniquidade.
“A dolente Madalena estava, portanto, detrás de meus pés desfazendo-se em lágrimas de dor e satisfazendo seu grande amor. Depois de beijar e ungir por algum tempo meus pés, ergueu-se e derramou todo o precioso e fragrante perfume em minha cabeça, voltando depois aos meus pés. A penitente Madalena não proferia palavra alguma, porque a dor não lhe permitia. Falava-me, no entanto, com o coração. Oh! Quantos afetos de amor exprimia esse coração amante e quantos atos de dor fazia no coração contrito e dolente! Eu falava-lhe ao coração com amor, convidando-a a seguir-me e assegurava-lhe meu amor.
“Desde o primeiro instante em que me viu, e eu a mirei, Madalena teve um claro conhecimento acerca de minha pessoa e acreditou ser eu o verdadeiro Messias.  O divino Pai concedera-lhe esta graça por causa das numerosas súplicas que eu lhe dirigira por ela. Minhas orações foram bem empregadas, pois ela correspondeu inteiramente à graça e aproveitou as luzes divinas”..
Após comentar sobre a raiva que o gesto de Santa Madalena causou em Judas e a ironia crítica dos fariseus, Nosso Senhor conclui:
“Tendo então Madalena se expandido, e dado algum reconforto a seu ardente amor e a sua grande dor, disse-lhe: “Tua fé te salvou; vai em paz” (Lc 7, 48). Despedi Madalena e mandei-a embora, absolvida de todas as suas culpas, porque grande foi sua dor e seu amor.”  [5]

O Sacrossanto olhar de Jesus

O Dr. Plínio Corrêa de Oliveira, ao longo de sua vida pública, teceu alguns  comentários sobre o olhar de Nosso Senhor. Em sua famosa Via Sacra, por exemplo:  “Vós, Senhor,  o fitaste (Pilatos) por longo tempo com aquele olhar que em um segundo operou a salvação de Pedro. Era um olhar em que transparecia vossa suprema perfeição moral, vossa infinita inocência, e, entretanto, ele Vos condenou”.[6]
A Beata Anna Catharina Emmerich narra em detalhes o tocante episódio em que os olhares de Nosso Senhor e São Pedro se encontraram naquele momento. Segundo ela, após haver negado Nosso Senhor pela primeira vez, São Pedro encontrou-se por acaso com Seu Mestre, o qual lançou-lhe terrível olhar de repreensão:
“O Senhor lançou a Pedro um olhar sério de repreensão. Pedro ficou como que esmagado pela dor. Mas, lutando com o medo e ouvindo alguns dos circunstantes dizerem: ‘Quem é esse sujeito?’, saiu novamente para o pátio, tão abatido e tão confuso pelo medo, que andava cambaleando a passos lentos. Vendo-se, porém, observado, entrou de novo no átrio, aproximou-se da fogueira, ficando ali bastante tempo sentado, até que diversas pessoas, que fora lhe tinham notado a confusão, entraram, começando de novo a provocá-lo, falando mal de Jesus e de suas obras. Um deles, chamado Cássio e mais tarde Longino, disse então: ‘É verdade, também és daquela gente; és Galileu, tua linguagem prova-o’. Como Pedro quisesse sair com um pretexto, impediu-o um irmão de Malcho, dizendo: ‘O que? Não te vi com eles no horto das oliveiras? Não feriste a orelha de meu irmão?’  Tornou-se Pedro então como insensato, pelo pavor que o dominou e livrando-se deles, começou a praguejar (tinha um gênio violento) e jurar que absolutamente não conhecia esse homem e correu do átrio para o pátio interior. Foi à hora em que o galo cantou de novo; os soldados conduziram Jesus, nesse mesmo momento, da sala circular, pelo pátio para o cárcere que ficava sob a sala. Virou-se, porém, o Senhor e olhou para Pedro com grande dor e tristeza; lembrou-se Pedro então da palavra de Jesus: ‘Antes do galo cantar duas vezes, negar-me-ás três vezes’, e essa lembrança pesou-lhe com terrível violência sobre o coração. Fatigado pela angústia e o medo, tinha-se esquecido da promessa presunçosa de querer antes morrer do que O negar e do aviso profético de Jesus;  mas à vista do Mestre, esmagou-o a lembrança do crime que acabara de cometer. Tinha pecado, pecado contra o Salvador, tão cruelmente tratado, condenado, inocente, sofrendo tão resignado toda a horrível tortura. Como desvairado de contrição, saiu apressadamente pelo pátio exterior, a cabeça velada e chorando amargamente; não temia mais ser interrogado; teria então dito a todos quem era e que pecado lhe pesava na consciência”.[7]

O olhar misericordioso da Santíssima Virgem Maria

 O olhar do Filho deve ser o reflexo do olhar da Mãe, mas quando o Filho é o próprio Deus é a Mãe que reflete o olhar do filho, pois ambos os olhares são reflexos das perfeições divinas. Ao sair do olhar de Jesus, São Pedro depara-se, porém, com outro olhar, o da Santíssima Virgem, que é assim relatado por Anna Catarina Emmerich:
“...De súbito, se abriu a porta e na frente de algumas pessoas saiu Pedro, correndo para eles, cobrindo com as mãos o rosto velado e chorando amargamente. À luz da lua e das lanternas, conheceu logo a João e a Santíssima Virgem; parecia-lhe que a voz da consciência lhe vinha ao encontro, na pessoa da Mãe de Jesus, depois que o seu Divino Filho a tinha despertado.  Ah! Como ressoava a voz de Maria na alma de Pedro, quando ela disse: “Oh! Simão! Que fizeram de Jesus, meu Filho?”  Ele não podia enfrentar o olhar de Maria, desviou os olhos para o lado, torcendo as mãos e não pôde proferir palavras.  Mas Maria não o deixou, aproximou-se-lhe e perguntou com voz triste: ‘Simão, filho de Jonas, não me respondes?’   Então exclamou Pedro na sua dor: ‘Oh, Mãe, não faleis comigo; vosso Filho sofre coisas indizíveis; não me faleis a mim, pois condenaram-nO à morte e eu O neguei vergonhosamente por três vezes’.  E como João se aproximasse para falar-lhe, fugiu Pedro, desvairado de tristeza e saindo do pátio e da cidade, retirou-se àquela gruta do monte das oliveiras, na qual as mãos de Jesus se tinham imprimido na pedra...”[8]


O olhar de Jesus fulgura como um sol

Nas páginas da revista “Dr. Plínio” vamos colher mais um precioso comentário sobre o olhar de Jesus:
“Em Jesus, o semblante, as expressões da face e até o timbre da voz não são senão comentários ao que mais O exprime, isto é, seu olhar. Este é sumamente ordenado e feito de gradualidades. Quando fulgura, é como um sol. Quando não, mostra-se sempre de um certo modo, semelhante ao que representa o barítono para a música vocal: nem muito alto nem muito baixo.
“Não é um olhar que sai de si para penetrar nos outros, a não ser raramente. Antes, convida  que se entre nele, para entabular elevados colóquios conosco.
“Olhar muito sereno, aveludado quase...  No fundo, porém, revelando uma sabedoria, retidão, firmeza e força que nos enchem ao mesmo tempo de encanto e de confiança.
“A meu ver, todas as perfeições existentes na ordem do Universo – a das estrelas como as de uma Gruta de Capri, ou as de qualquer outra maravilha – estão contidas no olhar de Nosso Senhor Jesus Cristo, e os estados de alma d’Ele correspondem a todas as belezas do mundo. Por isso, ao apreciarmos algum esplendor da criação, seria bastante proveitoso meditarmos na excelência do olhar d’Ele que se acha espelhada naquela grandeza criada.
“Por exemplo, quando estou sozinho e contemplo o céu todo estrelado acima de mim, experimento a curiosa impressão de que sou visto, e de que aquele firmamento todo converge sobre mim. Esta é a sensação que se tem quando Nosso Senhor nos olha. É todo um céu que se debruça sobre nós. Mas quando somos nós que nos pomos a fitá-Lo e colhemos o fundo de seu olhar, nos sentimos melhor do que ao sermos olhados por Ele.
“Pois ali, no conjunto dos olhares d’Ele, a ordem do Universo se reflete inteiramente, as regras da estética se resumem de modo perfeito, os princípios da lógica se articulam de maneira admirável.  Numa palavra, o “pulchrum” e o significado interno de tudo quanto existe estão contidos no olhar de Nosso Senhor.
“De sorte que, por exemplo, ao conversar com Lázaro, com Marta ou com Maria Madalena, a fisionomia, a voz e o olhar de Jesus – sem indiscrição alguma – iam muito naturalmente mudando, e em sua expressão se podia compreender um número incontável de coisas.

Olhar que acompanha a História

“Por isso mesmo, considero o olhar de Nosso Senhor Jesus Cristo como se fosse quase outro Evangelho, e uma prodigiosa “leçon des choses”.
“De fato, Jesus é Rei do Universo e, portanto, Rei da História. Não o é apenas da história das nações, mas também da existência individual de cada um de nós. E os desígnios d’Ele vão se fixando e se traçando na medida em que a nossa trajetória neste mundo se desenvolve. Ele vai olhando para nós, e se pudéssemos vê-Lo em cada momento, teríamos o sentido daquilo que estamos vivendo a cada passo.
“Imaginemos Nosso Senhor por ocasião da multiplicação dos pães, considerando o povo reunido em torno d’Ele: “Tenho piedade desta multidão”  (Mt 15, 32). É concebível que Ele tenha proferido essa frase com os olhos fechados? Não pode ser.
“Se os olhos de Jesus não estivessem abertos enquanto Ele falava ou caminhava, teria atraído aquela multidão? Claro está que, se assim o quisesse, Nosso Senhor tocaria aquelas almas mesmo sem lhes dirigir o olhar. Porém, não procedeu dessa forma, e foi o olhar d’Ele que as atraiu.
“Outra passagem do Evangelho na qual me parece que o divino olhar do Salvador se reveste de maior expressividade é o momento em que Jesus, flagelado e coroado de espinhos, foi apresentado ao povo por Pilatos. Para mim, excetuando o instante em que Nosso Senhor fita o Apóstolo Pedro que acabara de negá-Lo, não há episódio no Evangelho onde o papel do olhar se manifesta tão evidente como no “Ecce Homo”. Tanto mais quanto, naquela circunstância, o Redentor não proferiu qualquer palavra, permanecendo num majestoso silêncio.
“Cumpre ressaltar, aliás, o fato impressionante de que os algozes de Nosso Senhor, quando O esbofetearam durante a Paixão, não suportaram o divino olhar que os fitava. Para consumar as suas atrocidades contra Jesus, tiveram de Lhe vendar os olhos..

Devoção ao Sacrossanto olhar

“Essas considerações nos fazem compreender bem que noite tremenda se fez para o mundo quando o olhar d’Ele se extinguiu! Noite na qual se teria vontade de pedir a Deus que nos levasse desta Terra. Pois uma vez que alguém se habituou ao convívio daquele olhar, tendo este se apagado, nenhum sentido restaria para se continuar a viver no mundo. Para fazer o quê? Turismo em alguma linda cidade europeia? Visitar Paris, conhecer Viena? Como estas nos parecem pobres e insípidas, em comparação com a graça de ver aquele divino olhar! As maravilhosas joias da casa d’Áustria, a extraordinária coroa do Sacro-Império, nada seriam para o homem sobre quem pousaram os olhos misericordiosos do Salvador.
“Muito embora a devoção ao Sagrado Coração de Jesus me fale tanto à alma, na realidade toca-me ainda mais a devoção ao olhar d’Ele. Talvez, pela razão mesma de ser o olhar a melhor expressão do coração. E esta seria, caso não o impugnasse a Teologia, a “devoção ao Sacrossanto Olhar...”.
“A partir dessa ideia, poder-se-ia introduzir no “Anima Christi” outras invocações como: olhar padecente, olhar misericordioso, olhar de divino Juiz...  penetrai em mim e fazei-me entrar em vós.  Poder-se-ia, igualmente, compor uma “Ladainha dos olhares de Jesus”, a qual reluziria de uma beleza arrebatadora.
“Concluo, fazendo notar que, quando se analisa assim o Evangelho, encontram-se nele profundidades insuspeitadas. Suas páginas constituem um tesouro repleto de “nova et vetera” – coisas antigas e recentes.
“Tudo quanto acima foi dito nos revelou algo imensamente valioso, mas é natural que se procurem também outras gemas preciosas nesse tesouro. As joias que acabamos de admirar, a nós nos regalam, porque são as meditações que se acrescentam ao cântico antigo, em função de nossa vida, nossas batalhas e nossos sofrimentos nesta terra de exílio”.[9]
  
Eis mais um comentário que Dr. Plínio teceu sobre o olhar de Nosso Senhor Jesus Cristo:
“Se nós pudéssemos fazer uma coleção dos timbres de voz de Jesus ensinando como Mestre!...  Ninguém foi Mestre como Ele, que é o Divino Mestre! Explicando com clareza, com sabedoria, com profundidade, horizontes extraordinários, mas com uma simplicidade de desconcertar. Seu ensino é tão simples e, ao mesmo tempo, tão profundo! Santo Agostinho dizia que o ensinamento d’Ele era como um rio no qual um elefante se afogaria e um cordeiro passaria sem molhar senão os pés.
“Como nós gostaríamos também de, por exemplo, colecionar os seus sucessivos olhares! Para falar senão em dois: o olhar para São Pedro, que o converteu e o fez chorar a vida inteira, e um olhar para Nossa Senhora. Escolham o momento. Talvez o momento do último olhar nesta vida. Com certeza, antes de morrer, Eles trocaram um olhar em que transpareciam o carinho e adoração da parte d’Ela, e o amor indizível, o apreço extraordinário e o carinho da parte d’Ele, ao se separarem.
“Como seria a história de todos os seus olhares? E como seria o olhar d’Ele expulsando os vendilhões do Templo? Para Pilatos, desprezando toda a covardia do Procurador romano? E o olhar de  repreensão aguda e severa para Anás e Caifás?” [10]

O olhar de Jesus no Juízo Final

Assim, podemos imaginar como o olhar de Nosso Senhor Jesus Cristo refletiu o Seu bondoso coração. Já antes de nascer, os místicos dizem que Ele se privou da luz de seus olhos no seio virginal de Sua Mãe, a Santíssima Virgem Maria, como um verdadeiro martírio, prevendo já os piores momentos que iria passar ao final de Sua vida. Ao nascer, derramou todo seu inocente olhar dentro dos olhos de Sua Mãe Santíssima, com a qual teve colóquios e olhares amorosos durante toda a vida terrena.
Em Sua Paixão e Morte, os olhares de Nosso Senhor percorriam a multidão à procura de um coração piedoso que tivesse compaixão d’Ele. Até que os ímpios Lhe vendaram os olhos para que não tocasse tão bondosamente os olhares das pessoas que estavam ali e os convertesse, como o fez a Madalena.
Finalmente, no Juízo Final teremos o último olhar de Jesus Cristo, abarcando não somente toda a humanidade mas toda a historia, que será terrível para os ímpios e cheio de bondade para os justos. Naquele momento ninguém terá poder suficiente para Lhe colocar uma venda como o fizeram na sua Paixão.
Santa Catarina de Sena diz como será aquele olhar final:
“Aos olhos do condenado, sem embargo, ele aparecerá com aquele olhar terrível e tenebroso, que tem o mesmo condenado em si mesmo”. Completa Santa Catarina dizendo que isto não quer dizer que Jesus Cristo, a Bondade suma e infinita, tenha um “olhar temível e tenebroso”, mas sim, que será esta a forma com que o condenado O verá por “ter o mesmo olhar dentro de si mesmo”...
Santa Teresa de Jesus manifesta também grande temor daquele olhar terrível:
Nunca tive tanto medo dos tormentos do inferno que não  fosse menos que nada em comparação do que tinha quando me lembrava que os condenados haviam de ver irados estes olhos tão formosos e mansos e benignos do Senhor...”.[11]

Semblante de Jesus nas visões de uma mística italiana

“Uma manhã, não me recordo muito bem, creio que haviam passado cerca de três meses desde que comecei a estar continuamente na cama, quando estava em meu acostumado estado veio meu doce Jesus com um aspecto todo amável, como um jovem de dezoito anos, oh como era belo! Com sua cabeleira dourada e toda cacheada, parecia que encadeava os pensamentos, os afetos, o coração. Sua fronte serena e larga, onde se olhava como dentro de um cristal o interior de sua mente e se descobria sua infinita sabedoria, sua paz imperturbável. Oh como me sentia tranquilizar minha mente, meu coração, muito mais, minhas próprias paixões ante Jesus caíam por terra e não se atreviam a dar-me a mínima moléstia. Eu creio, não sei se me engano, que não se pode ver a este Jesus tão belo se não se está na calma mais profunda, tanto que o mínimo assomo de intranquilidade impede ter uma vista tão bela. Ah, sim! Somente ao ver a serenidade de sua fronte adorável, é tanta a infusão de paz que se recebe no interior, que acredito que não há desastre, guerra mais feroz que ante Jesus não se acalme. Oh meu tudo e belo Jesus, se por poucos momentos que te manifestas nesta vida comunicas tanta paz, de modo que se podem sofrer os mais dolorosos martírios, as penas mais humilhantes com a mais perfeita tranquilidade, parece-me uma mistura de paz e de dor, que será no Paraíso? Oh, como são belos seus olhos puríssimos, cintilantes de luz; não é como a luz do sol que querendo olhá-la prejudica nossa vista, não, em Jesus embora seja luz pode-se muito bem fixar o olhar, e somente com o olhar o interior de sua pupila, de uma cor celeste escuro, oh, quantas coisas me dizia. É tanta a beleza de seus olhos que uma só olhada sua basta para fazer-me sair fora de mim mesma e fazer-me correr atrás d’Ele por caminhos e por montes, por terra e pelo céu, basta somente uma olhada para transformar-me n’Ele e sentir descer em mim algo de divino. Quem pode descrever ademais seu rosto adorável? Sua pele branca, parecida à neve tingida de uma cor de rosas das mais belas; em suas bochechas bem rosadas se descobre a grandeza de sua pessoa, com um aspecto majestosíssimo e todo divino, que infunde temor e reverência e ao mesmo tempo dá tanta confiança, e quanto a mim, jamais encontrei pessoa alguma que me dê ao menos uma sombra da confiança que dá meu amado Jesus, nem em meus pais, nem nos confessores, nem em minhas irmãs. Ah, sim, esse rosto santo, enquanto é tão majestoso, ao mesmo tempo é tão amável, e essa amabilidade atrai tanto que a alma não tem a mínima dúvida de ser acolhida por Jesus, por quão feia e pecadora se veja. Belo é também seu nariz afilado, proporcionado a seu sacratíssimo rosto. Graciosa é sua boca, pequena, porém extremamente bela, seus lábios finíssimos de uma cor escarlate, enquanto fala contém tanta graça que é impossível poder  descrevê-lo. É doce a voz de meu Jesus, é suave, é harmoniosa, enquanto fala sai de sua boca um perfume tal que parece que não se encontra sobre a terra, é penetrante, de modo que a tudo penetra, se sente descer pelo ouvido ao coração e, oh, quantos afetos produz, mas quem pode dizê-lo todo? Ademais, é tão agradável que creio que não se podem encontrar outros prazeres como os que se podem encontrar numa só palavra de Jesus. A voz de Jesus é potentíssima, é operante, e no mesmo momento que fala opera o que diz. Ah sim, é bela sua boca, mas muito mais sua formosa graça no ato de falar então se veem seus dentes tão nítidos e bem alinhados, e exala seu hálito de amor que incendeia, asseteia, consuma o coração. Belas são suas mãos, suaves, brancas, delicadíssimas, com seus dedos proporcionados e que move com uma maestria tal que é um encanto. Oh, como sois belo, todo belo, ou meu doce Jesus! O que tenho dito de vossa beleza é nada, tem mais, parece-me que tenho dito muitos desatinos, mas que queres de mim? Perdoa-me, é a obediência que assim o quer, por mim não me teria atrevido a dizer nem uma palavra, conhecendo minha incapacidade”. [12]


Notas:



[1] Vida, Paixão e Glorificação do Cordeiro de Deus “– Anna Catharina Emmerich - Editora Mir – págs. 81/82
[2] revista “Dr. Plínio”, n. 83, de fevereiro de 2005, pág. 30
[3]   “O Apóstolo São  Pedro “, Ed. Melhoramentos - pp. 46/47
[4] A Vida Íntima de Nosso Senhor Jesus Cristo”. Maria Cecília Baij, OSB, Acrópole Editora e Distribuidora Ltda, 1984, págs. 443/444
[5] op. cit. pp. 445/446
[6] Publicada originalmente no mensário “Catolicismo”, de março de 1951, e divulgada em forma de opúsculo  pela campanha “Vinde Nossa Senhora de Fátima, não tardeis!” – pág. 6
[7] Vida, Paixão e Glorificação do Cordeiro de Deus” – Mir Editora – São Paulo, 1999 – págs. 189/190
[8] op. cit.  págs. 191/192
[9] revista “Dr. Plínio”, janeiro de 2004, págs. 18/20
[10] revista “Dr. Plínio”, edição de junho de 2003:
[11] Obras Completas de Santa Teresa de Jesus – Carmelo do Porto, Portugal – pág. 801
[12] Memórias da Serva de Deus Luísa Piccarreta – “A Pequena Filha da Divina Vontade” – págs..93/95